VOLTAR À COLEÇÃO ISBN: 978-65-997623-7-6
Volume 3

Experiências Críticas de Ensino na Educação Básica:

Educação Sexual, Questões Étnico-raciais, Inclusivas e Ambientais

Orientações para professores da Educação Infantil no Combate à Violência Sexual Contra Crianças: levantamento e análise documental de cadernos pedagógicos, cartilhas e guias formativos

AUTORAS
Kellen Jéssika Stalschus
Anna Maria Dias Vreeswijk
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1. Introdução

Este trabalho é parte da dissertação de mestrado desenvolvida, entre os anos de 2019 a 2021, no Mestrado Profissional em Ensino na Educação Básica do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do CEPAE/UFG, intitulada Educação Infantil Frente à Violência Sexual de crianças: um guia formativo para professores.

O objetivo principal desta pesquisa de mestrado profissional em ensino foi a construção, como produto educacional, de um guia formativo para professores/as que atuam na educação infantil e lidam na escola com a problemática da violência sexual na infância. Contatou-se, então, a necessidade de coletar e analisar o material formativo existente em relação a essa temática, para que o produto educacional pudesse ser pensado de modo a se distinguir do material disponível. Consideramos oportuna a apresentação desta análise documental no presente artigo.

O desenvolvimento da pesquisa orientou-se pela problemática dos/as professores/as de educação infantil em razão das ocorrências de violência sexual contra crianças, bem como as possibilidades de enfrentamento e prevenção nas instituições de ensino. Como os/as professores/as de Educação Infantil podem lidar com a problemática da violência sexual cometida contra as crianças? Teve-se por objetivo ampliar o debate sobre a importância do preparo do(a) professor(a) de educação infantil para lidar com o enfrentamento e a prevenção da violência sexual na infância, atuando na instrução e denúncia e nas diversas nuances de prevenção.

Os principais referenciais teóricos desta pesquisa são as questões epidemiológicas em relação à violência sexual infantil, elaboradas por Saffioti (2004) e também por Azevedo e Guerra (1989).

A violência sexual cometida contra crianças constitui-se de maneira histórica ao longo dos tempos e se perpetua na sociedade capitalista vigente. Sob a perspectiva marxista e feminista, Saffioti (2004) contextualiza o capitalismo, as relações de gênero e de classe, o racismo, as relações de poder e as relações adultocêntricas da sociedade ocidental para abordar as relações de violência que cercam a vida da criança. Saffioti (p 13-21) elucidou o conceito de produção de crianças vítimas de violência sexual, que atribui fatores importantes desse crime às relações de poder perpetuadas na sociedade alegando que não existe um estado natural da violência. Ora, se existem vítimas é porque existe quem as produza.

Para Azevedo e Guerra (1989, p 25-47), a violência cometida contra as crianças perpassa as diversas camadas da sociedade, de maneira transversal, transformando em vítimas crianças de diversos níveis sociais. Elas realçam o processo em que se transforma uma criança em vítima para salientar que as crianças que sofrem violência sexual não surgem de um estado natural. Existe um processo de fabricação de crianças que se tornaram vítimas.

As autoras o conceituam como processo de vitimação e processo de vitimização. A ênfase reside, pois, na produção e não no surgimento. Vitimação e vitimização são resultados de processos sociais e de relações de poder, e não manifestações de patologias (como na conceitualização da pedofilia) e/ou desvios de indivíduos. Nesse sentido, o conceito abuso não é utilizado. Neste caso, a ênfase de abuso sexual é atribuída ao algoz e não a quem sofreu o crime e foi violentado.

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Azevedo e Guerra (1989, p.26) denominam as crianças vitimadas como crianças de alto risco. As autoras também empregaram a expressão infância em dificuldade ao situarem as crianças vitimadas (AZEVEDO; GUERRA, 1993, p.232). Para Saffioti (1989, p.15), o conceito de vitimação revela o nível social, econômico, cultural de crianças vítimas das diversas formas de violência, inclusive a sexual; refere-se às crianças vulnerabilizadas socialmente.

