Wellington de Carvalho Arantes
wellingtoncarvalho0035@gmail.com

Matheus Henrique Ribeiro Freire
matheusfreiregeo@gmail.com

Pedro Arthur Crivello Neves Pereira
pedroarthur@discente.ufg.br

EIXO
Geografia e História

As redes sociais enquanto recurso didático para o ensino de geografia: a formação do pensamento geográfico nas práticas juvenis

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Resumo:Os estágios supervisionados do curso de licenciatura em Geografia instigam os futuros professores a identificarem problemáticas de variadas ordens nas escolas-campo em que estagiam. Este trabalho visa refletir sobre a dimensão prática das experiências de regência de estágio, lançando um olhar sobre as práticas juvenis dos alunos da educação básica e as potencialidades que elas oferecem para o ensino de Geografia, mais especificamente a partir do conteúdo cidade. As redes sociais Tik Tok e Instagram são populares entre os escolares, e, podem ser pensadas como recurso didático por possuírem finalidades de socialização entre os estudantes, são as linguagens presentes nelas que articulam entre o saber empírico e o conhecimento escolar. A metodologia é de base bibliográfica, com considerações prático-reflexivas. Considera-se que o professor precisa ter domínio do conteúdo geográfico, para que assim, execute uma sequência didática, como a proposta neste texto, colocando a experiência dos discentes na cidade como referência.

Palavras-Chave:Pensamento Geográfico. Linguagens. Redes sociais.

Introdução

A formação de professores de Geografia tem nos processos dos estágios supervisionados as condições que aproximam os licenciandos ao cotidiano da sala de aula, oportunizando a concretude de suas práxis, são esses conjuntos de vivências e desafios que estruturam este trabalho, constituindo assim, reflexões críticas sobre o fazer docente.

As recorrentes ausências de abordagens geográficas dos conteúdos trabalhados em sala de aula, que não só estão relacionados a uma dificuldade dos fundamentos teóricos da ciência, mas também à dificuldade de conectar esses conhecimentos ao cotidiano dos alunos e os restritos usos de instrumentos na efetivação de uma aprendizagem significativa e criativa em Geografia são os problemas que refletiremos sobre.

A carência de recursos didáticos é um dos empecilhos para o ensino de Geografia, principalmente para os conteúdos que fazem uso mais frequente da linguagem cartográfica. Nesta perspectiva, há outras linguagens, nas redes sociais, como Tik Tok e Instagram que podem se tornar aliadas ao ensino-aprendizagem, conectando-se ao cotidiano dos alunos e tornando-se metodologias ativas.

Toma-se como objetivos para este trabalho; apontar caminhos para uma abordagem geográfica de conteúdos de cidade usando as linguagens nas redes sociais (cartográfica, fotográfica e videográfica) com o cotidiano do aluno, e, a partir disso, propõe-se fomentar o protagonismo juvenil despertando o interesse pela Geografia com base no seu cotidiano na cidade e no uso das redes sociais.

Metodologia

A metodologia utilizada parte da experiência vivida e das anotações dos estágios curriculares obrigatórios 1 e 2, a partir dos quais definimos o tema, o problema e os objetivos deste trabalho, sendo também de natureza exploratória para buscar fontes que ajudassem a compreender como esse tema já vem sendo abordado pela Geografia escolar, se estruturando dentro de uma base bibliográfica qualitativa. A constituição metodológica do artigo ajuda a estabelecer e fundamentar os passos que tomamos ao elaborarmos um planejamento de sequência didática que possa ser efetivada em sala de aula.

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Resultados e discussões

Em nossas trajetórias de futuros licenciados em Geografia, nos deparamos com um intenso uso das redes sociais Tik Tok e Instagram, respectivamente, por parte dos discentes nas escolas. Partindo do pressuposto que essas tecnologias são condizentes, em partes, com o cotidiano desses sujeitos no que tange com aquilo que é interessante e dinâmico, mas também considerando que existe uma necessidade de filtragem das informações, pode-se dizer que nem tudo que é visto e apreciado pelos alunos na internet pode ser objeto de uma aula, precisando haver uma seleção e um planejamento para a mediação didática.

