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Caro educando e cara educanda,

Estamos iniciando o Módulo II do nosso curso. Neste módulo, conheceremos um pouco sobre o que são as comunidades rurais e tradicionais de Goiás. Para facilitar e organizar nossos estudos, dividiremos este módulo em quatro partes.

Na PARTE 1, falaremos um pouco sobre as noções de cultura e identidade envolvendo as comunidades rurais e tradicionais. Para isto, falaremos um pouco sobre os processos geográficos e históricos da formação das comunidades tradicionais, tais como quilombolas e ribeirinhos, bem como sua diversidade cultural e sua relação com os saberes populares e conhecimentos tradicionais. Também será neste momento que falaremos um pouco sobre a reforma agrária, os assentamentos rurais e a agricultura familiar, considerando seus aspectos socioeconômicos e suas dimensões de gênero, geração, equidade e sustentabilidade.

Na PARTE 2, abordaremos os modos de vida e sua relação com os recursos naturais e a própria ideia de natureza, buscando identificar como as comunidades rurais e tradicionais se organizam no seu território. Neste estudo, nos dedicaremos: aos conceitos básicos e métodos em biologia da conservação; à contextualização das principais ameaças à biodiversidade e sua implicação ao setor produtivo; à preservação e recuperação de áreas de preservação permanente (APPs); às políticas de meio ambiente, recursos hídricos e saneamento; às bacias hidrográficas e aos comitês de bacias; aos processos participativos e integrados de gestão ambiental.

Na PARTE 3, estudaremos os aspectos produtivos e as formas de organização econômica das comunidades rurais e tradicionais. Entender a dinâmica de organização da produção familiar e camponesa nas comunidades rurais e dos povos e populações tradicionais pode auxiliar na compreensão das práticas de saúde e saneamento adotadas. Por isto, o estudo proposto pretende introduzir: os conceitos básicos sobre os princípios e processos agroecológicos; os sistemas de agricultura alternativa e produção sustentável; o manejo alternativo e integrado de pragas; os métodos aplicados em agrossistemas; a tipologia dos mercados e a sensibilidade da demanda por produtos ambientalmente sustentáveis; as formas de certificação e a legislação federal que regula a agricultura orgânica e agroecológica. Além disso, menciona sobre a organização da produção familiar: experiência de gestão em cooperativas e redes de desenvolvimento local de base ecológica e novas formas de relação com o mercado; economia solidária.

A PARTE 4, por fim, tem por objetivos: proporcionar a análise das questões referentes ao espaço geográfico de ordem política, legal e de direito e sua interface com os problemas fundiários, com ênfase na distribuição dessas terras no território goiano; aspectos históricos relativos ao processo de ordenamento territorial e de construção social no campo, com ênfase nos principais agentes e atores transformadores; reforma agrária e assentamentos rurais, aspectos históricos, políticas públicas e de representação coletiva frente aos movimentos sociais. Ao encerrar o módulo, queremos frisar a importância da participação social nos processos de transformação social.

Para isso, precisaremos que você dedique a esse módulo 60 horas.

Iniciaremos os trabalhos, fazendo o seguinte questionamento: Você sabe o que são comunidades rurais e tradicionais? Como elas se organizam? O que as aproxima e as diferencia das demais comunidades? Como se expressam os seus saberes?

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São muitas questões a serem respondidas! Vamos procurar juntos as respostas?

Venham conosco!!!

Casa tradicional Quilombola. Foto: Kleber do Espírito Santo Filho.

Para começar conhecendo quem são estas comunidades, que é a PARTE I deste módulo, pediremos que assistam aos vídeos abaixo:

O documentário “Entremundos” mostra um debate em torno de como as comunidades tradicionais se mantêm na sociedade, entre a luta em preservar seus interesses a partir da manutenção da ancestralidade e dos saberes sociais e os impactos da sociedade urbana e industrial que as afligem. O vídeo apresenta que as comunidades tradicionais lutam para sobreviver em uma sociedade tecnológica, urbana e conectada a outras culturas.

