23

Caro educando e cara educanda,

Neste módulo já falamos de muitas coisas. Vamos tentar relembrar um pouco?

Na Parte 1, falamos sobre os diferentes tipos de conhecimento (popular e o científico) e ressaltamos os elementos de metodologia científica que lhe auxiliarão na elaboração e no desenvolvimento de sua pesquisa. Na Parte 2, falamos sobre didática e suas estratégias de ensino e aprendizagem. Na Parte 3, estudamos sobre a educação popular e sua interface com a educação do campo. Além disto, apresentamos alguns caminhos para o estudo da relação “educação e comunicação” na atualidade.

Agora que você já tem domínio dos conceitos básicos de metodologia científica e das estratégias de educação popular, vamos aplicá-las ao estudo da educação ambiental e sua relação com as ações de mobilização social em saneamento.

Vamos continuar nossos estudos?

Você sabe em que contexto surgiu a educação ambiental e qual a sua importância?

1) Histórico da educação ambiental

Desde a antiguidade, os seres humanos enfrentam problemas ambientais que afetam a sua saúde e qualidade de vida. No entanto, notadamente a partir da Revolução Industrial, que começou na Inglaterra no século XVIII, esses problemas se intensificaram.

A transição dos métodos de manufatura de produtos da maneira manual para aqueles produzidos por máquinas acelerou os processos produtivos e aqueceu a economia mundial por meio da industrialização e geração de novos empregos e profissões. No entanto, esse processo de industrialização trouxe consigo alguns aspectos negativos, como maiores níveis de poluição do ar, contaminação de fontes de água e do solo e aumento do risco de desenvolvimento de doenças, devido às maiores concentrações de pessoas nas cidades, vivendo, muitas vezes, em condições insalubres.

Para tentar reverter esses problemas, foram criados leis, normas e decretos de caráter proibitivo, disciplinadores e punitivos, mas estes instrumentos nem sempre resultaram em avanços concretos na resolução dos problemas ambientais e na melhoria da qualidade de vida das pessoas.

Nesse contexto, percebeu-se a necessidade de associar o processo educativo para conceber estrategicamente a sociedade, surgindo, assim, a educação ambiental. Deste modo, na década de 1960 foi utilizada pela primeira vez a expressão educação ambiental (enviromental education) na “Conferência de Educação” da Universidade de Keele, na Grã-Bretanha.

No entanto, foi a partir da década de 1970 que, diante do reconhecimento mundial da complexidade crescente dos problemas que afetam o meio ambiente, a expressão educação ambiental impregnou não só o ideário político, como também passou a ocupar destaque no contexto pedagógico (RAMOS, 2001).

No quadro que se segue, apresentamos um breve histórico da educação ambiental no mundo:

24

Fonte: Ministério do Meio Ambiente. Disponível em: http://www.mma.gov.br/educacao-ambiental/politica-de-educacao-ambiental/historico-mundial

Anos 1960 Anos 1970 Anos 1980 Anos 1990 Anos 2000

1962 - Publicação da “Primavera Silenciosa”, por Rachel Carlson.

1965 – Utilizou-se a expressão “educação ambiental” (enviromental education) na “Conferência de Educação” da Universidade de Keele, na Grã-Bretanha.

1966 - Pacto Internacional sobre os Direitos Humanos - Assembleia Geral da ONU.

1968 - Fundação do Clube de Roma, 1968, Manifestações de Maio de 68 na França.

1972 - Publicação do Relatório “Os Limites do Crescimento” - Clube de Roma.

1972 - Conferência de Estocolmo - Discussão do Desenvolvimento e Ambiente, Conceito de Ecodesenvolvimento. Recomendação 96, Educação e Meio Ambiente.

1973 - Registro Mundial de Programas em Educação Ambiental – USA.

1974 - Seminário de Educação Ambiental em Jammi, Finlândia - Reconhece a Educação Ambiental como educação integral e permanente.

1975 - Congresso de Belgrado - Carta de Belgrado - estabelece as metas e os princípios da educação ambiental.

1975 - Programa Internacional de Educação Ambiental (PIEA).

1976 - Reunião Subregional de EA para o ensino Secundário Chosica, no Peru. Questões ambientais na América Latina estão ligadas às necessidades de sobrevivência e aos direitos humanos.

1976 - Congresso de Educação Ambiental Brasarville, na África - Reconhece que a pobreza é o maior problema ambiental.

1977 - Conferência de Tbilisi, na Geórgia - Estabelece os princípios orientadores da EA e remarca seu caráter interdisciplinar, crítico, ético e transformador.

1979 - Encontro Regional de Educação Ambiental para a América Latina, em San José, na Costa Rica.

1980 - Seminário Regional Europeu sobre EA, para a Europa e a América do Norte. Assinala a importância do intercâmbio de informações e experiências.

1980 - Seminário Regional sobre EA nos Estados Árabes, Manama, Bahrein. UNESCO - PNUMA.

1980 - Primeira Conferência Asiática sobre EA Nova Delhi, na Índia.

1987 - Divulgação do Relatório da Comissão Brundtland, Nosso Futuro Comum.

