VOLTAR À COLEÇÃO ISBN: 978-65-86422-79-5
Volume 2

Ações e reflexões pedagógicas:

Produtos educacionais para o ensino na educação básica

Projeto de ensino e aprendizagem de geometria plana para todos

AUTORES
Danilo Borges Caetano
Jaqueline Araújo Civardi
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1. Apresentação

O Projeto de Ensino e Aprendizagem de Geometria Plana para Todos (PEAGPT) é um produto educacional elaborado como instrumento de investigação da pesquisa de Mestrado Profissional do Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica PPGEEB - Cepae/UFG.

A pesquisa de mestrado foi realizada no período de 2016 a 2018 e teve como objetivo desenvolver e investigar as estratégias de ensino de conteúdos de Geometria Plana, na perspectiva da Educação Matemática Inclusiva, buscando responder à seguinte questão-problema: quais são algumas das características que devem ser observadas na construção de estratégias de ensino, desenvolvidas segundo o Desenho Universal Pedagógico, que levam a uma Educação Matemática Inclusiva no ensino de Área e Perímetro de Figuras Planas?

Trata-se de uma investigação que considera as práticas de ensino como ponto de partida na formação continuada de uma professora do ensino fundamental de uma escola pública e inclusiva no município de Itaberaí-GO.

A partir do trabalho colaborativo, envolvendo uma parceria entre professores-pesquisadores da academia e professores da educação básica, procuramos promover ações docentes e um caderno com os registros dessas estratégias, que subsidiaram nossa análise.

A teoria histórico-cultural de Vygotsky (1994), complementada pela teoria da atividade humana de Leontiev (2016) e a teoria da atividade de aprendizagem na criança em Galperin (1987), são alguns dos pressupostos teóricos que subsidiaram a investigação e as ações pedagógicas. A criação das estratégias e instrumentos pedagógicos foi fundamentada também no conceito de Desenho Universal Pedagógico, de Kranz (2015).

Para o alcance dos objetivos propostos, adotamos a abordagem qualitativa, utilizando técnicas e instrumentos tais como: observação participante, diário de campo, entrevista estruturada, gravação de áudio e vídeo e registro dos alunos.

Encontramos como resultado o reconhecimento da importância e do uso dos procedimentos pedagógicos para ajudarem os educandos a encontrarem motivos para participarem da atividade. Assim como a realização da atividade em grupos promoveu uma maior interação entre os alunos e propiciou a utilização de linguagem própria e a ajuda do outro na atividade de aprendizagem.

Outro resultado foi que a elaboração dos instrumentos pedagógicos, na perspectiva do Desenho Universal Pedagógico, permitiu que todos os educandos participassem da atividade de maneira criativa na aprendizagem dos conteúdos de geometria. Consideramos ainda, que foi importante, a mediação do docente para potencializar nos educandos o raciocínio intuitivo nos conceitos de área e perímetro.

A compreensão dos objetivos de cada atividade pelos alunos foi importante para que eles pudessem compreender melhor as estratégias utilizadas, a intenção de cada atividade e até mesmo o desenvolvimento de um maior interesse em participar da aula. Identificamos essas características em relatos dos educandos.

Outros relataram também que gostaram das atividades utilizadas com os instrumentos pedagógicos, das atividades em grupos, da organização das aulas, das mediações docentes e, principalmente, porque conseguiram entender os conceitos estudados. Os educandos apresentaram interesse em participar das aulas nos mostrando que as atividades realizadas provocaram transformações em suas aprendizagens. Desse modo, notamos uma mudança na dinâmica e contexto inclusivo daquela turma.

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Ao longo da realização do PEAGPT, percebemos um maior envolvimento dos educandos nas atividades desenvolvidas, mostrando uma interação colaborativa entre eles, a fim de fomentar a aprendizagem dos conceitos trabalhados. Identificamos tais características no processo e também na avaliação feita pelos alunos e professoras da turma.

Destacamos nesse processo que é possível todos os alunos participarem da mesma atividade e que um planejamento colaborativo entre os professores inclui não só os educandos, mas também todos os envolvidos na atividade, como as professoras regente, de apoio e do Atendimento Educacional Especializado (AEE), assim como se envolvido no processo a coordenação pedagógica.

2. O produto educacional

O produto educacional foi desenvolvido pelo pesquisador com a colaboração da professora regente de matemática da escola. Foram observadas algumas aulas de matemática, no ano de 2016, da docente educadora para conhecimento do contexto da turma.

