Novo percurso literário: sequência didática
Quem conta um conto...
O planejamento para a composição deste produto educacional me proporcionou muitas descobertas. Dentre elas, contos de Machado de Assis os quais não conhecia, mas é para isso que serve a pesquisa: descobertas. O conto Quem conta um conto... foi escolhido para a abertura do projeto com a turma eletiva do Ensino Médio da escola da pesquisa, foi uma dessas descobertas. Ele foi escolhido não somente pela estética literária, mas pela riqueza vocabular que o compõe como, por exemplo, a palavra noveleiro, que proporciona ao professor valorizar a composição de nosso idioma. Este conto foi trabalhado apenas com alunos do Ensino Médio, mas pode ser trabalhado em turmas do Ensino Fundamental II.
Além disso, o conto Quem conta um conto de Machado de Assis é uma história breve que prende a atenção dos estudantes e que sintetiza o conceito do gênero textual conto: narrativa curta, poucos personagens, que possui um conflito e clímax. É uma história divertida de uma fofoca criada por Luís da Costa, um dos maiores “noveleiros” da cidade, e que resolve contar para o cliente que entra na loja Paulo Brito. Ao contar a fofoca é surpreendido por Gouveia (vítima da fofoca). O que Luís não esperava é que Gouveia pedisse que o levasse até quem inventou a falsa história de sua sobrinha que, supostamente, teria fugido com o alferes. Luís, muito esperto, consegue se livrar dizendo que foi o próprio major Gouveia que havia dito: “Disse-lhe que seria capaz de castigar minha sobrinha se ela, estando agora para casar deitasse os olhos a algum alferes que passasse.”

O conto é uma crítica bem-humorada das relações sociais superficiais, no caso do conto, a sociedade da época, além de ser uma crítica subjetiva ao caráter de algumas pessoas que inventam histórias para ficar em evidência. O próprio título faz referência a um ditado popular: “Quem conta um conto aumenta um ponto”, o que sugere que o próprio enredo gira em torno desse ditado popular.
Antes de iniciar a leitura é importante estabelecer alguns objetivos e levantar algumas expectativas com os estudantes. Em seguida, reservar um momento para que os estudantes façam uma leitura individual e silenciosa do texto, estabeleçam uma relação direta com ele e captem alguns dos seus sentidos. Eu pedi para que eles fizessem uma leitura prévia, preferencialmente em casa, para que viessem para aula sabendo a história do conto. Isso porque nosso tempo era pouco. Depois, convidei alguns estudantes para que fizessem uma leitura coletiva do texto.
Para a leitura desse conto eu realizei uma dinâmica chamada jogral que consiste em uma leitura compartilhada em que parte da sala lia as falas do personagem Luís da Costa e a outra parte lia as falas do Major Gouveia. Pedi para que fizessem vozes mais finas para o grupo que lia as falas de Luís da Costa e mais grossas do major Gouveia. Espera-se que essa segunda leitura auxilie na compreensão dos efeitos de sentido do texto. A proposta também promove a leitura de textos literários como uma prática de socialização entre os estudantes, bem como a vivência da experiência literária.
A leitura do conto Quem conta um conto, de Machado de Assis é de extrema importância por diversos motivos. Primeiramente, permite aos leitores adentrarem no universo literário de um dos maiores escritores brasileiros, conhecendo sua habilidade narrativa e sua capacidade de abordar temas complexos de forma sutil e profunda. Além disso, a leitura desse conto específico traz consigo uma reflexão sobre a importância da honestidade e da ética nas relações sociais. Ao acompanhar a história dos personagens e as consequências de suas ações, os leitores são instigados a refletir sobre os valores morais que regem a convivência humana e como a falta de honestidade pode afetar a confiança e o vínculo entre as pessoas.
Contudo, a atividade foi exitosa todos os estudantes da turma participaram. Entretanto, há a questão do tempo por ser uma disciplina eletiva ela acontece semanalmente, são duas aulas sequenciais. Portanto, a organização do texto bem como a explicação do texto devem ser objetivas para dar tempo de realizar a leitura integralmente.
O enfermeiro
O conto O enfermeiro, de Machado de Assis, é um excelente texto para leitura literária tanto com turmas do Ensino Médio quanto com turmas do Ensino Fundamental.
É um texto leve e bem-humorado e que proporciona ao estudante refletir sobre valores éticos e morais que permeiam em nossa sociedade. É a história de Procópio, um homem solteiro que estudou Teologia e recebe a proposta de um padre para trabalhar no interior como enfermeiro do coronel Felisberto, que é um senhor muito rico, porém rabugento. Procópio ao chegar no local fica sabendo de sua fama de ranzinza e que passaram vários enfermeiros por lá.
Por diversas vezes Procópio quis desistir e voltar para capital, mas o padre insistiu para que ele ficasse. Entretanto, certo dia o coronel Felisberto exagerou e jogou um prato de mingau em Procópio, sem paciência ele pegou o coronel pelo pescoço e ceifa com a vida de Procópio. Para que ninguém soubesse o que aconteceu Procópio chama um empregado que o ajuda a arrumar o corpo do coronel e fica próximo do caixão até o seu enterro. Após o enterro ele volta para a capital e vive com sua consciência pesada por tê-lo matado, e é claro com medo que descobrissem o que ele fez.