Já a filmagem sobre “Assentamentos Rurais” apresenta como a reforma agrária pode contribuir para a qualidade de vida das populações do campo, ofertando um novo ambiente de vida e trabalho.

E o filme sobre as “Comunidades Ribeirinhas” registra algumas das práticas culturais e produtivas destas populações em regiões da Amazônia.

Atividade

O que os documentários nos apresentaram?

Com as informações apresentadas até aqui, já é possível entender algumas características das comunidades rurais e tradicionais.

  • O que foi possível entender por povos e populações tradicionais?
  • O que foi possível entender que é um assentamento rural?
  • Qual a diferença entre assentamentos rurais e povos e populações tradicionais?

Que tal preencher o quadro abaixo com essas reflexões?

Item Povos e populações tradicionais Assentamentos rurais
Definição
Características

Em relação aos povos e às populações tradicionais, que tipologias de comunidades podem ser abrangidas por esta denominação?

Como vimos, a sobrevivência dessas comunidades não é uma tarefa fácil, porque o que está em jogo é o acompanhamento das mudanças sociais, e ao mesmo tempo, o direito de viver conforme os preceitos da cultura.

Nesse sentido, as comunidades tradicionais são aquelas que vivem e se apoiam na cultura.

A cultura pode ser definida, segundo Alfredo Bosi , como o reflexo (os costumes que herdamos, o modo que vivemos ditados pelo que aprendemos de nossos ancestrais, as danças, práticas culturais, modo de plantio e cultivo das plantas e cuidado dos animais etc.) e a criação (quer dizer que não é algo linear, pois o que marca o ser humano é a capacidade de, mesmo tendo herdado determinadas práticas, se adequar de acordo com as condições materiais que dispõem ao seu favor).

Assim, para Bosi (1992), cultura é não só a herança de valores, mas o projeto de um convívio, com o uso de práticas para isso.

Então, não podemos afirmar que a cultura é algo estático, mas que dialoga com o tempo: passado, presente e futuro. Desta forma, ao falarmos de comunidades tradicionais, não podemos esperar que essas comunidades não utilizem equipamentos do presente para auxiliá-los nas tarefas do seu cotidiano, ou que estejam estaticamente presas ao modelo produtivo de épocas pretéritas.

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O que pode definir o modo de vida das comunidades rurais e tradicionais é a forma como produzem os chamados saberes sociais.

Cândido Grybowski define saberes sociais como o conjunto de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes que são produzidos pelas comunidades tradicionais para fazer valer os seus interesses. Segundo ele,

[...] há um tempo nas lutas e um tempo para o aprendizado coletivo. A continuação da prática e o acumúmulo de experiências permitem um salto de consciência, na socialização política. Trata-se da formação de um saber social com os elementos da prática de luta e com os recursos da própria cultura do grupo. A reapropriação da cultura popular, sua elaboração crítica enquanto negação da cultura dominante, a afirmação do perfil cultural dos trabalhadores, a incorporação de um novo saber obtido na luta e seu uso político pelos movimentos sociais são, sem dúvida, algumas das questões mais importantes que decorrem da irrupção das classes subalternas na arena política, do seu exercício da cidadania.

Nesse trecho, fica claro que, para que as comunidades tradicionais mantenham o seu modo de vida, é necessário empreender uma luta.

Lutar para serem reconhecidos como cidadãos, portadores de direitos iguais, significou, para esses coletivos, lutar também pelo reconhecimento e valorização de sua identidade, o que revelou a dimensão conflitiva da vida política (MOUFFE, 1990, p. 28).

Cabe aos movimentos sociais a organização desses grupos, de modo a levantar a bandeira para os conflitos vivenciados. A grande contribuição dos movimentos sociais foi engendrar as lutas, encarregando de dar visibilidade a grupos que historicamente se encontravam invisíveis, construindo uma pauta em torno da diversidade de modos de vida e projetos oriundos, como o indígena, o quilombola, o MST, etc. É necessário que cada um se veja em um “mundo que seja único e diverso, um mundo onde caibam muitos mundos” (LEITE, 2017, p. 17).

