Devaneide Barbosa de Sousa
devaneidebarbosadesousa@gmail.com

Débora Barbosa de Moura Brasil
deb18gyn@gmail.com

Kêite Ferreira de Almeida
keite.f.almeida@hotmail.com

Renato Antônio Ribeiro
rhenato@gmail.com

Formação de Professores no Curso de Matemática: uma análise sobre o projeto pedagógico de curso

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Resumo

O presente artigo é fruto de uma pesquisa documental que teve como objetivo analisar e discutir a proposta de formação inicial de professores, bem como identificar e descrever o perfil dos egressos do curso de licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Goiás-Regional Catalão/GO, modalidade presencial e EaD, o que se deu mediante a análise dos Projetos Pedagógicos dos Cursos (PPC’s). Para cumprir com os objetivos elencados, as ementas e as referências utilizadas nas disciplinas pedagógicas foram analisadas, procurando observar os aspectos metodológicos e a articulação teoria-prática como sendo fatores primordiais na formação docente. Para a coleta de dados, servimo-nos da investigação qualitativa com elementos da pesquisa documental exploratória, tendo como aporte teórico autorescomo: Gatti (2008,2009,2014), Ghendin (2005,2009), Tardif (2009), Contreras (2002), Pimenta (2002), Perrenoud (1999) e Barbaceli (2017). Os resultados da análise evidenciam que os PPC’s estão em conformidade com as legislações e diretrizes para a formação de professores. Contudo, constatam-se algumas incoerências relacionadas à superação da dicotomia teoria-prática.Apesar da preocupação em formar um profissional consciente, crítico e reflexivo, percebe-se que a formação proposta se baseia em moldar um profissional ‘competente’ com perfil ‘flexível’, abrindo espaço para a formação docente sob a égide do paradigma neoliberal.Nesse sentido, não pretendemos esgotar as reflexões acerca dessa temática, mas fomentá-las, poisacreditamos que discutir a formação de professores não é o suficiente, mas é pressuposto necessário para avançarmos em busca de uma educação de qualidade.

Palavras-chave: Formação de Professores de Matemática. PPC. Formação por Competências.

Introdução/Justificativa

Não é novidade que as discussões em torno da qualidade da educação em nosso país perpassam toda nossa constituição histórica. Somos um país em ‘atraso educacional’ frente a muitos países no mundo, inclusive dentro da própria América Latina.Em consequência, pesquisas revelam que a profissão docente não tem atraído os jovens, visto que o reconhecimento social da profissão, principalmente em termos salariais, é bem aquém quando comparado a outras profissões de maior ‘prestígio’. Levantamento presente no relatório intitulado: Políticas Eficientes para Professores, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2018) indica que apenas 2,4% dos jovens brasileiros almejam a carreira docente. Dados da pesquisa ‘Profissão Docente’ realizada pelo Movimento Todos pela Educação (2018) mostra que 49% dos professores não recomendam a própria carreira profissional.

Aliado a isso, vemos os poucos ingressantes na profissão docente desistirem da carreira logo em seus anos iniciais de atuação e muitos destes profissionais sinalizam e queixam-se de que não foram preparados adequadamente em sua formação inicial para atuarem na Educação Básica. Parece haver ainda um abismo entre o que se trabalha na formação inicial de professores nas IES (Instituição de Ensino Superior) e o ‘chão da escola’.Neste sentido, Gatti (2014a, p.39), pesquisadora da área de formação de professores, alerta que as licenciaturas “segregam a formação na área específica dos conhecimentos pedagógicos, dedicando parte exígua de seu currículo às práticas profissionais docentes, às questões da escola, da didática e da aprendizagem escolar”.

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Neste viés, este artigo propõe uma reflexão acerca de propostas de formação inicial de professores de Matemática a partir da análise documental de um Projeto Pedagógico de Curso (PPC) da Licenciatura em Matemática de uma IES federal: a Universidade Federal de Goiás (UFG) – Regional Catalão-GO, que oferece o curso presencial desde 1988 e pela modalidade à distância (EaD) desde 2015. A análiseterá suporte da revisão bibliográfica do campo da formação de professores,sendo analisado no PPC, especificamente, o perfil dos egressos apresentado no documento, os aspectos metodológicos da formação, a organização do currículo com foco na articulação teoria-prática, a consonância com as legislações vigentes relacionadas à formação de professores e, mais precisamente, as ementas e as referências bibliográficas das disciplinas pedagógicas, confrontando-as com os modelos formativos e/ou principais tendências teóricas no campo da formação de professores.