Mas algo que era improvável acontece: o coronel deixa toda sua herança para Procópio em testamento. Procópio cogita não ficar com a herança, mas três dias depois resolve aceitar. Um sentimento de culpa e ao mesmo tempo de merecimento, uma vez que era um trabalho difícil aturar a rabugice do coronel, começa a dominar Procópio. E é este sentimento que pode ser explorado para o trabalho de leitura literária com este conto. O que proporciona ao professor trazer outras estratégias para que os estudantes experienciem a literatura. Utilizei uma animação sobre o conto antes de iniciar a leitura, além dessa estratégia didática, a leitura compartilhada em voz alta ajudou aos que não fizeram a leitura prévia a conhecer a história. Logo após, realizamos a leitura do conto em formato de histórias em quadrinhos. A utilização de histórias em quadrinhos na educação básica também promove o desenvolvimento de habilidades de leitura, como a decodificação de imagens e a compreensão de sequências narrativas. Os alunos são desafiados a observar, interpretar e relacionar os elementos presentes nas páginas das HQs, favorecendo o desenvolvimento da linguagem visual.
Após a leitura do texto original elaborei dez questões simples sobre o conto e organizei uma gincana a qual dei o nome de “Quiz literário”. Para esta atividade precisei de balões para colocar as perguntas dentro, enchi e fixei-os no quadro com fita adesiva transparente. Embaixo de cada balão escrevi um número de 1 a 10 para que ao chamar os estudantes escolhesse o balão de acordo com o número e estourasse para responder à pergunta sobre o conto. Como mostra a imagem a seguir:

O sentimento de competição fez com que os estudantes se dedicassem a leitura do conto e fixassem os detalhes do conto, como por exemplo, o ano que aconteceu a história narrada, de onde veio Procópio, o que ele fazia antes de ser o enfermeiro do coronel. É importante ressaltar que ao utilizar esta estratégia para a leitura consegui a adesão de todos os estudantes que participaram da pesquisa, é preciso se atentar apenas a questão da mediação, pois é uma competição de quem sabe mais sobre o conto e isso pode gerar conflitos entre os estudantes e o professor precisa mediar estes conflitos. Após esta atividade pedi aos estudantes para que transformassem o conto em uma história em quadrinhos.
Em resumo, a adaptação do conto O enfermeiro de Machado de Assis em história em quadrinhos na educação básica oferece uma abordagem lúdica e visualmente atrativa para a leitura, ampliando o acesso dos alunos à obra literária e estimulando a compreensão, a interpretação e o desenvolvimento de habilidades leitoras. Essa abordagem enriquece o processo educativo, proporcionando aos estudantes uma experiência enriquecedora e prazerosa com a literatura de Machado de Assis.

Figura 4. HQ produzida por aluno durante a pesquisa.
A cartomante
O conto A cartomante de Machado de Assis é a história de um triângulo amoroso entre Vilela, Rita e Camilo. Os seus destinos se cruzam a partir do momento que Vilela resolve voltar para sua cidade natal. Vilela é um advogado de sucesso. Camilo é seu amigo de infância e que apesar de sua família ter várias expectativas sobre ele não conseguiu ser bem-sucedido na vida. Era funcionário porque foi colocado em um cargo público não especificado no conto. Vilela casou-se com Rita e viviam aparentemente felizes.
O fato é que os dois começam a se relacionar as escondidas. Camilo começa a receber cartas anônimas e se afasta de Rita. O afastamento de Camilo faz Rita procurar uma cartomante, que a reconforta. Camilo é cético e zomba de Rita. Camilo recebe um bilhete de Vilela que diz “Venha, já, já.” Neste momento Camilo fica sem saber o que fazer, ao sair no tílburi há um acidente que impede que o condutor siga em frente ao olhar para o lado ele vê a casa da cartomante e resolve subir para falar com ela. A cartomante diz a ele que tudo dará certo e ele vai ao encontro de Vilela confiante. Ao chegar Vilela o recebe de forma estranha, Camilo entra na casa olha para o lado vê Rita morta em uma sala. Vilela dá dois tiros nele.

Para atividade de leitura deste conto eu pedi para que os estudantes encontrassem um espaço que consideravam agradável na escola para fazer a leitura fora da sala de aula. Expliquei a eles que a cada 20 minutos passaria por eles para sanar as dúvidas sobre o conto. A dúvida mais recorrente foi sobre se Rita era casada com Vilela ou com Camilo. Isso porque o conto inicia com Rita contando a Camilo quem foi a cartomante. Além disso, houve muitas dúvidas em relação a algumas palavras que os estudantes desconheciam.
