Capítulo 2
Ensino Remoto Emergencial na UFG: diferenças e aproximações com a Educação a Distância
Este texto foi baseado em entrevista cedida ao ConnectLab – FEFD/UFG, durante o Ciclo de Lives realizado entre os meses de junho e julho de 2020, com a finalidade de dialogar sobre a docência em Educação Física no período da pandemia.
O objetivo da entrevista foi provocar uma reflexão sobre as aproximações e distinções presentes nas práticas pedagógicas que envolvem cursos na modalidade a distância e cursos presenciais que emergencialmente estão sendo mediados com o uso de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação – TDIC (Ensino Remoto Emergencial – ERE), no Ensino Superior. Para isso, foram feitos questionamentos à diretora do Centro Integrado de Aprendizagem em Rede da UFG – CIAR, que abordou os aspectos legais dessas práticas pedagógicas, algumas experiências já consolidadas com a EaD na UFG, e o modus operandi nas duas propostas, refletindo sobre os pontos de convergência e os seus objetivos e metas.
Sobre a entrevistada e suas experiências com a EaD – Educação a Distância
Marília de Goyaz é professora aposentada pela Faculdade de Educação Física e Dança da UFG –Universidade Federal de Goiás (FEFD), e diretora do Centro Integrado de Aprendizagem em Rede – CIAR, órgão suplementar da reitoria da UFG, responsável pela implementação e apoio aos cursos a distância e projetos de ensino, pesquisa e extensão da UFG que são integrados por TDIC. A sua experiência com a EaD iniciou quando atuou como professora conteudista do curso de especialização a distância da Capacitação Continuada em Esporte Escolar, do Ministério do Esporte (2005), no módulo denominado Manifestações dos Esportes, unidade “A pedagogia da ginástica e suas manifestações lúdicas”. Em 2007, foi convidada pela Universidade de Brasília – UnB para atuar como conteudista e professora formadora da disciplina Pedagogia da Ginástica Escolar no curso de licenciatura em Educação Física a distância, do programa Pró-Licenciatura, ofertado pela UnB em parceria com as universidades federais de Rondônia e do Amapá. Para isso, fez cursos de formação em EaD na UnB, envolvendo formação pedagógica e formação para o uso da plataforma Moodle, ambiente virtual de aprendizagem largamente utilizado nos cursos a distância. Em 2009, após participar da comissão de elaboração do projeto político pedagógico do curso de licenciatura em Educação Física a distância da então FEF/UFG, foi designada pelo Conselho Diretor para assumir a coordenação desse curso que foi ofertado pela Universidade Aberta do Brasil – UAB, maior programa público de educação a distância, no qual também atuou como professora conteudista e formadora da disciplina Pesquisa e Ensino da Ginástica Escolar. Em 2012, assumiu a vice-direção do CIAR e a coordenação adjunta da UAB na UFG. Em 2017, assumiu a direção do CIAR e a coordenação geral da UAB na UFG, sendo eleita em 2019 para a presidência do Fórum Nacional de Coordenadores UAB e a representação das instituições do Estado de Goiás pertencentes ao programa UAB junto à Coordenação de Aperfeiçoamento de pessoal de Nível Superior – CAPES.
Situando o lugar de fala
A educação integrada por tecnologias não é uma novidade na UFG. Com o incentivo dado a professores e pesquisadores pela LDBEN 9394/96 para o desenvolvimento de projetos que pudessem ampliar o alcance do Ensino Superior por meio de ações que não exigissem a presença física de professores e estudantes no mesmo lugar e ao mesmo tempo, surgiram algumas iniciativas nesse formato no meio acadêmico na UFG. Com a crescente demanda de projetos nesta área, em 2000, a UFG Virtual foi criada com a finalidade de promover a Educação a Distância (EaD) na UFG, agregando alguns desses estudiosos em um Grupo de Trabalho composto por representantes das Pró-Reitorias e das Unidades Acadêmicas, com uma coordenação geral. A UFG Virtual era vinculada à Pró-Reitoria de Extensão e Cultura e teve um papel importante para que outros desafios na educação a distância fossem assumidos por esta instituição.
