Laís Rodrigues Campos (UFG)
laisrcufpa@gmail.com

Formação Docente em Geografia e a Linguagem Cartográfica na Educação Escolar Quilombola

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Resumo

O uso da linguagem cartográfica é essencial na formação dos sujeitos, pois possibilita compreender os fenômenos geográficos a partir de suas representações. Construir e ler mapas em diferentes propostas e perspectivas possibilitam o reconhecimento do espaço para além de suas estruturas ou concepções, ampliando a leitura espacial dos indivíduos sobre o território que ocupam. Assim, a Cartografia Escolar trabalhada nas aulas de Geografia tem função essencial no processo de compreensão espacial. Nesse sentido, o objetivo deste estudo é compreender o mapa como uma linguagem de representação do lugar e, ao mesmo tempo, como instrumento de afirmação da identidade territorial quilombola na comunidade de Vila União, em Salvaterra (PA).Nesse contexto esta pesquisa tem como espaço de análise uma escola municipal quilombola, localizada na comunidade quilombola Vila União- Campina, em Salvaterra no estado do Pará, cujos sujeitos investigados são professores de Geografia e alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. Trata-se de uma pesquisa participante, de viés qualitativo, que utiliza como instrumentos de pesquisa a observação de aulas, as entrevistas com docentes, a construção e a análise de mapas mentais elaborados pelos alunos, seguindo uma abordagem fenomenológica. A importância desse modo de cartografar fundamenta-se no trabalho desses mapas como recurso didático. Desse modo, entende-se que esse tipo de linguagem no ensino de Geografia possibilita ao aluno compreender o seu lugar, a construção de suas territorialidades e, portanto, se reconhecer no espaço e afirmar sua identidade. Entende-se que esta concepção possibilita uma nova proposta de ensinar e articular a Cartografia nas aulas de Geografia do Ensino Fundamental para as comunidades quilombolas. Assim, a proposta metodológica utiilizada em campo demonstrou que o uso da linguagem cartográfica cunho social e subjetivo no ensino de Geografia realizado na Educação Escolar Quilombola, contribui de maneira efetiva com a relação entre sujeito e seu espaço de vivência à medida que resgata suas experiências e trabalha sua espacialidade.

Palavras-chave: Formação Docente. Linguagem Cartográfica. Educação Quilombola.

Introdução

Construir e ler mapas em diferentes propostas e perspectivas possibilitam o reconhecimento do espaço para além de suas estruturas ou concepções, ampliando a leitura espacial dos indivíduos sobre o território que ocupam a partir de práticas pedagógicas.

Desse modo, o foco foi entender como o mapa pode ser utilizado enquanto instrumento de afirmação da identidade territorial quilombola a partir da formação de professores quilombolas diante da realidade que vivenciam. Logo, o cenário de investigação foi a escola situada na comunidade quilombola Vila União, localizada no município de Salvaterra, no estado do Pará, os sujeitos foram professores quilombolas que atuam nessa instituição de ensino.

Assim, elencou-se a seguinte questão: Como à linguagem cartográfica pode contribuir na formação de professores quilombolas para a afirmação da identidade territorial dos alunos?

As discussões a serem apresentadas fazem parte de uma pesquisa desenvolvida com dez professores da educação escolar quilombola, aonde destaca-se a entrevista realizada com uma professora de Geografia. Desse modo, utilizou-se uma abordagem qualitativa do tipo participante fundamentada na hermenêutica como método empírico de investigação e com as seguintes etapas metodológicas: levantamento bibliográfico e documental, pesquisa de campo, entrevista, observação, elaboração de mapas de cunho social e formação continuada de professores.

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Na busca em responder a questão central da pesquisa, são apresentadas discussões referentes ao uso da cartografia social na formação continuada de professores quilombolas enquanto processo metodológico essencial da linguagem cartográfica para a afirmação identitária.

Cartografia Escolar na Formação Inicial e Continuada do Professor de Geografia da Educação Escolar Quilombola

No processo de formação inicial e continuadado professor de Geografia, os fundamentos referentes ao conhecimento cartográfico presentes no currículo e nos conteúdos geográficos são essenciais para ensino de Geografia na perspectiva de fomentar o desenvolvimento do pensamento espacial e geográfico.

Tal contexto é evidenciado por Seemann (2009, p. 2) quando afirma que os três principais componentes da cartografia escolar são: o uso de linguagens, métodos e materiais e os processos de apreensão da realidade. Assim, esses componentes sustentam a educação cartográfica, buscando explorar os elementos que efetivam o processo de ensino-aprendizagem dos conhecimentos cartográficos.

