VOLTAR À COLEÇÃO ISBN: 978-65-997623-7-6
Volume 3

Experiências Críticas de Ensino na Educação Básica:

Educação Sexual, Questões Étnico-raciais, Inclusivas e Ambientais

Educação Básica, Educação Profissional e Educação Inclusiva: do Direito à Educação, ao Trabalho e à Cidadania

AUTORES
Fabiana Fernandes Harami
Elisabeth Cristina de Faria
Marcos Antonio Gonçalves Júnior
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“A educação visa o homem;
Na verdade, que sentido terá a educação se ela não estiver
voltada para a promoção do homem?”
SAVIANI (1993, p.51)

1. Introdução

Este ensaio tem como proposta apresentar um estudo que relaciona a educação profissional com a educação inclusiva na perspectiva de formação na educação básica. Entendemos que essa modalidade de ensino seja essencial, a fim de se levantarem questionamentos acerca da importância de se refletir, teoricamente as questões que perpassam a formação profissional de pessoas com deficiência.

Caracterizamos o cenário da educação profissional, sua origem, seu público, finalidade, bem como os desdobramentos para o sistema educacional, destacando os elementos que aproximam a educação profissional da educação inclusiva. Assim sendo, apresentamos os aspectos legais e discutimos a necessidade de integração das pessoas com deficiência. Com esse olhar, baseamo-nos em autores que discutem a educação profissional na perspectiva da inclusão, dialogando com autores, como: Cordão e Moraes (2020), Mantoan (2015), Orrú (2017), Saviani (1993) Freire (2020) e outros, juntamente com a legislação voltada à educação inclusiva e aos direitos da pessoa com deficiência.

Ao leitor, faz-se necessário esclarecer que este artigo é parte das discussões tecidas no trabalho de pesquisas que abordam as relações entre educação, trabalho e cidadania como aspectos básicos do homem. Tais reflexões levam-nos a investigar esses pilares como parte dos pressupostos de formação dos professores que trabalham com a educação profissional em seus ambientes de ensino. E, nesse cenário, buscam entender como eles desenvolvem suas práticas com os alunos com deficiências.

2. Relação entre educação e aspectos da inclusão no decorrer da história

A educação profissional é uma modalidade educacional prevista na LDB, como destaca o artigo 39: “A educação profissional e tecnológica, no cumprimento dos objetivos da educação nacional, integra-se aos diferentes níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia” (BRASIL, 1996). Portanto, esta é uma modalidade de educação básica que deve estar de acordo com o previsto na Constituição Federal de 1988, na qual se garante o direito à educação a todos os brasileiros.

Um representante dessa integração entre educação, trabalho e inclusão é Paulo Freire. Esse autor iniciou sua experiência com a educação de adultos na educação profissional no período entre 1947 e 1954, quando trabalhou no Serviço Social da Indústria (SESI) como diretor do setor de educação e cultura; posteriormente, assumiu também a superintendente da instituição de 1954 a 1957. Além dessa vivência, Freire tem uma visão de educação inclusiva. Nessa modalidade de ensino, a educação é vista como direito: “Mas, se dizer a palavra verdadeira, que é trabalho, que é práxis, é transformar o mundo, dizer a palavra não é privilégio de alguns homens, mas direito de todos os homens” (FREIRE, 1987, p. 77).

Para contribuir com essa discussão a respeito das relações de educação e trabalho, Saviani entende que o trabalho é mais do que mera atividade de produção ou fonte de subsistência: “Diferentemente dos outros animais, que se adaptam à realidade natural tendo a sua existência garantida naturalmente, o homem necessita produzir continuamente sua própria existência. [...] E isto é feito pelo trabalho” (SAVIANI, 2008, p.11).

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Geralmente, o início da educação brasileira está associado à chegada dos Jesuítas no Brasil. Porém, como citado por Cordão e Moraes (2020), devemos lembrar que, quando os portugueses chegaram ao Brasil em 1500, três a cinco milhões de indígenas habitavam o território brasileiro. Todavia, após o contato com os brancos, a maioria foi extinta ou perdeu sua identidade cultural. Segundo os autores,

Normalmente são esquecidos ou omitidos em quase todas as abordagens sobre educação e trabalho e sobre a cultura brasileira, como se a vida nessas terras tivesse tido início com a chegada dos portugueses. Essa invisibilidade dos povos indígenas brasileiros é fruto da forma preconceituosa como esses primeiros habitantes da terra foram tratados por nossos colonizadores (CORDÃO e MORAES, 2020, p. 18).

