Reflexões sobre o ato de avaliar a aprendizagem no ensino remoto emergencial: desafios e possibilidades

Lara Nayane Cardoso da Silva

Eliane Carolina de Oliveira

PT

Resumo:Devido à pandemia de COVID-19, no ano de 2020 as aulas presenciais precisaram ser suspensas em cumprimento às medidas sanitárias de contenção do vírus. Em razão disso, a modalidade chamada Ensino Remoto Emergencial (ERE) passou a vigorar no âmbito educacional nos vários níveis e contexto de ensino, entre eles o Centro de Línguas (CL) da UFG. Entre as adaptações e mudanças necessárias para essa modalidade de ensino, foi preciso também (re)pensar as práticas avaliativas para que fossem adequadas a esse novo contexto. Este artigo parte da necessidade de identificar e compreender melhor quais foram os desafios e possibilidades apresentados pelo ERE, e quais os caminhos possíveis para a avaliação da aprendizagem nessa modalidade. Para isso, foram analisadas publicações recentes de autores como Colombo; Andrade (2020), Ferreira (2020), Menezes; Francisco (2020), Sáet al (2020) e Xavier et al (2020) entre outros, sobre o tema, bem como sobre o Ensino à Distância (EAD), a fim de identificar esses obstáculos e também instrumentos avaliativos e ferramentas tecnológicas que se apresentam como alternativas nesse contexto. Os resultados apontam para a viabilidade de adaptar ferramentas comuns do ensino presencial para o ERE, além da exploração de novos instrumentos tecnológicos para avaliação. Destaca-se a modalidade de avaliação formativa como apropriada para o ERE, pois valoriza o percurso do estudante e permite o aprimoramento contínuo do aprendizado. Por fim, a colaboração entre professores, como a observada no grupo de WhatsApp criado à época, foi crucial para buscar soluções criativas, impactando positivamente o cenário educacional e promovendo práticas que valorizam mais o processo de aprendizagem do que apenas a obtenção de notas.
Palavras-chave: ensino remoto emergencial; COVID-19; avaliação; colaboração..

Introdução

O ano de 2020 impôs às educadoras e educadores de todo o mundo um enorme desafio e a necessidade inesperada de repensar o que sabiam sobre a prática docente, se adaptando a uma forma completamente nova de ensinar. Devido à pandemia de COVID-19, foram adotadas, em inúmeros países, medidas de contenção do vírus, entre elas, o isolamento social. Assim, as aulas presenciais foram suspensas no Brasil no mês de março e em abril o Conselho Nacional de Educação (CNE), através do parecer Nº 5/2020, autorizou que as atividades não presenciais fossem computadas para o cumprimento de carga horária nas instituições de ensino (Brasil, 2020).

Por conta desse novo contexto, foi necessário repensar e reformular as práticas pedagógicas para adequá-las ao formato remoto. Uma profusão de reportagens em várias mídias destacaram o fato de que professoras e professores tiveram que fazer isso da noite para o dia e, querendo ou não, precisaram aprender a utilizar novas ferramentas, aplicativos, dispositivos que, muitas vezes, nunca haviam utilizado em sala de aula antes. Houve sucessos e fracassos, mas os professores, cada um da sua forma, ofereceram (e continuam oferecendo) seu melhor para que as crianças e adolescentes continuassem tendo acesso à educação durante a pandemia.

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O acesso à educação é um problema antigo e de muitas nuances no Brasil. Com a pandemia e a necessidade de adoção do ensino remoto emergencial (ERE), a exclusão de pessoas economicamente e socialmente menos favorecidas se intensificou, pois, com o ensino acontecendo através de meio digitais, muitos obstáculos foram acrescentados ao já difícil acesso à educação de qualidade no país. De fato, o que observamos no contexto do Centro de Línguas da UFG, no qual atuamos como profissionais da área de inglês, é que era preciso ter um bom pacote de internet para participar de videochamadas e assistir as vídeo aulas. Para quem tinha apenas um aparelho celular e não um computador, as coisas ficavam ainda mais complicadas, pois era preciso fazer atividades que, muitas vezes, necessitavam de editores de texto e outros softwares que só funcionam adequadamente em um computador.

Além dos aspectos mencionados, também houve o fato de que muitas/os estudantes não contavam com um ambiente adequado para os estudos em casa ou, ainda, aqueles que estavam passando por situações que dificultavam o aprendizado. Faltavam não só aparelhos e internet, mas muitas vezes móveis, espaços individuais para estudo, silêncio, conhecimento básico de tecnologia e saúde mental. Em meio a tudo isso, se encontravam professoras/es que não tinham outra alternativa a não ser seguir com as aulas a despeito das condições de seus alunos. Em meio a tantas adaptações e reinvenções, foi preciso também escolher os recursos tendo em mente a realidade de seus alunos, para que houvesse o mínimo de exclusão possível.

No contexto experienciado durante e após a pandemia, em meio a vídeo conferências, vídeo aulas, aplicativos, webinars, plataformas, atividades síncronas, assíncronas e quedas de conexão, se encontrava o processo avaliativo. Essa, sem dúvidas, foi umas das principais preocupações no ERE. Como aplicar provas de forma virtual? Qual plataforma usar para isso? Como impedir a famosa “cola”? Como saber se os alunos estavam estudando e aprendendo? O processo avaliativo nessas circunstâncias se apresenta como um grande desafio e é por isso que se fez necessário um estudo sobre a avaliação nessa modalidade de ensino.