Garcia (1992, p. 54) já apontava que “a formação de professores está a converter-se novamente (nem poderia ser de outro modo) no elemento-chave, numa das pedras angulares do projeto de reforma do sistema educativo”. Assim, este estudo se torna válido ao trazer contribuições para o campo da formação de professores, especificamente de matemática, ao fornecer informações apontadas no PPC do curso analisado, que esclarecem e caracterizam o modelo formativo adotado pela IES, a concepção de escola e de formação, o papel da escola e do professor e o lugar dos processos formativos do profissional docente no contexto da qualidade da educação em nosso país, contribuindo para o fortalecimento dos cursos de licenciatura oferecidos pelas IES, bem como para a carreira docente na Educação Básica brasileira.

Discutindo a Formação do Professor de Matemática

A formação de professores tem sido amplamente discutida e configura-se como relevante objeto de estudo de diversos grupos de pesquisa. Gatti (2010) ao fazer uma pequena digressão histórica acercada formação de professores no Brasil, lembra-nos que esta se iniciou ao final do século XIX com a criação das chamadas Escolas Normais, as quais eram incumbidas da formação docente para as ‘primeiras letras’. No entanto, a mesma autora pontua que somente no final da década de 1930 foram instituídos cursos destinados à formação de docentes para o ‘ensino secundário’, conhecido de modo recorrente como ‘3 + 1’, pelo fato de se constituírem a partir da formação de bacharéis, acrescentando-se apenas um ano com disciplinas do âmbito educacional para obtenção da licenciatura.

Esse formato de curso que concebe o professor como um simples técnico, caracterizado pela supervalorização da teoria em detrimento da prática, concebendo esta prática como mera oportunidade de aplicação de conhecimentos teóricos, recebeu e recebe atualmente diversas críticas.Objetivando a superação desse modelo, têm sido discutidas novas tendências na formação de professores, as quais podem ser caracterizadas a partir de seus conceitos centrais, que segundo Ghendin (2009, p. 4) são: “saber docente, reflexão sobre a prática, pesquisa no ensino e competências da formação”. Dadas às potencialidades, limitações, e importância dessas tendências, acreditamos ser problemático discutir a formação de professores na atualidade sem discorrer, mesmo que brevemente, sobre as mesmas.

Ghendin (2009) defende que o conceito de saber aparece como elemento fundamental ao processo formativo do professor: “ele revela uma preocupação de caráter mais epistemológico e desvenda uma particular preocupação com os conteúdos e métodos do processo formativo” (GHENDIN, 2009, p. 6).

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Tardif (2009) defende que os saberes profissionais dos professores são variados e heterogêneos, sendo provenientes de diversas fontes, como: a cultura escolar e pessoal, advinda de sua história de vida; os conhecimentos disciplinares, didáticos e pedagógicos oriundos de sua formação profissional; conhecimentos curriculares veiculados pelos programas, guias e manuais escolares, além do próprio saber, ligado à experiência do trabalho e a convivência com seus pares.

Outro conceito comumente discutido no âmbito da formação de professores é o conceito de reflexão, apresentando-se na literatura como professor reflexivo, sendo usado inicialmente por Schön em conjunto com diversos autores.

Segundo Contreras (2002, p. 135) a “[...] menção à reflexão é tão extensa que passou a ser de uso obrigatório para qualquer autor ou corrente pedagógica”.O uso deste termo de modo impulsivo, sem uma análise profícua do seu real sentido para o contexto da formação de professores, tem contribuído para um esvaziamento de seu significado e tem gerado diversas críticas. Não objetivamos neste trabalho aprofundar a discussão desse conceito, nem apontar suas limitações,no entanto, é pertinente ressaltar que a reflexão está condicionada a prática cotidiana do professor ou a reflexão sobre essa mesma prática. Em decorrência dessas e outras críticas à perspectiva do professor reflexivo, Giroux sugere a utilização do termo intelectual crítico, Zeichner a do professor crítico-reflexivo e Stenhouse e Smyth a do professor investigador.

Ghendin (2005) pontua que outra perspectiva que nos possibilita pensar a formação de professores hoje, nos centros de formação, é o conceito de pesquisa, referindo-se como “um elemento que possibilita ao professor elaborar os próprios conhecimentos de modo sistemático. Quer dizer que lhe possibilita construir metódica e radicalmente um modo de compreender, de explicar e de interpretar o mundo” (GHENDIN, 2009, p.11).