Em 2004, a UFG teve como meta implantar o ensino a distância na graduação e filiou-se ao Consórcio Setentrional da UNIREDE (UnB, UFG e UEG – Curso de Ciências Biológicas Pró-Licenciatura I). Esse projeto colaborativo impulsionou outras iniciativas e, posteriormente, a UFG participou do programa Pró-licenciatura II, com a oferta dos cursos de Ciências Biológicas, Artes Visuais e Física. Em 2006, ocorreu oferta do curso de bacharelado em Administração do projeto-piloto em parceria com o Banco do Brasil, primeiro do Sistema UAB – Universidade Aberta do Brasil. Essas articulações da UFG aos programas públicos de educação a distância promoveram um grande salto da UFG nessa área e provocaram algumas mudanças nas normas internas da universidade, que até então tratavam apenas da educação presencial.
Com a expansão da educação a distância na universidade e a entrada no programa UAB, também surgiu a necessidade de criação de um núcleo de apoio às atividades acadêmicas de graduação, pós-graduação, extensão e pesquisa integradas pelas TDIC desenvolvidas pela UFG. O Centro Integrado de Aprendizagem em Rede da Universidade Federal de Goiás (CIAR/UFG) é um órgão suplementar da Reitoria, criado em 2007 com essa finalidade. O órgão foi estruturado com equipes especializadas que dão suporte aos cursos a distância e aos projetos de ensino, pesquisa e extensão da UFG integrados por Tecnologias de Informação e Comunicação – TIC. Historicamente, o conceito de TIC vem sendo utilizado para expressar a convergência entre a informática e as telecomunicações, contribuindo para a difusão de informações. (MISKULIN et al., 2006; CARDOSO, 2011; LEITE, 2015). Esse termo foi utilizado na Resolução 02/2007 – CONSUNI de criação do CIAR para definir o seu papel. No entanto, na atualidade, o termo Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação – TDICs tem sido amplamente utilizado, considerando a sua atualidade e abrangência, pois contempla as tecnologias digitais (FONTANA; CORDENONSI, 2015; MAIA E BARRETO, 2012) que permitem a navegação na internet e o uso de bancos de dados.
O conceito de Rede também vem ganhando força entre os estudiosos da educação a distância, sendo associado às Tecnologias Digitais, numa concepção que tem um amplo alcance educativo e transformador, que envolve, além de múltiplos e diversificados colaboradores, as potencialidades de conexão, de interação, de intercâmbio de informações e conhecimentos. Redes inacabadas, construídas de forma criativa, dialógica e que supera a ideia restrita de uma rede tecnológica de concentração e difusão de dados (GOMEZ, 2004).
O apoio do CIAR aos cursos e aos projetos acadêmicos da UFG integrados por tecnologias vai além do suporte tecnológico de natureza instrumental. O CIAR atua nas articulações com as Unidades Acadêmicas, Pró-Reitorias e Órgãos da UFG e com os diferentes entes federados (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) envolvidos nos projetos de educação a distância da universidade. O trabalho desenvolvido de forma integrada pelas equipes especializadas do CIAR compreende ações políticas e didático-pedagógicas fundamentadas teoricamente: na criação, no suporte e a manutenção de ferramentas tecnológicas; na formação de docentes, discentes e servidores técnico-administrativos para atuação e fruição na educação a distância; produção de materiais didáticos multimídia; e na criação de cursos a distância em diferentes formatos. O eixo-norteador do trabalho no CIAR é centrado no constante exercício de “Ação – Reflexão – Ação”, para qualificar cada vez mais os resultados e buscar inovações pedagógicas integradas por tecnologias digitais.
As ações do CIAR estão alinhadas ao Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) da UFG, promovendo a democratização do ensino superior de qualidade e a inclusão de estudantes de várias cidades do Estado de Goiás, fortalecendo a política de formação de professores e de gestores públicos.
Sobre os procedimentos que envolvem a organização de cursos na modalidade a distância e alguns princípios importantes dessa modalidade
A modalidade educacional a distância teve a sua oferta autorizada em instituições especificamente credenciadas pela União pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, publicada em 1996. A partir da publicação da LDBN 9394/96, que em seu Artigo 80 prevê o incentivo pelo poder público para o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada, houve um grande estímulo ao desenvolvimento de projetos dessa natureza nas Instituições de Ensino Superior – IES, embora a EaD, compreendida como um processo pedagógico que envolve ensino e aprendizagem, não fosse uma novidade.