Além da pertinência do assunto no momento em foco, durante e pós-pandemia, alguns outros fatores foram decisivos para despertar nosso interesse e motivação em pesquisar o tema deste artigo sob a orientação da minha supervisora no CL à época, co-autora deste artigo. Entre eles, a oportunidade que tive de ter contato com obras teóricas e de participar de discussões, na disciplina de Estágio do curso de graduação da Faculdade de Letras da UFG, ao longo do módulo dedicado ao estudo da avaliação.

Existem muitos tópicos importantes a serem discutidos quando se aborda o tema avaliação, como a utilização exaustiva da prova como instrumento de avaliação desvinculado dos demais momentos em sala de aula; os efeitos ocasionados nas/os estudantes, como ansiedade e sentimento de fracasso; a utilização da prova como instrumento de poder, percebida como algo hostil por estudantes, entre outros pontos bastante relevantes.

Com base na minha experiência discente e docente, observo que a prova tradicional, apesar de não ser o único instrumento avaliativo, costuma figurar como o mais utilizado e o que tem mais peso na distribuição de notas. É preciso reconhecer que ela tem, de fato, sua função, a depender das finalidades e objetivos de quem avalia, e que não há problema na prova em si, mas em utilizá- la sempre como elemento central do processo avaliativo, uma vez que ela não contempla todas as formas de aprendizado.

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Como discutido no grupo de WhatsApp criado para as interações entre a supervisora do CL, co-autora deste capítulo, e quatro professores do CL, é natural que a tendência seja que professoras/es reproduzam esse modelo e que também tentem transferi-lo para o ensino remoto, porque costuma ser a forma por meio da qual a maioria foi avaliada durante toda a sua trajetória escolar. Entretanto, durante os momentos de interação do grupo quando discutíamos as etapas de adaptação e de preparação para a retomada das aulas na modalidade remota, percebemos, tanto entre colegas do grupo, quanto entre professoras/es que produzem conteúdo para a internet, a preocupação em explorar novas formas para avaliar a aprendizagem. A pandemia de COVID-19 despertou, compulsoriamente, a necessidade de tentar transformar a prática docente no ato de avaliar e procurar alternativas que atendessem melhor as turmas nesse novo contexto virtual. No entanto, por se tratar de uma experiência que a maioria de nós nunca teve antes, ainda eram muitas as dúvidas e receios em relação à avaliação remota.

A compreensão dos aspectos apontados acima foi o que despertou nosso interesse em pesquisar o assunto. Tal compreensão nos fez perceber que, diante deste problema, que é o desafio de avaliar remotamente, era preciso pensar nas transformações necessárias na forma como avaliamos nossas alunas e alunos. O objetivo geral deste artigo foi, portanto, compreender quais as eventuais possibilidades para a avaliação no ERE. Mais especificamente, identificar as formas mais proveitosas e adequadas para avaliar no ERE, considerando as especificidades da modalidade. Além disso, este estudo pretendeu verificar quais são os desafios, dificuldades e limitações do processo avaliativo neste contexto. Para isso, foi feita uma pesquisa bibliográfica considerando a leitura de artigos e publicações virtuais recentes sobre o tema, e também sobre a avaliação em EAD que, apesar de possuir diferenças, é uma área com muito a contribuir para o momento que vivenciamos na educação remota. Nas primeiras duas seções deste artigo, estão delimitadas algumas considerações iniciais acerca do tema avaliação, tecnologias na educação e ensino remoto emergencial. Nas seções seguintes, são abordados os desafios e possibilidades para a avaliação no ERE, seguidas das considerações finais.

Avaliação

As instituições de ensino e a forma como se organizam, incluindo seus métodos e ferramentas de ensino-aprendizagem, encontram-se inseridas em um contexto histórico e cultural e, naturalmente, reproduzem valores da sociedade. A maneira como as coisas são feitas na escola diz muito sobre quais são as concepções de ensino naquele ambiente. Nesse contexto, entre outros aspectos, encontra-se a avaliação. Avaliação é um tema que frequentemente desperta sentimentos negativos em boa parte das pessoas que tenham passado por uma instituição de ensino no Brasil. É comum que estudantes relacionem avaliação a momentos de ansiedade, angústia, fracasso e baixa autoestima intelectual. Toda essa carga se soma às demais dificuldades encontradas no ERE e que podem afetar a execução das avaliações, como falhas de conexão, qualidade do sinal, dispositivos não adequados, entre outros.

Para compreender como a dinâmica dos processos avaliativos se inserem no ERE, é preciso, primeiramente, esclarecer alguns aspectos sobre a avaliação. É necessário identificar suas características, categorias e finalidades. Para isso, foram utilizadas neste estudo, obras de autoras e autores que trazem importantes contribuições para a compreensão do papel da avaliação enquanto parte do processo educativo.