Na ocasião, a turma escolhida, segundo o currículo da escola, trabalhava conceitos de área e perímetro. A matrícula de alunos com deficiência nessa turma foi outro ponto que nos interessou. Foram também realizadas entrevistas com as professoras de Apoio e de Atendimento Educacional Especializado – AEE e ainda leitura do Projeto Político Pedagógico - PPC e do Plano de aulas da professora.

A partir do exposto, as aulas foram planejadas e fundamentadas nos conceitos do Desenho Universal Pedagógico de Kranz (2015), Teoria da Atividade de Leontiev (2016) e na Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky (1994).

Eixo Temático: Grandezas e Medidas
Série: 8º ano do Ensino Fundamental
Conteúdo: Sistema de medida: área, volume e perímetro.
Pesquisador: Danilo Borges Caetano.
Colaboradora: professora de matemática da Escola
Orientadora: Jaqueline Araújo Civardi.

Figura 1. Capa do PEAGPT. Fonte: Elaborado pelo autor.

O produto educacional foi desenvolvido com o objetivo de ampliar a compreensão dos conceitos de área e perímetro por meio de estratégias e materiais pedagógicos que possibilitem a participação de todos na atividade, na perspectiva da Educação Matemática Inclusiva. Dessa forma, tínhamos os seguintes objetivos específicos:

Nessa direção, a elaboração das estratégias de ensino tomou por base as características dos sujeitos, contexto da escola e os pressupostos teóricos que subsidiaram a construção do projeto de ensino e aprendizagem. A teoria do Desenho Universal Pedagógico foi utilizada por nós como um princípio, fundamentado na Teoria Histórico-Cultural, considerando a interação social para desenvolver uma aprendizagem coletiva e com sentido, com o propósito de incluir todos os educandos na atividade de aprendizagem.

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Para construir os Geoplanos, escolhemos materiais de boa durabilidade, como a madeira. Além desta característica que é do Desenho Universal Pedagógico, também lixamos e deixamos o acabamento arredondado para facilitar o manuseio e, com o mesmo propósito, escolhemos parafusos de ponta arredondada. O material foi colorido de modo a destacar o contraste das cores, assim, alternamos entre cores escuras e claras delineando o perímetro do quadrado e a área do Geoplano. As Figuras 2 e 3 ilustram a construção e como ficaram os Geoplanos.

Figura 2. Construção do Geoplano. Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 3. Geoplanos. Fonte: Elaborado pelo autor.

Estas características foram pensadas para que todos pudessem ter acesso ao material, independentemente de suas características físicas e intelectuais e manuseassem o material com segurança, guiados por uma intencionalidade pedagógica. Elaboramos também algumas maquetes para o cálculo de área e perímetro, conforme a Figura 4.

Figura 4. Maquetes. Fonte: Elaborado pelo autor.

As maquetes seguiram as mesmas características. Os alunos usaram barbantes, fita métrica e régua para auxiliarem a medição das dimensões. Essas atividades foram realizadas em grupos.

Escolhemos a planta baixa da escola para trabalhar os conceitos de área e perímetro e ampliamos no tamanho 120 x 90 cm para diminuir o esforço dos educandos ao manusear o objeto, conforme a Figura 5.

Figura 5. Planta baixa da escola. Fonte: Elaborado pelo autor.

As mediações docentes, trabalhos em grupos, o uso de materiais manipuláveis e a utilização de signos e instrumentos foram determinantes para motivar e auxiliar o educando no processo de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, as estratégias foram pensadas com o intuito de garantir que todos os alunos participem da atividade com o entendimento das ações e sem qualquer tipo de barreira no acesso ao conhecimento. Desse modo, temos a compreensão de que é “necessário e imprescindível que o planejamento contemple mediações pedagógicas que possibilitem a aprendizagem e o desenvolvimento de todos os alunos, na perspectiva do Desenho Universal Pedagógico” (KRANZ, 2015, p. 157).

3. Metodologia do Peapgt

O processo metodológico está descrito sob a direção dos objetivos específicos que traçamos para o PEAGPT.

3.1 Objetivo 1

Desenvolver e utilizar materiais pedagógicos na perspectiva do Desenho Universal Pedagógico.

