Residência Pedagógica no CEPAE: a literatura como espaço de interlocução
150Resumo: O presente trabalho relata as experiências do Programa Residência Pedagógica do curso de Letras da Universidade Federal de Goiás (UFG). Iniciadas no 2º semestre de 2022, as atividades, conduzidas pela equipe (residentes, preceptora e coordenadora) no Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (CEPAE), buscam auxiliar as aulas de leitura literária e interpretação textual para turmas do terceiro ano do Ensino Médio. Para isso, diferentes atividades têm sido desenvolvidas desde a (con)vivência no ambiente escolar, a elaboração de materiais e a regência por meio de oficinas. Nosso objetivo é contrapor a visão pedagógica tecnocrata do ensino literário, priorizando a formação, humanização e criticidade dos educandos (Candido,1995). As ações têm promovido um diálogo profícuo entre a educação básica e a Universidade, além de ampliar a compreensão textual dos estudantes e contribuir para o desenvolvimento formativo das residentes em Letras.
Palavras-chave: Residência Pedagógica. Formação docente. Literatura.
1. Introdução
O presente trabalho faz parte de atividades desenvolvidas no âmbito do Programa Residência Pedagógica (RP), do curso de Letras, da Universidade Federal de Goiás (UFG) , especificamente no Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (CEPAE). O grupo é composto por vinte e cinco bolsistas, os quais foram divididos em cinco grupos e recebidos em três escolas-campo diferentes. Dois desses grupos foram encaminhados para o CEPAE, totalizando dez residentes, de modo que cada professora-preceptora supervisiona cinco residentes.
Assim, este trabalho é fruto das atividades desenvolvidas em um dos grupos, sob a supervisão de uma das professoras preceptoras no CEPAE, docente efetiva do Departamento de Língua Portuguesa.
Desde o final do ano de 2022, as cinco residentes estão sob a preceptoria da professora e estão acompanhando as turmas do Ensino Médio com o objetivo de ampliar o conhecimento sobre a realidade da educação básica e poder vivenciar de maneira mais efetiva o lugar docente, visto que ensinar não é transferir conhecimento, é, pois, “[...] criar as possibilidades para a sua própria produção ou sua construção" (Freire, 2018, p. 47), ou seja, ensinar não é estático ou só categorias de conhecimentos altamente valorizados. O processo de ensino-aprendizagem trata da dupla professor(a)-aluno(a) e de seus conhecimentos que interagem e se ampliam, em vista de valorizar os conhecimentos dos alunos, alimentar a curiosidade deles sobre o que os rodeiam, enriquecer suas visões de mundo e desenvolver criticidades.
151Frente a isso, em um primeiro momento, as residentes fizeram o reconhecimento do espaço escolar, acompanhando as aulas e a rotina escolar. Em seguida, passaram a planejar e efetivar atividades com as turmas do 3º ano do Ensino Médio, conforme a disponibilidade de cada aluna, uma vez que elas ainda estão em processo de formação na graduação e algumas, inclusive, já atuam como docentes na educação básica.
Após este momento inicial, as atividades foram divididas entre o grupo de modo a conseguirem acompanhar a professora preceptora. O intuito do grupo foi conhecer o planejamento da professora, perceber as necessidades da docente e do Colégio, e em diálogo, discutir formas de modo a possibilitar um trabalho profícuo para a tríade: preceptora, residentes e colégio.
Diante disso, as residentes partiram para o auxílio com as aulas voltadas para leitura e interpretação textual, especificamente com as aulas de leitura literária. Desse modo, para esta apresentação, centramo-nos no relato sobre esta experiência com a Literatura com turmas do 3º ano do EM do CEPAE, no ano letivo de 2023, junto ao grupo de residentes do Curso de Letras da UFG.
2. Literatura na Educação Básica
Na história da literatura, houve, e ainda há, entraves e muitas discussões para definir o seu objeto, uma vez que não é tão simples dizer o que constitui competência da literatura e o que determina um texto literário. Não à toa, muitos críticos tentaram indicar a função da literatura com objetivo de que essa noção facilitasse a compreensão do próprio objeto. O nevoeiro em torno da definição da literatura e sua função, no entanto, espalhou-se para o âmbito escolar, de maneira que também há muitas problemáticas no trato da literatura nas escolas brasileiras.
