VOLTAR À COLEÇÃO ISBN: 978-65-86422-79-5
Volume 2

Ações e reflexões pedagógicas:

Produtos educacionais para o ensino na educação básica

O estudo de invariantes conceituais na matemática uma proposta de ação/reflexão na programação de jogos no SCRATCH

AUTORES
Marília Rampanelli
Gene Maria Vieira Lyra-Silva
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1. O contexto da experiência vivida

A tecnologia está avançando de maneira muito rápida e que muitas vezes não conseguimos acompanhar, o que acaba tendo relação direta com o desenvolvimento de nosso trabalho como professores, devido ao fato de nos sentirmos inseguros com tantas mudanças e, muitas vezes, por não termos à nossa disposição os materiais necessários para podermos trabalhar com a tecnologia em nossas salas de aula.

Papert (2008, p. 18) nos traz a seguinte reflexão: “[...] por que, durante um período em que tantas atividades humanas foram revolucionadas, não vimos mudanças semelhantes na forma de ajudarmos nossas crianças a aprender?”. Esta reflexão nos faz levar o olhar para as escolas e salas de aula, que mantêm suas estruturas e organizações há muitos séculos, sem grandes mudanças e sem apoio tecnológico.

Estas “não mudanças” em nossas escolas e salas de aulas estão fazendo com que nossos estudantes não tenham interesse nos estudos e, até mesmo, em frequentar a escola, pois, além de terem que ser apenas ouvintes, muitas vezes lhes são propostas questões que eles não conseguem resolver, ocasionando o não aprendizado. Por isso, “se não confrontamos as crianças com situações nas quais elas precisem desenvolver conceitos, ferramentas, limites, elas não têm razão para aprender” (VERGNAUD, 2008, online, s/p).

É nesta perspectiva que, durante o desenvolvimento da dissertação de mestrado, buscamos situações que levassem ao estudo de conceitos matemáticos juntamente com o uso da programação de computadores, pois percebemos que, ao aprenderem a programar e usar algoritmos, os estudantes precisariam buscar conceitos matemáticos para que avançassem no algoritmo que estavam criando.

Neste sentido, também, que Papert vê no computador a possibilidade de tornar a aprendizagem de matemática mais humana e concebe a ideia de que a aprendizagem matemática ocorra em um ambiente onde aprender matemática se torne algo natural e contextualizado, assim como é aprender outra língua vivendo no país em que esta é falada. (RAMPANELLI, 2019, p. 43).
A ideia de “falar matemática” a um computador pode ser generalizada a aprender matemática na “Matelândia”, isto é, num contexto que está para a aprendizagem da matemática assim como viver na França está para aprender francês. Assim, uso a imagem da Matelândia - onde a matemática se tornaria um vocabulário natural - para desenvolver minha ideia de que a presença dos computadores poderia aproximar as culturas humanística e matemático-científica. (PAPERT, 1986, p. 19).

Seguindo estas concepções que chegamos à questão inquiridora da pesquisa: Que invariantes conceituais matemáticos podem ser explorados a partir de uma situação de criação de jogos produzidos com o uso do Scratch?

Com este questionamento, fomos em busca de realizarmos uma atividade de programação de computadores que fizesse sentido para os estudantes participantes, condizente com a realidade em que estão inseridos. Sobre a realidade dos estudantes, vale destacar que a pesquisa foi desenvolvida em um ambiente não formal de educação, que é a Organização Não-Governamental Sociedade Espírita Trabalho e Esperança (ONG SETE) que está localizada no Setor Madre Germana II na periferia de Goiânia/GO. Nesta ONG os estudantes participam de diversas atividades no turno inverso da escola regular, dentre estas atividades têm-se as oficinas que são realizadas pelo projeto de extensão Ações Pedagógicas em Ambientes Digitais (@PED) da Universidade Federal de Goiás, no qual são desenvolvidas atividades mediadas por computadores e tablets e baseadas em jogos digitais.

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São várias as crianças que são atendidas no projeto @PED que acontece duas vezes por semana e o dia todo, então, para a realização da pesquisa, optamos pelo turno da manhã, em dias diferentes das ações do @PED e recebemos, semanalmente, seis crianças que demonstraram interesse em participar da pesquisa. Estas crianças tinham entre 11 e 13 anos e eram estudantes do Ensino Fundamental II. Dos seis estudantes, dois frequentavam o 6º ano, três o 7º ano e um o 8º ano. Entre estes estudantes, três têm computador em casa, apenas dois têm acesso à internet, e os outros têm acesso a computadores somente nas atividades da ONG, que eles frequentam semanalmente.