Historicamente, a EaD tem sido classificada de diferentes formas por alguns autores, tendo como base as tecnologias e os meios utilizados para promover a interação. Moore e Kearsley (2007) abordam a evolução histórica do ensino a distância definindo períodos associados aos avanços tecnológicos em cinco gerações. Belloni (2009) menciona três modelos, mas existem outras classificações. Esses modelos são relacionados ao contexto histórico vivido pela sociedade em cada época.
Aqui, faremos um recorte na regulamentação da EaD no Ensino Superior e os seus desdobramentos, evidenciando a inserção da EaD nas Instituições Públicas de Ensino Superior – IPES. O Decreto 5622/2005 regulamentou o Artigo 80 da Lei Nº 9394/1996 e, também em 2005, foi criado pelo Ministério da Educação o Programa UAB – Universidade Aberta do Brasil, para a articulação e integração de um sistema nacional de educação superior a distância, que foi instituído posteriormente pelo Decreto 5.800/2006. A UAB é a principal referência de educação a distância pública e contribui com os processos de consolidação e qualificação dos sistemas de EaD nas IPES integrantes do sistema. Tem promovido o desenvolvimento institucional, a formação e a capacitação de pessoal, mas, também, a reflexão crítica sobre os modelos de EaD praticados. A UAB tem como os principais princípios a democratização e interiorização do ensino superior público de qualidade; a inclusão de estudantes que não tinham acesso ao ensino superior, por residirem em rincões não contemplados com IPES e não terem condições de se deslocarem para os grandes centros onde estão situadas estas instituições; e por serem trabalhadores, não tendo disponibilidade de um tempo em horário comercial, que é o horário predominante nos cursos superiores presenciais públicos. A EaD também permite uma flexibilização do tempo e do espaço de estudo, embora exija um compromisso e organização maior do tempo de estudo por parte dos estudantes, autodisciplina e estudo individualizado. É essencial que o estudante tenha uma participação ativa, criativa e crítica nas atividades mediadas por tecnologias. As relações pedagógicas entre a equipe docente e os estudantes na EaD levam a um contrato didático-pedagógico diferenciado dos cursos presenciais, evidenciando a mediação e a interação dialógica.
O uso pedagógico das TDICs na EaD tem promovido transformações no processo de ensino e aprendizagem. Além disso, tem favorecido a compreensão de que a educação pode se realizar em lugares e tempos diversos e ser construída coletivamente, em rede, com o uso da internet, favorecendo o ensino híbrido que é apontado como uma tendência do século XXI (BELLONI, 2012). Essa integração do ensino presencial com o ensino a distância é um processo cuja implementação é de responsabilidade das Instituições de Ensino Superior (IES) e deve ser precedida de intenso planejamento, visto que impacta as ações dos professores e dos gestores.
Em 2016, após ampla discussão em audiências públicas, o Conselho Nacional de Educação – CNE publicou a Resolução Nº 01 definindo as Diretrizes e Normas Nacionais para oferta de programas e curso de Educação Superior na modalidade a distância. Essas diretrizes, embora tenham algumas limitações, representam um avanço significativo na regulamentação da EaD no Ensino Superior e um marco importante para a institucionalização da educação a distância como modalidade educativa, vinculando-a ao Programa de Desenvolvimento Institucional e ao Projeto Pedagógico Institucional, afastando a possibilidade de as instituições tratarem a EaD como um projeto secundário. As diretrizes também ampliam o conceito de EaD em relação à caracterização dada pelo Decreto 5622/2005 a partir de uma visão de educação para todos com garantia de padrão de qualidade.
Atualmente, o marco regulatório da Educação a Distância é o Decreto 9057/2017, que considera a modalidade a distância como uma modalidade educacional que acontece com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, desenvolvendo atividades educativas por estudantes e profissionais da educação que estejam em lugares e tempos diversos. Este decreto gerou algumas preocupações, pois flexibilizou e diminuiu o rigor em relação a algumas exigências para a oferta de cursos a distância por instituições de ensino superior, facilitando, ao nosso ver, que instituições privadas que não tenham os compromissos sociais presentes nas instituições públicas ampliem o número de cursos e vagas sem o cuidado necessário com a qualidade das ofertas. Os dados estatísticos do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP (BRASIL, 2017) já demonstravam o grande crescimento da oferta de cursos a distância, principalmente nas instituições privadas.