Vale destacar que essa invisibilidade não atinge exclusivamente os povos originários que lutam com persistência contra o preconceito, reconhecimento e demarcação de suas terras. Infelizmente, outras parcelas da população também foram invisibilizadas ou segregadas, ao longo da história da educação brasileira, assim como as pessoas com deficiência, os negros, os pobres, entre outros.

De acordo com Arroyo (2012), esses outros sujeitos sociais se fazem presentes em ações coletivas e trazem consigo experiências sociais, políticas de resistência e identidades. Ademais, chegam às escolas trazendo outras indagações para o pensar e o fazer pedagógicos.

São eles, os novos/velhos atores sociais em cena. Estavam em cena, mas se mostram como atores em público, com maior ou novo destaque. Seu perfil é diverso, trabalhadores, camponeses, mulheres, negros, povos indígenas, jovens, sem teto, sem creche... Sujeitos coletivos históricos se mexendo, incomodando, resistindo. Em movimento. Articulados em lutas comuns ou tão próximas por reforma agrária, urbana, educativa. Por trabalho, salários, carreira. Por outro projeto de campo, de sociedade (ARROYO, 2012, p. 26).

Retomando o processo de colonização do país, com o objetivo de catequização, isto é, converter a alma dos indígenas ao cristianismo, o governo português, em parceria com a igreja católica, estrutura a educação brasileira a partir de 1549. Nesse período havia um ensino diferenciado; enquanto os índios estudavam em escolas improvisadas nas missões e recebiam apenas instruções de cunho religioso, os filhos dos colonos e descendentes europeus recebiam um ensino elitizado, com acesso a outras matérias voltadas para letras. Desse modo, a educação brasileira, desde a sua concepção, é marcada pela segregação de classes sociais. Além disso, outra característica marcante do período colonial é o fato de ser voltada apenas para os homens; as mulheres eram educadas para a vida doméstica e religiosa. Para Foucault, tais medidas são utilizadas para estabelecer relações de poder, em que a escola funciona como o lugar capaz de articular íntima e eficientemente o saber com o referido poder (apud VEIGA-NETO, 2006, p. 28).

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Em 1772, ocorre a reforma Pombalina, um marco no sistema de ensino brasileiro. Após a expulsão dos Jesuítas, são instituídas as aulas régias com o intuito de agregar outras disciplinas e destituir o caráter religioso. As aulas são ministradas por docentes concursados e funcionários do Estado, constituindo a primeira tentativa de ensino público no país. Eram realizadas na casa dos próprios professores, sendo este um período em que muitas crianças ficaram sem acesso à escola. A faixa etária atendida era a partir dos sete anos, mas não existia limite no tempo de estudo, tampouco sistematização do ensino. Em 1808, com a chegada da família real, a educação brasileira foi impulsionada, dando origem às primeiras escolas de educação superior do país. Porém, somente em 1827, foi sancionada a primeira lei brasileira que tratava exclusivamente da educação. Ela determinava que deveria haver escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos.

Inicialmente o ensino superior no Brasil, assim como na Europa, era privilégio das pessoas com poder aquisitivo, enquanto os menos favorecidos eram destinados aos colégios estaduais, com estrutura precária e professores com pouca qualificação. Enquanto as universidades preparavam os profissionais das classes dirigentes, a classe trabalhadora, que constituía as linhas de produção, deveria se aprimorar no fazer.

Nesse contexto, a Educação Profissional é consolidada com a Revolução Industrial do século XVIII: “aparece pela primeira vez descrito o quadro de ocupações da época – e o que se deveria estudar para exercê-las” (MACHADO, 2000, p.13). Partia-se do pressuposto de que escola profissionalizante fosse a única alternativa para a profissionalização, sem a possibilidade de direitos a uma educação como a da elite.

Na década de 1920, chega ao Brasil o movimento da Escola Nova, tendo por objetivo uma educação mais inclusiva e moderna, representado no Brasil por nomes como Anísio Teixeira. No entanto, foi com o golpe militar de 1930, durante o governo de Getúlio Vargas, que surgiram as primeiras tentativas de um sistema organizado de ensino. Nesse período foram criados o Ministério da Educação e as secretarias estaduais de educação, consolidando-se a Educação Profissional no país.