A luta dos movimentos sociais é a luta pela transformação da sociedade, a manutenção do direito a viver de acordo com as suas escolhas, e não apenas pela tomada do poder pelo Estado.

Cabe aos coletivos, através dos movimentos sociais, ampliarem a democracia, de modo que todos possam ter direitos, sendo reconhecidos não pelo racismo, preconceito ou pela exploração econômica, mas pela capacidade de manterem-se a partir de seus saberes, costumes, tradições e valores;

Então, cabe-nos compreender que, sem os movimentos sociais, não há possibilidade de mudança. Foi com muita luta que os povos e as comunidades tradicionais tiveram a garantia de seus direitos.

A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) , ratificada em 1989, reconheceu os povos indígenas e tribais no mundo como sujeitos de garantia de direitos e proteção.

No Brasil, apesar de a construção étnica ter se efetivado com a presença indígena e africana, foi somente a partir de 2007 que se instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), por meio do Decreto n⸰ 6040 de 07 de fevereiro de 2007, pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (SEPPIR).

Esse decreto designa esses povos como:

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[...] grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos por tradição (SEPPIR, 2018).

São considerados povos e comunidades tradicionais, segundo o mesmo decreto:

[…] Entre os povos e comunidades tradicionais do Brasil estão quilombolas, ciganos, matriz africana, seringueiros, castanheiros, quebradeiras de coco-de-babaçu, comunidades de fundo de pasto, faxinalenses, pescadores artesanais, marisqueiras, ribeirinhos, varjeiros, caiçaras, praieiros, sertanejos, jangadeiros, ciganos, açorianos, campeiros, varzanteiros, pantaneiros, caatingueiros, entre outros (SEPPIR, 2018).

Segundo a Seppir, essas comunidades não são um número inexpressivo como possamos imaginar, mas integram 5 milhões de brasileiros e brasileiras, ocupando um quarto do território nacional.

A luta pela terra e os direitos territoriais tiveram várias faces no Brasil. O processo de formação política e econômica do país, derivado do modelo de colonização empregado pela coroa portuguesa, expropriou não só os povos originários (povos indígenas) de suas terras, mas o modelo de desenvolvimento que se seguiu. Este criou uma variedade de pessoas e grupos que, destituídos de sua terra natal, deram origem aos movimentos sindicais rurais e ao dos sem terra.

Para conhecer um pouco da história dos posseiros e camponeses do Brasil, leia os livros:

  • Os parceiros do Rio Bonito, de Antônio Cândido.
  • Os camponeses e a política no Brasil, de José de Souza Martins.
  • O cativeiro da terra, de José de Souza Martins.

Podemos dizer que os assentamentos de reforma agrária derivam da história de toda luta dos camponeses e posseiros no país. Portanto, quando falamos de assentamentos rurais, também estamos falando de pessoas que lutaram pelo direito à terra. Vocês já ouviram falar das ligas camponesas? Das lutas de Trombas e Formoso?

As lutas camponesas de Trombas e Formoso

Trombas e Formoso são dois povoados do município de Amaro Leite, hoje Norte do Estado de Goiás, onde aconteceu a luta de posseiros camponeses contra o processo de expropriação promovido por um grupo de grileiros nas décadas de 1950 e 1960. De acordo com Borges (2005), a origem dos camponeses posseiros que chegaram na região está nas políticas de expansão de fronteiras que ficaram conhecidas como Campanha Marcha para o Oeste, a partir de 1938. O autor aponta como a construção da nova capital federal e da rodovia Belém-Brasília na década de 1950 atraiu os investimentos do processo de modernização da agricultura vinculados à perspectiva capitalista da exploração da terra naquela região.

Assim, o conflito pelas terras começou quando um grupo de fazendeiros, um juiz e o dono de um cartório local grilaram títulos que lhes garantissem a propriedade das terras devolutas na região, e seguiram com tentativas violentas de expulsão dos posseiros, com a atuação de jagunços e agentes da polícia local, que se recusaram a sair. O crescimento dos conflitos na região levou o PCB a acompanhar a resistência dos posseiros e a colaborar com a organização do movimento, de forma que, no final da década de 1950, essas duas movimentações formaram as alianças que caracterizaram o conflito de Trombas e Formoso: Partido Comunista e os posseiros de um lado e os grileiros e o Estado de outro (MAIA, 2008).