No caso específico da exploração sexual de crianças e adolescentes, os menores são os explorados na medida em que, em lugar de estarem desenvolvendo uma atividade prazerosa para si próprios, atuam para causar prazer a um adulto, com prejuízo inclusive de sua própria saúde mental (SAFFIOTI, 1989, p. 49).

As crianças vitimizadas são as crianças vítimas de violência, mas não necessariamente vitimadas. Portanto, crianças vitimizadas não precisam, necessariamente, se originar de uma estrutura de pobreza ou miséria que propulsione esse crime, tal qual ocorre com as crianças vitimadas. Mas são também o resultado da sociedade capitalista, patriarcal, machista e adultocêntrica, são “crianças em estado de sítio”, que sofrem violência sexual intra e extra- familiar. Se as violências praticadas contra as crianças vitimadas estão no âmbito social, a vitimização de crianças ocorre de maneira interpessoal.

Partindo desse referencial teórico, buscou-se a construção de um produto educacional, isto é, de material formativo para professores/as de educação infantil, destinado a instruir sobre a violência sexual na infância, fundamentado nas análises das mencionadas autoras.

Pesquisando cadernos pedagógicos, cartilhas e guias para elaboração do produto educacional, foram encontrados alguns materiais formativos destinados a professores/as que abordam a temática da violência sexual contra crianças. As análises dos materiais existentes apontam para a seguinte problemática: ausência de material formativo específico para atuação de professores/as de educação infantil e proposição de ações concretas. Essas ações, tanto pedagógicas quanto formativas, devem estar voltadas à prevenção e aos caminhos para a denúncia na perspectiva da atuação do professor e da professora de educação infantil. Mesmo havendo quantidade considerável de material sobre o tema, a análise de conteúdo dos documentos apontou para a necessidade da produção do guia proposto.

2. Levantamento e análise do material

Para a análise dos cadernos pedagógicos, cartilhas e guias de combate à violência sexual na infância e adolescência, buscou-se coletar documentos de acordo com os objetivos do trabalho e o problema da pesquisa. Com essa busca, constituiu-se o corpus da documentação desta pesquisa. Segundo Bardin (2016, p.126), “o corpus é o conjunto dos documentos tidos em conta para serem submetidos aos procedimentos analíticos.”

Para constituição desse corpus documental, utilizaram-se as regras de Bardin (2016). Primeiramente, a regra da exaustividade, com vistas a abranger todos os documentos alinhados com os objetivos. Essa etapa se encaminhou de maneira laboriosa. Alguns documentos eram de difícil acesso em sites que não disponibilizavam a íntegra do documento demandando tempo de procura. Foi empreendida uma busca minuciosa dos documentos que abordassem a temática da violência sexual na infância e adolescência e estivessem de acordo com os objetivos da pesquisa, isto é, que fossem materiais formativos, não apenas informativos. A exclusão de material nessa primeira etapa realizou-se de forma rigorosa, para que a subjetividade não se aplicasse como regra de seletividade.

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Em seguida, utilizou-se a regra da representatividade. Esta consiste na seleção de uma amostra do material escolhido, isto é, amostragem que representasse o todo do documento. Priorizou-se a busca de guias, cartilhas e cadernos pedagógicos indicados a públicos variados e que estivessem disponíveis virtualmente. Considerou-se o contexto da pandemia mundial de COVID-19 que exigia isolamento social e trabalho remoto de pesquisa. A coleta de material resultou no encontro de onze documentos formativos, apresentados na tabela a seguir (Tabela 1):

Tabela 1: Cadernos pedagógicos, cartilhas e guias analisados para composição do corpus de estruturação de análise para necessidade de escrita do produto educacional de prevenção e combate à violência sexual na infância para professores/as de educação infantil.