No encontro seguinte fizemos a leitura compartilhada do conto para que todos os estudantes da sala pudessem ter contato com o texto. Ainda sobre a linguagem utilizada por Machado de Assis em A Cartomante houve muitas dúvidas em relação ao vocabulário, como por exemplo a palavra “sufrágio”, expliquei a eles que significava orações pela alma de um morto. Odor di femina é outra expressão que gerou dúvidas nos estudantes, expliquei que se tratava de uma expressão citada na ópera italiana Don Giovanni, de Wolfgang Amadeus Mozart (1576-1791), com libreto de Lorenzo da Ponte (1749-1838). A palavra “caleça” que é um tipo de carruagem de quatro rodas, e dois assentos, e se assemelha ao significado do vocábulo “tílburi”.
Apesar disso, grande parte dos estudantes conseguiram acompanhar a história. Para um primeiro contato com os textos machadianos achei que foram muito bem, apesar das dificuldades relatadas aqui. Creio que com o passar da pesquisa eles irão se familiarizar com a escrita machadiana.
Sobre a concepção de história que os educandos têm de que há personagens do “bem” e personagens do “mal”, um educando comentou “Professora, neste conto todo mundo está errado. A mulher traiu o marido com o melhor amigo dele, o Camilo nem dá para comentar ele foi muito “traíra”. Mas o Vilela também não precisava matar eles, era só ir embora de lá”. Eu comentei que a obra machadiana tem essa característica de mostrar personagens com características de pessoas comuns mesmo, que têm defeitos e qualidades, não existem mocinhos nem vilões. Diante dessa discussão organizei um júri simulado.
Esta oficina do Júri simulado foi bem produtiva com muitas participações. Para realizá-la, dividi a turma em várias equipes, uma para cada função. A equipe do promotor, a equipe da defesa, a equipe dos jurados, a equipe da assistência, a equipe de acusação. Escolhi um aluno para ser o juiz, uma aluna para representar Rita e uma testemunha. Pedi para que se concentrassem no conto e nas ações de Rita para formularem as perguntas tanto de acusação quanto de defesa. Tanto no 9º B quanto no C, reservei uma aula para organizarem seus argumentos. A atividade do Juri simulado ficou muito bem executada, tendo muito empenho por parte dos alunos que organizaram suas falas, todas baseadas nos acontecimentos do conto.
Após as atividades com o Juri simulado fizemos a leitura do conto em formato de história em quadrinhos A cartomante. Como o arquivo possui cinquenta páginas, ele foi disponibilizado no grupo do Whats App para leitura prévia. Além disso, o colégio recebeu da SEDUC/Goiás um laboratório de informática itinerante, que basicamente é um carrinho com trinta e seis Chromebooks (uma espécie de tablete), o que possibilitou que todos tivessem em mãos a história. Na história em quadrinhos de A cartomante, o roteiro, o desenho e a arte final foram elaborados por Jô Fevereiro, e publicada pela editora Escala Educacional.
As imagens são muito bem elaboradas, os detalhes dos espaços são um atrativo a mais para quem já leu o conto original. Ao projetar a história em quadrinhos no Datashow os educandos foram relacionando as imagens à história do conto. Alguns comentaram “Eu imaginei a Rita diferente. Para mim, ela era loira”. As vestes também ajudaram os educandos a entender que o enredo do conto não acontece neste século, o que ajuda a compreender, por exemplo, a atitude de Vilela em matar os dois para limpar sua honra devido a época. Veja a imagem a seguir que mostra Camilo cabisbaixo no tílburi.

Figura 6. Fonte: trecho do conto em formato de HQ. Ilustração Jô Fevereiro.
Além dessa contribuição, a imagem que ilustra o meio de transporte da época e deixou claro o que é um tílburi. A composição do cenário mostrou como era o Rio de Janeiro de 1869, ano em que se passa a história. Alguns temas sociais que são abordados durante o enredo são evidenciados melhor com a leitura da obra em histórias em quadrinhos porque os elementos visuais ajudam a compor o contexto histórico. Por exemplo, alguns alunos que antes eram contra o comportamento de Rita identificaram que na época divorciar não era uma opção, porque a mulher ficava em situação ruim diante da sociedade, era malvista. De acordo com Aguiar (2021) isso acontece porque:
Na HQ, a imagem se soma ao texto nessa missão narrativa. O leitor cria, imagina, transforma significados e, assim, também se transforma. É uma leitura ativa. O bom texto literário tem múltiplas camadas de profundidade, que vão se revelando conforme lemos – e relemos – neste caso, conforme lemos os balões e recordatórios narrativos e somos surpreendidos pelas ilustrações artísticas que os acompanham (AGUIAR, 2021, p.25)
No final pedi que escrevessem suas impressões sobre o conto. Veja a seguir o comentário da aluna V.S. do nono ano C sobre o conto A cartomante, de Machado de Assis:

Figura 7. Fonte: arquivo pessoal.