É importante ressaltar a complexidade das relações na educação mediada por TDIC, que envolve uma grande quantidade de pessoas para ofertar apenas uma disciplina, formatada por meio de uma construção coletiva. Nesse processo, professores definem o que é relevante e, com a equipe multidisciplinar, composta por especialistas em educação em rede, webdesigners e revisores, buscam as formas mais adequadas para desenvolver esses conhecimentos por meio de TDIC. No contexto da educação em rede, é comum a intervenção de outro profissional da educação – o Tutor – que desempenha um importante papel no processo, realizando a mediação didático-pedagógica do ensino e aprendizagem. No entanto, convivemos com outros modelos de formação em rede, destacando aqui aquele em que essa mediação também é assumida pelo professor responsável pela disciplina, o modelo autoinstrucional e os modelos híbridos.
A modalidade de educação a distância não se reduz à reprodução das aulas presenciais via web, por meio de equipamentos e de ferramentas tecnológicos, ou de vídeos e arquivos de materiais didáticos postados numa plataforma virtual para os alunos acessarem e realizarem tarefas propostas pelos professores. Atuar nesta modalidade exige um trabalho rigoroso que envolve a formação na área dos profissionais que atuam nos cursos e dos estudantes, que mesmo sendo nativos digitais, carecem de uma formação inicial para compreenderem a lógica do processo de ensino e aprendizagem organizado e mediado por meio de TDIC e dominarem o uso das ferramentas disponibilizadas. Com isso, professores e estudantes também poderão contribuir para a criação de novas formas de ensinar e aprender, garantindo a qualidade na formação, como já tem sido feito nos modelos presenciais já consolidados.
A educação na modalidade a distância, portanto, tem uma regulamentação legal, possui uma organização do trabalho pedagógico com características próprias envolvendo vários atores, segue uma lógica diferenciada no trato com o conhecimento e, para a sua oferta, é necessário um planejamento coletivo cuidadoso antecedendo as ofertas.
Até janeiro de 2021, a UFG formou 12.211 estudantes em cursos a distância de graduação, pós-graduação, extensão. Esses cursos foram ofertados em aproximadamente 30 polos de apoio presencial localizados em diferentes regiões do Estado de Goiás, um em Votuporanga (São Paulo) e três em Moçambique, promovendo a interiorização e democratização do ensino superior de qualidade e a inclusão de alunos que já não tinham a expectativa de acesso a esses cursos, por residirem em locais distantes dos grandes centros onde estão situadas as instituições públicas de ensino superior.
Como diferenciar a educação a distância do ensino remoto? Quais os limites, possibilidades e função da educação remota em sua opinião?
O ensino remoto é apenas um dos modelos de ensino a distância. Esses modelos costumam ser definidos de acordo com as tecnologias e as formas utilizadas para a interação, e nas ferramentas que serão utilizadas. Lembrando que o ensino a distância passou por diferentes fases, sendo realizado por meio de correspondência, via rádio e TV, por teleconferência, e pelo uso da internet. Embora atualmente todos esses modelos de comunicação possam ser incorporados e utilizados no ensino a distância, o mais comum na atualidade é o uso da internet e das redes de computadores, que pode promover uma interação mais individualizada, como era lá no início, bem como uma interação mais ampliada, coletiva.
O modelo de ensino remoto faz parte das estratégias de educação na modalidade a distância, que como já mencionamos, é muito mais abrangente, complexa e é regulamentada por normas legais rígidas. No entanto, neste momento que enfrentamos uma e pandemia do coronavírus, ele está sendo utilizado como estratégia temporária para que os estudantes continuem tendo acesso ao conhecimento que em seus cursos era acessado presencialmente, com professores e estudantes em um mesmo espaço e ao mesmo tempo. Por essa razão, várias instituições denominaram as atividades acadêmicas que estão sendo realizadas nos cursos presenciais por meio de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação – TDIC de Ensino Remoto Emergencial– ERE. O ensino remoto permite a realização de atividades síncronas e assíncronas em lugares e tempos diversos com o uso da internet e das redes de computadores.