Documento Fonte do documento Tipo e formato do documento Páginas Público Alvo
Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes - No caminho da prevenção (2007). CRAMI – Não possui ISBN Cartilha - PDF 20p. Profissionais que atuam diretamente com a população infanto-juvenil
A escola contra o abuso sexual infantil: Guia de orientação aos profissionais de ensino (2019). Secretaria de Educação de São Paulo
Link
Não possui ISBN.
Guia de orientação - PDF 56p. Profissionais de ensino.
A escola que educa, previne e protege: violência sexual contra crianças e adolescentes em debate (s/d). Governo do Estado do Paraná
ISBN: 9788580150940
Caderno pedagógico - PDF 37p. Professores/as e funcionários/as
Abuso sexual contra crianças e adolescentes – abordagem de casos concretos em uma perspectiva multidisciplinar e interinstitucional (2021). Link
Não possui ISBN
Cartilha- PDF 30p. Toda a sociedade para participar da causa.
Abuso sexual: mitos e realidade (2002). Abrapia Brasil
ISBN: 8572100679
Guia - PDF 64p. População responsável pela prevenção das situações de risco social e pessoal para crianças e adolescentes.
Escuta de crianças e adolescentes em situação de violência sexual: aspectos teóricos e metodológicos: guia para capacitação em depoimento especial de crianças e adolescentes (2014). Childhood Brasil
ISBN: 978-85-60485-703
Guia- PDF 346p. Profissionais que têm a missão de ouvir a criança e o adolescente no serviço de atenção e nos sistemas de segurança.
Guia de referência construindo uma cultura de prevenção à violência sexual (s/d). Childhood Brasil
ISBN: 978-85 62194-01-6
Guia de referência - PDF 158p. Capacitação de profissionais da saúde, assistência social, educação, segurança pública e Conselhos tutelares.
Guia Escolar Rede de proteção à infância: Identificação de sinais de abuso e exploração sexual de crianças e adolescente.
(2011)
Portal do professor
(portaldoprofessormec.gov.br)
ISBN: 978-85-8067-008-0
Guia Escolar -PDF 239p. Formação continuada para professores/as e gestores das escolas fundamental e média.
Navegar com segurança. Por uma infância conectada e livre da violência sexual. (2012) Childhood Brasil
ISBN: 9788581150093
Cartilha - PDF 27p. Todos que estão próximos cuidam ou educam crianças adolescentes.
Violência sexual contra crianças e adolescentes: compreender para prevenir. (2007) Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Diadema/SP
Não possui ISBN
Cartilha - PDF 20p. Pais e responsáveis, adolescentes e crianças.
Violência Sexual contra crianças e adolescentes: Reflexões e abordagens. (2016) Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Não possui ISBN
Cartilha - PDF 54p. Rede de proteção, junto àqueles que atuam de forma direta com o recebimento da informação, seja na investigação ou no processamento.

Fonte: Autoras (2021)

Devido à extensão do material documental encontrado, era necessário realizar uma seleção menor que possibilitasse a pesquisa qualitativa, com o aprofundamento da leitura e da análise. Com o objetivo de se fazer uma seleção menor do material encontrado após a primeira coleta do corpus, foram analisadas e aplicadas outras duas regras da análise de conteúdo temática de Bardin (2016): primeiramente, a regra da homogeneidade, isto é, os documentos devem obedecer a critérios precisos de escolha e não apresentar demasiada singularidade. Logo, as escolhas não eram aleatórias. Foram selecionados documentos homogêneos entre si através de critérios específicos.