Ao longo das últimas décadas, ocorreram inúmeras transformações sociais em vários sentidos. As pessoas não se comportam, comunicam nem aprendem mais da mesma forma. Na educação formal, entretanto, muitas tradições continuam sendo seguidas. A educação bancária, termo cunhado por Paulo Freire, segue sendo a regra nos dias de hoje. Se a educação for bancária, a avaliação também seguirá os mesmos princípios. Fidalgo (2006) explica o conceito de avaliação bancária , termo de Romão (1998) baseado em Freire (1970, p. 58):

A avaliação bancária consistiria na capacidade do aluno de buscar nos seus “arquivos mentais” os depósitos ali deixados, exatamente como foram feitos, sem interpretação, sem acréscimos, sem qualquer tipo de juros ou deduções, e devolvê-los ao depositante, mediante requisição: a prova, o teste, o exame final. Nesse sentido, avaliação e testagem passam a ser conceitos sinônimos, uma vez que, tendo como meta a devolução “objetiva” dos conhecimentos depositados, a prova seria o único instrumento utilizado para a ampla tarefa de avaliar (Fidalgo, 2006, p. 19).

A avaliação na educação está ligada, em suas origens, a poder, medo, controle e seletividade, como mostra Fidalgo (2006) ao fazer um apanhado histórico de como a avaliação surgiu, com que finalidades, e como passou a ser utilizada na educação. Através do conceito de avaliação bancária (Romão, 1998,apud Fidalgo, 2006, p. 19), a autora evidencia um dos principais usos que ainda hoje é dado à avaliação: a devolução de conhecimento, por parte da/o estudante, exatamente da forma como foi depositado. Dessa forma, seria provado que houve aprendizagem e o conhecimento foi adquirido. Essa seria uma das formas de avaliar, entre tantas outras possíveis.

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Rabello (1998, apud Zanon; Althaus, 2008, p. 8) esclarece que a avaliação pode ser dividida em três categorias, de acordo com a finalidade a que se destina:

Na avaliação diagnóstica, é feito um prognóstico sobre as capacidades do aluno em relação a um novo conteúdo. Uma avaliação somativa caracteriza-se por ser pontual, acontecendo normalmente ao final de uma unidade de ensino, de curso ou bimestre. Já na avaliação formativa objetiva-se buscar informações relativas ao processo ensino-aprendizagem para que o professor possa ajustá-lo às características dos alunos (1998, apud Zanon; Althaus, 2008, p. 8).

A avaliação, portanto, deve ser adaptada de acordo com seus objetivos e finalidades. No entanto, a avaliação do aprendizado costuma se dar principalmente pelo instrumento mais tradicional: a prova ou exame. A respeito da escolha do instrumento avaliativo por parte do/a professor/a, Luckesi (2011) aponta:

Em nossa experiência escolar, não tivemos oportunidade de aprender outra forma de acompanhar a aprendizagem dos educandos que não fosse os exames escolares, pois a eles fomos submetidos durante os anos sucessivos de nossa escolaridade. Se não fomos traumatizados, acostumamo-nos a esse modo de agir como se fosse o único. Hoje como educadores, no momento da necessidade, repetimos a solução que fora praticada conosco (Luckesi, 2011, p. 220).

A avaliação é um dos pontos na educação que mais necessita uma reformulação de paradigmas, de forma mais inovadora, principalmente considerando-se o contexto atual do ERE, em que isso se torna ainda mais urgente. É fundamental questionar essa repetição de práticas educativas e pensar outras formas de avaliar a aprendizagem, para que esse processo se torne mais adequado aos objetivos de uma educação que se oponha à educação bancária. A avaliação seria mais justa, afinal, se identificasse as necessidades das/os alunas/os para adequar o curso a elas, oferecendo oportunidades melhores para que cada estudante expresse o que sabe e encontre pontos que necessitam de melhora.

A tecnologia na educação e o ensino remoto emergencial

Geralmente, quando se fala em tecnologia na educação, o que vem em mente são dispositivos como computadores, projetores, lousas digitais, tablets e afins. No entanto, essas são apenas algumas das ferramentas tecnológicas utilizadas no contexto das salas de aula. Oliveira (2013) traz algumas informações a respeito da utilização de tecnologia na educação, que mostram que não se trata de um fenômeno recente. Apesar de haver pouco tempo de utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), outras ferramentas tecnológicas já vêm sendo empregadas na educação há décadas. A autora mostra que desde 1801, com o marco da criação do quadro de giz, que se apresentou como uma importante ferramenta tecnológica, pode-se dizer que a tecnologia vem se incorporando cada vez mais à educação (Oliveira, 2013).

Em relação à terminologia para tratar dessas tecnologias, Costa, Duqueviz e Pedroza (2015, p. 604) esclarecem que:

O termo Tecnologias da Informação e Comunicação – TIC – é o mais comum para se referir aos dispositivos eletrônicos e tecnológicos, incluindo-se computador, internet, tablet e smartphone. Como o termo TIC abrange tecnologias mais antigas como a televisão, o jornal e o mimeógrafo, pesquisadores têm utilizado o termo Novas Tecnologias para se referir às tecnologias digitais (KENSKI, 1998) ou Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação – TDIC (Baranauskas; Valente, 2013).
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A relação entre educação e tecnologia é um campo em que não há receitas prontas. Sobre isso, Oliveira (2013) destaca, através da frase “navegar (não) é preciso", em referência a Fernando Pessoa, um aspecto que traduz perfeitamente o momento que vivemos na educação durante a pandemia de COVID-19:

[...] as mudanças, representadas principalmente pela nova era da internet – a chamada Web 2.0, configuram-se como plenas de oportunidades educacionais, mas também repletas de imprevisibilidades – o que faz com que, por um lado, o navegar não seja preciso, exato, mas, por outro, necessário, haja vista o descompasso entre a educação escolar e a sociedade atual (Oliveira, 2013, p. 204).