Segundo Vieira e Higino (2019, p. 16) “A falta de discernimento sobre as informações postas na rede criam uma ilusão de que tudo o que há na internet é verdade, de que qualquer coisa que foi publicada se trata de algo verídico”, pode-se corroborar com a ideia de que o cotidiano real não é completamente abarcado no cotidiano digital, com isso, o interesse pela aprendizagem de Geografia pode ser potencializado através do uso das redes sociais para a realização de uma conexão com o cotidiano dos escolares que precisa ser direcionada pela ação mediadora do professor, aproximando as linguagens aos conteúdos inerentes à disciplina.

Ao refletir sobre a dificuldade de ensinar o aluno a pensar, Soares (2013, p. 77) diz que “Cabe às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), através das suas mais recentes ferramentas, desequilibrar a tendência tradicional, proporcionando aos alunos uma visão crítica e articulada dos processos”, nesse ponto de vista, o autor indica que o professor pode se articular com as tecnologias digitais para que os alunos possam ser provocados a romper suas zonas de conforto e, assim, o uso das redes sociais como recurso didático se contornam como formas contemporâneas para o ensino de Geografia.

Por definição, uma rede social é uma forma de relação não hierárquica e horizontal na relação entre seus usuários (SOARES, 2013), elas abarcam muitos eixos conteudísticos conforme o usuário se comporta, portanto, para serem utilizadas no ensino de Geografia, mais especificamente pensando a cidade, elas precisam ter suas características gerais compreendidas para se pensar em suas potencialidades.

O Facebook é a rede social com mais usuários, porém, o Instagram se tornou um aplicativo de uso recorrente entre jovens em idade escolar, suas funcionalidades têm pontos em comum como o Tik Tok, mas se difere na possibilidade de publicação de fotos e pelo seu layout. O TikTok está entre as dez mídias sociais mais acessadas no mundo e já atinge mais de 800 milhões de usuários, sua principal característica é o compartilhamento de vídeos dinâmicos (VIEIRA e HIGINO, 2019).

Metodologicamente, em uma aula de Geografia, as linguagens propostas pelas plataformas digitais (Instagram e TikTok), podem ser usadas como meio de apresentação e organização de fotos e vídeos produzidos pelos alunos que serão publicados no perfil social da escola, tendo enquanto recorte espacial a Região Metropolitana de Goiânia (RMG) de modo que as duas plataformas se integrem na problematização, sistematização e sintetização das aulas.

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O professor tem o desafio não só de passar o conteúdo, mas sim de fazer que o aluno aprenda verdadeiramente aquilo, para que realmente internalize o conhecimento e não use ele só para “passar na prova”. Mas como é possível ensinar o aluno permitindo que ele não só absolva o conteúdo como o pense de maneira critica a fazê-lo refletir sobre a realidade em que vive? Em uma perspectiva construtivista, se usa o universo do aluno para ensina-lo estabelecendo uma relação de dialogicidade entre sujeito e objeto (SANTOS, MENEZES, COSTELLA, 2018), o que acaba gerando interesse pelos estudos.

Especificamente para o estudo de cidade, no contexto da disciplina escolar que visa a compreensão de sua concretização, há um requerimento de sua identificação pelo aluno, que somente após se entender como parte dela poderá ter as bases para compreender as relações no mundo a partir de sua experiência urbana, corroborando com isso, Bento (2011, p.78) aponta que “a cidade é a materialização dos modos de vida, é o espaço simbólico, seu estudo permite o desenvolvimento do sentido global e local na formação de habilidades necessárias na realidade cotidiana.” Logo, para chegar até o aluno, o professor deve estar atento para que as redes sociais não sejam vistas como distrações em sala de aula e sim como ferramentas mediadoras entre as experiências na cidade e os momentos pedagógicos.

Ao pensar o ensino do espaço urbano, é fundamental que o professor e o aluno vivam e conheçam sua cidade para que entendam suas características. Arrais (2017) analisa a cidade a partir de diferentes abordagens, e destas, podemos citar dois conceitos que se encaixam na ótica das redes sociais; a paisagem e o cotidiano.