O reconhecimento do papel que a literatura desempenha, portanto, não tem sido suficiente para valorizá-la nas escolas, haja vista que a função da literatura está distante das noções tecnocratas e objetivas presentes na sociedade. Nesse sentido, o ensino da literatura tem sido negligenciado nos currículos das séries da educação básica do sistema público brasileiro. Talvez uma das razões para esses empecilhos no ensino de literatura esteja na própria dificuldade em formar professores que tenham clareza acerca do tema. Em “A literatura em perigo”, Tzvetan Todorov (2009) aponta para a discrepância entre o entendimento atual acerca da literatura de grandes estudiosos da área e a prática docente nas escolas, que está alinhada à própria delimitação dessa disciplina.
Para compreender melhor o trabalho escolar com a literatura, convém retomar o texto “O direito à literatura”, no qual Antonio Candido (1995) observa como, em todos os momentos da história, o ser humano sentiu necessidade de se expressar por meio da literatura e recorrer a ela em seu universo imaginário. Tendo isso posto, o crítico então considera a literatura “uma necessidade universal, que precisa ser satisfeita e cuja satisfação constitui um direito" (Candido, 1995, p. 175). Nessa perspectiva, a literatura exerce uma função primordial nos indivíduos e, de maneira mais ampla, na sociedade: reforçar a humanidade dos sujeitos e proporcionar uma harmonia social. Sobre a relação literatura versus realidade, Candido explica que
152muitas correntes estéticas, inclusive as de inspiração marxista, entendem que a literatura é sobretudo uma forma de conhecimento, mais do que uma forma de expressão e uma construção de objetos semiologicamente autônomos. Sabemos que as três coisas são verdadeiras; mas o problema é determinar qual o aspecto dominante e mais característico da produção literária. Sem procurar decidir, limitemo-nos a registrar as três posições e admitir que a obra literária significa um tipo de elaboração das sugestões da personalidade e do mundo que possui autonomia de significado; mas que esta autonomia não desliga de suas fontes de inspiração no real, nem anula a sua capacidade de atuar sobre ele (Candido, 1999, p. 85-86).
É importante lembrar, no entanto, que, conforme o próprio autor, a noção de educar os indivíduos pela arte e a compreensão da literatura como uma forma de conhecimento não diz respeito a uma instrução ética e moral relacionada a uma perspectiva pedagógica. A função de formação é muito mais ampla e complexa, refletindo a própria contradição e complexidade dos seres humanos. A literatura, dessa forma, ensina como a própria vida: “não corrompe nem edifica, [...] humaniza em sentido profundo, porque faz viver” (Candido, 1995, p. 176). Essa perspectiva, contudo, vai de encontro à formação técnica almejada pelo sistema educacional tecnicista.
Esse embate acarreta muitas problemáticas observadas no ensino de literatura, haja vista que, ao tentar encaixar a arte literária em uma visão pedagógica de ideologia de mercado, tecnocrata e despolitizada, perde-se a verdadeira essência do texto literário. Podemos pensar, por exemplo, na ausência do contato direto do aluno com a obra literária completa. Há, segundo Todorov (2009), uma quase completa exclusão do sujeito leitor e do texto literário no processo educacional, tendo em conta que, por vezes, os estudantes leem apenas um trecho ou um resumo da obra e suas percepções acerca do texto lido são ignoradas em prol de uma interpretação já pré-estabelecida e considerada correta . Nas palavras do autor: "na escola, não aprendemos acerca do que falam as obras, mas sim do que falam os críticos” (Todorov, 2009, p. 27).
153Para pensarmos em, de maneira produtiva, trabalhar o texto literário na educação básica brasileira, é indispensável (re)pensar o papel do professor em sala de aula. A partir da pesquisa de Segabinazi e Silva (2015), “O ensino de literatura continua em perigo…”, a qual estabelece uma análise do ensino de literatura no ensino fundamental, é possível perceber que a primeira etapa para um trabalho produtivo com o texto literário se baseia na “tomada de consciência do próprio professor enquanto mediador do texto literário em sala de aula” (p. 74). Essa mediação consiste justamente na propiciação da experienciação da literatura e na reflexão profunda sobre a obra que englobe os estudantes, buscando a formação de leitores de literatura competentes e críticos.