Tendo em vista que estas crianças já vinham realizando atividades com jogos digitais que propusemos que elas criassem seu próprio jogo digital. Durante a realização das atividades os estudantes trabalharam em dupla e cada dupla precisava criar um jogo digital, sendo o tema e o tipo do jogo escolhidos por eles. Nos relatos denominamos as duplas de Dupla 1, Dupla 2 e Dupla 3. Na Dupla 1, os estudantes receberam o pseudônimo de AD1 e BD1; na Dupla 2, CD2 e DD2; e, na dupla 3, ED3 e FD3. Desta forma, a Dupla 1 decidiu por criar um Jogo Quiz, com perguntas diversas da área de português, matemática, geografia, inglês e entretenimento. Já a Dupla 2 criou um jogo que denominaram de “Obstáculos Perdidos”, o qual possui um avatar que se locomove com o uso do teclado e precisa chegar até o fim das fases sem tocar nos obstáculos que tinham pelo caminho para vencer o jogo. E, por fim, a Dupla 3 criou o jogo do Ping Pong, baseado no jogo clássico que conhecemos, e precisa de dois jogadores, que com o uso das teclas do computador realizam os movimentos da raquete, vencendo o jogo o primeiro jogador que marcar cinco pontos.

Então, nas atividades semanais, proporcionamos aos estudantes uma situação de criação de jogos digitais por meio da programação de computadores e, a partir disto, identificamos invariantes conceituais que foram surgindo diante da situação proposta e elaboramos a proposta pedagógica que possibilita o estudo destas por meio de atividades de programação de computadores, que compuseram o nosso produto educacional, com o uso do software Scratch, que possui uma linguagem de programação simples e prática.

O Scratch foi criado pelo Massachusetts Institute of Technology – MIT e é um ambiente de programação gratuito. No Scratch é possível, segundo o site scratch.mit.edu, programar as suas próprias estórias, jogos e animações interativas, podendo compartilhar as criações com outros usuários na comunidade do Scratch ou salvá-las em um computador. É um aplicativo licenciado, de fácil acesso e que não depende, necessariamente, da disponibilidade da internet, ou seja, pode ser instalado no computador.

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A programação dos objetos no Scratch é realizada com o uso de blocos coloridos, e cada bloco possui uma função de comando, como a de movimento, de som, de aparência e são divididos por cor. Estes blocos são encaixados conforme o que se pretende programar e este encaixe é análogo ao brinquedo Lego, formando o algoritmo da programação, podendo este ser editado de maneira acessível e sempre que for necessário. A figura 1 exemplifica os principais componentes do software Scratch 2.0:

Figura 1. Principais componentes do Scratch 2.0. Fonte: Elaborada pela autora.

Com o uso do Scratch cada dupla criou seu jogo, mas durante esta criação diversas situações foram surgindo e invariantes conceituais, que neste caso eram os conteúdos matemáticos, foram aparecendo como necessidade para que pudessem dar continuidade à programação do algoritmo, sendo eles: geometria plana, geometria espacial, plano cartesiano e números inteiros. Nestes momentos, se necessário, dávamos uma pausa na programação e íamos para o quadro ou para atividades práticas na busca de propiciar aos estudantes o estudo necessário do invariante conceitual.

Assim, a busca por compreender o investigado se deu ao analisar o desenvolvimento das atividades vividas em cada oficina e por perceber a forma como os estudantes compreendiam ou não os invariantes conceituais que estavam envolvidos nas situações apresentadas. Durante estas situações, diversas aberturas para o estudo de invariantes conceituais iam surgindo e faziam com que os estudantes as relacionasse com as atividades que estavam desenvolvendo, obtendo uma solução para estas.

Ao observar as situações que foram propostas aos estudantes ao longo do desenvolvimento das oficinas, percebemos que é possível realizar o estudo de conteúdos matemáticos de forma que tenha sentido para quem está aprendendo, as quais fizeram com que os estudantes se interessassem pela construção dos seus próprios saberes, em que os conceitos iam aparecendo conforme a necessidade de cada dupla, pois precisavam compreender o conteúdo ali envolvido para dar continuidade à realização da atividade.