Nesse momento, também se aplicou a regra da pertinência para a escolha dos documentos: os documentos deveriam corresponder especificamente ao objetivo do trabalho de modo preciso. Como o objetivo do trabalho é a criação de um guia formativo para professores de educação infantil, na segunda seleção levou-se em consideração que materiais poderiam auxiliar melhor e mais diretamente na construção do produto educacional. Nessa etapa, foi efetivada a seleção de cinco documentos, tal como exposto na tabela a seguir:

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Tabela 2: Cadernos pedagógicos, cartilhas e guias analisados para validação da necessidade de escrita do produto educacional de prevenção e combate à violência sexual na infância para professores de educação infantil.

Documentos
D1- Abuso sexual: mitos e realidade (2002)
D2- A escola que educa, previne e protege: violência sexual contra crianças e adolescentes em debate (2016).
D3- Guia Escolar: rede de proteção à infância. Identificação de sinais de abuso e exploração sexual de crianças e adolescente (2011).
D4- Guia de referência construindo uma cultura de prevenção à violência sexual (2020).
D5- Navegar com segurança. Por uma infância conectada e livre da violência sexual (2012).

Fonte: As autoras (2021)

Após a seleção dos cincos documentos, realizou-se o processo de codificação dedutiva, retomando a literatura e o referencial teórico que guiam esse trabalho. A codificação consiste em destacar elementos do conteúdo de documentos, efetuando regras. Os dados brutos dos textos foram colocados em recortes, citações, palavras ou frases. Para a codificação dedutiva, selecionaram-se questões guias embasadas no referencial teórico, objetivo e problema de pesquisa. A seguir, apresentamos a análise do material referente aos documentos selecionados, de acordo com o modo pelo qual foram identificados na tabela 2 (D1, D2, D3, D4 e D5).

A - Possui objetivos formativos para professores/as da educação infantil? – Neste código, objetivo formativo é concebido como “formação de indivíduos intencionalmente planejada para efetivação de determinada prática social”, de acordo com Martins (2010, p.14).

D1- Não específico para professores e professoras de educação infantil.
D2- Não específico para professores e professoras de educação infantil.
D3- Sim, ao longo do documento, como no trecho a seguir:

O trabalho de educação em sexualidade com crianças é integrado às atividades diárias da escola, em situações de jogos, brincadeiras e histórias. Aos educadores, cabe acolher as manifestações da sexualidade infantil e sua curiosidade sexual, suprindo as lacunas de informação, muitas vezes decorrentes da falta de orientação e de diálogo na família. Esse trabalho se dá em todos os momentos e espaços de convívio do adulto com a criança, não apenas em horários e locais predeterminados. O educador precisa estar sensibilizado e capacitado para observar a criança, perceber suas manifestações de sexualidade e responder às questões formuladas usando linguagem simples, adequada a cada faixa etária, considerando as singularidades, respeitando os limites e as possibilidades de compreensão de cada um. Cada educador deve usar sua capacidade criativa e afetiva para encontrar uma forma de se aproximar dos estudantes (D3, p. 55).

D4- Sim, ao longo do documento.
D5- Não específico para professores e professoras de educação infantil.

B- Conceitua violência sexual infantil abarcando os fenômenos que a compõe, não atribuindo a exploração sexual infantil, vitimação e vitimização (crianças em estado de sítio) como abuso?

D1- Explica apenas o conceito de abuso sexual no trecho a seguir:

O abuso sexual é uma situação em que uma criança ou adolescente é usado para gratificação sexual de um adulto ou mesmo de um adolescente mais velho, baseado em uma relação de poder que pode incluir desde carícias, manipulação da genitália, mama ou ânus, exploração sexual, voyeurismo, pornografia, exibicionismo, até o ato sexual com ou sem penetração, com ou sem violência física (D1, p. 8-13).
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D2- Emprega o conceito de violência sexual para se referir à abrangência que advém do abuso e da exploração sexual, como no trecho a seguir: “A violência sexual contra crianças e adolescentes inclui diversas modalidades, mas podem ser divididas em grupos maiores: abuso sexual (intrafamiliar e extrafamiliar) e exploração sexual” (D2, p.5).
D3- Utiliza o conceito de violência sexual para se referir à abrangência que advém do abuso e da exploração sexual no seguinte trecho:

Enquanto o abuso sexual é uma violação à dignidade sexual de crianças e adolescentes, que ocorre de forma mais recorrente nos contextos intra e extrafamiliar, a exploração sexual comercial está relacionada ao que se denomina prostituição de crianças e adolescentes. Embora os dois problemas façam parte do fenômeno mais amplo da violência sexual, os números de casos de abuso são substancialmente maiores do que os de exploração sexual comercial (D3, p. 12).

