5.1
Domínio da Legislação e da Política da Pessoa Idosa

É sabido que a partir das leis, dos direitos e deveres constituídos por meio da Constituição Federal de 1988, ocorre uma busca efetiva de proteção aos idosos no Brasil, buscando melhoria nas condições de vida e da cidadania dessa parcela da sociedade.

Para tanto, é importante reconhecer o debate em que se fez distanciar a Assistência Social do "assistencialismo", onde o primeiro passou a ser lei, especificamente a Lei nº. 8742, de 7 de dezembro de 1993, conhecida como Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Chamamos atenção que a LOAS traz, em seu artigo terceiro, que as entidades e organizações de assistência social, que prestam serviços e executam programas ou projeto, devem estar voltadas prioritariamente para o fortalecimento dos movimentos sociais e das organizações de usuários, formação e capacitação de lideranças (BRASIL, 1993). Assim fortalece a importância do protagonismo dos atores sociais e do controle social, descartando ações de assistencialismo que agem pelos sujeitos, valorizando ações e projetos que atuem com os atores, nesse caso, atores sociais com 60 anos ou mais. Os Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa e outras instâncias de participação e controle social têm como função fiscalizar, acompanhar e avaliar a execução da política de serviços prestados à pessoa com 60+, atuando, assim, na defesa e garantia dos direitos.

Então, o Conselho de Direito da Pessoa Idosa deve dar voz, empoderar e apoiar as pessoas idosas, exigindo a efetivação de seus direitos. Simples, né? Não é não. A população idosa é bastante heterogênea. Isso significa que existem diferenças cognitivas, sociais, financeiras, culturais, entre outras. Dessa forma, é imprescindível que políticas públicas, acompanhadas pela sociedade civil organizada, sejam pensadas para que contribuam com a elevação da qualidade de vida da pessoa idosa.