Estratégias

# construção do Geoplano para utilizar nas aulas;

# imprimir a planta baixa da escola no formato de um banner. Convidar um pedreiro ou mestre de obras para ir à sala de aula mostrar aos alunos como ele faz o cálculo para cobrir a base com azulejos, o cálculo do perímetro, etc. Preparar um cronograma de perguntas e estratégias para envolver os alunos na situação prática;

# construir seis maquetes de regiões que representem cômodos de casa ou comércios e desenvolver situações-problema para que, em trios, os alunos resolvam. Com a maquete será distribuída uma lista com os procedimentos: medir as regiões com régua ou fita métrica, calcular área e perímetro, estabelecer relações de escala de medidas, etc. Incentivar os alunos a construírem uma relação matemática que represente essa situação;

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# propor ao grupo que escrevam como foi a estratégia que utilizaram. Após trocar as maquetes entre os grupos, pedir para cada grupo analisar a resolução do problema do outro. Pedir para que cada grupo apresente a solução do grupo avaliado e comente se concorda com a solução ou se tinha outra maneira de resolver.

Recursos/Instrumentos

O material será confeccionado com materiais duradouros, seguros, coloridos, de modo que haja um contraste de cores (aspectos do DUP).

Banner impresso em lona no formato 90x120 cm ou papel tipo planta baixa.

Maquetes de madeira; régua e fita métrica, lista com as orientações da atividade; espaço organizado para seis grupos;

Período

Anterior à aplicação deste plano nos momentos de estudo e planejamento da professora regente para que ela possa participar desta atividade.

3.2 Objetivo 2

Criar problemas com caráter desafiador, investigativo e reflexivo no processo de ensino e aprendizagem dos alunos.

Estratégias

# entregar uma atividade para os alunos resolverem em grupos de três ou quatro pessoas. A divisão será aleatória, de modo que todos participem da atividade. Cada grupo irá receber a mesma atividade com orientações e passos a seguir para a resolução de problemas de área e perímetro utilizando o material didático Geoplano;

# para garantir que todos compreendam a atividade, o professor irá a todo o momento acompanhar os grupos dando dicas, fazendo provocações e utilizando a prática com intencionalidade pedagógica;

# pedir para cada grupo elaborar um problema envolvendo área e perímetro (desenvolver a criatividade). Após a construção, fazer a troca do problema com outro grupo. Esse problema deverá ser resolvido com o Geoplano. Após o grupo conseguir resolver o problema, pedir para que cada um apresente o resultado obtido para toda a turma.

Recursos/Instrumentos

Geoplano e ligas elásticas; lista da atividade com as orientações e passos descritos; Geoplano.

Período

Aplicação das atividades.

3.3 Objetivo 3

Incentivar várias formas de interação e colaboração dos alunos, uns com os outros.

Estratégias

# nos grupos de trabalho, incentivar e provocar os alunos a definirem as estratégias de resolução com o seu colega no grupo;

# envolver cada colega do grupo na atividade;

# desenvolver a manifestação oral do aluno como avaliação das suas estratégias e dificuldades;

# uso da linguagem oral e escrita para avaliarem a resolução da atividade do outro grupo quando for solicitado.

Recursos/Instrumentos

Orientação e participação do professor nos trabalhos em grupos; uso de linguagem escrita e verbal para que os alunos compreendam o objetivo da atividade.

Período

Em todo momento.

3.4 Objetivo 4

Levar o aluno a buscar conexão com os dados apresentados com a generalização do que é posto.

Estratégias

# nas atividades desenvolvidas com as maquetes, pedir aos alunos para estabelecer uma relação matemática que represente a situação do problema recebido;

# motivar os alunos a refletirem se essa relação funciona para qualquer situação, o que precisa ser observado, quais os cuidados, etc.;

# realizar a construção de um memorial com os alunos. Atividade individual. Motivar os alunos a revelarem pontos de que gostaram e que foram desafiadores e o que aprenderam sobre o conteúdo. Após, motivar alguns alunos a comentarem seu memorial com os colegas.

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Recursos/Instrumentos

Mediação do professor. Construção do memorial.

Período

Duas últimas aulas.

4. Processo avaliativo do Peagpt

A concepção que fundamentamos foi a avaliação formativa e processual. Foi observada a participação de todos os alunos em cada atividade. Observamos também o planejamento das ações dos grupos e a realização dos planos.

Após cada atividade, os alunos foram motivados a falar sobre as dificuldades encontradas, o que aprenderam e o que sentiram ao realizar cada atividade.

Nas atividades realizadas em grupos, cada grupo analisou o plano de resolução do outro grupo e apontou por escrito as suas considerações.

Os alunos resolveram uma lista de problemas envolvendo área e perímetro após as aulas em que manipularam o Geoplano, a maquete e a planta baixa. A lista foi resolvida em duplas.