Nesse caso, são os fundamentos teóricos- metodológicos da Cartografia que devem estar presentes no percurso de formação dos professores de Geografia, sem deixar de considerar seu objeto de estudo e conceitos. Desse modo, desde 2001 as DCN’s para formação inicial em nível superior, já evidenciavam apontamentos para o perfil do licenciado em Geografia, destacando que é necessário:

Compreender os elementos e processos concernentes ao meio natural e ao construído, com base nos fundamentos filosóficos, teóricos e metodológicos da Geografia. Dominar e aprimorar as abordagens científicas pertinentes ao processo de produção e aplicação do conhecimento geográfico. (BRASIL, 2001, p.10)

Esses apontamentos caracterizam o conjunto de orientações referentes ao currículo do curso de Geografia e fazem conssonância com o que foi instituído em 2015 pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial e continuada de Professores da Educação Básica (DCN’s),destacando que “A formação inicial requer projeto com identidade própria de curso de licenciatura articulado ao bacharelado ou tecnológico, a outra(s) licenciatura(s) ou a cursos de formação pedagógica de docentes.” (BRASIL, 2015, p.9)

Concorda-se com Cavalcanti (2008) que a formação inicial desse profissional deve está de acordo com as orientações do projeto de curso de licenciatura e a integração teoria e prática deve ser o elemento fundamental desse processo.Desse modo, durante a investigação em campo, ao realizar a etapa de entrevista com uma professora de Geografia, um dos eixos do roteiro faz referência a seu aprendizado na disciplina de Cartografia na graduação e no momento do diálogo a docente fez o seguinte relato:

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Ah foi um impacto pra mim porque era algo novo e novo geralmente causa isso na gente, então a principio eu senti muita dificuldade porque não era uma realidade minha e aí a gente começa a refletir sobre as nossas práticas, a forma como eu estava trabalhando com o fundamental menor e quando eu entrei no curso e principalmente quando veio a cartografia eu disse: meu Deus a gente realmente precisa mudar as práticas da gente porque a gente pensa que tá trabalhando certo, mas as vezes a gente tem um leque de informações que faz com que a gente realmente reflita sobre isso, então a cartografia, inclusive, a gente teve um professor muito bom que explorou bastante e aí usou uma ferramenta que assim a princípio eu sofri com muita dificuldade para entendê-la e até mesmo para manusear e aí o professor percebendo que alguns da nossa turmatinha dificuldade, ele começou a usar não somente a teoria, mas também a prática pra vê se a gente conseguia, aí quando eu fui pra prática eu já consegui entender, compreender e melhorar um pouquinho porque na teoria eu não tava entendendo quase nada. (PROFESSORA ISABELLA, 2017, grifo nosso)

Nota-se que a Cartografia ensinada na formação incial da professora, o uso de Geotecnologias estava atraledado mais ao contexto teórico sobre os Sistemas de Informação Geográfica (SIG) e quando houve a relação teória e prática esse contexto proporciou melhor entedimento do conteúdo, o que fez a docente repensar sobre sua prática na sala de aula. Segundo Marcondes (2002):

A prática reflexiva não é uma prática específica nem um componente autônomo do currículo; portanto, não pode estar desvinculada do conjunto da formação como todo. Não se deve limitar a ser responsabilidade apenas dos estágios de prática de ensino, mas a uma orientação comum ao conjunto de unidades da formação. (p.1915)

Dessa forma, ao destacar a importância da epistemologia da prática no currículo de formação de professores e seus desdobramentos, é notório que qualquer disciplina do curso deva propiciar fundamentos teóricos que permeiem todo processo da prática educativa, visto que, a experiência em si não é capaz dar total sentido ao conhecimento a ser produzido no percurso docente. Nesse caso, Ghedin (2002) aponta que:

Não há o que possa explicar melhor o sentido de nossas práticas pedagógicas educativas do que os limites e as possibilidades de estabelecer-se em nós um processo sistemático de reflexão sobre elas. O que fazemos não se explica pelo o como fazemos; possui sentido diante dos significados que lhe são atribuídos. (p. 141)

Após, a análise sobre o que foi relatado e o impacto da disciplina na prática docente da professora, sentimos a necessidade em realizar um breve diagnóstico do Projeto Político de Curso (PPC) de Geografia da instituição em que a professora se formou e verificamos a existência de duas disciplinas voltadas para área cartográfica. Uma chamada Introdução à Cartografia referente ao aspecto técnico e outra intitulada Cartografia aplicada ao Ensino de Geografia de cunho mais metodológico e voltada para o trabalho docente.