Durante a realização desta atividade, uma aluna A.L. (15 anos) disse que no filme A cartomante que encontrou no Youtube “fica mais claro que a história não se passa nessa época, que é de muito tempo atrás. As roupas e as formas de falar são bem diferentes.” Eu falei para eles que muitos textos literários se transformaram em filmes e que havia o filme do conto A cartomante e que se quisessem assistir em casa ficassem à vontade. Comentei também que várias obras de Machado fizeram sucesso na tv e no cinema. Por exemplo Dom Casmurro que tem uma série chamada Dom no Globoplay e disponível no Youtube. Muitos disseram que iriam assistir. No encontro seguinte pedi para que elaborassem suas histórias em quadrinhos sobre o conto A Cartomante de Machado de Assis. Veja a seguir um exemplo de história em quadrinhos produzida por um estudante.

Figura 8. HQ produzida por estudante durante a pesquisa. Fonte: arquivo pessoal.
Conto de escola
Para iniciar a leitura com a turma de ensino médio com o Conto de Escola, de Machado de Assis, escrevi em duas folhas de papel A4 as palavras delação e corrupção. Depois colei no quadro com fita adesiva e pedi para que os alunos dissessem o que essas palavras os faziam lembrar na história do conto. A aluna S.C. (16 anos) comentou “As lições que Pillar teve ao ensinar a lição de gramática ao filho do professor?” Outra aluna respondeu “Eu não vejo corrupção na história. Mas a delação que o Curvelo fez ao professor sobre o acordo entre Pillar e Raimundo.” Eu perguntei se mais alguém gostaria de comentar e o aluno A.K. (16 anos) respondeu “Eu acho a palavra corrupção muito forte. Na história foi uma simples troca de favores entre crianças. Um pagou para o outro ensinar a matéria, na minha opinião não pode ser classificado como corrupção.”
Esta dinâmica com as palavras que se destacam no texto tem a intenção de fazer com que se lembrem dos detalhes do conto associando às palavras que o professor destacou. A partir disso, cada aluno vai falando sobre as suas impressões sobre a história. Esta dinâmica foi a motivação que usei para iniciar a leitura do conto em formato de história em quadrinhos, as respostas que os alunos deram é a interpretação deles a respeito da história lida. De acordo com Cosson (2021), “A interpretação é feita com o que somos no momento da leitura. Por isso, por mais pessoal e íntimo que esse momento possa parecer a cada leitor, ele continua sendo um ato social.” (p.65)
O Conto de escola é narrado em primeira pessoa, por Pilar, e conta a história de ter recebido uma moeda de um colega de sala, Raimundo (filho do professor Policarpo), para explicar uma atividade de sintaxe, e é denunciado pelo colega de sala Curvelo. Por ser uma história que se passa no ambiente escolar e com personagens com idade aproximada da idade dos alunos, imagina-se que os educandos vão participar mais, e foi o que aconteceu. Já nas turmas de 9º anos iniciei perguntando: “Quem aqui já pediu ajuda ao colega quando está com dificuldade na matéria?” Vários levantaram a mão como sinal afirmativo.

Com efeito, no decorrer das atividades de leitura muitos educandos identificaram-se com Pilar que no início estava em dúvida se iria para escola ou se iria brincar com seus amigos. Disseram “Professora, esse Pilar parece comigo. Todos os dias eu penso se venho para escola ou se fico em casa vendo série”. Estes comentários deixam a aula mais leve e proporcionam segurança aos outros alunos o que faz eles participarem mais. Por isso é importante que o professor deixe os estudantes a vontade rir junto com eles é uma ótima estratégia para isso. Perguntei “O que vocês acham que Pilar fez? Foi brincar ou foi para escola?”. Grande parte deles responderam que ele havia ido para escola, isso porque fizeram a leitura prévia do conto.
Ao saberem que Raimundo era filho do professor, disseram que já estudaram com colegas que eram filhos de professores em outras escolas. A forma como foram contando suas experiências foi muito espontânea. A aluna M.C. (15 anos) disse que tinha uma amiga que era filha de professora de matemática e que ela “obrigava” a filha a decorar a tabuada. Não quis interromper o momento porque percebi que estavam fazendo comentários pertinentes e que estavam familiarizados com o texto, mas não apenas porque fizeram a leitura prévia, mas pelas relações que foram estabelecendo com o personagem.
Essa relação autor, texto e leitor é muito importante para o trabalho de formação de leitores. É como se fosse um reconhecimento de si no próprio no texto. Essa relação dialógica acontece porque o ato de criar um texto ou de ler um texto está intimamente relacionado com a ideologia, conhecimentos e vivências individuais, mas que se contrapõem e interagem durante o processo e que se transforma em conhecimento após a leitura. Sobre esta relação, Bakhtin (1999, p.333) afirma que “há encontro de dois textos, do que está concluído e do que está sendo elaborado em relação ao primeiro. Há, portanto, o encontro de dois sujeitos, de dois autores”.