Para Vergnaud (1993) um campo conceitual é um conjunto de situações e as situações um conjunto de tarefas. Vergnaud (1993, p. 9) nos diz que ao trabalhar desta forma conseguimos ter certa vantagem, pois possibilita “[...] a produção de uma classificação baseada na análise das tarefas cognitivas e dos procedimentos que podem ser adotados em cada um deles”.

Desse modo, o conjunto de tarefas que foram propostas durante as oficinas proporcionou o estudo de diversos conceitos que envolviam a geometria plana, geometria espacial, plano cartesiano e os números inteiros. Estes conceitos foram os que se destacaram durante a realização das programações no Scratch e é possível percebê-los nos relatos descritos ao longo da dissertação que deu fruto ao produto aqui apresentado. Destacamos alguns exemplos em que é possível perceber a presença dos invariantes conceituais no uso do Scratch pelos estudantes:

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Nas figuras geométricas presentes na atividade de introdução à linguagem matemática e que tiveram o uso dos blocos lógicos; no conceito de plano cartesiano na organização dos movimentos; na ideia de ângulo nos momentos de rotacionar ou movimentar o objeto pelo uso das teclas; na importância da compreensão do conceito de figuras quadrangulares para a elaboração da sequência dos algoritmos no momento de desenhá-las no Scratch; e na noção de adicionar valores negativos ao movimento do objeto e também à variável, quando esta representa a ideia de pontos e o jogador perde pontos na partida. A compreensão desses conceitos se deu a partir da combinação de esquemas construídos durante a experiência de programação no Scratch. (RAMPANELLI, 2019, p. 141).

Com a comprovação da possibilidade de trabalhar conteúdos matemáticos no Scratch, conseguimos elaborar uma proposta de ação/reflexão para o professor com uma sequência de atividades para o estudo de invariantes conceituais, que faz parte do produto educacional. Esta sequência de atividades é composta por todas as situações que foram propostas ao longo das oficinas e contam, também, com orientações sobre os conceitos matemáticos trabalhados e que foram reestruturadas conforme a análise da experiência vivida. No tópico a seguir, descrevemos detalhes sobre o produto educacional, contemplando a forma como este foi elaborado e apresentando a sua relação com a pesquisa do mestrado.

2. A proposta de ação/reflexão e sua relação com a programação de jogos digitais

O produto educacional desta pesquisa é composto por uma sequência de doze oficinas com atividades sobre a programação de computadores e o estudo de conceitos matemáticos, nas quais há, também, sugestões para as ações esperadas do(a) professor(a) e dos estudantes. Estas sugestões se deram pela experiência vivida ao longo da coleta de dados, na qual foram realizadas oficinas com estas doze atividades e ao analisá-las percebemos que, em alguns momentos, as abordagens podiam ter sido feitas de maneira diferente e que também tivemos êxito em outras. Assim acreditamos na importância, não apenas de compartilhar uma sequência didática, de oferecer a visão geral da vivência nas atividades presentes nas oficinas. No entanto, sabemos e esperamos que muitas outras observações e constatações surjam, de outros professores ou pesquisadores, que ao utilizarem este material consigam explorar as atividades por meio de metodologias próprias.

A construção do produto educacional se deu ao longo de toda a pesquisa, desde a elaboração das atividades das oficinas até as últimas análises da coleta de dados. Ao pensar nas atividades que seriam desenvolvidas precisamos ter consciência do público que as iriam realizar, que eram crianças de onze a treze anos e que nunca haviam tido acesso à programação de computadores. Pensando nisto, começamos com atividades lúdicas que introduzissem a ideia de o que é programar e para isso utilizamos os blocos lógicos e também atividades práticas, nas quais envolviam os próprios estudantes.

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A primeira atividade, que foi realizada com os blocos lógicos, buscou introduzir a noção dos conectivos da programação, que são o “e”, “ou”, “se...então” e o “se...então, senão”. Para que eles conseguissem compreender a função de cada conectivo, utilizamos sentenças lógicas, em que eles precisavam separar as peças conforme os atributos descritos pela sentença. Por exemplo: blocos azuis ou triangulares.

Já a segunda atividade visou à concretização da ideia de programar e se deu por meio da aplicação de movimentos físicos, em que, nas duplas, os estudantes precisavam descrever como que o colega poderia fazer para chegar até um certo obstáculo que era posicionado pela pesquisadora. Nesta atividade, podemos explorar também noções de rotação de ângulos e de lateralidade.