3. Inclusão escolar no cenário educacional

Nos últimos anos, a inclusão escolar tem ganhado espaço no cenário educacional, seja no debate sobre os direitos sociais, seja nas pesquisas. Cabe realçar ainda a formulação de políticas voltadas à prática da legislação que regulamenta e visa a efetivar essa modalidade de ensino. Afinal, o que é educação inclusiva?

De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, “O movimento mundial pela educação inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os estudantes de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação” (BRASIL, 2014).

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Conforme Mantoan (Prefácio. In: ORRÚ, 2017, p.9), “para entender o que é e como incluir, temos de nos desfazer do que nos fez excluir, sem ou com a intenção de fazê-lo”. Para compreender a inclusão, fazem-se necessários movimentos, tais como: refletir sobre a nossa atuação profissional como educadores e gestores; repensar nossos hábitos e atitudes para não generalizar; tratar todos da mesma maneira, sem considerar as particularidades, limitações e os ritmos de aprendizagem de cada aluno, sejam estes, pessoas com deficiência ou não. Afinal, cada indivíduo é único. Desse modo, o conceito de inclusão vai além do atendimento aos alunos com deficiências, mas se estende a todos os indivíduos no processo educacional.

Retomando o histórico da educação no Brasil, tem-se que, desde os primórdios, a escolarização foi privilégio de alguns, contribuindo com o surgimento das lutas das pessoas com deficiências, bem como de seus pais e/ou responsáveis. Tais iniciativas visavam à inserção dessas pessoas no mundo do trabalho que também é local de inclusão. O acesso à escola era regulamentado a partir da classe social dos alunos; a educação superior era privilégio da elite enquanto a educação profissional era destinada aos menos favorecidos. Por muitos anos esta foi vista sob a perspectiva assistencialista e filantrópica. Atualmente a educação profissional está cada vez mais comprometida com o desenvolvimento de competências profissionais para a laborabilidade.

A realidade nacional agora é outra. Embora ainda existam ranços da história de dualidade entre o campo da educação geral e o campo da educação profissional, atualmente o conceito assistencialista associado à educação profissional está sendo cada vez mais superado. Nos dias atuais, a educação profissional é vista muito mais corretamente inserida na agenda do desenvolvimento socioeconômico e nos ‘objetivos da educação nacional’ integrada ‘aos diferentes níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia’” (LDB, art. 39), muito mais como direito público subjetivo do que na agenda policial e assistencial (CORDÃO e MORAES, 2020, p. 125)

Contudo, ainda existem aspectos relevantes a serem superados, pois, com a democratização da escola a exclusão permaneceu sob outras formas, sendo excluídos todos aqueles considerados fora dos padrões homogeneizadores da escola. Nesse grupo dos excluídos estão as pessoas com deficiências físicas, transtornos mentais, altas habilidades, autistas e outros.

Nesse contexto caracterizado pelas diferenças, hierarquização e desigualdades, surge a educação especial, com a seguinte finalidade:

A educação especial se organizou tradicionalmente como atendimento educacional especializado substitutivo ao ensino comum, evidenciando diferentes compreensões, terminologias e modalidades que levaram à criação de instituições especializadas, escolas especiais e classes especiais. Essa organização, fundamentada no conceito de normalidade/anormalidade, determina formas de atendimentos clínico-terapêuticos fortemente ancoradas nos testes psicométricos que, por meio de diagnósticos, definem as práticas escolares para os estudantes com deficiência (BRASIL, 2014).

4. Educação profissional inclusiva

Referindo-se à inclusão na educação profissional, além da Constituição Federal e do estatuto da pessoa com deficiência, lei n.º 13146, de 6 de julho de 2015, podemos considerar a lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991. Esta é conhecida como lei de Cotas, a qual constitui um incentivo a mais para a profissionalização de pessoas com deficiência ao estabelecer, entre outros critérios, cotas para contratação de pessoas com deficiência nas empresas. Como descreve o artigo 93 (BRASIL, 1991):

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Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:
I até 200 empregados..........................................................2%;
II - de 201 a 500..........................................................3%;
III de 501 a 1.000..........................................................4%;
IV - de 1.001 em diante...........................................................5%.

Além disso, as pessoas com deficiência têm o direito constitucional de reserva de cargos e empregos em concursos públicos. Esta é uma medida de ação afirmativa para se atingir a igualdade de oportunidades das pessoas com deficiência.

O Art. 37, da Constituição da República, dispõe que os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei (inciso I), sendo que a investidura nos mesmos depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (inciso II). Mais adiante determina que a lei reservará percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de admissão (inciso VIII). (GUGEL in GUGEL, COSTA FILHO e RIBEIRO, 2007, p. 212).