Após a leitura do conto original, iniciei a leitura do Conto de Escola em formato de histórias em quadrinhos. Uma característica que é comum toda vez que abro a história em quadrinhos é comentarem como são os personagens. Expliquei que o ilustrador imaginou os personagens assim e que, é claro, como é um trabalho que vai ser publicado, é realizado um trabalho de pesquisa para saber como eram as vestes, o espaço onde vai se passar a história para ficar o mais fiel à época da história. E que eles, ao produzirem as suas histórias em quadrinhos também poderiam fazer isso. Para a leitura do Conto de Escola de Machado de Assis em formato de história em quadrinhos precisei de três aulas.
O Conto de escola foi, entre os contos lidos, o que mais gerou comentários dos alunos. Quando o Curvelo conta ao professor que Raimundo deu uma moeda para Pilar para ajudar ele com a lição alguns questionaram “O que tem de mais um aluno explicar a matéria para o outro?”. Um detalhe que chamou a atenção é que um aluno questionou “Professora, o Policarpo é o professor e ele recebia para ensinar. O que tem demais o Pilar ensinar o Raimundo e receber um pagamento por isso?” Nas duas turmas dos nonos anos os educandos chamaram Policarpo de hipócrita, uma vez que ele cobrava dos outros o que ele mesmo fazia. Muitos disseram que ele fez isso porque se sentiu humilhado porque Pilar era mais inteligente que o filho dele.
Os castigos também foram alvo de discussão, grande parte dos educandos não concordava com os “bolos” nas mãos de quem não conseguia entender a lição ou até mesmo fugisse das regras. Um educando comentou “Como pode, professora, um professor agredir um aluno?”. Uma educanda respondeu “Ainda bem que não nasci nesta época! Eu preferia não estudar. Já apanho em casa, vou apanhar na escola também?”. O colégio tem uma postura de dialogar com os alunos diante de qualquer problema, acredito que esse comentário tem relação com essa postura e porque hoje este tipo castigo é inadmissível.
O educando J.V.T. (15 anos) respondeu que “Eu acho que o professor é corrupto porque ele castigou o Pilar porque estava ajudando o filho dele. Ele deveria ficar feliz. Mas ele castigou Pilar porque ele não queria que os outros soubessem que seu filho era menos inteligente que Pilar”. Já o educando K.V. (16 anos) respondeu com ironia “Professora, aqui nessa sala é cheio de gente que faz delação. Seu bando de Curvelos”. Outro educando falou “Eu achei que o Raimundo não tinha que ter passado a moeda para o Pilar dentro da sala. Ele precisava aguardar o recreio para ter certeza de que ninguém iria ver”. No encontro seguinte, reservei o momento para que pudessem finalizar as histórias em quadrinhos. Veja a seguir uma história em quadrinhos produzida por um estudante durante a pesquisa.

Figura 10. HQ produzida por estudante durante a pesquisa. Fonte: arquivo pessoal.
A carteira
Para iniciar a leitura deste conto preparei uma atividade motivadora. Peguei uma carteira minha que não estava usada sem documentos e coloquei uma nota de R$ 10 e outras 3 notas de R$2. Coloquei apenas um papel com o número do meu celular sem identificar para ver qual seria a reação deles. Deixei a carteira bem perto da porta da sala que fica próximo à quadra poliesportiva do colégio.
A intenção desta “dramatização” é motivar os alunos para a leitura do conto. E deu certo. Na troca de aula alguns alunos têm o costume de ir para a porta da sala e ficar esperando o professor, que neste caso seria eu. Fiquei de olho para ver quem pegaria a carteira. Foi bem engraçado. O aluno J.K. (15 anos) viu primeiro, mas quem pegou foi o aluno H.C. (15 anos) que me viu e falou “Professora, eu encontrei esta carteira perto da nossa sala.” Mas o J.K. (15 anos) falou “Professora, eu vi primeiro. Mas o H. foi e pegou.”
Entretanto, a discussão envolveu alguns alunos do 9º ano C que estavam na porta e viram tudo, a curiosidade os levou a perguntar o que estava acontecendo. E de repente o aluno J.V.T. (15 anos) do 9º ano C, falou “Gente, esta carteira foi a professora que colocou aí no chão. Vocês esqueceram qual o nome do conto que a gente estava lendo ontem?” Todos riram porque foi bem engraçado. Mas não daria para repetir esta motivação no 9º ano C.