Para saber mais sobre o conflito:

  • Filme: Trombas e Formoso - Memórias de uma luta. https://www.youtube.com/watch?v=Agt9anlBokY
  • BORGES, Barsanufo Gomides. Goiás nos quadros da economia nacional: 1930 – 1960. Goiânia: Editora UFG, 2005.
  • MAIA, Cláudio Lopes. Os donos da terra: a disputa pela propriedade e pelo destino da fronteira – a luta dos posseiros em Trombas e Formoso 1950/1960. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em História, Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2008.
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A luta pela terra marcou a história do Brasil e de Goiás, e a busca por direitos levou os camponeses a exigirem leis que lhes fossem favoráveis. Em 1963, foi promulgada a Lei n⸰ 4.214, de 2 de março, instituindo o Estatuto do Trabalhador Rural, que garantiu direitos à jornada de trabalho de oito horas, férias, entre outros . Esta lei foi revogada pela Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973, que estendeu as disposições da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) aos trabalhadores rurais. Esta lei representou conquistas importantes e contribuiu para o fortalecimento das organizações sindicais de trabalhadores rurais.

Mas foi no período do golpe militar que foi promulgado o Estatuto da Terra (Lei n⸰ 4504, de 30 de novembro de 1964). Esta lei apresenta os procedimentos e mecanismos básicos e fundamentais para a execução da reforma agrária e promoção da política agrícola. No artigo 1º, parágrafo 1°,

Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade.

A Constituição Federal (CF) 1988, no artigo 184, reafirmou a destinação do imóvel que não cumprir sua função social para fins de reforma agrária. O país teve dois Planos Nacionais de Reforma Agrária, sendo que o I PNRA foi elaborado antes da CF, em 1985, por meio do Decreto n⸰ 91766, de 10 e outubro, e o II PNRA foi aprovado em 2014 . Para regulamentar os procedimentos de execução da reforma agrária, dispostos na CF, foi promulgada a Lei n⸰ 8.629, de 25 de fevereiro de 1993.

Portanto, vejam que estamos estudando grupos sociais marcados por lutas, conquistas e perdas!

Vale dizer que, por causa da histórica má distribuição de riquezas e da desigualdade social que assolam essas comunidades, muitos vivem em situação de negação de direitos, com escolas precárias, saúde que não chega para eles, ausência de saneamento, muita vulnerabilidade social, preconceito e discriminação!

A vulnerabilidade social, preconceito e discriminação invisibilizam os conflitos vividos diariamente no campo , que por vezes ameaçam a permanência dessas comunidades em seus territórios e a própria vida.

O nosso trabalho nesse curso é dar visibilidade a essa situação, intervindo de forma a garantir uma situação digna, de respeito e de inserção social a esses diversos brasileiros!

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Atividade

Vamos ler a poesia “Somos todos Severinos”, de João Cabral de Melo Neto, para refletir sobre isso um pouco?

O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.

Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.

Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.

Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).

Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,

a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.

(Morte e Vida Severina - Introdução)

João Cabral de Melo Neto

O que esta poesia (fala) apresenta para nós? (Vamos colocar nossas impressões no FÓRUM?)

Para saber mais sobre a ocasião da escrita dessa poesia, acesse em: https://revistacult.uol.com.br/home/60-anos-morte-vida-severina/

Além da poesia, vários pintores pensaram a cultura brasileira e a expressaram em suas obras. Sugerimos que vejam o quadro “A Alma, o povo e a vida brasileira”, de Cândido Portinari:

Fonte: https://www.google.com.br/search?q=pinturas+sobre+o+homem+do+campo+de+1940&tbm

O que esta pintura apresenta para nós? (Vamos colocar nossas impressões no FÓRUM?)