Temos o respaldo das políticas educacionais, bem como o incentivo garantido pela lei de cotas que prevê esse percentual de vagas para a contratação de pessoas com deficiência. Porém, apesar desse amparo nos termos da legislação, na prática ainda há muito a ser feito. Faz-se indispensável garantir que esse público tenha acesso à educação profissional e venha a ter as mesmas condições de empregabilidade que qualquer outra pessoa.

Neste sentido, de um lado a classe empresarial proporciona a integração do PcD, considerando a obrigatoriedade decorrente da legislação vigente, por outro, há pessoas com deficiência que buscam na Educação Profissional o caminho para assumir a cidadania e efetivar a sua inclusão social. Essas pessoas desejam, simplesmente, concorrer a vagas de trabalho em condição de igualdade com outros candidatos, sem serem inferiorizadas ou discriminadas pelo fato de possuírem restrição física. Um profissional qualificado, independentemente de ter ou não determinada deficiência, possui condições de desempenhar as funções requeridas pela profissão.

A realidade é que existe um número expressivo de pessoas com deficiência no Brasil que necessitam de acesso e condições de permanência no sistema de ensino. Esse número não pode ser simplesmente ignorado. Sobre esse aspecto, Manica e Caliman (2015) assim ressaltam: “a pessoa com deficiência (PcD) sempre existiu e sempre existirá. Jamais poderemos viver em um mundo que tenha 100% de pessoas sem nenhum tipo de deficiência. Elas farão parte da sociedade, da cultura de um país, ou seja, sempre estarão no mundo”.

Lorenzo e Silva (2017), em pesquisa realizada no interior paulista sobre a Contratação de Pessoas com Deficiência nas Empresas na Perspectiva dos Profissionais de Recursos Humanos, destacam que:

Para algumas empresas a questão da baixa escolarização está relacionada à pessoa ou às características da deficiência, e em nenhum momento foram ponderados os obstáculos oriundos das próprias metodologias de ensino, as quais podem dificultar esse processo educacional, entre tantos outros que ocorrem dentro e fora das escolas, mas que são externos ao indivíduo (LORENZO e SILVA, 2017, p. 13).
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Essas informações trazidas por Lorenzo e Silva (2017) reforçam a importância de discutir os elementos vinculados ao preconceito em contratar PcD. Estes refletem uma deficiência na estrutura de formação desse aluno e não nas limitações decorrentes de sua própria deficiência. Desses elementos constam as metodologias, o preparo dos professores e as condições de ensino ofertadas pelas Instituições.

Logo, ao abordar a inclusão na Educação Profissional, faz-se necessário discutir as relações entre inclusão, educação e trabalho. Mais precisamente, situações, como: as condições de acesso e permanência dos alunos com deficiência nos cursos de formação profissional; o preparo pedagógico dos professores para receber e contribuir com o desenvolvimento e aprendizagem desses alunos; os recursos disponibilizados pelas instituições de ensino e, ainda, a visão das empresas ao contratar PcD.

Na temática da formação acadêmica e profissional da pessoa com deficiência, distingue-se a terminalidade específica que, segundo o artigo 16 das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução n° 2, de 11 de setembro de 2001, consiste em

Viabilizar ao aluno com grave deficiência mental ou múltipla, que não apresentar resultados de escolarização previstos no Inciso I do Artigo 32 da mesma Lei, terminalidade específica do ensino fundamental, por meio da certificação de conclusão de escolaridade, com histórico escolar que apresente, de forma descritiva, as competências desenvolvidas pelo educando, bem como o encaminhamento devido para a educação de jovens e adultos e para a educação profissional (BRASIL, Resolução nº 2/2001).

A terminalidade específica deve seguir as mesmas etapas de qualquer processo educacional, segundo as estratégias e orientações para a educação de alunos com dificuldades acentuadas de aprendizagem associadas às condutas típicas (BRASIL, 2002, p. 43).

Sob o Parecer CNE/CEB nº 17/2001, a necessidade de fornecer apoio, ajuda e adaptações curriculares significativas, “não deve significar uma escolarização sem horizonte definido, seja em termos de tempo ou em termos de competências e habilidades desenvolvidas”. Assim sendo, é responsabilidade dos respectivos sistemas de ensino normatizar a idade-limite para a conclusão do ensino fundamental.