O modo da paisagem pretende olhar recortes da cidade que levam em conta o ponto de vista de cada morador, para Arrais (2017, p.84) “paisagem é, sempre, vista por um indivíduo localizado em um sítio específico, influenciado pelas dimensões econômicas, políticas e culturais da vida cotidiana”. O autor, inclusive, fala da fotografia que recorta um momento do cotidiano da cidade, isolado de outros momentos, isso nos leva a crer que é assim que vemos a cidade em redes sociais de fotos e vídeos como o Instagram e o Tik Tok, tendo em vista que um vídeo são 24 fotos em um frame por segundo. Tratasse, portanto, das linguagens fotográficas e videográficas que podem revelar aspectos da paisagem a partir da percepção de cada indivíduo.

O modo do cotidiano engloba vários momentos que formam uma experiência, segundo Arrais (2017, p. 105) O cotidiano está “nas maneiras de apropriação dos espaços públicos e privados”, isso está relacionado com uma das intenções mais recentes das redes socias, que é a formação de um Vlog pessoal diário por meio de stories, no qual os aspectos do dia a dia podem se tornar públicos. Para se ver a cidade pela ótica do cotidiano nas redes sociais, com base na proposta metodológica deste trabalho, a linguagem cartográfica aparece como meio de localizar, relacionar e comparar os trajetos cotidianos dos estudantes na cidade. Entretanto, deve-se atentar que apenas uma parte do conteúdo visual das redes sociais tem a ver com a cidade e que seus usuários não o registram de forma intencional a pensar geograficamente.

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Cavalcanti (2014) apresenta propostas para o ensino de cidade (metrópoles) com base em sua sequência didática para o ensino de Geografia. Relacionaremos essa autora com o uso das redes sociais, de forma em que o Tik Tok e o Instagram, primeiramente, e as ferramentas de geolocalização (Google Maps e Google Earth), secundariamente, sejam utilizadas como recursos didáticos. O tema pensado na elaboração da proposta foi a mobilidade na RMG.

A seguir, apresenta-se no quadro 1, as indicações gerais da proposta com base nas metodologias de oficina e trabalho de campo, sendo adaptável à outras metodologias, que, a partir de recortes temáticos específicos como; mobilidade, acesso à cidade, componentes físico-naturais, arquitetura e entre outros, pode ser usada como base para o ensino de cidade.

Quadro 1 - Proposta de encaminhamento metodológico para ensinar sobre a cidade usando as redes sociais – 2022
Principais etapas
Problematização
  • Propor que os alunos façam, livremente, vídeos (com fotos) de até 3 minutos, do caminho percorrido de casa até a escola por meio do Tik Tok.
  • Apresentar orientações com exemplos e direcionar o olhar do aluno para os fenômenos que se materialização no espaço.
  • O uso criativo de filtros, estar ou não no vídeo, tipo de sonorização a ser utilizada, inserir escrituras, uso de imagens e recortes de gravações posteriormente unidas ficam a critério de cada aluno.
  • Os vídeos podem ser postados ou não, mas devem ser encaminhados para o professor, para que ele planeje a próxima etapa.
Sistematização
  • Ensinar o passo a passo sobre o uso de ferramentas de geolocalização.
  • Com base no vídeo feito para o Tik Tok; O aluno deve cartografar o trajeto de casa até a escola por meio dos App’s de geolocalização.
  • Intervenção didática do professor a partir das problemáticas diagnosticadas nos vídeos com base no tema eleito para a(s) aula(s).
  • Atividade de campo em pontos estratégicos da cidade, com roteiro prévio e produção de novos vídeos individuais para o Tik Tok.
Sintetização
  • Interligar os momentos de produção de vídeo e mapeamento fazendo uma interface entre a realidade percebida e o conteúdo escolar.
  • Seleção dos 10 ou 15 segundos mais pertinentes dos vídeos de cada estudante para elaboração de dois vídeos síntese para o Instagram.
  • Diferenciar o vídeo síntese inicial do vídeo síntese do trabalho de campo.

Fonte: Alterado de Cavalcanti (2014).