D4- Explica o conceito de abuso sexual e cita cartilha da ABRAPIA sobre abuso sexual intrafamiliar e extrafamiliar. Conceitua abuso sexual no seguinte trecho:

O abuso sexual é descrito como toda situação em que uma criança ou um adolescente é utilizado para gratificação sexual de pessoas, geralmente mais velhas. O uso do poder pela assimetria entre abusador e abusado é o que mais caracteriza essa situação. O abusador “se aproveita do fato de a criança ter sua sexualidade despertada para consolidar a situação de acobertamento. A criança se sente culpada por sentir prazer e isso é usado pelo abusador para conseguir o seu consentimento. (D4, p. 8-13).”

D5- Utiliza o conceito de violência sexual para se referir à abrangência que advém o abuso e a exploração sexual, como no seguinte trecho:

A violência sexual pode ser entendida tanto como uma forma de abuso quanto de exploração. Essas denominações são utilizadas aqui para diferenciar a violência quando há a mediação de dinheiro ou ganhos materiais (exploração) e quando não há, o que configura o abuso. (D5, p. 20)

C- Professores de educação infantil compõem a equipe multidisciplinar no enfrentamento da violência sexual?

D1- Não menciona professores de educação infantil.
D2- Não menciona professores de educação infantil.
D3- Sim, entre as páginas 44 e 46, como no trecho a seguir:

A Lei 11.525 (BRASIL, 2007a), que acrescentou à Lei 9.394 (BRASIL, 1996), de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a “inclusão de conteúdo que trate dos direitos da criança e dos adolescentes no currículo do Ensino Fundamental, observada a produção e distribuição de material didático adequado”, com base no ECA (BRASIL, 1990a), merece indagações metodológicas, análises de boas práticas, inserções de materiais didáticos específicos e, sobretudo, nova postura para discutir a educação, a instrução e os direitos humanos no sistema escolar. Sua implantação significa incluir no cotidiano escolar a visão de crianças e adolescentes como sujeitos de direito, cidadãos, protagonistas e merecedores de prioridades, atenção e cuidados (D3, p. 45).

D4- Sim, entre as páginas 62 e 67, como no seguinte trecho:

Em geral, os membros da comunidade escolar podem tomar conhecimento de uma situação de violência sexual por três meios: pela revelação direta da criança ou adolescente para um dos profissionais da comunidade escolar, particularmente para professores; por meio de informações de colegas ou familiares da criança ou do adolescente comunicadas aos membros da comunidade escolar; e pela identificação de sinais da violência realizada por meio da observação de professores, da aparência, do estado físico e de comportamentos das crianças e dos adolescentes. Os educadores devem adotar atitudes e procedimentos distintos para cada tipo de situação (D4, p. 62).
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D5- Não menciona professores de educação infantil.

D-Contém orientações pedagógicas específicas para professores de educação infantil que atuam no sentido da prevenção a violência sexual em suas aulas?