Outro conceito trazido ao debate da formação docente é o de competências e talvez seja o mais complexo deles, dada sua polissemia. É um consenso a dificuldade em se obter uma definição concreta para o termo. Perrenoud (1999, p.7) define competência como a “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiado em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles”.

Pimenta (2002 apud GHENDIN, 2009) pontua que a concepção de competências de Perrenoud nega a ideia tradicional de que ensinar restringe-se ao simples ato de transferir conhecimentos.No entanto, é possível verificar na atualidade o uso indiscriminado desse conceito, inclusive de modo a camuflar uma abordagem tecnicista de formação.A teoria das competências na formação de professores recebe diversas críticas, especialmente por ter servido, de acordo com Ghendin (2009), a uma ideologia que reduz o papel da educação e do professor a uma mera atividade técnica, eliminando de suas ações a responsabilidade ética e o compromisso político na formação de cidadãos.

Cabe também ressaltar que historicamente há uma dicotomia em relação à atuação docente: o domínio de conteúdos específicos de área e o domínio pedagógico. No âmbito específico da formação inicial de professores de matemática, muitos cursos deixam de articular os saberes técnico-científicos e os saberes pedagógico-didáticos, sendo a distribuição dos conteúdos heterogênea nos mais diversos cursos.

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Gatti e Nunes (2009) defendem a existência de três tipos de licenciatura em matemática: uma primeira com formação voltada para bacharéis, que consiste no aprofundamento de estudos dos conhecimentos específicos da matemática e com poucas disciplinas pedagógicas; um segundo tipo de licenciatura designada à formação básica de matemática que atende tanto ao desenvolvimento dos conhecimentos específicos quanto pedagógicos, porém, com pouco espaço para as disciplinas na área da Educação Matemática, e um terceiro tipo, que além da formação específica em Matemática, tem uma maior abrangência nas áreas pedagógicas, como: Didática, Filosofia, História da Matemática, Tópicos de Educação Matemática e outras disciplinas para a área de Educação.

Promover uma formação inicial de qualidade, aos moldes do que Gatti e Nunes (2009) brevemente explicitam como sendo o terceiro tipo, implica a superação de uma série de dificuldades que perpassam a formação docente, no qual serão brevemente explanadas na análise do PPC.

Procedimentos Metodológicos

Essa investigação possui características qualitativas com elementos da pesquisa documental exploratória e bibliográfica. Foram analisados os PPC’s dos cursos de licenciatura em Matemática da UFG/Regional Catalão-GO(CAC-UFG), campus criado com objetivo de possibilitar uma participação efetiva no processo de desenvolvimento cultural e socioeconômico local, regional e também nacional, promovendo a interiorização da IES.

Os PPC’s foram acessados via internet e lidos na íntegra para a caracterização dos cursos, alinhados aos objetivos de pesquisa já delimitados anteriormente. É importante frisar que a IES possui três cursos de graduação na área de Matemática: o de Matemática Industrial, voltado para atender às necessidades econômicas da região em que se encontra, não sendo objeto de análise neste estudo, e dois cursos de licenciatura em Matemática: um presencial e outro oferecido à distância. Os dois cursos de licenciatura possuem PPC’s distintos, visto suas particularidades, mas verifica-se que o PPC do curso EaD (de 2013), mais recente, possui praticamente a mesma estrutura e teor do PPC do curso presencial (de 2008), acrescidas apenas partes referentes à Educação à distância e sua dinâmica de trabalho/funcionamento.

Assim, optou-se neste estudo por focar no PPC do curso presencial e quando possível e pertinente, estabelecer algumas comparações e/ou considerações com o PPC do curso oferecido via EaD. Dessa forma, realizou-se um estudo analítico-descritivo, bem como uma análise interpretativa, fazendo relações entre as informações disponíveis nos PPC’s, as legislações e/ou diretrizes que os amparam e a revisão bibliográfica realizada.

A Análise do Projeto Pedagógico de Curso

Os PPC’s de licenciatura analisados, estão em conformidade com as orientações das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Matemática, conforme Parecer CNE/CP 1.302/2001 (BRASIL, 2001) e também com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Formação de Professores da Educação Básica de 2002 (BRASIL, 2002a), em vigor desde 2006. Tais diretrizes constituíram a culminância dos anseios e discussões em torno da formação de professores advindas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996). Segundo Melo (2007, p. 72), tais DCN “apresentam um perfil eminentemente técnico-profissionalizante para a formação de professores. Desta forma, os conceitos de flexibilização e competência são elementos fundamentais na concepção de formação de professores”. Assim, modelos formativos que se sustentam por tais DCN, apontam para a formação de profissionais preparados para a competitividade, competência e eficiência individuais.