Pedi para que todos fossem para suas respectivas salas. Quando consegui acalmar a turma entreguei as cópias do conto A carteirapara cada aluno. Muitos alunos estavam empolgados com a “brincadeira da carteira perdida” e comentavam “Foi legal, professora!”. A aluna P.S. (15 anos) “Eu estava aqui dentro, professora. Mas quando ouvi que acharam uma carteira me lembrei na hora do Honório, que é o personagem principal.” Este comentário me fez perceber que é possível vivenciar a literatura na escola. Sobre a atividade motivadora Cosson (2021) afirma que:
Ao denominar motivação a esse primeiro passo da sequência básica do letramento literário, indicamos que seu núcleo consiste exatamente em preparar o aluno para entrar no texto. O sucesso inicial do encontro do leitor com a obra depende de boa motivação. Nesse sentido, cumpre observar que as mais bem-sucedidas práticas de motivação são aquelas que estabelecem laços estreitos com o texto que se vai ler a seguir. (COSSON, 2021, p.54)
Perguntei quem havia lido o conto em previamente e muitos responderam positivamente. Apesar de não conseguir fazer nas outras turmas esta motivação outros alunos viram e comentaram com os colegas o que fez com que estudantes de outras turmas da escola tivessem a curiosidade de ler o texto. Antes de começar a ler perguntei para os alunos que encontraram a carteira para dizer o que fariam com a carteira caso não tivessem me visto? Eles responderam que levariam até a coordenação e pediriam para olhar nas câmeras para ver de quem era a carteira. Diante de tantos comentários posso afirmar com certeza que a atividade de motivação realmente ajudou e muito na atividade de leitura literária.
O conto é a história de Honório um advogado que se endividou para agradar a esposa e seus parentes. Honório estava passando por uma fase financeira difícil quando encontra uma carteira com o dinheiro suficiente para quitar suas dívidas. A dúvida de Honório em encontrar o dono e devolver a carteira ou pegar o dinheiro e se livrar das dívidas é o conflito do texto. Até que encontra um catão de visita com o nome do seu amigo, também advogado, Gustavo.
Além do cartão de visita dentro da carteira há vários papéis recortados, mas Honório não acha conveniente ler. Ao chegar em casa encontra Gustavo com sua esposa e pergunta a ele se perdeu algo. Ele responde que sim que perdeu a carteira. Honório entrega a carteira a ele e vai tomar banho para jantar. Enquanto Gustavo confere se seus pertences estão na carteira. Vendo que estava tudo lá retira um papel da carteira e entrega a Amélia que imediatamente amassa o papel e joga fora.

Durante a leitura fui interrompida várias vezes porque grande parte dos alunos concordavam que o melhor é entregar qualquer objeto que você encontre para o responsável do lugar. Mas, no caso do conto A carteira, o personagem Honório deveria ter ficado com a carteira porque o seu “amigo” Gustavo estava na verdade querendo sua mulher. Os alunos do 9º ano B falaram que este foi o melhor conto que leram. A aluna M.S. (15 anos ) perguntou “ Professora, não tem a segunda parte?” Eu respondi que não que este conto traz uma ironia em relação a sociedade da época através de temas como luxuria que seria a causa de Honório estar passando por dificuldades financeiras, porque gastava muito com Amélia e sua família. Falsidade que aparece na figura de Gustavo que finge ser amigo de Honório, mas na verdade está interessado em Amélia. Honestidade que paira sobre o personagem Honório a dúvida se fica ou não com a carteira mesmo.
No nono ano C não foi muito diferente grande parte dos alunos haviam realizado a leitura prévia. Gostaram da leitura em voz alta que propus a aluna V.P. (15 anos) comentou “Professora, este conto foi o melhor que lemos até agora. Na verdade, é que ele foi mais fácil de entender!” Perguntei o que fariam no lugar de Honório as respostas foram variadas. O educando I.S. (15 anos) respondeu “O certo é entregar. Mas no lugar dele eu não entregaria. Seria bem-feito para o Gustavo. Mas ele não tinha como saber.” A aluna M.E.S. (15 anos) comentou “Não é possível que ele não desconfiou do interesse do Gustavo por Amélia em momento algum. Muito estranho os dois juntos em momento em que ele não está.” Este conto não possui adaptação em HQ. Nos encontros seguintes reservei para que os alunos pudessem confeccionar as HQs. Disponibilizei folhas A4, réguas, lápis de cores e canetinhas hidrográficas.
A característica principal da obra machadiana é sua ironia, no conto A carteira de Machado de Assis é possível identificá-la o tempo todo. Machado de Assis faz uma crítica a sociedade carioca da época através dos temas: luxúria, falsidade, honestidade e fidelidade. Em se tratando de leitura literária os temas chamam a atenção dos leitores e geram bastante discussão. Durante a leitura do conto fui interrompida várias vezes para que os estudantes pudessem expor sua visão sobre o texto. Não encontrei a versão em quadrinhos desse conto. Para encerrar os trabalhos com este conto pedi aos estudantes que fizessem suas histórias em quadrinhos. Veja a seguir um exemplo de uma história em quadrinhos produzida por um estudante.

Figura 12. HQ produzida por estudante durante a pesquisa. Fonte: arquivo pessoal.
A sereníssima República
A história deste conto é de um curioso, o Cônego Vargas. Para quem não sabe cônego é um cargo administrativo que um padre ocupa dentro da igreja. Naquela época era um cargo acima da posição do padre. Hoje em dia, os títulos de Cônego e Monsenhor são meramente honorários e não indicam cargo ou posição dentro da igreja. Mas, naquela época ele tinha privilégios dentro da igreja. Cônego Vargas decide convocar pessoas da alta sociedade do Rio de Janeiro para contar sua descoberta de que aranhas que podiam falar e que a língua delas era tão complexa quanto a nossa. Mas, que além disso ele havia conseguido desenvolver uma sociedade organizada. O que gerou mais risadas e muito burburinho.