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Nesse aspecto, ao analisar objetivos presentes nas disciplinas de cartografia cursadas pela professora e o relato sobre sua prática, conseguimos afirmar que o conhecimento cartográfico trabalhado na formação inicial possue grande relevância para o desenvolvimento dos conceitos cartográficos durante as aulas de Geografia da educação básica. Nesse sentido, Castellar (2011) garante que:

Para que a cartografia tenha a relevância que merece no currículo escolar, não adianta ser mais um conteúdo; é preciso que os professores compreendam os fundamentos teóricos da discussão cartográfica.(...).Porém, esses conteúdos precisam ser tratados na formação inicial dos professores na medida em que, para ensiná-los, é necessário se apropriar deles. (p.122)

Por isso, a linguagem cartográfica não deve limitar-se apenas ao que está colocado no discurso curricular. É necessário que o professor tenha o domínio dos fundamentos cartográficos e possibilite os alunos entender a espacialização dos fenômenos. É evidente que limites e desafios com o trabalho cartográfico apareça, mas a tarefa de não dissociar esse processo da realidade dos alunos é fundamental. Desse modo, em outro momento da entrevista, ao dialogar sobre sua prática com a Cartografia em sala de aula, a professora afirmou que:

A cartografia é um conteúdo muito técnico e como na escola assim a gente não tem quase recurso e a gente mora assim numa comunidade que não tem quase acesso a internet, eu tenho que me virar nos trinta, no primeiro período eu tive que confeccionar um jogo pra trabalhar as coordenadas geográficas no sentido de localização para trabalhar os fusos horários também porque assim só falando, mostrando o mapa, passando uma atividade contextualizada não dá pra perceber que o aluno realmente está aprendendo, então geralmente eu uso métodos, mas também tenho que trabalhar algo pra eu verificar esse aprendizado, então ano passado inclusive nós apresentamos esse projeto de cartografia na feira de ciências, então eu sinto essa dificuldade pelo acesso a informação, por isso que eu utilizo os livros, aí eu vou buscar às vezes quando vou em Salvaterra que tem acesso a internet, porque aqui na escola é muito rarefeito, então é complicado (PROFESSORA ISABELLA, 2017)

Verificou-se que para além do uso do livro de didático de Geografia, a professora realiza pesquisas para trabalhar os conteúdos e elabora materiais didáticos para ensinar conceitos cartográficos aos alunos, relevando que não se limita ao saber da experiência, no sentido de entender que tanto o currículo escolar quanto o principal recurso didático presente na escola (o livro didático) são apenas parte do processo de ensino. Desse modo, Martins (2015) enfatiza que:

A atuação na disciplina de Geografia exige, atualmente, sujeitos autônomos, capazes de dar conta dos desafios relacionados à atividade docente. Essa autonomia colabora para que o docente possa pensar a sua prática, questionar as suas ações, tomar decisões e organizar seu planejamento de acordo com a realidade em que está inserido. (p. 262)

Essa compreensão sobre a prática docente no ensino de Geografia está para além da formação inicial do professor, pois está relacionada ao uso de diferentes métodos, procedimentos, técnicas e linguagens para trabalhar os conteúdos geográficos na sala de aula, o que na maioria das vezes exige o ato da pesquisa pelo professor.

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No caso da Cartografia escolar o professor que realiza pesquisa sobre o conhecimento cartográfico, suas abordagens e diferentes materiais didáticos para trabalhar com seus alunos, consegue potencializar sua prática. Nessa ação Seemann (2009, p. 2) aponta que para além de uma Cartografia cartesiana existem histórias e fenômenos que consistem em “carto-fatos” que precisam ser valorizados na aula de Geografia.

Outro contexto investigado durante a entrevista foi em relação as propostas de formação continuada poderiam contribuir com o trabalho da professora a respeito da cartografia no ensino de Geografia, e para tal foram apresentadas as seguintes opções: minicursos, oficinas ou palestras. Esse processo apontado como algo tão relevante, apareceu no seguinte relato da professora:

O que conversamos na sala dos professores né, que a oficina seria interessante porque ela vai nos dar um norte de como trabalhar, por exemplo eu pego o livro, já verifico lá , olha eu posso trabalhar um jornal falado com os alunos porque eu trabalho o conteúdo mas não gosto daquele conteúdo da técnica tradicional, só depositando, não, eu gosto de trabalhar dinâmicas com eles, por exemplo aquela turma que levei ontem para Joanes eles vão apresentar o mesmo trabalho, vão apresentar uma dramatização, não um jornal falado porque a turma é numerosa aí eu prefiro uma dramatização, a outra turma é pouca eles vão ficar com o jornal, então a oficina eu acredito que seja um norte pra gente trabalhar essas atividades que tenham o jornal, o fórum, algo assim que nos oriente aqui dentro da escola.(PROFESSORA ISABELLA, 2017)

Essa busca por um aperfeiçoamento profissional caracteriza-se como um processo essecial para o trabalho docente. Conforme explicita Libâneo (2008, p. 229) a formação continuada “se faz por meio do estudo, da reflexão, da discussão e da confrontação das experiências dos professores. É responsabilidade da instituição, mas também do próprio professor”.