Em tempos de ERE e distanciamento social, a utilização de tecnologias e o navegar foram necessários, pois eram as formas mais recomendadas para se manter o contato entre escola e estudantes. Por ser algo inédito e que antes acontecia majoritariamente em cursos da modalidade Ensino à Distância (EAD), muitas professoras e professores se viram frente a desafios imprevisíveis onde foi necessário experimentar e testar novas possibilidades.

Antes do uso compulsório de tecnologias devido à suspensão das aulas presenciais, a incorporação dessas novas tecnologias e ferramentas digitais na educação vinha sendo um processo lento no Brasil, que à época da pandemia e do ERE se deu de maneira acelerada e não estruturada. Devido à falta de infraestrutura, má utilização de recursos financeiros, entre outros fatores, a escola brasileira, especialmente a pública, não costumava contar com o uso de tecnologias de forma consistente no processo educativo. Muitas/os estudantes também não tinham, e continuam não tendo, fácil acesso a aparelhos ou conexão de internet em suas casas. Esses fatores se configuram como grandes obstáculos para a utilização de novas tecnologias em sala de aula. O acesso inadequado a dispositivos eletrônicos se comprova no gráfico abaixo, com dados divulgados pela pesquisa TIC Educação, conduzida pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC) entre agosto e dezembro de 2019 para averiguar o uso das TICs em escolas públicas e particulares de ensino fundamental e médio no Brasil.

Gráfico 1 - Alunos de escolas urbanas, disponibilidade de computador no domicílio
Fonte:
CETIC (2020)

No gráfico, nota-se a discrepância entre estudantes de escolas públicas e privadas. Um total de 39% das/os estudantes de escolas públicas não possuem acesso a nenhum dispositivo como computador de mesa, portátil ou tablet, em contraposição a 9% que não têm acesso das escolas particulares. Tais aparelhos eram essenciais para que se conseguisse acompanhar as aulas remotas e, principalmente, realizar atividades, que em grande parte das vezes não podiam ser feitas com qualidade por meio do celular. Os dados também mostram que 35% das/os estudantes de escolas públicas têm acesso a um computador portátil em casa, enquanto 71% de estudantes de escolas particulares contam com esse aparelho. De toda forma, uma parcela considerável nos dois tipos de instituição não possui acesso aos aparelhos necessários para acessar às aulas com qualidade e participar de atividades avaliativas e provas.

Em outra pesquisa de abrangência nacional conduzida entre outubro de 2019 e março de 2020 pela CETIC, a chamada TIC Domicílio, foi constatado que 28% dos domicílios brasileiros não possuem acesso à internet e que 58% acessam apenas pelo celular. A pesquisa também mostra o contraste entre as classes econômicas quando se trata de acesso à internet. Em 2019, 50% dos domicílios de classes D e E tinham acesso à internet, enquanto 99%, 95% e 80% dos domicílios das classes A, B e C, respectivamente, tinham acesso, conforme se pode ver no gráfico abaixo.

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Gráfico 2 - Domicílios com acesso à Internet
Fonte:
CETIC (2020)

Esses obstáculos acentuam ainda mais as desigualdades nas instituições de ensino brasileiras. A exclusão digital, que já era uma realidade no Brasil, ficou muito mais evidente quando a única forma de acesso à educação se tornou virtual. Enquanto algumas crianças, adolescentes e adultos, no caso das instituições de ensino superior, tinham condições materiais para continuar seus estudos no ERE, outras não tinham acesso aos dispositivos e condições necessárias, ficando para trás e sendo excluídas do processo educativo. Sobre essa questão, o CNE, por meio do parecer Nº 5/2020, evidencia que a situação à época:

[...] leva a um desafio significativo para todas as instituições ou redes de ensino de educação básica e ensino superior do Brasil, em particular quanto à forma como o calendário escolar deverá ser reorganizado. É necessário considerar propostas que não aumentem a desigualdade ao mesmo tempo em que utilizem a oportunidade trazida por novas tecnologias digitais de informação e comunicação para criar formas de diminuição das desigualdades de aprendizado (Brasil, 2020, p. 3).

Tais dificuldades e obstáculos interferiram, portanto, nas escolhas pedagógicas das professoras e professores, que precisaram levar em consideração as realidades das/os estudantes para saber como conduzir as aulas e quais ferramentas seria possível utilizar. A utilização das TICs como forma de continuar o ano letivo de forma remota trouxe consigo, ao mesmo tempo, muitos desafios e muitas possibilidades que antes não eram tão exploradas. A próxima seção traz algumas reflexões acerca dos desafios para a avaliação nesse contexto.

Avaliação no ensino remoto emergencial: desafios

Como esperado, foram muitos os desafios encontrados para ensinar, avaliar e aprender no ERE. Nesta seção, são investigados alguns dos obstáculos encontrados nessa modalidade, considerando as reflexões feitas por pesquisadoras/es e professoras/es em publicações recentes. Também foram levadas em conta algumas publicações acerca da avaliação na modalidade EAD, que trazem importantes contribuições nesse sentido e que têm pontos em comum com o ERE.