No último dia de aplicação deste plano de ensino, foi pedido aos alunos que construíssem um memorial sobre esta experiência.

5. Considerações finais

O produto educacional contribui para o desenvolvimento da nossa dissertação do mestrado, uma vez que foi a partir da aplicação do PEAGPT que realizamos a observação das aulas e fizemos a análise dos dados. A experiência foi muito rica, pois identificamos por meio da análise dos dados que a pesquisa contribuiu para a formação da professora regente e principalmente para a aprendizagem dos sujeitos.

Procuramos desenvolver um contexto inclusivo onde todos os educandos participassem da atividade e que desenvolvessem aprendizagens e experiências significativas. Ao ler os relatos dos alunos e também dos professores envolvidos, percebemos que o ambiente inclusivo se estendeu também para o aspecto do ensino e não somente na aprendizagem. As professoras regente, de apoio e AEE participaram da construção do plano e, assim, todos os educadores envolvidos tinham conhecimento claro dos objetivos de cada aula do projeto de ensino e aprendizagem. Na execução dele, vimos que um bom planejamento e estratégias pensadas num contexto inclusivo podem dar mais autonomia aos alunos para que eles mesmos possam resolver os problemas.

A escola em que realizamos esse projeto ficou com todos os materiais desenvolvidos e disponibilizamos o PEAGPT em portable document format (pdf) para que todos os professores tivessem acesso e de alguma forma contribuirmos nas atividades pedagógicas.

Acreditamos que este produto educacional contribui para os professores tanto na inspiração de ideias como também na possibilidade de ensinar conteúdos de área e perímetro numa perspectiva inclusiva. No entanto, ao compreender a maneira como o projeto de ensino foi criado, numa perspectiva colaborativa entre professores, conhecendo melhor as características da turma e elaborando estratégias de ensino que explorem a criatividade, autonomia, participação e aspectos desafiadores para os educandos, este produto educacional pode auxiliar também em outras áreas de ensino.

Não fizemos uma ampla divulgação deste produto educacional, mas ele pode ser encontrado com as descrições de todas as atividades, mais os relatos e análises dos resultados na nossa dissertação de mestrado disponível em http://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tede/8597. Informamos ainda que o PEAGT está na íntegra nos apêndices da dissertação.

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Esperamos que este relato de experiência possa contribuir para a construção de uma educação mais inclusiva e mostrar aos educadores possibilidades pedagógicas de ensino e aprendizagem da matemática.

Referências

D´AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática: Da teoria à prática. Campinas: Papirus, 2014.

DEMO, Pedro. Educar Pela Pesquisa. Campinas: Autores Associados, 2015.

DEMO, Pedro. Pesquisa: como princípio científico e educativo. 2. ed. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1991.

GALPERIN, P. Sobre la investigación del desarrollo intelectual del niño. In: La Psicologia Evolutiva Y Pedagogica em la URSS - Antología. Biblioteca de psicologia soviética. Moscú: Editorial Progreso, 1987, p. 125-142.

KRANZ, Cláudia Rosana. O Desenho Universal Pedagógico na Educação Matemática Inclusiva. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2015.

LEONTIEV, Alexis N. Uma Contribuição à Teoria do Desenvolvimento da Psique Infantil. In: VIGOTSKII, Lev S.; LURIA, Alexander R.; LEONTIEV, Alexis N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 14. edição. São Paulo: Ícone, 2016. p. 59-83.

LIBÂNEO, José Carlos, FREITAS, Raquel A. M. da M. Vygotsky, Leontiev, Davydov – três aportes teóricos para a Teoria Histório-Cultural e suas contribuições para a didática. In: IV CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO. 2006. Eixo temático: 3. Cultura e práticas escolares. Disponível em: http://www.sbhe.org.br. Acesso em 14 jul. 2016.

PONTE, João Pedro. Investigações Matemáticas na sala de aula. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.

VIGOTSKI, Lev S. A defectologia e o estudo do desenvolvimento e da educação da criança anormal. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 37, n. 4, p. 861-870, dez. 2011.

VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

CONTATOS
Danilo Borges Caetano •
Mestre em Ensino na Educação Básica pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica do CEPAE/UFG •
danilobcaetano@gmail.com
Jaqueline Araújo Civardi •
Doutora em Didática das Ciências Experimentais e da Matemática pela Universidade de Barcelona/ES •
jaqueline@ufg.br