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De fato, em ambos PPC’s, presencial e EaD, há menções para a formação deste ‘perfil profissional competente’ ao propor o desenvolvimento de competências que possam lhes servir de alicerce para conseguirem atuar como sujeitos nos mais variados contextos dos quais vierem a participar. (UFG-PPC-PRESENCIAL, 2008, p. 23; UFG-PPC-EAD, 2013, p. 21).

O conceito de competência é polissêmico, embora o denominador comum para vários autores seja relacionar competência como conhecimento prático aplicado, mas de acordo Machado, o conceito competência deve ser utilizado com cautela no contexto educacional: “a ideia de qualidade na empresa não significa o mesmo que na escola. [...] No contexto educacional, a noção de competência é muito mais fecunda e abrangente” (MACHADO, 2002, p. 140-141).

Neste sentido, ficam claras as intenções que emanam dos PPC’s analisados quanto ao paradigma econômico neoliberal, próprio do modo de produção capitalista, de regulamentar e colocar em posição submissa a área educacional, inclusive a formação de professores. Esta formação é pautada por um modelo que se fundamenta em moldar um profissional ‘competente’ com perfil ‘flexível’, adaptável às mudanças do mercado, enfrentando os novos desafios e as transformações que a sociedade apresenta, a partir de um currículo também ‘flexível’, constituindo uma formação aligeirada e fragmentada.

Quanto à carga horária (CH) total dos cursos, há leve diferença: o curso presencial conta com CH de 3032 horas e o curso à distância com CH de 2904 horas, ambos oferecidos em oito semestres letivos. A Matriz Curricular do curso presencial, segundo o PPC, elenca 40 disciplinas, incluindo os Estágios Supervisionados (400 horas), e também o Trabalho Final de Curso. No curso à distância são elencadas 39 disciplinas, incluindo os Estágios Supervisionados (400 horas), mas sem mencionar o Trabalho Final de Curso e sua CH, apesar de estar prevista sua realização para conclusão do curso conforme o PPC. A quantidade de disciplinas específicas de área é bem superior às disciplinas pedagógicas e/ou não específicas, que incluindo os estágios supervisionados obrigatórios perfazem 36,41% da CH cumprida no curso presencial e 38% da CH cumprida no curso à distância. Logo, conclui-se que apesar de serem cursos de licenciatura, destinados à formação de professores atuantes na educação básica, os componentes curriculares pedagógicos, que poderiam contribuir para a formação da identidade profissional docente, acabam se constituindo como disciplinas acessórias.

Dessa forma, a dimensão prática estipulada nas DCN está reduzida, no documento analisado, à atribuição numérica de CH nas disciplinas cursadas. Sob a perspectiva freireana, teoria e prática são indissociáveis e devem manter um diálogo permanente dentro do processo pedagógico, constituindo uma práxis educativa: “é preciso que fique claro que, por isso mesmo que estamos defendendo a práxis, a teoria do fazer, não estamos propondo nenhuma dicotomia de que resultasse que este fazer se dividisse em uma etapa de reflexão e outra, distante de ação” (FREIRE, 1987, p. 125).

Apesar de propor a superação da dicotomia teoria-prática, o PPC sugere uma articulação das mesmas baseando-se na ‘aplicação’ da teoria na prática, pois “os alunos têm a possibilidade de estabelecer contato efetivo com a prática em relação a vários conceitos abordados teoricamente, uma vez que diversas disciplinas apresentam um percentual de carga horária destinado à aplicação[grifo nosso] dos conceitos em laboratórios” (UFG-PPC-PRESENCIAL, 2008, p. 30).

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Quanto ao perfil do egresso, o PPC propõe uma sólida formação plural e holística do profissional docente com “conhecimento teórico relativo aos saberes matemáticos, sólida formação teórico-prática relativa aos saberes educacionais, bem como uma visão histórico-crítico-tecnológica relativa a estes conhecimentos e às relações existentes entre eles” (UFG-PPC-PRESENCIAL, 2008, p. 24) evidenciando preocupação com a constituição de sua identidade profissional.