Logo, a utilização da terminalidade específica permite avaliar o aluno de acordo com suas competências, respeitando-se suas limitações e proporcionando condição de equidade, como se segue:

A consciência do direito de constituir uma identidade própria e do reconhecimento da identidade do outro traduz-se no direito à igualdade e no respeito às diferenças, assegurando oportunidades diferenciadas (equidade), tantas quantas forem necessárias, com vistas à busca da igualdade. O princípio da equidade reconhece a diferença e a necessidade de haver condições diferenciadas para o processo educacional (BRASIL, Parecer nº 17/2001).

Em conformidade com o Parecer CNE/CEB nº 2/2013, consulta sobre a possibilidade de aplicação de “terminalidade específica” nos cursos técnicos integrados ao Ensino Médio no Instituto Federal do Espírito Santo (IFES), assim reitera:

A ‘terminalidade específica’, além de se constituir como um importante recurso de flexibilização curricular, possibilita à escola o registro e o reconhecimento de trajetórias escolares que ocorrem de forma específica e diferenciada. Nesse sentido, entre uma ação negligente, porque também sem critérios para tal, julga que é possível estabelecer parâmetros e objetivos que são exequíveis e passíveis de serem alterados sempre que necessário. Entendem os requerentes que é perfeitamente possível, viável e oportuno permitir ao aluno avançar ao máximo em seu processo educacional e, ao longo de sua trajetória educacional, ir estabelecendo novas perspectivas de itinerários formativos (BRASIL, Parecer nº 2/2013).
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Entretanto, na prática ainda existem dificuldades para se aplicar a terminalidade específica, como: omissão por parte das comunidades escolares e inúmeros conceitos assistencialistas e caritativos, segundo as estratégias e orientações para a educação de alunos com dificuldades acentuadas de aprendizagem associadas às condutas típicas (BRASIL, 2002):

A família, a Comunidade Escolar e o Poder Público devem superar esses sentimentos que estão resultando numa conivência coletiva de encobrir a necessidade daqueles que, seja por suas limitações, seja pela inexistência de educação para algum tipo de atividade produtiva, estão sem um espaço que atenda suas necessidades ocupacionais socializantes, assim como atrasam o acesso a alternativas educacionais de caráter profissionalizantes (BRASIL, 2002, p. 44).

A terminalidade específica é um recurso disponível a todos os estudantes com grave deficiência mental ou múltipla. Deve ser realizada em concordância ao previsto nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, seguindo os aspectos citados anteriormente. A certificação obtida a partir da terminalidade específica tem por objetivo o encaminhamento dos alunos para os cursos da educação de jovens e adultos, educação profissional e inserção no mundo do trabalho.

Logo, a educação profissional, como parte integrante da educação básica, deve garantir o acesso de todos, como prevê a Constituição Federal de 1988. Compete, igualmente, considerar a lei de cotas ao prever que toda empresa destine um percentual de suas vagas para contratação de pessoas com deficiências, a reserva de vagas em concursos públicos estabelecida pelo artigo 37 da Constituição Federal e ainda o estatuto da pessoa com deficiência (2015) que visa assegurar, entre outros, os direitos referentes à educação, à profissionalização e ao trabalho.

5. Considerações finais

Discutir a educação inclusiva, independentemente da modalidade de ensino, é resgatar questões que remetem à origem da educação brasileira como um todo. Tal qual apresentado neste ensaio, desde os primórdios da educação básica, esta se caracterizou por segregações. Entretanto, a inclusão escolar vai além de oferecer acesso à educação. É necessário proporcionar condições de permanência e contribuir para a formação integral desses alunos, caso contrário, será apenas uma integração.

Esperamos que este texto contribua para sensibilizar quanto à importância da inclusão e a urgente necessidade de sua adequação, em todos os segmentos da educação básica, inclusive na educação profissional. Acreditamos que a educação inclusiva possibilita aos alunos com deficiência: a garantia de que seus direitos sejam respeitados, o acesso aos cursos de formação profissional, e um ensino de qualidade que lhes possibilite a inserção no mercado de trabalho e possam, enfim, exercer uma profissão com dignidade.

6. Referências

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BRASIL. Parecer CNE/CEB Nº 2, de 31 de janeiro de 2013. Consulta sobre a possibilidade de aplicação de “terminalidade especifica” nos cursos técnicos integrados ao Ensino Médio. Interessado: Instituto Federal do Espírito Santo (IFES). Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica, Brasília, DF, 2013.

BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de 2001. Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica, Brasília, DF, 2001.

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