Observamos que no ERE, grande parte das instituições e de professores tem recorrido às atividades síncronas no mesmo horário programado para as aulas que eram presenciais. Vários fatores podem ter levado a essa decisão, mas parece-me que a falta de conhecimento sobre as possibilidades dos recursos tecnológicos e do potencial da EaD levam a essa limitação na forma de interagir com os estudantes nas atividades desses cursos. Em minha opinião, essa não é uma boa escolha, pois a simples reprodução do modelo de aula presencial utilizando recursos tecnológicos, muitas vezes por um longo tempo, não contribui para uma boa interação entre professores e estudantes, que ficam desmotivados. Além disso, tem os problemas de conexão à internet e de disponibilidade de computadores no momento da aula. No entanto, temos que considerar que não havia uma previsão de que essas estratégias de ensino teriam que ser utilizadas emergencialmente, sem que todos passassem por cursos de formação em EaD e para o uso de TDIC, mesmo sabendo que o ensino remoto, bem como outros modelos estratégicos de EaD já poderiam ser incorporados nos cursos presenciais em algumas atividades antes da pandemia. Mas também sabemos que havia uma resistência, ou pelo menos uma desconfiança por parte de muitos professores em relação ao uso de TDIC em suas aulas.
A Portaria MEC 4059/2004 já autorizava as instituições de ensino superior a introduzir na organização pedagógica e curricular dos seus cursos presenciais reconhecidos a oferta de disciplinas a distância, integral ou parcialmente, desde que a oferta não ultrapassasse 20 % da carga horária do curso, desde que as avaliações fossem presenciais. Em 2016, essa Portaria foi revogada pela Portaria 1134, que estabeleceu uma nova redação para o tema, permitindo que as instituições de ensino superior que tivessem pelo menos um curso de graduação reconhecido poderiam introduzir até 20% da carga horária a distância nos cursos de graduação regularmente autorizados. A possibilidade de ampliar essa carga horária até 40% foi dada com a publicação da Portaria 1428/2018, que revogou a anterior e regulamentou a oferta de disciplinas com metodologia a distância, observando-se a legislação educacional que dispõe sobre atos autorizativos de funcionamento de instituições de ensino superior e de oferta de cursos superiores de graduação na modalidade presencial e a distância. No entanto, já em 2019, essa Portaria foi revogada com a publicação da que está vigente, Portaria 2117/2019. Essa última dispõe sobre a oferta de carga horária a distância até o limite de 40% em cursos de graduação presenciais ofertados por instituições de Educação Superior pertencentes ao Sistema Federal de Ensino, excluindo dessa oferta o curso de Medicina. No artigo 4º da Portaria há a determinação de que deverão ser incluídos métodos e práticas de ensino-aprendizagem que incorporem o uso de tecnologias de informação e comunicação para a realização dos objetivos pedagógicos, além de outras exigências. Mas, mesmo com a autorização legal e com a existência do CIAR para apoiar essas atividades acadêmicas, não houve uma adesão significativa dos cursos presenciais para o uso regulamentado dessa carga horária. O curso presencial de licenciatura em Artes Visuais da Faculdade de Artes (FAV/UFG) alterou o seu projeto pedagógico e criou cinco disciplinas a distância no seu currículo, tendo como base a Portaria MEC 2117/2019.
Feita a distinção, podemos dizer que há uma diferença entre a modalidade de educação a distância e o ensino remoto que atualmente estamos recorrendo emergencialmente para darmos continuidade aos cursos originalmente criados e formatados na modalidade presencial nesse período em que temos a necessidade de fazer um afastamento social em consequência da pandemia do coronavírus. Não houve uma transformação dos cursos presenciais em cursos a distância. Os cursos presenciais recorreram emergencialmente a algumas estratégias utilizadas nos cursos na modalidade a distância para dar continuidade ao processo de ensino e aprendizagem neste período de afastamento social imposto pela pandemia do coronavírus. É uma estratégia temporária que cumpre uma função importante de manter o vínculo dos estudantes com a universidade, com acesso ao conhecimento por meio remoto, preservando o seu direito à educação superior.
Essa realidade que nos foi imposta pelo contexto atual, foi bastante refletida e planejada na UFG para que o ensino fosse desenvolvido da melhor forma possível, garantindo acessibilidade e qualidade. Em atendimento aos protocolos de saúde e ao necessário isolamento social, a UFG suspendeu temporariamente as atividades presenciais para avaliar coletivamente as condições reais e construir um novo calendário acadêmico com alternativas viáveis que pudessem garantir a preservação da saúde da comunidade universitária. Algumas atividades essenciais foram mantidas seguindo os protocolos de saúde e segurança A reitoria criou um Grupo de Trabalho – GT ampliado de TDIC, com a participação da reitoria, de pró-reitores, secretários, diretores de órgãos, diretores de unidades acadêmicas, coordenadores de cursos e especialistas em EaD, que tiveram como atribuições: fazer um diagnóstico da viabilidade de expansão de projetos acadêmicos mediados por TDIC no Ensino Básico, na Graduação, na Pós-Graduação, na Pesquisa e Inovação, na Extensão e Cultura da UFG; realizar um mapeamento de estratégias e ações para a incorporação da EaD e das TDIC em projetos, práticas e atividades acadêmicas; e realizar um levantamento das condições de acesso dos estudantes, professores e técnico-administrativos da UFG às TDIC. Esse GT foi subdividido com a composição de subgrupos temáticos com a participação de representantes do CIAR em todos. O trabalho realizado pelo GT de TDIC subsidiou as decisões para as fases seguintes e outros grupos foram criados para acompanhamento e avaliação das atividades que estão sendo desenvolvidas desde a preparação, passando pela implantação do ERE e o seu desenvolvimento. O CIAR contribuiu com as discussões e com as ações encaminhadas em todos os GTs.