1987 - Congresso Internacional da UNESCO – PNUMA, sobre Educação e Formação Ambiental - Moscou. Realiza a avaliação dos avanços desde Tbilisi, reafirma os princípios de educação ambiental e assinala a importância e necessidade da pesquisa e da formação em educação ambiental.

1988 - Declaração de Caracas. ORPAL - PNUMA, sobre Gestão Ambiental em América. Denuncia a necessidade de mudar o modelo de desenvolvimento.

1989 - Primeiro seminário sobre materiais para a educação ambiental. ORLEAC - UNESCO - PIEA. Santiago, no Chile.

1989 - Declaração de HAIA, preparatório da RIO 92. Aponta a importância da cooperação internacional nas questões ambientais.

1990 - Conferência Mundial sobre Ensino para Todos, satisfação das necessidades básicas de aprendizagem, Jomtien, na Tailândia. Destaca o conceito de analfabetismo ambiental.

1990 - ONU declara o ano de 1990 como o Ano Internacional do Meio Ambiente.

1991 - Reuniões preparatórias da Rio 92.

1992 - Conferência Sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, UNCED, Rio/92 - Criação da Agenda 21; Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis; FORUN das ONGs - compromissos da sociedade civil com a educação ambiental e o meio ambiente; Carta Brasileira de Educação Ambiental - aponta as necessidades de capacitação na área.

1993 - Congresso Sul-americano continuidade Eco/92 – Argentina.

1993 - Conferência dos Direitos Humanos. Viena.

1994 - Conferência Mundial da População. Cairo.

1994 - I Congresso Ibero Americano de Educação Ambiental. Guadalajara, no México.

1995 - Conferência para o Desenvolvimento Social. Copenhague. Criação de um ambiente econômico-político-social-cultural e jurídico que permita o desenvolvimento social.

1995 - Conferência Mundial da Mulher/Pequim.

1995 - Conferência Mundial do Clima. Berlim, 1996, Conferência Habitat II Istambul.

1997 - II Congresso Ibero-americano de EA. Junho, Guadalajara, no México.

1997 - Conferência sobre EA, em Nova Delhi.

1997 - Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade: Educação e Conscientização Pública para a Sustentabilidade, Thessaloniki, na Grécia.

1999 - É lançada a revista Tópicos en Educación Ambiental, uma publicação internacional editada no México, que contém informações sobre as variadas vertentes e áreas da educação ambiental.

2002 - Em dezembro, a Assembleia Geral das Nações Unidas, durante sua 57ª sessão, estabeleceu a resolução nº 254, declarando 2005 como o início da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, depositando na Unesco a responsabilidade pela implementação da iniciativa.

2003 - Durante a XIV Reunião do Foro de Ministros de Meio Ambiente da América Latina e Caribe, em novembro, no Panamá, oficializou-se o PLACEA, o Programa Latino-americano e Caribenho de Educação Ambiental, que teve como principal protagonista a Venezuela e, como foro de discussões, a série dos congressos ibero-americanos de educação ambiental.

2003 - Em novembro, realizou-se, na Venezuela, a reunião de trabalho de especialistas em gestão pública da educação ambiental na América Latina e no Caribe, que elaborou o plano de implementação do PLACEA, de modo articulado com a Iniciativa Latino-americana e Caribenha para o Desenvolvimento Sustentável.

2003 - Em janeiro criou-se, em Portugal, durante as XII Jornadas Pedagógicas de Educação Ambiental da ASPEA, Associação Portuguesa de Educação Ambiental, a Rede Lusófona de Educação Ambiental, reunindo educadores ambientais brasileiros, portugueses e outras nacionalidades de língua portuguesa.

25

Mas, afinal, o que é educação ambiental?

Existem vários conceitos para definir educação ambiental. Vamos ver alguns deles?

A educação ambiental é um processo de reconhecimento de valores e clarificações de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando as atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as inter-relações entre os seres humanos, suas culturas e seus meios biofísicos. A educação ambiental também está relacionada com a prática das tomadas de decisões e a ética que conduzem para a melhora da qualidade de vida.
Conferência Intergovernamental de Tbilisi (1977)

Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.
Política Nacional de Educação Ambiental - Lei nº 9795/1999, Art. 1º.

A Educação Ambiental deve proporcionar as condições para o desenvolvimento das capacidades necessárias; para que grupos sociais, em diferentes contextos socioambientais do país, intervenham, de modo qualificado tanto na gestão do uso dos recursos ambientais quanto na concepção e aplicação de decisões que afetam a qualidade do ambiente, seja físico-natural ou construído, ou seja, educação ambiental como instrumento de participação e controle social na gestão ambiental pública.
QUINTAS, J. S. Salto para o Futuro, 2008.

Como podemos ver, apesar de os conceitos serem diferentes, todos possuem em comum o fato de trazerem a educação ambiental (EA) como uma educação política, no sentido de que ela reivindica e prepara os cidadãos para exigir justiça social, cidadania nacional e planetária, autogestão e ética nas relações sociais e com a natureza.

