Henrique Mendes da Silva
henriquemendes_bio@hotmail.com

Wender da Silva Caixeta
wendersilvacaixeta@gmail.com

EIXO
Educação Ambiental

Percepções socioambientais de estudantes do ensino fundamental: o caso do rio Santa Catarina em Vazante/MG

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Resumo:Apresenta resultados parciais da pesquisa em andamento. Pretende-se verificar as percepções socioambientais de estudantes de uma escola pública do Ensino Fundamental referente ao Rio Santa Catarina, localizado em Vazante/MG. O socioambiente corresponde a interação mútua entre sociedade e ambiente natural. A Educação Ambiental enquanto dimensão pedagógica contribui com novos olhares para esta dimensão socioambiental. Nesta fase inicial da pesquisa, aplicamos um questionário a 44 estudantes de 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de Vazante/MG. Os dados iniciais apontam que grande parte do alunado desconhece os problemas socioambientais relacionados ao Rio Santa Catarina, sua importância para a comunidade local e responsabilizam apenas a população que mora ao entorno como responsável pela problemática socioambiental. Quanto as ações pedagógicas realizadas pela escola, percebe-se uma descontinuidade no planejamento, além de uma disciplinaridade envolvendo a temática socioambiental, relacionada em conteúdos de Ciências, Geografia e História, apenas.

Palavras-Chave:Educação Ambiental. Percepções socioambientais. Rio Santa Catarina.

Introdução

A relação entre sociedade e natureza tem sido compreendida a partir de perspectivas que integram este dois campos nos quais seres humanos e natureza estão em uma relação mútua formando um campo socioambiental (CARVALHO, 2012). Nesta interação diferentes saberes são construídos para além de campos paradigmáticos, conforme nos traz Leff (2009).

Nesse sentido, a Educação Ambiental (EA) como dimensão pedagógica que discute as relações socioambientais, surge de um movimento ecologista que passou a ser influenciado por movimentos de contracultura a partir dos anos 1950 (CARVALHO, 2004; TREIN, 2009; CARVALHO, 2012). Numa perspectiva mais crítica, Layrargues e Lima (2014) discutem que a Educação Ambiental Crítica interessa discutir o socioambiente em sua complexidade. A partir desta perspectiva, a escola assume um espaço de diálogo importante para discutir diferentes temáticas socioambientais (PESSANO et al., 2014; MARTINS; SÁNCHEZ, 2020) que estão associadas a realidade local de cada instituição (BIASOLI, 2015), como é o caso deste estudo realizado a partir de problemas socioambientais relacionados ao Rio Santa Catarina, localizado em Vazante – MG.

O Rio Santa Catarina é a principal fonte de abastecimento de água e dessedentação animal do município de Vazante, Minas Gerais. A área de drenagem do Rio é cerca de 686,5 km2 e compreende municípios mineiros de Lagamar, Coromandel, Arrenegado e Guarda Mor, com atividades relacionadas ao setor agropecuário ocupando cerca de dois terços dessa área. Além disso, o Santa Catarina sofre diversos outros impactos ambientais como assoreamento e a contaminação do solo e da água por agrotóxicos e fertilizantes agrícolas. Todos esses impactos afetam a qualidade e quantidade de água do Rio Santa Catarina. Devido à importância dele para o município, foi instituído o Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos que estabeleceu a Microbacia do Rio Santa Catarina como zona de preservação.

Além disso, o Plano Diretor de Vazante – MG apresenta diretrizes de política ambiental municipal que visam a promoção da EA de forma contínua e integrada para o desenvolvimento de políticas públicas sustentáveis, tais como a proteção e recuperação do meio ambiente, a redução da poluição e degradação ambiental, o trabalho de informação à população a respeito dos serviços de saneamento e preservação dos recursos hídricos (VAZANTE, 2020).

Diante do exposto, este estudo, ainda em andamento, pretende verificar as percepções socioambientais de estudantes do Ensino Fundamental referente ao Rio Santa Catarina, em uma escola da rede estadual de Vazante/MG, como ferramenta promotora para ações de EA na referida escola.

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Metodologia

Esta pesquisa, de natureza qualitativa, exploratória e que se configura como uma pesquisa de campo, ainda está em andamento, tendo seu início no primeiro semestre do ano de 2022 na Escola Estadual “Carolina Silva” instituição pública localizada em uma região de vulnerabilidade social do município de Vazante/MG. A seleção da escola foi pensada de forma estratégica por possuir características e perfis diferentes em termos de estudantes, professores e localização geográfica em relação ao Rio Santa Catarina, que fica a uma distância de 6 km da unidade educacional.