Obviamente, muitos outros fatores estão relacionados a esse trabalho com a literatura, como as concepções de língua e linguagem, de ensino da comunidade escolar e as políticas educacionais voltadas a essa área. Focamos, no entanto, no trabalho docente, já que nosso texto consiste em um relato de experiência. A seleção das obras literárias e as metodologias de ensino aplicadas almejam tornar o trabalho com a literatura produtivo e, em suma, levar os estudantes a uma reflexão da própria realidade, envolvendo os temas, como racismo, misoginia, desigualdade social, preconceito linguístico, futebol, infância, morte, dentre outros.
Tendo isso posto, partimos, a seguir, para a explanação das experiências didáticas ocorridas no CEPAE no 1º semestre letivo de 2023.
2.1 Nelson Rodrigues e Carolina Maria de Jesus
A escolha dos títulos de Nelson Rodrigues (A falecida) e Carolina Maria de Jesus (Quarto de despejo) levou em consideração uma série de fatores que o grupo identificou como serem pertinentes para a formação leitora autônoma e crítica dos estudantes, a qual é verificada nos principais documentos curriculares da educação de nosso país.
Assim, pensou-se em trabalhar a literatura brasileira a partir de um recorte contemporâneo que abrangesse outras formas estéticas do texto literário, a peça teatral e o diário. Além disso, é de suma importância destacar a escolha de obras que contribuem para diversas discussões sobre o cotidiano brasileiro da segunda metade do século XX, trazendo representações variadas de personagens contextualizadas em cenários de disparidades sociais, questões de gênero, problemas urbanos entre outras coisas; a fim de compor o projeto, escolhemos autores não-canônicos que, infelizmente, não foram devidamente considerados pela crítica de sua época, enfrentando os entraves do apagamento por muito tempo, como é o caso de Carolina Maria de Jesus.
154O objetivo maior foi mediar possibilidades de ampliar, por meio da literatura, as leituras de vida de todos os sujeitos envolvidos nesse processo de ensino-aprendizagem. Dessa forma, como Vera Teixeira de Aguiar (2013) discorre, o saldo da leitura é indubitavelmente gratificante pois proporciona um contato entre a experiência própria de cada leitor e a descoberta de outras formas de ser, fazer e estar no mundo.
Por fim, o acesso das obras pelos estudantes também foi um aspecto ponderado pela professora. Deste modo, após pesquisa dos títulos na Biblioteca Seccional CEPAE (BSCEPAE), foram encontrados os exemplares em outras unidades da UFG, porém ainda não seriam suficientes para que as duas turmas fizessem a leitura seguindo o cronograma de cada escala. Por isso, então, as obras foram disponibilizadas na plataforma digital Google Classroom.
2.1.1 A falecida, de Nelson Rodrigues
A primeira experiência foi com a obra A Falecida , de Nelson Rodrigues, que, pelo planejamento, ficou distribuída em uma sequência de quatro encontros de cinquenta minutos, em cada turma, para realizar: a) quiz em grupo; b) uma exposição-dialogada sobre autor, gênero e obra e c) uma atividade avaliativa de produção textual sobre uma temática da obra que contemplou os gêneros multimodais (anúncio publicitário, sinopse e meme ). Conforme disponibilidade, o grupo de residentes organizou-se em duplas para desenvolver o plano de aula. Sendo assim, nos dois primeiros encontros, as duplas, com apoio da professora preceptora, iniciaram uma explicação sobre as etapas iniciais: um quiz de perguntas elaboradas pelas professoras e depois exposição-dialogada.
Na primeira etapa, a turma foi organizada em grupos entre cinco e sete alunos, cada grupo recebeu duas perguntas que deveriam ser debatidas em conjunto e, posteriormente, as respostas deveriam ser apresentadas oralmente. Essa primeira avaliação foi de extrema importância para trabalhar a produção de textos orais dos alunos e desenvolver a capacidade de interpretação e correlação da literatura com as questões cotidianas. A peça de Nelson Rodrigues apresenta um enredo marcado com o egoísmo, a futilidade e a hipocrisia da contemporaneidade. De modo que os alunos questionaram o papel do vulgar/grotesco presente na obra, e nas apresentações e comentários das professoras, eles construíram a relação da obra e com o cotidiano.
155Contudo, também pode-se identificar a distinta adesão à leitura da peça teatral entre os grupos e entre as turmas, a partir da observação e breves intervenções das professoras: na turma B, as intervenções foram para complementar as falas dos alunos, e na A, foram para apresentar e sintetizar a trama da peça. Além do que, devido maior ou menor adesão na discussão e maior ou menor necessidades de mediação, fez com que duas aulas não fossem suficientes para concluir as duas etapas iniciais nas duas turmas. Com isso, mais uma aula no 3ºB e mais duas aulas no 3ºA foram necessárias para finalizar o quiz e a segunda etapa.