Foi durante essa etapa da pesquisa participante que surgiu como demanda dos professores da escola e da própria secretaria municipal de educação, a solicitação de um curso de formação continuada, sendo algo que perpassa pelo desenvolvimento profissional dos docentes e está regimentado nas DCN’s para formação inicial e continuada de professores da Educação Básica, ao considerar:

I. os sistemas e redes de ensino, o projeto pedagógico das instituições de educação básica, bem como os problemas e os desafios da escola e do contexto onde ela está inserida;
II. a necessidade de acompanhar a inovação e o desenvolvimento associados ao conhecimento, à ciência e à tecnologia;
III. o respeito ao protagonismo do professor e a um espaço-tempo que lhe permita refletir criticamente e aperfeiçoar sua prática;
IV. o diálogo e a parceria com atores e instituições competentes, capazes de contribuir para alavancar novos patamares de qualidade ao complexo trabalho de gestão da sala de aula e da instituição educativa.( BRASIL, 2015,p.)
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Diante da importância estabelecida no documento e da demanda apresentada pela secretária municipal de educação e pelos professores, logo no início do ano letivo de 2018 foram ofertadas duas oficinas no mês de fevereiro, sobre a linguagem cartográfica na perspectiva do conhecimento interdisciplinar na educação escolar quilombola, por ser um trabalho no âmbito da formação continuada, as etapas foram realizadas com todos os professores que atuam nos anos finais do ensino fundamental da escola quilombola Maria Lúcia Ledo. Por isso destacamos que:

A formulação de uma proposta pedagógica para a educação quilombola certamente carece de pesquisas que envolvam aqueles saberes comunitários e um intercâmbio de conhecimentos entre diversas áreas. A interdisciplinaridade torna-se necessária para a abertura de diálogos entre sociologia, história, geografia, antropologia e outras ciências que venham a contribuir com a elaboração de um currículo pertinente a essa realidade. (CARRIL, 2017, p.554)

Além disso, a intenção dessa proposta em campo foi para que os professoras das disciplinas de Geografia e de Educação Quilombola da escola pudessem participar da atividade formativa e realizar um trabalho futuro a respeito da temática com seus alunos em sala de aula. Essa abordagem encontra-se coerente com a proposta das DCN para Educação Escolar Quilombola referente ao processo de formação continuada, ao destacarem:

Art.53 A formação continuada de professores que atuam na Educação Escolar Quilombola deverá:
I – ser assegurada pelos sistemas de ensino e suas instituições formadoras e compreendida como componente primordial da profissionalização docente e estratégia de continuidade do processo formativo, articulada à realidade das comunidades quilombolas e à formação inicial dos professores;
II – ser realizada por meio de cursos presenciais ou a distância, por meio de atividades formativas e cursos de atualização, aperfeiçoamento, especialização, bem como programas de mestrado e doutorado.
III- realizar cursos e atividades formativas criadas e desenvolvidas pelas instituições públicas de educação, cultura e pesquisa, em consonância com os projetos das escolas e dos sistemas de ensino;
IV- ter atendidas as necessidades de formação continuada dos professores pelos sistemas de ensino, pelos órgãos próprios e instituições formadoras de pesquisa e cultura, em regime de colaboração. (BRASIL, 2012, p.44)

Compreende-se que as atividades de formação continuada aos professores tem a finalidade de atender as necessidades referentes à prática profissional. Nesse caso, entende-se que “Os docentes em exercício constroem novos conhecimentos, ideias e práticas, pois é a partir daquilo que já possuem e sabem que continuam seu desenvolvimento.” (ALVARADO-PRADA; FREITAS; FREITAS, 2010, p.370). Para tanto, no início da oficina (Figura 01) foram discutidos, o contexto dos territórios quilombolas na Amazônia, no Marajó e o processo de organização territorial das comunidades localizadas em Salvaterra.

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Figura 1. Início da oficina de formação continuada. Fonte: Pesquisa Campos, fevereiro de 2018.