Em uma pesquisa com professoras/es de uma escola pública de Londrina (PR), com o objetivo de investigar sua relação com as TICs, Colombo e Andrade (2020) observaram alguns aspectos negativos apontados pelos professores entrevistados, como:

Nos aspectos negativos 05 professores indicaram a distância e a falta de afetividade com os alunos como sendo o principal problema enfrentado. Isso reforça o entendimento de que o processo de ensino e aprendizagem demanda trocas entre alunos e professores, pois é um processo de interação, logo mesmo com estratégias a distância se torna um desafio a ser superado, uma vez que simplesmente digitalizar a sala de aula não se torna um caminho viável (Colombo; Andrade, 2020, p. 11).

A falta do contato presencial foi, com certeza, um dos maiores obstáculos enfrentados por todos na área da educação, tendo grande impacto no processo de ensino-aprendizagem. Isso também afeta o processo avaliativo em si, conforme apontado por Colombo e Andrade (2020) que relatam o fato de professores da mesma pesquisa demonstrarem essa preocupação:

Por fim, 02 professores declararam se preocupar com a certificação da aprendizagem dos alunos, pois pela falta de interação e/ou interesse, os mesmos não recebem um feedback adequado quanto às dúvidas pertinentes à aprendizagem dos alunos, ficando uma lacuna que possivelmente só será avaliada após algum período de tempo (Colombo; Andrade, 2020, p. 12).
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No ensino presencial, a avaliação é cercada de outros fatores que auxiliam o/a professor/a a identificar e solucionar dúvidas e na própria interação durante as aulas é possível certificar a aprendizagem. No ERE, entretanto, essa dinâmica sofre alterações que impactam a avaliação. Sgarbi et al (2012) destacam esse fator na modalidade EAD, que também define bem o que acontece no ERE:

Entendemos que a avaliação na EaD tem pontos fortes calcados na autonomia, autodidaxia, pesquisa e autoria, capacidades importantíssimas na formação de todo educando que deseje ser crítico e cônscio de seu papel. Mas não podemos ignorar o fato de que nessa modalidade de educação, o contato pessoal – professor/aluno –, a presença “face a face”, é bem menor ou, praticamente, inexistente, o que, fatalmente, dificulta, por exemplo, o professor conhecer ou observar mudanças comportamentais individuais no aluno, ações bastante importantes para o processo qualitativo de avaliação que almeje qualidade (Sgarbi et al, 2012, p. 1836).

Certamente, as/os estudantes também sentem que seu aprendizado é afetado por todas essas mudanças na transição do ensino presencial para o remoto. Sobre a perspectiva de estudantes, Chen, Wang e Yang (2020,apud Menezes et al, 2020, p. 998) afirmam que:

[...] os estudantes geralmente consideram que a aprendizagem efetiva não ocorre do mesmo modo que em sala de aula, embora os ambientes de ensino online sejam uma alternativa para não suspender completamente as aulas em escolas e universidades. Ainda, o atual modelo de ensino online é dirigido para complementar o conteúdo básico, sem considerar os reais efeitos sobre a aprendizagem dos estudantes. Alguns aspectos apontados são: objetivos das aulas online não serem suficientemente claros, lacunas na interação online, o interesse dos estudantes em aprender não é tão forte, dentre outros.

Outro ponto acerca da avaliação no ERE é o fato de as avaliações serem conduzidas de forma síncrona ou assíncrona. Xavier et al (2020) sugerem que as avaliações síncronas, em tempo real, sejam pensadas com cautela. Isso se deve ao fato de que “há questões tecnológicas que podem fugir do controle do estudante ou do professor, como questões de conectividade e instabilidade de transmissão, por exemplo” (XAVIER et al, 2020, p. 10). Sendo assim, as autoras ressaltam a importância de ofertar outras oportunidades para a aplicação e realização dessas avaliações síncronas, de modo que esses fatores sejam levados em conta.

Partindo dessa perspectiva, é necessário também levar em consideração os inúmeros fatores que podem influenciar o desempenho estudantil durante o ERE, uma vez que se trata de um contexto atípico. Dessa forma, Xavier et al (2020) trazem uma observação importante sobre a distribuição de notas no processo avaliativo no ERE, destacando que:

A adoção da recuperação processual da aprendizagem como parte da metodologia avaliativa oportuniza resgatar e reincluir o estudante no processo formativo, ao longo do desenvolvimento da disciplina. O inverso, ou seja, a preferência por uma metodologia que privilegia a prova final em detrimento à recuperação processual, pode se mostrar ineficiente nesse sentido do resgate do estudante, podendo, somente a prova final, ser um momento tardio para o estudante se recuperar. À vista desta concepção, não recomendamos a adoção da prova final como metodologia avaliativa para o ERE (Xavieret al, 2020, p. 11).

Ainda nessa lógica, o feedback é um ponto fundamental no ERE para estreitar a relação professor-aluno. Leffa (2003, p.26) afirma que um dos desafios do ensino a distância e, por extensão, do ERE, é tornar o professor presente, “garantindo ao aluno o desempenho assistido necessário para que ele possa realmente ser ajudado a atingir seu nível potencial de competência.” (Leffa, 2003, p. 26). O feedback é uma das formas de comunicação entre professor/a e estudante e que evita a sensação de ausência do/a professor/a (Flores, 2009, p.4).