A proposta da aula expositiva-dialogada objetivou a comparação de características do gênero tragédia clássica e moderna, breve apresentação do autor e aspectos estéticos de suas obras. Este conjunto de aspectos estéticos rodriguianas foram relacionados, pelas professoras e pelos próprios estudantes, às respostas orais elaboradas na primeira etapa, ocorrendo o processo de reconhecimento da estrutura e impactos da leitura crítica, de modo que a literatura assumiu papel de desmascaramento das realidades.
Em seguida, duas aulas foram reservadas para realizar a atividade avaliativa, nestas objetivavam a elaboração de um gênero textual multimodal sobre uma temática da obra. Para isso, as aulas iniciaram-se com questionamento “O que é texto?”, a partir do debate mediado, os alunos e professoras retomaram a aula da professora-preceptora sobre gêneros e tipologia textual. Após a discussão, seguiu-se com apresentação de três gêneros (sinopse, meme e anúncio publicitário) e suas principais características por meio de exemplos selecionados, a escolha destas modalidades textuais considerou os diferentes modos de circulação e recorrência de tais na vida dos alunos e, por isso, a desenvolver a interpretação e avaliação crítica dos alunos. Por fim, a última atividade do ciclo envolveu a produção de um dos gêneros sobre uma temática da obra; para este propósito, os estudantes se organizaram em novos grupos para começarem as produções em sala de aula. Novamente, nas duas turmas, foram necessárias mais uma aula para que os grupos apresentassem suas produções.
No fim da primeira escala, as residentes e a professora-preceptora mostraram-se satisfeitas com as produções dos alunos, e ainda mais questionadoras em como fazer a literatura se tornar atrativa. Por isso, a segunda escala teve o replanejamento da abordagem metodológica com o intuito na adesão à leitura da obra e para proporcionar mais diálogos entre a experiência de leitura e o cotidiano. Com isso, ao fim do semestre, comparamos as abordagens em seus pontos positivos e negativos para o trabalho das obras literárias e o impacto da formação docente das residentes.
1562.1.2 Quarto de Despejo: dário de uma favelada , de Carolina Maria de Jesus
A segunda experiência foi com a obra Quarto de despejo , de Carolina Maria de Jesus. O grupo de residentes contou com as intervenções dos estagiários da Faculdade de Letras para desenvolver o trabalho com o texto literário. Assim, a partir deste cenário, planejamos nossa sequência didática sobre o Quarto de despejo: diário de uma favelada , de Carolina Maria de Jesus. Neste segundo ciclo, foi realizado um planejamento de seis aulas, organizadas em duas etapas: a) atividade avaliativa, em dupla, com duas questões objetivas e quatro discursivas e b) seminários, em grupo, sobre temáticas do livro e análise escrita da apresentação do grupo.
Nesta escala, é importante mencionar que tivemos um cronograma mais curto, devido às questões de calendário (feriados, jogos da seleção brasileira feminina na Copa do Mundo, intervenções/atuações pedagógicas de estagiários). Assim, a execução das atividades propostas sofreram adiamentos, os quais foram, previamente, conhecidos.
A avaliação escrita foi elaborada pelo grupo de residentes após a reunião com todas as participantes do programa (professora-preceptora e professoras em formação). A reunião visou discutir ideias para elaboração da atividade avaliativa e o nosso objetivo central foi considerar a obra como tema principal a ser lido e discutido por meio da escrita. Além disso, as questões foram organizadas em níveis diferentes de dificuldade, sendo as questões objetivas, fáceis, e discursivas, médias e difíceis.
Em relação aos seminários, as turmas foram divididas em seis grupos, e cada um ficou responsável por apresentar um eixo temático depreendido após a leitura da obra, organizado pela professora-preceptora, segundo as perguntas:
- Qual a importância do livro como uma crítica social à época em que fora escrito?
- Qual o papel da mulher e da religião nas camadas mais marginalizadas?
- Qual o contexto sócio-histórico, político e econômico vivenciado no Brasil e cidade de São Paulo no qual o livro está inserido?