O cônego pediu respeito aos presentes e disse que no sítio onde ele morava e observava as aranhas e anotava um caderno o comportamento delas. E que pelo fato dele ser grande as aranhas o viam como um “deus” ou um ser superior e achavam que suas anotações eram referentes aos seus pecados e ao que elas faziam de bom. O que posteriormente as levariam a ser julgadas. Dessa forma, o cônego conseguia controlar as aranhas. Outro fato interessante é que o que também o ajudava a controlar as aranhas era ele tocar flauta. Quando tocava a flauta ele animava as aranhas e elas se distraíam, ficavam felizes. E com isso aceitavam as sugestões que vinham dele.

Mas ele continuou dizendo que o mais difícil não era entender a língua delas, mas escolher o sistema governamental seria o mais adequado para elas. Depois de muito pensar ele chega à conclusão de que todos tinham problemas. Assim mesmo, resolveu que com todos os problemas o melhor sistema era o republicano. Para colocar este sistema em vigência ele distribui funções para cada uma nessa sociedade. Depois de organizar esta sociedade precisou escolher o sistema eleitoral. Logo fez isso e criou várias leis e critérios para que as eleições pudessem acontecer.
Mas havia um problema toda vez que realizava uma eleição aconteciam fraudes. Assim, a validade dessas eleições era questionada pela comunidade das aranhas. E para resolver este problema elas sempre tinham a mesma solução: alterar a lei. Desse modo, cada eleição que acontecia as leis tinha que ser modificadas. Apesar disso, o cônego disse que acreditava que no futuro essa república funcionaria. Isso porque as aranhas eram muito persistentes. Este é apenas um resumo superficial e é claro que possui mais interpretações que deixaremos para aqueles professores que ao lerem este produto educacional se interessarem em realizar a leitura deste conto com seus alunos.
Para realizar a leitura do conto A sereníssima República, de Machado de Assis comecei de forma diferente para que todos pudessem participar e sentirem-se motivados para a atividade. Orientei que após a leitura prévia do conto escolhessem uma música para representar o conto na concepção deles. Para esta aula precisei de caixa de som, Datashow, computador e internet. A orientação era que fizessem em dupla ou em trio para que fosse mais rápido.
Ao começar a aula pedia para que cada grupo fosse até o computador e digitasse o nome da música que a história do conto os fazia lembrar. O primeiro grupo disse que a música que o conto os fez lembrar foi “Que país é este?”, do Legião Urbana. Perguntei se outro grupo também teria escolhida a mesma música e o grupo 3 e 6 disseram que também haviam escolhido a mesma música. Então pedi para que apenas expusessem qual parte do conto os fizeram pensar nesta música. A representante J.R. (16 anos), estudante da 2ª série do Ensino Médio, do grupo 1, disse que, no entendimento deles, o conto “Faz uma crítica ao sistema eleitoral. E que muitas vezes as pessoas reclamam dos problemas do país, mas elas não refletem sobre os impactos das suas escolhas durante o processo eleitoral.”
Já o representante R.A. (16 anos), do grupo 6, disse que eles escolheram porque:
Os telejornais e as redes sociais estão falando muito sobre a confiança que as urnas eletrônicas passam para a sociedade. Nós do grupo conversamos e nas nossas famílias as pessoas acham que elas são confiáveis. E que tem muita coisa eletrônica hoje. Por exemplo, com PIX as pessoas não vão mais ao banco. Resolvem praticamente tudo pelo celular. Por que não confiar?! E pelo mesmo motivo do grupo 1.
Ao mencionar a questão da confiabilidade das urnas eu intervi dizendo que o processo eleitoral no nosso país é muito elogiado devido a fiscalização e pelo fato da apuração ser rápida. Que não há indícios de fraudes registrados desde que o sistema foi implantado no país. Esta colocação gerou um debate em relação ao sistema eleitoral brasileiro, eu deixei todos que queriam comentar falarem um pouco para estimular a reflexão sobre não somente o sistema eleitoral, mas sobre a disseminação de notícias falsas que enfraquecem o processo eleitoral e o sistema democrático.
Para o leitor entender a importância da discussão, o contexto histórico atual é de uma polarização política em que foram disseminados conceitos distorcidos sobre política através das redes sociais, muitas vezes endossadas por representantes que ocupam cargo de destaque em nosso país. Tal situação se agrava pelo fato de parte da população apoiar situações que não condizem com a democracia, como, por exemplo, o retorno da ditadura. Sobre a importância da reflexão sobre a obra COSSON (2021, p.60) afirma que “(...) usualmente se evita fazer uma síntese da história pela razão óbvia que, assim, se elimina o prazer da descoberta.”