Logo no início, no preâmbulo do lindo documento da Constituição Federal Brasileira de 1988, diz que busca “instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos” (BRASIL, 1988, P.01).
A complexidade do “Domínio da Legislação”, que é o tema dessa aula, é aparente na riqueza, plenitude, amplitude, entre outros muitos adjetivos que poderíamos colocar nesse momento, presente nesse pedacinho inicial da nossa lei maior: a Constituição. Mas gostaria de, nesse momento, chamar a atenção da igualdade e do quando é necessário cuidar da “igualdade na diversidade” quando tratamos de direitos da pessoa idosa.
Quando se fala em igualdade, não se refere que as pessoas sejam iguais, mas numa sociedade em que as pessoas tenham direitos iguais, independente da situação social, econômica ou étnica. Portanto, políticas públicas são direitos legalizados que foram conquistados por lutas sociais, e que, também, podem ser consideradas uma forma do Estado diminuir os equívocos cometidos com seus cidadãos, ofertando mais oportunidades a estes. Como é o caso das políticas públicas de assistência aos estudantes, aos negros, aos índios e aos velhos (VAZ, 2020, p. 19).
Referência: VAZ, Fábio Pereira. Captação de recursos: qualidade de vida de idosos no município de Palmeirópolis – 2015 a 2019. 113f. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão de Políticas Públicas) – Universidade Federal do Tocantins, Programa de Pós-Graduação em Gestão de Políticas Públicas, Palmas, 2020. Palmas/TO, 2020.
O controle social é previsto na política do idoso tanto na Política Nacional de Idoso e no Estatuto do Idoso. A Política Nacional do Idoso, Lei nº 8.842 de 04 de janeiro de 1994, tem por objetivo "assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade” (BRASIL, 1994, p. 04). Já o Estatuto do Idoso, que rege a PNI, apresenta as linhas de ação da política de atendimento ao idosos no inciso VI do artigo 43, dizendo que deve-se realizar a “mobilização da opinião pública no sentido da participação dos diversos segmentos da sociedade no atendimento do idoso” (BRASIL, 2003, p.08).
Estimular o controle social implica incentivar a sociedade a participar da vida pública em todas as nuances, enfatizando o viver coletivo e a busca pelo bem-estar comum. É importante que os governos estimulem e fortaleçam a participação de uma multiplicidade de atores na gestão pública, pluralizando as vozes no espaço público e possibilitando a construção de uma Administração mais eficiente, aberta e democrática (BRASIL, 2021, p.1)
Um fato importante de se verificar na legislação e na Política da Pessoa Idosa é que apesar dos encaminhamentos da participação das pessoas com 60 anos ou mais nos projetos, ações e discussões sobre o seu direito, não há nenhuma indicação que essas pessoas devem compor os Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa, o que vai ao contrário aos princípios do Controle Social.
Ao excluir os mais velhos da gestão dos seus próprios interesses, deixando-os de fora dos Conselhos do Idoso, o Estado acabou revelando sua subestimação das idades avançadas da vida, enxergando-as como limitadas e dependentes, relegando-as a passividade e resignação (JUSTO; ROZENDO; CORREA, 2010, p. 49).
Justo, Rozendo e Correa (2010) relatam que, buscando uma atuação mais coerente com o controle social, alguns Conselhos criaram vaga para garantir a participação de pessoas idosas nos Conselhos, mas que, muitas vezes, essas vagas são ocupadas por pessoas com 60 anos ou mais de órgãos públicos ou de classes dominantes, não trazendo representatividade das pessoas idosas que mais necessitam das políticas públicas.
Não estando previsto na legislação, a participação de pessoas idosas de diferentes características na composição dos Conselhos de Direitos do Idoso não é garantida. Andrade (2007) aponta diversos fatores que dificultam a participação da sociedade nos Conselhos de Direitos, entre eles, a burocratização e os cargos criados por convite, onde a constituição dos Conselhos acontece por indicação de confiança.
As conferências regionais, municipais, estaduais, nacionais e mundiais são importantes momentos de participação popular e de controle social. Esses momentos reforçam a condição das pessoas com 60 anos ou mais como protagonistas na luta pelos seus direitos, nas decisões relacionadas a sua concepção e necessidades para qualidade e expectativa de vida, assim como participação ativa nas discussões e decisões. As decisões, discussões e encaminhamentos realizados nas conferências municipais são encaminhadas para as conferências estaduais, da mesma forma das estaduais para nacionais, e das nacionais para as mundiais. Dessa forma, a representação da participação social surte efeito nos direitos mundiais das pessoas idosas.

Algumas vezes os Conselhos podem atuar considerando apenas seus interesses individuais e de instituições que representam, onde a participação da comunidade idosa fica muito restrita. Mas temos visto também muitos Conselhos atuando com clareza de sua missão, que possuem domínio da legislação e da Política do Idoso, e que facilitam e estimulam a participação das pessoas com 60 anos ou mais que mais necessitam das políticas públicas e que fazem parte de grupos sociais que sofrem maior violação de seus direitos nos Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa, proporcionando uma gestão diferenciada, efetiva e verdadeiramente participativa.
Independente da discussão de composição dos Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa, a participação e protagonismo das pessoas com 60 anos ou mais na busca de direitos e de políticas públicas, como já dissemos, está prevista na legislação. Para isso, os Conselhos devem evitar modelos de gestão tradicional e burocrático adotando o modelo participativo.
Outra reflexão que é importante fazer é que muitas vezes a participação popular não acontece em função de uma cultura e educação que não prepararam esse indivíduo para esse papel. Losso (2011, p. 170/171) relata que entre as dificuldades que os Conselhos enfrentam para efetivar o controle social estão:
falta de consciência cívica da população, que não raramente tem a convicção de que somente o governo deve resolver os problemas públicos; ausência de tradição de cidadania. A falta de conhecimento dos direitos inibe a população de participar. Não é comum a atitude fiscalizadora do cidadão – ao contrário, usualmente as pessoas não querem se envolver, se preocupar com os problemas públicos, salvo quando estes as atingem diretamente; existência relativamente recente dos Conselhos, que dada à falta de exercício prático (e às vezes a sua inexistência) e o desconhecimento de suas possibilidades, por parte da maioria dos Conselhos Setoriais, como elementos de formulação de políticas públicas para a população, podem resultar em espaço livre a ser ocupado e utilizados como mecanismo político dos ocupantes do poder.