Na terceira atividade demos início à exploração do software, apresentando aos estudantes as principais funções que eles precisariam saber para conseguirem começar a programar com o Scratch. Dentre as funções, mostramos como se realiza o encaixe dos blocos para programar um objeto, onde encontrar novos objetos, como funciona o movimento no palco, que é baseado em um plano cartesiano e outros.

Em seguida já começamos com a escolha e programação dos jogos. Cada dupla definiu o jogo que iria desenvolver, bem como os objetos necessários e as regras do jogo. Tendo estas escolhas definidas pudemos dar continuidade à elaboração das atividades das oficinas, pois precisávamos saber o que cada dupla iria programar para que conseguíssemos preparar as oficinas futuras com base nas possíveis situações que iriam surgir com cada dupla e, assim, chegar aos invariantes conceituais matemáticos a serem estudados. Então, as próximas nove oficinas foram elaboradas de acordo com as situações que cada jogo propiciou a cada dupla.

Assim, durante a pesquisa buscamos, na situação de criação de jogos com o Scratch, constatar os invariantes conceituais matemáticos e, a partir disso, elaborar a proposta do produto educacional que é voltada para o estudo de conteúdos matemáticos na perspectiva dos Campos Conceituais de Vergnaud. Para chegarmos a esta proposta, realizamos o estudo dos dados obtidos por meio de vídeo, gravações e diário de campo. Este estudo proporcionou a identificação de princípios e conceitos que demandam do professor certo tratamento pedagógico que esteja de acordo com as indagações que os estudantes propõem.

O produto educacional traz aberturas para a ação pedagógica e para o modo de ação do professor, em que as vivências de outros estudantes poderão indicar outras aberturas para a abordagem de ideias matemáticas, colocando, assim, o professor como autor de outras ações que satisfaçam a esta necessidade. A seguir, apresentamos o relato com as descrições de uma das atividades que foram desenvolvidas nas oficinas.

3. A experiência vivida durante os trajetos de construção das ações/reflexões

As situações vividas na coleta de dados conduziram para uma diversidade de estudo de invariantes conceituais matemáticos, pois em cada proposta tínhamos algumas aprendizagens sobre o software e conceitos matemáticos que almejávamos. A seguir relatamos a aplicação de uma destas situações vividas, bem como a proposta e aprendizagens pretendidas na realização destas.

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Quadro 1 – Descrição da Oficina II. Fonte: RAMPANELLI (2019, p. 63).
OFICINA II - Introdução à programação de computadores no Scratch e exploração de conceitos iniciais de matemática
Objetivos:
- exemplificar a ideia de programação por meio de aplicações nos movimentos físicos, compreendendo alguns comandos lógicos;
- aprofundar as noções de rotação de ângulos e de lateralidade, referente à direita e esquerda, por meio da elaboração de algoritmos na programação física;
- explorar o site do Scratch e o próprio software, construindo animações simples;
- introduzir o conceito de plano cartesiano, viabilizando a compreensão dos movimentos dos personagens no Scratch;
- dialogar sobre os possíveis temas dos jogos a serem programados, explicitando os motivos pelos quais certos jogos não poderão ser elaborados.
Recursos didáticos:
Projetor, notebook, software Scratch, câmera webcam para filmagem da atividade, computadores, caderno de anotações e lápis de escrever.
Expectativa de Ação dos estudantes em duplas:
Atividade 1:
- programar a pesquisadora para que ela chegue até certo ponto da sala;
- descrever a sequência lógica de programação a ser executada pelo colega da dupla que deve chegar ao local determinado no início da atividade.
Atividade 2:
- criar a conta no site do Scratch;
- explorar os comandos básicos do Scratch, analisando suas posições e deslocamentos;
- programar o objeto para ir para as coordenadas (170, 60).
Atividade 3:
- discutir sobre os possíveis tipos de jogos que irão criar.
Avaliação:
Realização das atividades, descrição delas no caderno de anotações, produções das interações no Scratch.

No quadro 2, apresentamos a proposta de encaminhamento da oficina e, a seguir, o relato da atividade 1.