Como você pode ver, tanto a poesia como o quadro mostram situações de trabalho, que embora retratem situações do passado, ainda são bem atuais no que se refere ao trabalho pesado, aos direitos negados e à manutenção das formas de exploração do trabalho. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) , desde 1995 mais de 40.000 trabalhadores foram resgatados de condições análogas ao trabalho escravo no Brasil.

Considerando tudo o que foi dito até agora, vamos pensar sobre as comunidades rurais e tradicionais do seu município.

  • Quais comunidades rurais e tradicionais existem no seu município?
  • Você conhece ou já visitou alguma comunidade desta?
  • Quais são as características históricas e culturais que você diria sobre elas?

Caso você não conheça nenhuma comunidade rural ou tradicional no seu município, procure a prefeitura, a secretaria de saúde, a secretaria de agricultura ou a secretaria de meio ambiente e procure se informar sobre quais comunidades existem no seu município e como elas vivem.

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Conversando sobre gênero e geração no meio rural

Gênero e geração no meio rural

Um outro aspecto a se considerar para compreensão das comunidades rurais são as análises de gênero e geração. O reconhecimento do protagonismo das mulheres e da juventude nas comunidades rurais e tradicionais possibilitou a execução de políticas públicas de valorização destes sujeitos sociais.

No campo, as mulheres são responsáveis pelo cuidado com a casa, pelas tarefas domésticas e pelo quintal, onde se dedicam a hortas, à transformação de alimentos e ao trato dos animais domésticos (porcos, galinhas...) (BUTTO; HORA, 2014). Entretanto, as atividades realizadas pelas mulheres no dia a dia não são consideradas como trabalho, por não serem contabilizadas monetariamente. Esta noção também implica a não valorização dos trabalhos realizados por elas. Paulilo (1987) identifica que, no campo, as mulheres se dedicam ao “trabalho leve”, que não significa um trabalho agradável, desnecessário ou pouco exigente em termos de tempo ou de esforço. O “leve” indica apenas que o trabalho é realizado por mulheres ou crianças, que recebem menor ou nenhuma remuneração.

A invisibilidade do trabalho das mulheres rurais também tem reflexo sobre os temas da saúde e ao saneamento. Face às desigualdades de gênero e geração no meio rural, mulheres e crianças tendem a ser mais penalizadas na ausência de serviços de saneamento, sendo essas as responsáveis pelo cuidado com a água e a busca por este recurso destinado à subsistência familiar (HORA et al., 2015; NOBRE; HORA, 2017).

As desigualdades de gênero no meio rural tendem a ser naturalizadas e reproduzidas nas ações de extensão e, mesmo, nas políticas públicas (BUTTO; HORA, 2008). Paulilo (1987) identifica que essa situação ocorre devido à valorização social do homem enquanto chefe de família, responsável pela reprodução de seus dependentes, de tal forma que o trabalho da mulher é colocado em plano secundário, como uma “ajuda” na composição do orçamento familiar.

Ao mesmo tempo, o protagonismo das mulheres das regiões rurais da América Latina e do Caribe na manutenção socioeconômica e cultural das comunidades em que vivem é crescente, assim como a luta pelos seus direitos, os planos individuais e o bem viver coletivo (FAO, 2017). Nas comunidades rurais e tradicionais, as mulheres são ainda as principais responsáveis pela defesa de seus territórios e da biodiversidade, pela transmissão do conhecimento e da história de sua comunidade, como também de saberes tradicionais técnicos, como o manejo ecológico, a seleção de sementes, a reprodução de plantas em extinção e o uso de plantas medicinais e ervas. Em Goiás, podemos identificar experiências como essas:

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Referências

BEZERRA, Roberto; HORA, Karla E. R.; SCALIZE, Paulo S. Cenário das políticas públicas de saneamento nas comunidades quilombolas do estado de Goiás. Anais do 48º Congresso Nacional de Saneamento - ASSEMAE, Fortaleza-CE, 2018.

BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

BUTTO, A.; HORA, K. E. R. ATER para Mulheres: a experiência recente do governo federal. Cadernos Feministas de Economia e Política, Recife: CMN, 2008b, v.1, p. 130-145.