D1- Não direcionado a professores de educação infantil.
D2- Não direcionado a professores de educação infantil.
D3- Sim, de maneira breve, não específica para cada faixa etária da primeira infância:

O trabalho de educação em sexualidade com crianças é integrado às atividades diárias da escola, em situações de jogos, brincadeiras e histórias. Aos educadores, cabe acolher as manifestações da sexualidade infantil e sua curiosidade sexual, suprindo as lacunas de informação, muitas vezes decorrentes da falta de orientação e de diálogo na família. Esse trabalho se dá em todos os momentos e espaços de convívio do adulto com a criança, não apenas em horários e locais predeterminados. O educador precisa estar sensibilizado e capacitado para observar a criança, perceber suas manifestações de sexualidade e responder às questões formuladas usando linguagem simples, adequada a cada faixa etária, considerando as singularidades, respeitando os limites e as possibilidades de compreensão de cada um. Cada educador deve usar sua capacidade criativa e afetiva para encontrar uma forma de se aproximar dos estudantes (D3, p. 55).

D4- Sim, de maneira breve, não específica para cada faixa etária da primeira infância:

Saber a hora e a melhor maneira de falar sobre sexualidade com as crianças e seus pais é muito importante. Conhecer as características de cada fase do crescimento da criança pode ajudar a evitar equívocos na maneira de lidar com a sexualidade das crianças e dos adolescentes, respeitando formas de expressão da sexualidade, sem reprimi-las, e enfrentando a invasão da sexualidade infantil por adultos (D4, p. 58).

D5- Não direcionado a professores de educação infantil.

E- Contém o processo de comunicação e denúncia, bem como responsabilidade e atuação de cada órgão, a partir da comunicação do/a professor/a de educação infantil?

D1- Não especifico para professores.
D2- Não especifico para professores.
D3- Sim, no seguinte trecho:

Lembre-se de que a denúncia pode ser realizada de forma declarada ou sigilosa. Muitos educadores preferem notificar a ocorrência de abuso sexual e não ter sua identidade revelada. Porém, o ideal é que a direção da escola assuma conjuntamente a notificação por escrito ou visite o órgão responsável, de preferência acompanhada de membros da família que não cometeram abuso sexual, que possam dar seguimento tanto à denúncia quanto ao encaminhamento da criança ou adolescente aos serviços educacional, médico e psicológico, quando esses se fizerem necessários. Qualquer que seja a opção, substanciar a denúncia é muito importante pelas seguintes razões: uma boa descrição do caso contribuirá para que o órgão competente agilize seu papel e evitará solicitar ao educador que complemente as informações. A descrição bem feita do caso pode evitar que os órgãos competentes demandem que a criança ou adolescente fale novamente sobre a situação de violência, aumentando ainda mais o seu sofrimento. De modo geral, é preferível dirigir-se em primeiro lugar ao Conselho Tutelar mais próximo de sua moradia, a uma delegacia especializada ou a algum serviço público do tipo SOS Criança. Esses três órgãos normalmente têm profissionais mais experientes para lidar com as situações de violência sexual (D3, p. 98-102).

D4-. Não especificamente para professores, mas destinados a instituições, como no trecho a seguir:

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Registre o mais cedo possível tudo o que lhe foi narrado pela criança ou pelo adolescente, as informações prestadas por terceiros, as evidências colhidas na convivência com a vítima e/ou durante o atendimento realizado. Esse relato deve seguir com a notificação para ser utilizado em procedimentos legais posteriores (D4, p. 85).

D5- Abrangente, sem estruturar os protocolos de denúncia e não específico para professores.

No momento de categorização dos documentos, buscou-se refletir sobre os códigos e transformá-los em categorias em dois processos: o de diferenciação e o de reagrupamento, observando ora a frequência e presença ora a ausência de palavras e termos subsidiados em nosso referencial teórico.

No código A, apenas os documentos D4 e D3 apresentaram objetivos formativos para professores/as de educação infantil, o que torna importante a fabricação de mais materiais formativos para esses sujeitos.

No código B, os documentos D2, D3 e D5 apresentaram fundamentações em relação à violência sexual infantil com ênfase na exploração sexual, ao denominar violência e abuso sexual nas situações em que a violência sexual ocorria de maneira intra ou extra familiar. Já nos documentos D1 e D4, apenas a nomenclatura abuso sexual foi denominada.