Referência: LOSSO, Marcelo Ribeiro. Conselhos setoriais como elementos de formulação de políticas públicas. Rev. Direito Econ. Socioambiental, Curitiba, v. 2, n. 1, p. 151-178, jan./jun. 2011.
Temos que ter clareza que para se chegar em um nível de construção coletiva, onde todos os atores participam de forma efetiva, é necessário, antes de tudo, oportunizá-los, oferecendo ferramentas para que estes tenham condições e conhecimento necessários para contribuir, pois, caso contrário, a detenção do conhecimento fica para um ou parte pequena do grupo e os demais ficam impossibilitados do debate e, consequentemente, da construção coletiva. Para isso, será necessário o envolvimento da comunidade idosa, com processos de formação, de valorização e empoderamento desses indivíduos, para que se sintam parte do processo de busca de direitos e cidadania, e que tenham conhecimentos e liberdade de expressar suas demandas.

Nesse processo, um conceito que é bem útil é a escuta sensível. Quando falamos de escuta sensível buscamos muito mais que ouvir, a sensibilidade está no sentir os sentidos dos gestos, dos incômodos, e das vivências. Ouvir a pessoa idosa com sensibilidade é se deixar entrar em seu mundo, buscando sua essência, realidade, necessidade, e quais direitos, políticas públicas e projetos poderiam fazer a diferença na qualidade de vida e cidadania desta pessoa e das demais pessoas idosas que convivem na mesma comunidade. Trazemos algumas questões de Brandão (2013) para refletirmos:
No mundo que envelhece, qual o espaço social do indivíduo idoso? Quem o escuta e valoriza? (p. 43).
Mas indagamos: uma escuta sensível, no sentido de abertura, empatia e acolhida, não deveria ser incorporada por todos os profissionais da área gerontológica? (p.44).
A escuta sensível e o acolhimento do sofrimento e necessidades sociais dos sujeitos e sua família, sem pré-julgamentos e expectativas, são importantes para criar laços de confiança. O acolhimento auxilia na superação de ações que se estabelecem de forma normativa e impositiva, a partir de preconceitos estabelecidos sobre participação, desejo, corpo, esporte, performance, saúde etc. A elaboração de projetos sociais com estas características contribuem para que as pessoas possam conquistar autonomia, reelaborando suas dificuldades e potencialidades, com apoio profissional e familiar. Além disso, podem fortalecer a relação dos sujeitos com o território onde vivem e ampliar suas maneiras de pertencimento quando envolvidos em projetos participativos, inclusivos, acolhedores e elaborados a partir da gestão democrática, como já trabalhado neste material.
Com a participação das pessoas idosas na busca pelos seus direitos, maximizada pela escuta sensível, será possível efetivar políticas públicas que atendam a problemas reais dessa população e não se faça política sem sentido.
Política sem sentido; é aquela elaborada sem conhecimento específico sobre o problema ou sem alternativas de solução para o problema, além de ser vazia de intenções políticas genuínas [...] Política pública real; quando incorporam a intenção de resolver um problema público com o conhecimento para resolvê-lo (SECCHI, 2014, p. 22).

Assim, os Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa em que os conselheiros dominam e respeitam a legislação e a política da pessoa Idosa, exercendo o controle social com escuta sensível e atenta aos problemas reais dessa população, terá uma maior possibilidade de fiscalizar a política com sentido, mudando as condições de vida da pessoa idosa e alcançando o reconhecimento da sociedade.