Assim que ocorreu a suspensão das atividades presenciais o CIAR alterou o seu Plano de Trabalho e ampliou a sua atuação para atender às demandas do ERE. Aproximadamente 65% das atividades desenvolvidas pelas equipes do CIAR em 2020 foram de apoio ao ERE. A Assessoria de Comunicação do CIAR, além do trabalho habitual, também atuou na alimentação, edição, atualização, planejamento e produção de conteúdo para o site UFG em Casa – dedicado a informações sobre o ERE. A produção de materiais pedagógicos e de orientação sobre as TDIC e o ERE produzidos pelo CIAR envolveram as equipes de produção de materiais, a equipe pedagógica e a assessoria de comunicação. A equipe pedagógica atuou fortemente em cursos de formação para professores, servidores técnicos administrativos e estudantes; na abertura de salas Moodle e oficinas para o bom uso desse ambiente virtual de aprendizagem; na criação de novos plugins no Moodle e de ferramentas de avaliação on-line. Muitas atividades desenvolvidas pelas pró-reitorias também tiveram o apoio do CIAR. Como diretora do CIAR participei de várias reuniões e Lives para falar sobre a EaD e o ERE.
Essa experiência com o ERE na UFG de algum modo nos traz novas perspectivas para um futuro próximo. Algumas barreiras sobre a EaD e sobre as possibilidades pedagógicas das TDIC foram superadas no que tange à insegurança de professores e alunos, que tiveram a oportunidade de experimentar outras formas de ensinar e aprender utilizando tecnologias digitais. O ERE permitiu a vivência na UFG de um ensino multimodal. Estamos avançando para uma educação híbrida, que já era preconizada há algum tempo, mas que não se reduz à junção das modalidades presencial e a distância sem planejamento e sem critérios. Deve haver uma conexão e um alinhamento entre as atividades desenvolvidas presencialmente com as atividades desenvolvidas a distância, pautadas em reflexões pedagógicas e adoção de metodologias que explorem mais a autonomia e liberdade dos estudantes, proporcionando, até certo ponto, uma personalização do ensino-aprendizagem (MILL e CHAQUIME, 2017). Mas esse é um assunto para ser debatido e aprofundado em outra oportunidade.
Referências
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BRASIL. MEC. Decreto nº 9057, de 25 de maio de 2017. Regulamenta o Artigo 80 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
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CARDOSO, Tatiana Medeiros. A aplicação das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) no ambiente escolar. Revista iTEC, v. 3, n. 3, dez. 2011. Disponível em: https://docplayer.com.br/16301747-A-aplicacao-das-tecnologias-da-informacao-e-comunicacao-tic-no-ambiente-escolar.html Acesso em out. de 2020.
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GOMEZ, M. V. Educação em rede: uma visão emancipadora. São Paulo: Cortez, 2004.
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MISKULIN, R.G.S. et al. Identificação e análise das dimensões que permeiam a utilização das tecnologias de informação e comunicação nas aulas de matemática no contexto da formação dos professores. Bolema, Rio Claro, v.19, nº 26, p. 103-123, 2006.
MOORE, Michael; KEARSLEY, Greg. Educação a distância: uma visão integrada. São Paulo: Thomson Learning, 2007.
Notas
1. Mestra em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas. Aposentada como professora Adjunta da Universidade Federal de Goiás (1994-2018). Atualmente ocupa o encargo de diretora do CIAR - Centro Integrado de Aprendizagem em Rede da UFG e a Coordenação Geral da UAB - Universidade Aberta do Brasil na UFG.