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Essas foram algumas das limitações e dos desafios apontados sobre o ERE e que foram vivenciados e enfrentados por educadoras/es no momento da pandemia de COVID-19. Simultaneamente, foram criadas soluções para conduzir as aulas e avaliações nesse novo contexto, e que serão discutidas a seguir.

Avaliação no ensino remoto emergencial: possibilidades

Apesar de todos os obstáculos e desafios da implementação abrupta das TICs na educação durante a pandemia, é inegável que a tecnologia abriu um grande leque de possibilidades a serem exploradas no campo educacional, viabilizando soluções criativas para os problemas enfrentados. Atualmente, podem ser encontrados inúmeros recursos tecnológicos disponibilizados de forma gratuita na rede, como aplicativos, softwares para computador, jogos online, sites para hospedagem de vídeos, ambientes virtuais de aprendizagem, plataformas de videoconferência, sites de compartilhamento de diversos tipos de materiais, como apresentações de slides, apostilas, entre muitos outros. Os recursos são incontáveis, e muitas professoras e professores encontraram na internet o suporte para se reinventar na nova modalidade remota como experienciado pela nossa supervisora do CL.

Em relação à avaliação, não é diferente. Entre esses diversos recursos gratuitos, muitos oferecem funcionalidades direcionadas a avaliar, ou podem ser adaptados para esta finalidade. Nesta seção, são abordadas algumas das possibilidades apontadas por autoras/es para que se possa compreender quais são os caminhos possíveis para avaliar a aprendizagem durante o ERE.

Ferreira (2012) ressalta a importância da avaliação na EAD, que assume um papel diferente e central nessa modalidade se comparado à modalidade presencial. Por extensão, podemos dizer que a mesma lógica se aplica ao ERE. Segundo a autora:

A avaliação no ensino à distância tem um maior impacto nas relações entre o agente avaliador e o aluno do que nas situações vivenciadas no ensino presencial, uma vez que é peça central na e para a interação entre professor e aluno, baseando-se na elaboração de trabalhos escritos e no desenvolvimento de atividades e discussões que ficam registradas em papéis e/ou ambientes virtuais, podendo ser acessadas e analisadas a qualquer momento pelos agentes avaliadores (Ferreira, 2012, p. 2).

Ferreira observa que esse papel central da avaliação na modalidade EAD se dá pelo fato de que “os professores/tutores não têm os identificadores informais visuais e verbais dos alunos, ou seja, não conta com a análise do comportamento dos alunos, com o diálogo e com as atitudes que podem ser observadas pelo professor.” (FERREIRA, 2012, P. 2). Sendo assim, a avaliação se torna um recurso ainda mais essencial de interação e de acompanhamento da aprendizagem das/os estudantes, onde o/a professor/a tem a chance de ter um contato mais individualizado e próximo com cada um, estabelecendo diálogos.

Em uma publicação elaborada para nortear a implementação do ERE na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Garcia et al. (2020) apontam como sendo uma das competências do/a professor/a no ERE a “definição, informação e esclarecimentos aos alunos quanto às formas e métodos de acompanhamento da aprendizagem.” (Garcia et al., 2020, p. 7). No ERE, portanto, assim como na modalidade presencial, é essencial que estejam claras para a turma a forma com que serão avaliados. As autoras defendem, também, que a avaliação abarque dois aspectos: a avaliação em processo, que se trataria do “acompanhamento do progresso do aluno durante a etapa de apresentação do tema e seus conteúdos” (Garcia et al., 2020, p. 7); e a avaliação de resultado, que diz respeito à “verificação da aprendizagem ao final da apresentação do tema ou da unidade de estudo” (Garcia et al., 2020, p. 7).

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Para a avaliação em processo, as autoras sugerem a aplicação de estratégias avaliativas que o/a professor/a já conheça, bem como o monitoramento de acesso das/os estudantes à plataforma de aprendizagem, participação e cumprimento de prazos. Para a avaliação de resultado, é recomendada a utilização de instrumentos de avaliação individuais e em grupo, apresentações de trabalhos e discussões em chats e fóruns. A respeito da avaliação em processo, as autoras ressaltam que “o professor pode decidir se esse acompanhamento será utilizado como estratégias de avaliação [aferição de notas] ou somente de acompanhamento e, nesse caso, deve buscar fortalecer a motivação e o interesse.” (Garcia et al., 2020, p. 14). Como meio de aplicação das ferramentas avaliativas, são apontadas como opção os aplicativos do Google e plataformas como o Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (SIGAA), que é um “sistema de informação web corporativo que informatiza os procedimentos da área acadêmica” (Barroca Filho et al., 2013, p. 93), utilizado em diversas universidades brasileiras.

A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) também elaborou, em 2020, um documento intitulado Ensino Remoto Emergencial dos Cursos de Graduação da UFMG, com direcionamentos para as atividades remotas em que constam orientações acerca da realização de avaliações. Nas diretrizes do documento, orientou-se a adoção de uma concepção formativa de avaliação. Xavier (1998/1999 apud Zocaratto et al., 2008, p. 48) afirma que:

[...] uma das principais funções da avaliação formativa é a realização de diagnósticos. Segundo a autora, tem-se como ponto de partida a observação sistemática do professor, que faz uma análise das informações coletadas para, então, elaborar o diagnóstico. Caso não seja identificado nenhum problema, a ação pedagógica prossegue, no entanto, se esse diagnóstico não for positivo, o professor, por meio da reflexão, procura estratégias que possam preencher as lacunas encontradas ou solucionar as dificuldades emergentes.