GRZYBOWSKI, Cândido. Esboço de uma alternativa para pensar a educação no meio rural. Revista Contexto e Educação. Ijuí. Ano 01, n. 4, out./dez., 1986. p.47-59.

HORA, Karla E. R. et al. Gênero e Gestão Integrada dos Recursos Hídricos e Saneamento: aproximações da realidade cabo-verdiana e brasileira. In: REMOA, v. 14, n.1, jan./abr. 2015, p. 166-175. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/remoa/article/viewFile/16697/pdf. Acesso em: 31 jul. 2018.

HORA, Karla; BUTTO, Andrea. Políticas Públicas para Mulheres Rurais no Contexto dos Territórios da Cidadania. In: BUTTO, Andrea et al. Mulheres Rurais e Autonomia: formação e articulação para efetivar políticas públicas nos territórios da cidadania. Brasília, MDA, 2014. p.14-45.

LEITE, Lúcia Helena Alvarez; OLIVEIRA, Fernanda Silva de. A atualidade do pensamento de Paulo Freire e sua contribuição para a educação no Brasil. Paideia, ano 9, n. 13, p. 43-56, jul./dez. 2012, p. 17.

MOUFFE, Chantal. El retorno de lo político. Barcelona: Paidós, 1999.

ORGAIZACION DE LAS NACIONES UNIDAS PARA LA ALIMENTACIÓN Y LA AGRICULTURA – FAO. In: NOBRE, Miriam; HORA, Karla. (Orgs.) Atlas de las mujeres rurales de América Latina y el Caribe. Chile, 2017.

PAULILO, Maria Ignez Silveira. O peso do trabalho leve. Revista Ciência Hoje. v. 5, n. 28, p. 64-70, Rio de Janeiro, 1987.

SEPPIR, Comunidades tradicionais.In http://www.seppir.gov.br/comunidades-tradicionais. Acesso em 15/07/2018.

BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

GRZYBOWSKI, Cândido. Esboço de uma alternativa para pensar a educação no meio rural. Revista Contexto e Educação. Ijuí. Ano 01, n. 4, out./dez., 1986. p.47-59.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) é uma agência das Nações Unidas, criada em 1919 como parte do Tratado de Versalhes, no fim da Primeira Guerra Mundial, responsável pela formulação e aplicação das normas internacionais do trabalho (Convenções e Recomendações), com o objetivo de promover justiça social em defesa do acesso ao trabalho decente e produtivo, para mulheres e homens, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade. Você pode conhecer um pouco mais sobre o trabalho da OIT no seu endereço eletrônico, Disponível em: http://www.ilo.org/brasilia/conheca-a-oit/lang--pt/index.htm

Para conhecer um pouco mais desta histórica, você pode ler o livro A História da Luta pela Terra e o MST, de Misue Morissawa.

Você pode conhecer um pouco mais sobre o Estatuto do Trabalhador Rural consultando o verbete Estatuto do Trabalhador Rural, que está disponível no seguinte endereço eletrônico:http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/estatuto-do-trabalhador-rural

O I PNRA está disponível em:http://www.incra.gov.br/sites/default/files/uploads/servicos/publicacoes/pnra/i_pnra.pdf

O II PNRA está disponível em:http://www.incra.gov.br/servicos/publicacoes/pnra/file/482-ii-pnra

Anualmente a Comissão Pastoral da Terra sistematiza e divulga os conflitos vividos no Brasil, com a publicação do Conflitos no Campo Brasil. Todas as edições estão disponíveis no site: https://www.cptnacional.org.br/index.php/publicacoes-2/conflitos-no-campo-brasil

Para conhecer mais sobre essa realidade, acesse o estudo da OIT sobre o Perfil dos Principais atores envolvidos no Trabalho Escravo Rural no Brasil. http://www.justica.sp.gov.br/StaticFiles/SJDC/ArquivosComuns/ProgramasProjetos/NETP/Relat%C3%B3rio%20OIT.%20Trabalho%20Escravo%20Rural%20Brasil.%202011.pdf