Quadro 2 - Proposta de atividades, aprendizagens sobre o Scratch e abertura para estudo de invariantes conceituais percebidos pela pesquisadora na oficina 2. Fonte: RAMPANELLI (2019, p. 78).
Proposta de encaminhamento de oficina Aprendizagem sobre o scratch almejada Aprendizagens percebidas e abertura para estudos de invariantes conceituais
Atividade 1:
1.1 Programando a pesquisadora.
1.2 Programação física entre as duplas.
- Comando inicial.
- Compreensão de alguns comandos lógicos utilizados na programação física e que estão presentes no Scratch.
- Movimentação do objeto no palco do Scratch (mover, girar, posição…).
- Ângulo.
- Rotação de ângulos.
- Lateralidade (esquerda e direita).
- Raciocínio lógico.
- Ideia de Plano Cartesiano.
- Localização e movimento do objeto no plano cartesiano.
- Raciocínio lógico.
Atividade 2:
Explorar os comandos de programação do Scratch, analisando a posição do objeto e programando-o para ir para as coordenadas (170, 60).

Na atividade 1.1, os estudantes precisavam ditar o passo a passo para que a pesquisadora chegasse a um local definido da sala. É importante ressaltarmos que P é quando estamos nos referindo à fala da pesquisadora e as outras nomenclaturas são os pseudônimos já mencionados.

Primeiro eles falaram para andar sete passos para a frente, aí chegava a um ponto que precisava virar 90º para a direita, então começaram novos diálogos:

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AD1: Agora três passos… três passos para a direita.
P: Mas eu estou de frente.
AD1: Agora três passos… três passos para a direita.
P: Mas eu estou de frente.
BD1: Vire à direita.
P: Ok, vou virar à direita, mas quantos graus vou virar?
BD1: 30 graus.
FD3: 5 graus.
BD1: Ah, eu já sei, já estudei isso aí. Tem 90 graus, 270…
P: Como é a curva de um ângulo de 90 graus?
BD1: É assim [fazendo sinal de meia-volta na mesa com os dedos].
P: Quantos graus tem um círculo? Uma volta inteira?
BD1: 270 graus.
CD2: 360 graus.
P: Metade de uma volta?
BD1: 90 graus.
CD2: 180 graus.
P: Certo. [Mostra, girando meia-volta]. __ Agora, eu estou aqui [de frente para eles] e quero virar assim [vira 90 graus para a direita], quantos graus eu estou girando?
BD1, AD1, FD3: 90 graus.

Figura 2. Momento de realização da atividade. Fonte: Elaborada pelo autor.

Na atividade 1.2, cada dupla programava seu colega para chegar até um obstáculo definido na sala. Apresentamos o relato do desenvolvimento da atividade com a dupla 1:

P: Qual é o comando inicial?
BD1: Apertar na mão do AD1.

Figura 3. Comando inicial para a colega iniciar os movimentos. Fonte: Elaborada pelo autor.

BD1: Ande cinco passos para a frente.

Figura 4. AD1 anda os cinco passos para a frente. Fonte: Elaborada pelo autor.

BD1: Gire 90 graus para a direita.

Figura 5. AD1 gira 90 graus para a direita. Fonte: Elaborada pelo autor.

BD1: Ande três passos para a frente.
P: Chegou BD1? [Questionei por que faltou um passo para chegar bem no objeto].
BD1: Quatro passos.

Figura 6. – AD1 chega ao obstáculo. Fonte: Elaborada pelo autor.

Estas duas atividades tinham como propósito a introdução da ideia de programar um computador e também de buscar quais as compreensão iniciais que os estudantes tinham sobre rotação, medidas de ângulos, noções de lateralidade. Podemos perceber que durante a realização das atividades foi possível chegar às aprendizagens almejadas por meio das situações que lhes foram expostas, pois acreditamos que:

A construção de jogos digitais, com o propósito educacional, nas aulas de matemática, deve servir aos estudantes como instrumentos para trabalhar a pensar, como meios de realizar projetos, como fontes para produzir novos conceitos e mobilizar novas aprendizagens, não o contrário. (AZEVEDO, 2017, p. 33).

Apresentamos, então, atividades de uma das doze oficinas que foram realizadas, mas todas estão descritas detalhadamente no produto educacional, disponível no Google Drive e que podem ser acessadas pelo link https://drive.google.com/file/d/1bBTP5mJUtOZB5274LW9lrD0wL5BflWPe/view?usp=sharing, ou, no repositório de produtos educacionais do Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica da Universidade Federal de Goiás, no endereço eletrônico https:// pos.cepae.ufg.br. Os jogos criados pelos estudantes participantes não fazem parte do produto em si, mas também podem ser acessados pelo site do Scratch, no qual é apresentado cada jogo separadamente.

Jogo Quiz - https://scratch.mit.edu/projects/362568600
Jogo Obstáculos Perdidos - https://scratch.mit.edu/projects/362568561
Jogo Ping Pong - https://scratch.mit.edu/projects/362568518.