Isso indica que é preciso reforçar a conceitualização da violência sexual infantil e exploração sexual infantil. No código C, apenas nos documentos D4 e D3 professores/as de educação infantil de alguma maneira, são participantes do composto multidisciplinar de proteção à criança. Justamente com os dados obtidos no código A, isto reforça que é preciso material formativo que destaque a importância dos/as professoras da educação infantil no combate e prevenção à violência sexual contra crianças.

No código D, apenas os documentos D4 e D3 traziam um protocolo em relação às orientações pedagógicas para professores de educação infantil. Contudo, não traziam orientações específicas para cada faixa etária da primeira infância. No código E, apenas esses dois documentos, D4 e D3, trouxeram um protocolo pensado no/a professor/a da educação infantil para realizar a comunicação e a denúncia.

3. Considerações Finais

De acordo com os dados analisados, evidenciamos a necessidade de se produzirem de mais materiais formativos específicos sobre o enfrentamento da violência sexual infantil para professores de educação infantil. A análise realizada dos cinco documentos selecionados não possui, certamente, o objetivo de apontar erros e contabilizar acertos, mas sim de salientar a importância de material específico para a formação de professores de educação infantil. Esses materiais devem, inclusive, conter o aglomerado de questões que identificamos com a pesquisa documental e bibliográfica.

É preciso mais material instrucional para professores de educação infantil que traga objetivos formativos aos docentes dessa etapa de ensino, assim como a conceituação da violência sexual e de suas facetas, bem como a não-dicotomização de violência sexual apenas no sentido de exploração sexual. Faz-se necessário o material instrucional que enfatize o/a professor/a de educação infantil enquanto componente da equipe escolar multidisciplinar que deve atuar contra a violência sexual na infância. É importante também que ele traga orientações pedagógicas específicas para professores de educação infantil, abarcando a faixa etária 0 a 6 anos da primeira infância da educação infantil.

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E, por fim, é imprescindível maior número de materiais que expliquem o processo de denúncia sistematizado em protocolos, a partir da perspectiva do docente que atua na educação infantil. O aumento na divulgação desse protocolo é fundamental, particularmente em contextos nos quais muitos/as professores/as da educação infantil se sentem inseguros/as, sem apoio e sem as instruções necessárias de como agirem no enfrentamento e na prevenção da violência sexual contra crianças.

4. Referências

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______. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Análise epidemiológica da violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil, 2011 a 2017. Boletim Epidemiológico, v. 49, n. 27, 2018.

______. Departamento de Enfrentamento de Violações aos Direitos da Criança e do Adolescente – SNDCA/MMFDH. Abuso sexual contra crianças e adolescentes: abordagem de casos concretos em uma perspectiva multidisciplinar e interinstitucional. Brasília, 2021. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2021/maio/CartilhaMaioLaranja2021.pdf. Acesso em: 27 mar. 2022.

CARAVIERI, L. M. V.; MAGALHÃES, J. S. Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes: no caminho da prevenção. São Bernardo do Campo: Fundação Criança São Bernardo do Campo. 2007.

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CENPEC: Childhood Instituto. Instituto Childhood Brasil. Navegar com segurança: por uma infância conectada e livre da violência sexual. São Paulo: WCF Brasil, 2012. Disponível em: https://www.childhood.org.br/publicacao/Navegar_com_Seguranca.pdf. Acesso em: 27 mar. 2022.

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SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação, Secretaria da Segurança Pública. Aescola contra o abuso sexual infantil: guia de orientação aos profissionais deensino – identificar, acolher e não se omitir. São Paulo: 2018, 29 p.Disponível em: https://efape.educacao.sp.gov.br/convivasp/wp-content/uploads/2021/03/Cartilha-A-Escola-contra-o-Abuso-Sexual-draft-06.pdf. Acesso em: 27 mar. 2022.

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