O documento também apontava para a necessidade de avaliar de formas diversificadas e priorizando avaliações assíncronas (UFMG, 2020, p. 9), isto é, que poderiam ser realizadas pela/o estudante sem horário específico. Foram listadas diversas alternativas e exemplos de avaliações que seriam viáveis para o contexto do ERE, com algumas orientações acerca de adaptações e ferramentas tecnológicas necessárias. Entre elas, prova escrita e oral; portfólio; mapa conceitual e mental; fórum; trabalhos (resumo, resenha, fichamento, ensaio, estudo dirigido, estudo de caso, elaboração de vídeo e podcast); quiz; wiki; discussão; mural; e apresentação (seminário, artigo e trabalho) (UFMG, 2020, p. 15-17).

Para a prova escrita e prova oral, foram feitas considerações sobre a possível comunicação entre as/os estudantes e, para prevenir esse tipo de situação, foi recomendado no documento que o/a professor/a elaborasse banco de dados de questões, de modo a evitar provas com questões iguais (UFMG, 2020, p. 15). Como ferramentas de apoio para realização dessas provas, foi sugerido a plataforma de videoconferência Teams da Microsoft e o Moodle, que é uma ferramenta definida da seguinte forma:

O Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment (MOODLE) ou Ambiente Modular de Aprendizagem Dinâmica Orientada a Objetos, é um sistema web voltado para o ensino e aprendizagem criado por Martin Dougiamas, cientista da computação e Pedagogo, no início dos anos 90 (Carlini; Tarcia, 2010, apud Conceição; Rocha, 2020, p. 103).
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Alguns dos demais instrumentos avaliativos sugeridos no documento e citados acima, como por exemplo portfólio, fórum, trabalhos, wiki, discussão e apresentação, não acompanhavam orientações específicas acerca de adaptações, uma vez que poderiam ser realizadas em programas editores de texto, slides, e as sugeridas plataformasMoodle e Teams, que possuem alternativas similares na rede. Outros instrumentos avaliativos sugeridos exigem ferramentas tecnológicas específicas, como por exemplo: mapa conceitual/mental, que pode ser realizado através das ferramentas Cmaptools, MindMeister e GetMind; quiz, realizado através do Mentimeter, Socrative, Quizlet ou Kahoot; e mural, realizado através do Padlet (UFMG, 2020, p. 15-17).

De forma semelhante, a Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG) também designou, em documento elaborado como guia para a avaliação no ERE, a avaliação formativa como sendo adequada “pois ocorre ao longo da formação do estudante, durante todo o período de estudos, valorizando o processo de aprendizagem em seus distintos momentos e fases.” (Xavier et al, 2020, p. 3). Nesse sentido, as autoras também ressaltam, citando Sordi (2012), que

a avaliação deve colocar-se a serviço das aprendizagens, num processo de produção de sentidos, auxiliando tanto professor, quanto estudantes, orientando-os formativamente a reverem avanços e vulnerabilidades e a construírem possibilidades de superação (Sordi, 2012, apud Xavier et al, 2020, p. 3).

Neste documento, Xavier et al. (2020) aponta que as avaliações sejam diversificadas, como alternativa à tradicional distribuição de notas entre duas provas que, somadas e divididas por 2, resultam na média final. Algumas das alternativas de avaliações propostas eram: portfólio; estudo de caso; questões avaliativas abertas; avaliação oral síncrona; avaliação oral por podcasts; projetos; questionários online; listas de exercício; resumos, resenhas, relatórios ou artigos; avaliação por construção colaborativa; fóruns e quizzes; seminários online; e autoavaliação individual e entre pares (Xavier et al., 2020, p. 6-9). Como forma de atender as especificidades da modalidade remota nessas avaliações, Xavier et al. faz sugestões como a inclusão de explicações discursivas em questões de questionários, explicações sobre a resolução de listas de exercícios, inclusão de relatos de experiência em resumos, resenhas ou relatórios, por exemplo (Xavier et al., 2020, p. 6-9).

Em uma publicação da nossa Universidade Federal de Goiás (UFG) que estabelece diretrizes gerais para o ERE na instituição, Sá et al. (2020) trazem orientações acerca do processo avaliativo. Os autores propõem que, como em outros contextos, a avaliação deve ser feita de forma contínua, de modo que haja um acompanhamento do processo de aprendizagem das/os estudantes. Eles também destacam a importância de explicitar, no plano de ensino, as estratégias e atividades que terão cunho avaliativo. Outro ponto levantado na publicação é que seria interessante se atentar ao fato de que possíveis problemas, como quedas de energia e conexão, podem dificultar avaliações síncronas e, por isso, devem ser associadas a atividades assíncronas ou offline.