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4. Considerações finais

A proposta do produto educacional surgiu da ideia de poder compartilhar um material com atividades que propiciem a outros professores a utilização da tecnologia em sala de aula. Sabemos da dificuldade que muitos professores encontram para abandonar o ensino tradicional, pois são muitos alunos por sala, poucos computadores por aluno e falta de estrutura para tal utilização. Mas, mesmo com todos estes impasses, acreditamos na possibilidade de poderem utilizar este material, seja em uma aula ou em um conteúdo específico, não necessitando a aplicação de todas as atividades descritas, pois cada atividade visa a um conceito a ser abordado e podem ser trabalhadas separadamente.

Destacamos aqui que em cada atividade tem-se a abertura para o estudo de conteúdos matemáticos que são trabalhados na segunda fase do ensino fundamental e no ensino médio, podendo estas serem utilizadas para ambas as fases de ensino. Na pesquisa, estas atividades foram desenvolvidas com estudantes de sexto a oitavo ano, os quais distinguiam-se pela idade e pela etapa de ensino, com o que conseguimos provar que é possível trabalhar conteúdos matemáticos com estudantes em etapas diferentes e com conhecimentos distintos, pois todos tiveram êxito nas atividades desenvolvidas.

Durante a realização da pesquisa, fizemos uma breve busca por outros estudos que abordassem os conteúdos que se destacaram nesta pesquisa. Em relação ao ensino de geometria, plana e espacial, percebemos que é um assunto invulgar e que muitas vezes não é trabalhado no anos finais do ensino fundamental. Algumas das justificativas para esta infrequência têm relação com a complexidade com que é visto este conteúdo, o que deixa os profissionais da educação angustiados por terem que trabalhar tais conceitos. Por isso, neste trabalho, é possível ter uma ideia mais clara do assunto e também ter acesso a uma forma contextualizada e dinâmica para se trabalhar as geometrias. Ressaltamos que não propicia um amplo estudo sobre a geometria, mas fornece aberturas para trabalhar de forma dinâmica.

Outro conteúdo abordado foi o conjunto dos números inteiros, que muitas vezes faz com que os estudantes não compreendam o real sentido da “regra de sinais” transmitida na escola, bem como o porquê devem utilizá-la e onde. Nas atividades com o Scratch foram várias as situações que levaram os estudantes a perceberem a ideia de adicionar um número negativo, pois alguns jogos visavam à perda de pontos ou de vidas e, para isso, eles precisavam ter um total de vidas ao começar o jogo e que podiam ir sendo perdidas ao longo das jogadas.

Assim, as atividades propostas no produto educacional permitem a abordagem de invariantes conceituais por meio de situações que têm sentido para o estudante e que surgem como uma necessidade para que consigam avançar no algoritmo desejado na programação. Por fim, destaca-se que o produto educacional pode ter um alcance ainda maior que o previsto, pois professores podem reestruturar as atividades propostas conforme a realidade escolar em que se encontram e, assim, levar sentido para as suas aulas de matemática, proporcionando aos estudantes um estudo mais contextualizado e dinâmico.

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Referências

AZEVEDO, G. T. de. Construção de conhecimento matemático a partir da produção de jogos digitais em um ambiente construcionista de aprendizagem: possibilidades e desafios. Dissertação (Mestrado Acadêmico) – Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2017.

PAPERT, S. A Máquina das crianças: repensando a escola na era da informática. Trad. Sandra Costa. ed. rev. Porto Alegre: Artmed, 2008.

PAPERT, S. Logo: computadores e educação. 2. ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.

RAMPANELLI, Marília. A programação de jogos no Scratch como situação para estudo de invariantes conceituais na matemática. Dissertação (Mestrado Profissional) – Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2019.

VERGNAUD, G. Teoria dos campos conceituais. In: NASSER, L. (Ed.) 1º SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA DO RIO DE JANEIRO. Anais [...] Rio de Janeiro, p. 1-26, 1993.

VERGNAUD, G. Todos perdem quando a pesquisa não é colocada em prática. São Paulo: Nova Escola, 1 set. 2008.

CONTATOS
Marília Rampanelli •
Mestre em Ensino na Educação Básica pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica do CEPAE/UFG •
mariliaportella05@gmail.com
Gene Maria Vieira Lyra-Silva •
Doutora em Educação/UNICAMP
gene.lyra@gmail.com