- De que maneira a infância é retratada no livro? Essa relação é condizente com os dias atuais?
- O livro pode ser considerado um clássico da Literatura brasileira ou não deve estar incluso no rol da literatura nacional?
- O porquê do título “Quarto de despejo” e de que modo a história retratada pode ser “relida” na atualidade?
Dessa forma, orientamos os estudantes sobre as questões relacionadas ao cronograma de apresentações e entrega da análise escrita; os critérios de avaliação e sugestões de dinâmicas que foram de livre escolha das equipes (slides, estudo dirigido, debate, produção de vídeo, etc.). Ademais, não foi exigida obrigatoriedade de que todos devessem apresentar oralmente ou realizar a síntese escrita, essa organização, na verdade, se deu distintamente entre cada grupo.
157Em seguida, após a realização da avaliação escrita, verificamos que, em geral, as duas turmas deram uma atenção maior ao texto literário trabalhado na segunda escala, em vista da peça de teatro da escala anterior. Os estudantes puderam fazer o exame em dupla, favorecendo, assim, a troca de percepções de leitura que tiveram com o (a) colega.
Acerca dos seminários, foi possível identificar o empenho de cada equipe, a participação dos integrantes envolvidos e, principalmente, as correlações estabelecidas entre as perguntas norteadoras e as informações e ideias apresentadas a partir da leitura do livro literário. A maioria dos grupos optou por apresentar com slides , outros prepararam dinâmicas para a apresentação, quiz, apresentação de dados. Durante as apresentações, intervenções foram feitas pelas professoras a fim de estabelecer um diálogo que contemplasse maiores especificidades das temáticas abordadas. Além disso, no início, foi estipulado um tempo determinado para cada grupo, mas, de maneira satisfatória, alguns grupos trouxeram materiais muito interessantes que demandaram um prolongamento no tempo de exposição, posto que não foram de nenhuma forma prejudicados em suas exposições.
A leitura da obra se deu de maneira individual e cada aluno (a) pôde acessar o material textual na plataforma digital da turma. Entretanto, sempre que possível, observações sobre o livro foram feitas durante as aulas anteriores às atividades da escala (bimestre). Percebemos que a maior parte dos estudantes não teve dificuldades com a leitura, além disso, a partir das apresentações, diversas questões foram debatidas com as turmas sobre reconhecimento do valor literário da obra considerando todas as condições de produção, suas implicações e repercussões no panorama da literatura nacional e, também, internacional, uma vez que a obra conta com traduções em treze línguas, compondo um importante referencial para pesquisas e estudos sócio-históricos e culturais no Brasil.
2.1.3 Semana de Arte Moderna
A terceira experiência foi a elaboração de uma aula, de 90 minutos, sobre a Semana de Arte Moderna e o Modernismo. Para isso, foram feitas pesquisas para selecionar os temas mais relevantes e poder, assim, apresentar para os alunos a importância e o impacto que esse evento gerou na arte, literatura e na história do Brasil. Foi elaborado um slide para apresentação da aula, nele foi abordado o contexto histórico do acontecimento do evento, os principais críticos do movimento, as principais obras e participantes Semana de Arte Moderna e do Modernismo e uma reflexão sobre os objetivos e as consequências desse evento tão polêmico.
Além disso, foi feita a inclusão de um vídeo, ilustrando a leitura do poema “Ode ao Burguês”, de Mário de Andrade, que enriqueceu a aula, proporcionando aos alunos uma vivência mais palpável da crítica ao modo de vida burguês proposta pelo autor. Ao final da aula, foram realizados exercícios juntamente com os alunos de questões sobre o assunto discutido, retirados do Enem, oferecendo uma oportunidade valiosa de aplicação dos conhecimentos adquiridos e preparação para a prova do Enem, que aconteceria na mesma semana. Essa abordagem integrada, que mescla exposição teórica, material audiovisual e exercícios práticos, demonstrou-se uma estratégia eficaz para engajar os alunos e consolidar o aprendizado, evidenciando o êxito da proposta pedagógica.
1583. Considerações Finais
A partir da observação e participação das aulas, foram realizadas atividades como debate, aula expositiva-dialogada, quiz , seminário e atividades escritas que evidenciaram um aumento na participação ativa dos estudantes nas aulas voltadas para a leitura e interpretação textual. Além disso, observou-se um progresso notável na capacidade de reflexão crítica diante de textos literários, indicando uma influência positiva das estratégias pedagógicas adotadas.