Através dessas reflexões, é possível observar que o ERE e as inovações necessárias com a utilização das TICs trazem algumas potencialidades para o processo educativo. Com o suporte de certas ferramentas, é possível conduzir o processo avaliativo de forma remota. Na já mencionada pesquisa que analisa a relação de professores com as TICs, Colombo e Andrade (2020) identificaram os seguintes aspectos positivos apontados pelos professores entrevistados:

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Um dos aspectos mais recorrentes é o de utilizar novos métodos para o trabalho com os alunos de maneira remota, uma vez que o professor teve de adaptar sua maneira de trabalho para o formato on-line, tanto nas modalidades síncronas quanto assíncronas. A ampliação emergencial do ensino remoto demandou de professores conhecer e utilizar novos softwares, tanto para a interação, quanto para trabalhar os conteúdos, por isso 03 professores levantaram o aspecto de utilizar novos dispositivos e programas, além de um indicar as novas possibilidades que o formato proporciona (Colombo; Andrade, 2020, p. 11).

Além disso, outro aspecto positivo na avaliação em EAD destacado por Sgarbi (2012), que também se aplica ao ERE, é que:

[...] a relação professor/aluno é menos hierarquizada, pois a interação via mensagens eletrônicas não causa inibição; o aluno sente-se mais “à vontade” para comunicar-se, já que os símbolos socioculturais subjetivos não afloram, como na educação presencial. Esse fato não anula o distanciamento espacial que existe entre ambos, mas auxilia muito para que se de uma educação mais democrática (Sgarbi et al, 2012, p. 1836).

Concluímos esta seção reafirmando a importância de se adaptar os métodos de avaliação para refletir as condições variadas dos alunos, levando em consideração suas realidades, acesso à tecnologia e ambiente de aprendizagem. Além disso, é essencial oferecer alternativas acessíveis e flexíveis para a realização das avaliações, com diferentes formatos de provas, projetos, trabalhos individuais ou em grupo, bem como a utilização de recursos digitais para que os alunos demonstrem seu aprendizado de maneiras diversas, levando em conta suas habilidades e circunstâncias individuais.

Considerações finais

Neste trabalho, foram analisados algumas publicações feitas ao longo do ano de 2020, após a suspensão das aulas presenciais e implementação do ERE, bem como artigos sobre a avaliação na modalidade EAD, a fim de identificar não só os desafios e problemas enfrentados, mas também as potencialidades e alternativas possíveis para o processo avaliativo no ERE. Verificou-se que foram muitas as alternativas e que, além de ser viável adaptar algumas ferramentas já comumente utilizadas no ensino presencial, também é possível e desejável explorar outros instrumentos avaliativos proporcionados pela tecnologia.

Foi possível identificar alguns pontos em comum entre as publicações pesquisadas, como a menção à avaliação formativa e a sugestão desta como sendo adequada ao ERE, por permitir a valorização do percurso da/o estudante. Uma abordagem formativa da avaliação se mostra adequada por considerar-se que a aprendizagem não ocorre de forma linear e é preciso utilizar recursos que permitam que as/os estudantes tenham a oportunidade de aprimorar seus saberes nesse processo, através do feedback fornecido pelo/a professor/a e pelos instrumentos de avaliação. A respeito disso, Fidalgo (2006, p. 22) explica que “em avaliação formativa, definida como aquela que está a serviço da regulação da aprendizagem (Perrenoud, 1999; BONNIOL, 1989) e que está diretamente ligada à ideia de revisão, re-elaboração (Scriven, 1967), não caberia uma concepção linear de aprendizagem [...]”.

Através da experiência como primeira autora deste capítulo e docente no CL durante esse período de ERE, pude perceber que algumas dessas formas de avaliação sugeridas nas publicações pesquisadas se mostraram bastante eficientes para essa modalidade, como a autoavaliação, que permite que a/o estudante reconheça a importância do seu papel no processo de ensino- aprendizagem; os quizzes que, quando feitos durante as aulas, se mostram como uma excelente ferramenta para que possamos observar quais conteúdos precisam ser reforçados; construções colaborativas utilizando ferramentas onde é possível a edição simultânea de arquivos, o que trabalha habilidades como a interpretação de texto, colaboratividade e comunicação entre pares.

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É preciso reconhecer que ainda há muitos desafios e dificuldades nas práticas avaliativas, não só no ERE como no ensino presencial, uma vez que as provas tradicionais continuam tendo papel central no processo avaliativo na maioria das salas de aula. Este trabalho buscou pesquisar e apresentar algumas alternativas que puderam ser aplicadas não só no período de aulas remotas, mas também no período pós-pandemia, pois só se tem a ganhar com a diversificação de atividades no processo avaliativo. Durante esse período, também houve uma notável atmosfera de colaboração entre professores/as, como no nosso grupo de interações do WhatsApp, com o objetivo comum de se reinventar e buscar soluções criativas, algo que certamente terá impactos positivos no cenário educacional futuro. A partir disso, poderemos caminhar para que sejam difundidas as práticas avaliativas que valorizem o processo de aprendizagem das alunas e alunos, e que a avaliação deixe de ser vista como apenas um procedimento que visa a atribuição e a obtenção de nota.

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Notas

1. Graduada em Letras-Inglês pela Universidade Federal de Goiás.

2. Doutora em Linguística Aplicada pela Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Linguística Aplicada pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora de língua inglesa, estágio e Tecnologias Aplicadas ao Ensino de Línguas da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás.

3. No ensino, feedback refere-se a comentários ou outras informações que os alunos recebem sobre seu sucesso em tarefas de aprendizagem ou testes, seja do professor ou de outras pessoas. (Richards, J.; Platt, J.; Weber, H. Longman Dictionary of Applied Linguistics. Hong Kong: Longman, 1987, p. 199).