Incialmente, aplicamos um questionário contendo questões abertas e fechadas a 44 estudantes do 6º ao 9º ano desta instituição. O questionário busca coletar informações da realidade dos participantes envolvendo questões referentes a quatro aspectos distintos do Rio Santa Catarina: 1) conhecimento geral dos alunos sobre o Rio Santa Catarina; 2) envolvimento dos estudantes e da escola com questões socioambientais relacionadas o Rio Santa Catarina; 3) Importância do Rio Santa Catarina para o município e os problemas ambientais existentes na área e; 4) Reconhecimento geográfico da bacia hidrográfica na qual o Rio Santa Catarina está inserido.

Os dados produzidos e que já foram analisados partiram de uma análise de conteúdo proposta por Bardin (2011).

Resultados e Discuções

Nesta seção, apresentamos os resultados parciais referentes à análise dos questionários já aplicados. Os 44 estudantes participantes da pesquisa tinham entre 10 e 14 anos, apresentando uma idade média de 12 anos. Aproximadamente dois terços dos estudantes são meninos, representando 64,9% dos participantes e 35,1% meninas.

Na análise dos dados, verifica-se que mais da metade dos estudantes participantes afirmam não conhecer o Rio Santa Catarina, nem o visitaram pessoalmente. Esse resultado diverge daquele encontrado por Silva (2020), onde a maioria dos estudantes do ensino médio de Vazante afirmaram ter conhecimento sobre este rio e outros da região. Essa divergência demonstra que discussões aplicadas à realidade socioambiental investigada pode não ocorrer de forma sistêmica na escola ao longo de toda a educação básica dos estudantes.

Ressalta-se que muitos estudantes pesquisados são filhos de agricultores e trabalhadores rurais, os quais vivem mais próximos ao Rio Santa Catarina. A maioria dos estudantes (76,9%) que afirmaram conhecer o Rio Santa Catarina cursam 7º ano e conheceram o Rio por visitarem com os pais (58,8%) ou com a escola (23,5%).

Quanto às ações realizadas pela escola em relação aos problemas socioambientais e visitas técnicas a este ambiente investigado, os estudantes do 8° ano foram aqueles que mais visitaram o ambiente. Por outro lado, nenhum dos estudantes do 6° ano visitaram o Rio Santa Catarina por meio de iniciativa da instituição escolar. A proximidade da escola ao Rio Santa Catarina pode também ter favorecido o desenvolvimento de atividades junto ao respectivo ambiente. De acordo com Pessano et al.(2014), isso também foi observado em seus estudos ao afirmarem que pode ocorrer uma associação positiva entre a distância das escolas em relação ao Rio, uma vez que instituições mais próximas desenvolvem mais atividades junto a ele do que àquelas mais distantes. Entretanto, o fato de que a maioria dos estudantes que visitaram o ambiente ser 7° ano demonstra que mesmo na escola, as visitas não ocorrem de forma planejada e contínua ao longo do Ensino Fundamental dando importância à participação de toda comunidade escolar, uma vez que menos de 25% dos estudantes afirmaram que a escola já realizou alguma atividade com temática relacionada ao Rio Santa Catarina.

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Além disso, apesar do Rio Santa Catarina ser de jurisdição municipal, nenhum estudante declarou ter conhecimento de ações feitas pelo poder público municipal para valorização deste recurso natural. Esse fato evidencia a inobservância da prefeitura em relação ao Plano Diretor do próprio município. Em muitos casos, os próprios gestores públicos não possuem um conhecimento aprofundado sobre os recursos hídricos existentes na região (SOARES, 2018).

Nenhum dos estudantes participaram de atividades envolvendo a avaliação dos problemas ambientais nem sobre a qualidade e quantidade da água do Rio Santa Catarina. Isso demonstra que as temáticas relacionadas aos impactos socioambientais não foram desenvolvidas eficientemente em nenhuma turma da escola.

Dado importante refere-se a abordagem disciplinar na qual temáticas socioambientais relacionadas ao Rio Santa Catarina estão envolvidas, uma vez que a grande parte dos estudantes afirmaram que assuntos inerentes são trabalhados principalmente nas disciplinas de Ciências e, em menor frequência, Geografia e História. Nenhum outro conteúdo/disciplina foi citado pelos estudantes.

Os estudantes também foram questionados sobre a importância do Rio Santa Catarina para o município, os principais problemas socioambientais enfrentados por ele e a percepção do estudante enquanto sujeito social capaz de modificar a realidade . Quase 90% dos estudantes declararam que o Rio Santa Catarina tem um papel importante para o município de Vazante. A principal relevância atribuída ao Rio foi o abastecimento de água da região (51,3%). Isto denota a relação direta entre a existência dos elementos naturais como função de satisfazer a existência humana, uma perspectiva utilitarista.

Em relação aos problemas socioambientais existentes no Rio Santa Catarina, apenas 20,5% dos estudantes afirmaram conhecê-los. Houve uma diferença significativa entre as turmas, com mais da metade dos estudantes do 7º ano afirmando conhecer os problemas socioambientais em comparação com apenas 11% dos estudantes de outras séries.