Dessa forma, segundo Dias (2004), a EA pretende:

2) Princípios básicos da educação ambiental

Segundo a Política Nacional de Educação Ambiental (Lei nº 9795/1999), são princípios básicos da EA:

  1. O enfoque humanista, holístico, democrático e participativo;
  2. A concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o socieconômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade;
  3. O pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade;
  4. A vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais;
  5. A garantia de continuidade e permanência do processo educativo;
  6. A permanente avaliação crítica do processo educativo;
  7. A abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais;
  8. O reconhecimento e o respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural.
26

Ainda segundo essa mesma lei, são objetivos fundamentais da educação ambiental:

  1. o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos;
  2. a garantia de democratização das informações ambientais;
  3. o estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social;
  4. o incentivo à participação individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania;
  5. o estímulo à cooperação entre as diversas regiões do País, em níveis micro e macrorregionais, com vistas à construção de uma sociedade ambientalmente equilibrada, fundada nos princípios da liberdade, igualdade, solidariedade, democracia, justiça social, responsabilidade e sustentabilidade;
  6. o fomento e o fortalecimento da integração com a ciência e a tecnologia;
  7. o fortalecimento da cidadania, autodeterminação dos povos e solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade.

3) Educação ambiental e o Programa de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento (PEAMSS)

O saneamento básico, ou a falta dele, está diretamente relacionado à qualidade de vida da população. Muitas doenças podem ser causadas devido à falta de saneamento básico adequado.

No entanto, pela complexidade do tema, que envolve inclusive questões relacionadas aos hábitos de vida da população, apenas o desenvolvimento de infraestruturas de saneamento adequadas pode não ser suficiente para evitar que a população seja afetada.

Dessa maneira, segundo Brasil (2009a), é imprescindível desenvolver ações educativas que possibilitem a compreensão sistêmica que a questão exige e estimular a participação popular, engajada e consciente, no enfrentamento dessa questão.

Nesse contexto, a educação ambiental em saneamento pode ser uma estratégia eficaz para despertar o protagonismo da população por meio de ações articuladas entre as questões relativas ao saneamento básico e à educação ambiental.

Partindo dessa premissa, o governo federal brasileiro, por meio do Programa de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento (PEAMSS), tem desenvolvido estratégias para tentar formar cidadãos comprometidos em atuar coletivamente rumo à construção de “sociedades sustentáveis”, como preconiza o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (BRASIL, 2009a).

O PEAMSS também está em consonância com o preconizado na Lei Nacional do Saneamento Básico nº 11.445, de 05/01/2007, que tem como principais objetivos a universalização dos serviços de saneamento e a participação efetiva da sociedade no controle social das ações deflagradas.

O objetivo principal do PEAMSS é fomentar e apoiar o desenvolvimento de iniciativas de educação ambiental e mobilização social em saneamento, de modo que se consolidem como ações continuadas e transformadoras que contribuam para o conhecimento, a participação e o controle social, a universalização do acesso aos serviços de saneamento básico e a construção de sociedades sustentáveis.

Os princípios do PEAMSS são:

27

Também é importante destacar as diretrizes do PEAMSS, pois elas têm caráter orientador e articulador das ações de saneamento básico, devendo ser reconhecidas e observadas como prioritárias e de caráter permanente.

As diretrizes do PEAMSS são as seguintes:

28

4) Temas geradores em saúde e saneamento

O termo tema gerador foi cunhado por Paulo Freire, em 1985, e, segundo ele, o tema gerador é o tema ponto de partida para o processo de construção da descoberta. Por emergirem do saber popular, os temas geradores são extraídos da prática devida dos educandos, substituem os conteúdos tradicionais e são buscados através da “pesquisa do universo vocabular”.

Em saúde e saneamento, vários temas geradores podem ser levantados junto às comunidades onde irão ser desenvolvidas as ações de mobilização social em saneamento.

Exemplos de temas geradores em saúde e saneamento incluem:

Partindo desses temas geradores é possível estabelecer objetivos e estratégias de ação para cada comunidade, baseados na sua realidade local.

Exemplos de temas geradores e respectivos objetivos podem ser obtidos no “Caderno Metodológico para as ações de educação ambiental e mobilização social em saneamento” (BRASIL, 2009b).

5) Estratégias metodológicas participativas para ações educativas em saúde e saneamento

Duas das principais metodologias participativas utilizadas em ações educativas em saúde e saneamento são o biomapa e o diagnóstico rural participativo (DRP).

Referências

BRASIL. Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental. Departamento de Articulação Institucional. Diretrizes para ações de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento – Documento de referência conceitual. Brasília, DF: Ministério das Cidades, 2009a.

BRASIL. Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental Programa de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento. Caderno metodológico para ações de educação ambiental e mobilização social em saneamento. Brasília, DF: Ministério das Cidades, 2009b.

DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 9. ed. São Paulo: Gaia, 2004.

FREIRE, P. A importância do ato de ler. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1985.

RAMOS, E. C. Educação ambiental: origem e perspectivas. Educar, Curitiba, n. 18, p. 201-218. 2001. Editora da UFPR.