Entretanto, como se sabe, o trabalho com o texto literário deve ser focado nele mesmo, em sua fruição, então deixei que eles continuassem a discussão, fui intervindo para que eles trouxessem elementos do conto para a discussão a fim de que usassem como exemplos de acontecimentos do conto e fizessem uma comparação, pois, de acordo novamente com Cosson (2021) “O professor não precisa vigiar o aluno para saber se ele está lendo o livro, mas sim acompanhar o processo de leitura para auxiliá-lo em suas dificuldades” (p.62). Uma educanda M.E. (17 anos), que cursa 3º ano do Ensino Médio, disse:
Para mim, as aranhas lembram muito o que acontece hoje em dia com as pessoas que concordam com essas falas de que existe fraude no sistema eleitoral, que o STF precisa deixar de existir, que o exército tem que tomar conta do Brasil etc. É como se o político tivesse descoberto a língua de grande parte das pessoas.
O texto machadiano, de fato, indica questões-chave para a formação da base da sociedade brasileira, dentre elas a utilização do medo e da superstição para a dominação. Foi uma aula muito produtiva. Acredito eu que uma das melhores durante a aplicação do projeto de pesquisa, porque proporcionou aos educandos uma experiência estética não somente no sentido de ler a obra, mas em ler um clássico literário e vivenciar a narrativa, uma vez que a maior parte dos educandos relacionaram a narrativa ao momento atual. Acredito que houve, sim, um encontro do leitor com a obra. É preciso ressaltar que este conto foi lido apenas com a turma da disciplina eletiva composta por alunos do ensino médio pela complexidade da história. Antes de terminar a aula pedi para eles utilizarem as aulas de Estudo Orientado II para confeccionarem as HQs.
Uns braços
A história deste conto é a história do jovem Inácio (15 anos) por dona Severina que além de ser mais velha do que ele era a esposa do seu patrão. Inácio ficava distraído e fazia tudo ao contrário do que lhe era pedido pelo solicitador Borges. O conflito do conto é quando dona Severina percebe os olhares de Inácio para ela e passa a observar o garoto durante o sono. Entre realidade e devaneios dona Severina ao observar Inácio dormir cede aos seus encantos e o beija. Inácio ao dormir estava sonhando com esse beijo. Depois disso dona Severina passa a evitar o rapaz com medo dele ter percebido o que aconteceu. Algum tempo depois dona Severina pede a Borges que demita o rapaz.

O tempo de duração da pesquisa foi de um bimestre, por isso, o último conto a ser lido foi em formato de histórias em quadrinhos. Além disso, este seria o último conto priorizei apenas a leitura do conto adaptado em HQ porque ele além de longo é um dos mais conhecidos do autor. Portanto, merece destaque nesta pesquisa. Para esta aula precisei de Datashow, Computador e internet. Ao projetar o conto através do Datashow o aluno J.C. (15 anos) “Esta história é bem legal. Mas os outros contos tinham mais a ver com a nossa realidade. Hoje em dia quem fica apaixonado por alguém só por ver os braços da pessoa? Nada a ver!” Eu respondi a ele que é importante refletirmos sobre as mudanças dos comportamentos sociais que ocorrem de tempos em tempos. Hoje isso pode não acontecer, mas um dia aconteceu. E o que mudou?
Diante desta indagação a aluna G.S (15 anos) falou “Eu acredito que as pessoas mudaram porque não aguentavam mais guardar seus sentimentos para si. Então hoje tanto as mulheres quanto os homens são mais abertos para falarem disso.” A aluna F.S. (15 anos) refutou “Eu acho que isso que a G. falou não tem nada a ver. O que mudou foi que os pais perceberam que não adiantava prender seus filhos que eles seriam o que quiserem ser.” Para amenizar a tensão dos comentários eu disse que cada um tinha um pouquinho de razão na interpretação da pergunta.
À medida que ia passando para fazer a leitura ia explicando o que estava acontecendo para eles. Os estudantes da turma da eletiva do ensino médio não tiveram tantas dúvidas em relação à linguagem a que mais repercutiu foi “O que é um solicitador?”. Expliquei que seria um procurador que, sem ser diplomado, exerce a função de advogado. E a palavra canapé que achavam que era algo de comer, mas na HQ trazia uma imagem de alguém deitado em um sofá. Outra curiosidade em relação em relação a linguagem neste conto é que a “côvado e meio”, expliquei a eles que côvado era uma antiga medida equivalente a 66 cm. A expressão “côvado e meio” era usada para descrever a primeira farda militar. Assim, significa, no conto, que o rapaz já tinha alcançado estatura suficiente para o serviço militar.
Além disso, outro aspecto que chamou a atenção dos estudantes foi a representação do personagem Inácio que na história tinha quinze anos de idade, mas sua aparência era de alguém muito mais velho. O solicitador Borges também chamou a atenção por sua aparência “assustadora” de acordo com alguns estudantes.
Contudo, pode-se perceber que a história em quadrinhos oferece muitas possibilidades de leitura, tanto a gráfica, quanto das imagens, e ainda a leitura que cada leitor faz da história. Portanto, unir literatura e história em quadrinhos é sim uma ferramenta eficaz para formação do leitor.