Nos encontros seguintes foi apresentado o panorama da Educação Escolar Quilombola e as discussões referentes às práticas educativas dos professores que atuam nessa modalidade, como proposta de contextualizar sua implementação e compreender que “Uma proposta de educação quilombola necessita fazer parte da construção de um currículo escolar aberto, flexível e de caráter interdisciplinar, elaborado de modo a articular o conhecimento escolar e os conhecimentos construídos pelas comunidades quilombolas.” (BRASIL, 2012, p.16)

Em outro momento, foi discutido a importância da práxis na construção do conhecimento na sala de aula. Nesse caso, entendo que a formação continuada é o processo em que os professores ao mobilizarem seus saberes, refletem sobre suas práticas, atualizam seus conhecimentos, explicitam o que realizam durante o trabalho docente e vivenciam outras propostas para contribuir em suas atividades. A esse respeito Giovanni (2003) evidencia contextos importantes no processo de formação continuada:

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Há de se levar o conjunto de profissionais da escola-alvo da ação de formação continuada a falar sobre o próprio saber, não para tomar saberes e experiências individuais como verdades, ou apenas para identificar lacunas e carências na formação de cada um, mas para que o grupo possa buscar novas mediações com o próprio trabalho, significativas, contextualizadas, viáveis. (p.216)

A compreensão desse olhar sobre a formação continuada foi que deu suporte ao terceiro momento da atividade para discutir a Cartografia escolar enquanto linguagem. No sentido de valorizar a função do mapa como meio de comunicação, sua importância no ensino, além de diferentes tipos de representações. A esse respeito Castellar (2011, p. 122) contribui ao dizer que: “quando assumimos que a linguagem cartográfica é uma estratégia de ensino ou um procedimento, não estamos desconsiderando que ela também seja uma técnica, mas que para o ensino, ela é uma linguagem importante.”

Para fortalecer essa perspectiva cartográfica foi realizada uma atividade de construção de uma sequência didática (figura 2) a respeito de um conteúdo do currículo escolar quilombola do ensino fundamental e a elaboração de mapas mentais sobre os elementos que constituem a identidade territorial quilombola a partir da realidade que os professores vivenciam nos lugares (comunidades quilombolas) e na prórpia escola.

Figura 2. Elaboração da sequência didática e do mapa mental. Fonte: Pesquisa de Campo, fevereiro de 2018.
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Todas essas etapas demonstram que a formação continuada de professores é um processo coletivo que resulta das necessidades, experiências, atividade reflexiva, situações de trabalho e fundamenta-se na importante articulação teoria e prática. Por isto, verificou-se que atividades formativas com professores voltadas para a Cartografia escolar de abordagem social possibilitam outras formas de trabalhar conceitos e conteúdos a partir de representações cartográficas construídas pelos sujeitos (alunos /professores) em sala.

Em vista disso, Cavalcanti (2008, p.95) destaca que “a formação do professor ou de qualquer profissional hoje é continua, permanente, deve se realizar também nos espaços de atuação profissional”. Tanto que na finalização das oficinas foi realizada uma avaliação coletiva em sala, com aplicação de questionário a respeito das oficinas, tema e proposta desenvolvida nesses dias. Ressalta-se que em todo percurso houve a preocupação em demostrar a importância do ambiente escolar quilombola como espaço de educação continuada a docentes e gestores.

Considerações Finais

As discussões e análises apresentadas neste texto vêm no sentido de elucidar algumas questões referentes à linguagem cartográfica na perspectiva social utilizada na formação continuada de professores quilombolas. Assim, verifica-se que o uso de mapas colocados como não-convencionais, que trazem essa abordagem (social) contribuem de maneira significativa para o contexto de diferentes realidades de ensino.

Nesse caso, entende-se que a formação contínua de professores é um processo coletivo que resulta das necessidades, experiências, atividade reflexiva, situações de trabalho e fundamenta-se na articulação teórico-prática.

Por isso, as atividades formativas de cartografia social com professores quilombolas possibilitam outras formas de trabalhar conceitos e conteúdos a partir de representações cartográficas construídas pelos sujeitos (alunos /professores) em sala.

Durante a oficina foi analisado que os mapas elaborados pelos professores trazem representações do cotidiano que vivenciam nas escolas quilombolas de Salvaterra. Portanto, as gráfias, os símbolos construídos representam de maneira específica as práticas sociais e culturais existentes nesses territórios quilombolas, fortalecendo o trabalho dos professores com os alunos quilombolas.

Referências

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Notas

1. Pesquisa resultante da Tese de doutoramento financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq)

2. Doutora em Geografia, professora adjunta do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (CEPAE)- UFG.

3. A professora já atuava nos anos iniciais com a formação em Magistério e posteriormente foi cursar Licenciatura em Geografia.