As discussões realizadas em sala de aula propiciaram um ambiente de diálogo enriquecedor, estabelecendo uma ponte entre a teoria literária discutida na Universidade e a prática no contexto do Ensino Médio. Essa interconexão entre a academia e a educação básica demonstrou ser um elemento-chave para a efetividade do processo formativo.
Diante desses resultados, destaca-se a relevância de estratégias pedagógicas que vão além da abordagem tecnicista, priorizando a formação e humanização dos alunos. Essa perspectiva, alinhada aos princípios delineados por Candido (1995), mostra-se promissora na construção de um ambiente educacional mais rico e significativo.
O contexto da educação básica impulsiona-se a pensar o acesso, interesse e estudos pela literatura. Nesse sentindo, o propósito deste grupo do Programa Residência Pedagógica (RP), da UFG Letras, dedicou-se a trabalhar duas obras contemporâneas, A falecida, de Nelson Rodrigues, e Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus, por uma abordagem mediadora-dialógica no processo de ensino-aprendizagem, com o objetivo de possibilitar discussões sobre o cotidiano, racismo, misoginia, moralismo, preconceito e valoração linguística, formação da sociedade brasileira, entre outros temas. Para além de uma avaliação, o ensino de literatura possibilita a formação política, sócio-cultural e crítica dos estudantes. Diante disso, acerca da importância do papel da leitura literária na formação humana, Aguiar (2013) sustenta
ler, no entanto, não é apenas decifrar um código: é perceber a interligação lógica dos significados, a relação entre eles e, o que é mais importante, assimilar o pensamento e as intenções do autor, confrontar as ideias apreendidas com os conhecimentos anteriores sobre o assunto, dialogar com o autor, posicionando-se diante dele, e utilizar os conteúdos ideativos adquiridos em novas situações (Aguiar, 2013, p.153).
Muito mais do que uma exigência curricular, trabalhar com uma obra literária em sala de aula diz respeito, principalmente, a uma postura de resistência à manutenção de estruturas limitadoras do pensamento e viver social, à qual o docente assume quando acredita na possibilidade de transformação que a literatura promove nas experiências imaginativas e internalizadas do sujeito-leitor.
159Assim, durante esse processo de formação docente, a experiência da RP tem contribuído significativamente em diversos níveis, desde estar em contato com a rotina da sala de aula, lidar com imprevistos no planejamento, até desenvolver projetos que propiciem maior adesão à leitura, ao considerar abordagens mais atrativas para o texto literário. Outro princípio muito importante que nos marcou positivamente no programa foi a troca de experiências entre as partes envolvidas, trabalhar em conjunto foi essencial para acrescentar novas perspectivas e reflexões sobre a carreira docente.
4. Referências
AGUIAR, V.T. O saldo da leitura. In : Leitura de literatura na escola . 1ª ed. São Paulo: Editora Parábola, 2013.
CANDIDO, A. O direito à literatura. In: Vários escritos . 3. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
______. A literatura e a formação do homem . Remate de Males : Revista do Departamento de Teoria Literária. p. 81-89, 1999.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa. 57ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2018.
SEGABINAZI, D. M.; SILVA, R. S. O ensino de literatura continua em perigo. Revista Língua e Literatura , v. 17 n. 30, 2015. Disponível em http://revistas.fw.uri.br/index.php/revistalinguaeliteratura/article/view/1967/2040 . Acesso em 28 set. 2022.
TODOROV, T. A literatura em perigo . Trad. Caio Meira. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.
Notas
1. Docente da Faculdade de Letras – UFG. Orientadora do Núcleo de Libras/Português do Programa de Residência Pedagógica – Letras UFG.
2. Docente do departamento de Língua Portuguesa no Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação, da Universidade Federal de Goiás (CEPAE/UFG). Preceptora da Residência Pedagógica – Letras/UFG. Bolsista CAPES.
3. Discente da Faculdade de Letras - UFG. Residente da Residência Pedagógica – Letras/UFG. Bolsista CAPES. Faculdade de Letras – UFG.
4. Discente da Faculdade de Letras - UFG. Residente da Residência Pedagógica – Letras/UFG. Bolsista CAPES. Faculdade de Letras – UFG.
5. Discente da Faculdade de Letras - UFG. Residente da Residência Pedagógica – Letras/UFG. Bolsista CAPES.