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A função da produção dos vídeos na problematização é de comparar as diferentes realidades que cada sujeito enfrenta até o espaço comum da sala de aula, pode ser um meio de socialização das experiências, já os vídeos do trabalho de campo servem como meio de entender como cada indivíduo percebe um mesmo fenômeno de formas distintas. A função do Tik Tok não é necessariamente a divulgação dos vídeos, mas sim o uso de suas ferramentas de edição.

Na sistematização, que significa “elencar elementos do conceito e discuti-los em consonância com o tratamento do tema (PORTELA, 2017, p. 15)”, o professor deve fazer uma apresentação do conteúdo escolar, que de alguma forma, deve dar respostas aos problemas encontrados nos vídeos feitos para o Tik Tok.

Para a sintetização da(s) aula(s), a elaboração do vídeo síntese com os momentos mais representativos do caminho de casa de cada aluno pode compor um mural sobre as diferentes nuances da cidade no perfil do Instagram da escola ou da turma, podendo mostrar de um lado da tela os momentos captados nos vídeos, e do outro lado, o percurso cartografado, o qual cada discente percorreu para captura-los. O vídeo síntese do trabalho de campo pode mostrar um mapa com o percurso comum de todos de um lado da tela, e do outro, os diferentes registros paisagísticos que cada um considerou mais importante. A função dos Instagram é divulgar os vídeos produzidos para a comunidade escolar.

As redes sociais e as linguagens se complementam em um momento que prender a atenção do aluno de forma orgânica e ministrar os conteúdos geográficos precisam se aliar, pois, separadamente um se torna exemplo de distração e divertimento, e, o outro (as linguagens) não conseguem abarcar a representação de mundo que são capazes quando são meios e não fins. Portanto, não é a rede social em si que ensina ou detém os conteúdos de ensino, são as linguagens com a intervenção do educador que as geografizam e direcionam o olhar dos discentes a uma formação de seus pensamentos geográficos com base em suas práticas juvenis.

Este trabalho nos propõe, ainda, a refletir sobre mais um desafio para um ensino democrático e transformador, pois, ao mesmo tempo que trabalhar com redes sociais pressupõe uma aproximação com o universo dos alunos, ainda é uma ação de trabalho que não abarca um grupo minoritário de renda muito baixa ou muito leiga, que pode não saber usar ou possuir celular, portanto, existe a possibilidade da execução desta proposta metodológica em grupo, de forma a minimizar os efeitos das disparidades entre os discentes.

Referências

ARRAIS, T. A. Seis modos de ver a cidade. Cânone editorial, Goiânia 2017.

BENTO, I. P. Estudar a cidade e seus sujeitos para aprender geografia. in MORAIS, E. M. B. de.; CAVALCANTI, L. de S. (Org). A cidade e seus sujeitos. Editora Vieira, Goiânia, p. 89 – 108, 2011.

CAVALCANTI, L. de S. A metrópole em foco no ensino de Geografia: o que/para que/para quem ensinar? In: PAULA, F.M.A.; CAVALCANTI, L.S.; SOUZA, V.C. Ensino de Geografia e Metrópole. Goiânia: Gráfica e Editora América, p. 27 – 41, 2014.

PORTELA, M. O. B. Propostas para o ensino de cidade: Problematizar, sistematizar, sintetizar e significar. In OLIVEIRA, K. A. T. de; PIRES, L. M. (Org). Ensinar sobre a cidade. Goiânia: Editora espaço acadêmico, p. 13 – 29, 2017.

SANTOS, L. P. dos; MENEZES, V. S.; COSTELLA, R. Z. Piaget pedagogo? A criança, o espaço geográfico e a epistemologia do professor. In: Itinerarius reflectionis. Volume 14, n. 2, p. 1 - 18, 2018.

SOARES, M. I. A tecnologia Web e o ensino da geografia: ser professor com mediação digital. Tese (Doutorado em Geografia). Universidade de Lisboa - Portugal, 2013.

VIEIRA, C. O.; HIGINO, V. L. F. Uso da tecnologia no ensino da geografia na educação básica: o Instagram como instrumento metodológico. Universidade Estadual da Bahia, Jacobina – BA, 2019.

Notas

1. Disponível em: https://phet.colorado.edu/pt_BR/. Acesso em: 29 jun. 2021.