Os principais problemas citados entre os estudantes que afirmaram conhecê-los foram o desmatamento das margens, poluição por defensivos agrícolas e esgoto, assoreamento do leito do rio, erosão de suas margens e instalação de barramentos. Esses problemas condizem com a realidade do lugar e o desmatamento das matas ciliares é o principal problema ambiental enfrentado pelo Rio Santa Catarina (SILVA, 2020).

Apenas cerca de 33% dos estudantes indicaram saber quem eram os responsáveis por causar os problemas socioambientais existentes no Rio Santa Catarina. Os principais atores citados como responsáveis por estes ao longo do Rio foram a população em geral, a atual matriz produtiva, os proprietários de indústrias, e os poderes públicos. Silva (2020) também observou uma responsabilização da população em geral, entretanto, os estudantes pesquisados responsabilizaram principalmente a população residente no entorno do Rio analisado.

Mesmo desconhecendo os problemas socioambientais relacionados ao Rio Santa Catarina, 79,5% dos estudantes afirmam poder contribuir para melhorar as condições locais, citando como opção de ação, principalmente, a economia de água.

Apesar da importância da EA envolver temáticas socioambientais inerentes a realidade na qual os indivíduos se inserem, nota-se que existe uma falha generalizada na inserção dessa temática no ambiente escolar (PESSANO et al., 2014).

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Os aspectos mencionados anteriormente resultam em uma baixa percepção socioambiental dos estudantes quanto a importância de recuperar área degradadas e preservar recursos naturais vitais para a existência humana, como a água, além do reconhecimento de fatores mais amplos como sociais e econômicos que estão presentes neste quadro. A implementação de atividades de intervenção costuma melhorar rápida e significativamente as concepções dos alunos sobre questões ambientais (PESSANO et al., 2014).

Portanto, para uma eficaz integração da EA nos currículos dessas escolas seria preciso envolver estudantes e professores em atividades pedagógicas inovadoras, que visem a preservação de recursos naturais e contribuam para o estabelecimento de ações sustentáveis a partir de uma perspectiva crítica que compreenda o socioambiente em um contexto multifacetado. A EA precisa ser promovida de forma interdisciplinar e contextualizada com os conteúdos já lecionados em sala de aula. A incorporação dos rios como temática ambiental dinamiza as práticas pedagógicas e torna o processo de aprendizagem mais instintivo e interessante para os estudantes.

Referências

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2011.

BIASOLI, S. A.. Institucionalização de políticas públicas de educação ambiental: subsídios para a defesa de uma política do cotidiano. 2015. 235f. Tese (Doutorado em Ciências). Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2015.

CARVALHO, I. C. de M. Educação Ambiental Crítica: nomes e endereçamentos da educação. In: LAYRARGUES, P. P. (Coord.). Identidades da educação ambiental brasileira. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2004.

LAYRARGUES, P. P; LIMA, G. F. da C.. As macrotendências político-pedagógicas da educação ambiental brasileira. Ambiente & sociedade, v. 17, p. 23-40, 2014.

LEFF, E. Complexidade, Racinalidade Ambiental e Diálogo de Saberes. Revista Educação & Realidade, 2009.

LOUREIRO, C. F.; TORRES, J. R. Educação Ambiental: dialogando com Paulo Freire (orgs). São Paulo: Cortez Editora, 2014, p. 155-178.

MARTINS, P.; SÁNCHEZ, C. Educação ambiental escolar: caminhos e cruzamentos rumo à educação ambiental crítica. Educazione Aperta, n. 7, 2020.

PESSANO, E. F. C., DÁVILA, E. da S., SILVEIRA, M. G. S., PESSANO, C. L. A., FOLMER, V., PUNTEL, R. l . Percepções socioambientais de estudantes concluintes do ensino fundamental sobre o rio Uruguai. Revista Ciências & Ideias, 4(2), 61-84, 2014.

SILVA, H. M da. Atividade investigativa no ensino de biologia: aplicação de protocolo de avaliação rápida (pars) no diagnóstico ambiental e captura macroinvertebrados aquáticos. Revista de Ensino de Biologia da SBEnBio, p. 838-861, 2021.

SOARES, J. R. O (não) cumprimento dos Termos de Ajustamento de Conduta e a contribuição da Educação Ambiental em áreas de preservação permanente no município de Palmeira das Missões-RS.(Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, 121 p.; 2018

TREIN, E. S. A Educação Ambiental Crítica: crítica de quê?. Revista Contemporânea de Educação, vol. , n. 14, 2012.

VAZANTE. Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos do município de Vazante-MG, novembro de 2020.

Notas

1.Doutorando em Educação em Ciências na Universidade de Brasília (UnB).

2.Doutorando em Educação em Ciências na Universidade de Brasília (UnB).