Percebe-se a influência de diferentes tendências teóricas na formação de professores (A reflexão sobre a prática; O professor pesquisador; Os saberes docentes; A formação por Competências) na elaboração do PPC a partir da citação de seus conceitos chave em vários trechos:

Espera-se formar educadores e professores de matemática que sejam, em um só tempo, reflexivos, críticos, criativos, investigadores do universo sociocultural no qual atuam. Pesquisadores que façam da sua própria prática docente elemento de reflexão e crítica indispensável ao seu desenvolvimento profissional.
[...] garanta ao licenciando chegar ao fim do curso em condições de assumir a sua função profissional em liberdade de pensamento, com a consciência da abrangência sócio-político-cultural.
[...] seja um agente da construção do conhecimento e da cidadania, enquanto facilitador, mediador e incentivador dos alunos com os quais compartilha um ambiente de aprendizagem.
[...] enfrentar de modo criativo e crítico os desafios impostos pelas rápidas – e, muitas vezes, bruscas – transformações sócio-político-culturais que acabam por modificar as formas de organização do mercado de trabalho e do meio acadêmico em geral (UFG-PPC-PRESENCIAL, 2008, p. 24-25).

Tardif (2002, p. 54), acerca dos saberes docentes necessários ao exercício da profissão, afirma que estes devem se pautar pelo “saber plural, formado de diversos saberes provenientes das instituições de formação, da formação profissional, dos currículos e da prática cotidiana”. O autor destaca a importância dos saberes experienciais, em detrimento dos outros saberes, o que vai ao encontro do que consta no PPC, ao chamar a atenção para a própria prática docente como elemento primordial na formação profissional.

Considerações Finais

Tendo por base a complexidade e os múltiplos fatores que influenciam a formação do professor de matemática, objetivamos nesse trabalho mediante a análise dos PPC’s, descrever e caracterizar os elementos que moldam a formação dos professores naUFG/Catalão, contribuindo de modo a agregar mais elementos à discussão dessa temática.

Neste sentido, percebemos algumas contradições na formação dos professores,que são evidenciadas, por exemplo, na proposta de superação da dicotomia teoria-prática, ao mesmo tempo em que se sugere uma articulação das mesmas, baseando-se na limitada ‘aplicação’ da teoria na prática.

OsPPC’smanifestam preocupação em formar um profissional consciente de seu papel na sociedade, conduzindo o ato educativo como um ato político, não neutro, pautado pela autonomia e liberdade de pensamento docente, bem como na reflexão crítica, visando educar para o exercício da cidadania.No entanto, enfatiza uma formaçãoque se fundamenta em moldar um profissional ‘competente’ com perfil ‘flexível’,que acabam por “reforçar e fortalecer o paradigma neoliberal/neotecnicista já estabelecido na área [...]. A teoria das competências faz-se presente, explícita ou implicitamente, nas políticas de formação docente, visto que expressam a ideologia neoliberal na fase atual de acumulação flexível” Barbaceli (2017, p. 88-89).

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Com esse trabalho, foi possível traçarmos um panorama geral acerca da formação inicial de professores de matemática no contexto dessa IES específica, sendo ela uma das mais conceituadas e mais importantes para o contexto da formação de professores no estado de Goiás. Corroborando Ghendin (2009), afirmamos que é preciso aprender a ler o que está posto na formação dos professores, reinterpretando o que vemos e desvelando o que não vemos no véu da aparência para repensar osmodelos de formação.

Referências

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Notas

1. Universidade Federal de Goiás: Mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática. Graduada em Matemática.

2. Universidade Federal de Goiás: Mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática. Graduada em Matemática.

3. Universidade Federal de Goiás: Mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática. Graduada em Matemática.

4. Universidade Federal de Goiás: Doutorando do Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática. Graduado em Ciências Biológicas.

5. Desde 2009, esta Regional da UFG também oferece o curso de Matemática Industrial, atendendo o potencial econômico da região de Catalão-GO, mas tal curso não será objeto de análise neste estudo.

6. Schön (1992), Contreras (2002), Perrenoud (2002), Pimeta e Ghedin (2005), Zeichner (1992), Libâneo(2002), Cherlot (2002), Sacristán (2002), Valadares (2002), Franco (2002), Lima e Gomes (2002),Serrão (2002), Borges (2002), Pimenta (2002), Ghedin (2002), Monteiro (2002), Matos (2003), entre outros.

7. A Lei nº 13.634, de 20 de março de 2018 (BRASIL, 2018) criou a Universidade Federal de Catalão (UFCAT), por desmembramento da UFG. O processo de desmembramento/transição está em curso desde então.

8. A aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024 (Brasil, 2014) demandou a instituição de novas DCN em 2015 (Brasil, 2015), a vigorarem a partir de 2017. Porém, já em segunda prorrogação, tais DCN têm previsão de entrarem em vigor em 2019. Logo, os PPC’s analisados neste artigo foram elaborados a partir das DCN de 2002.