Mateus de Almeida Ventura
matteusufg@gmail.com

Rosane Rocha Pessoa
pessoarosane@gmail.com

EIXO
Letras

Problematização de Ideologias Linguísticas de Professoras de Inglês

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Resumo: Este estudo é resultado de uma pesquisa de iniciação científica, realizada com professores/as de inglês participantes do Grupo de Estudo de Professores/as de Língua Inglesa de Goiás (GEPLIGO). O objetivo da pesquisa é analisar ideologias linguísticas e as concepções de língua/linguagem desses/as participantes, com base em seus relatos sobre suas práticas pedagógicas. Em específico, buscamos discutir: a) o uso de inglês e português pelos/as professores/as participantes do GEPLIGO; b) as percepções dos/as professores/as sobre o uso do inglês e português no GEPLIGO; c) os relatos sobre as práticas linguísticas e educacionais de três participantes focais do GEPLIGO. Os instrumentos de pesquisa utilizados foram participação e gravação de três encontros do GEPLIGO, notas de observação, aplicação de questionários, entrevistas e análise de portfólios. Da análise desse material, identificamos quatro ideologias linguísticas, sendo duas delas (ideologia do falante nativo e do inglês padrão) mais opressoras e as outras duas (translinguismo e pluralidade de repertórios linguísticos) mais críticas, percebemos que existem movimentos de aproximação e afastamento das professoras em relação a essas ideologias e que, em relação ao ensino de inglês com o uso de tecnologias, novas perspectivas mais críticas foram observadas.

Palavras-Chave: Ideologia linguística. Ensino de inglês. Tecnologias.

Introdução

Este estudo é resultado de uma pesquisa de dois anos de Iniciação Científica que foi realizada com professores/as de inglês de escolas públicas que participam do Grupo de Estudo de Professores/as de Língua Inglesa de Goiás (GEPLIGO), na cidade de Goiânia. Através dela, buscou-se estudar e problematizar ideologias linguísticas, ou seja, “a expressão, explícita ou implícita, das concepções de um grupo sobre línguas” (CÁCERES, 2014, p. 109), que se pautam em interesses morais e políticos (IRVINE, 1989).

A pesquisa foi realizada em duas etapas. Na primeira delas, de agosto/2018 a julho/2019, buscamos problematizar as ideologias linguísticas dos/as professores/as de língua inglesa. Aceitaram participar dessa etapa 9 professores/as de escolas públicas que faziam parte do grupo. Por conta da grande quantidade de material empírico gerado, decidimos continuar a pesquisa em uma segunda etapa, realizada de agosto/2019 a setembro/2020. Nela, levamos em consideração não apenas o que já tínhamos observado na primeira etapa, mas decidimos também ampliar os estudos das ideologias linguísticas através da análise dos relatos das práticas de três participantes focais do grupo.

Assim, o objetivo geral desta pesquisa é analisar ideologias linguísticas, com base nas percepções dos/as professores/as participantes do GEPLIGO, bem como concepções de língua/linguagem desses/as participantes, com base em seus relatos sobre suas práticas pedagógicas. Mais especificamente buscamos analisar: a) o uso de inglês e português pelos/as professores/as participantes do GEPLIGO; b) as percepções dos/as professores/as sobre o uso do inglês e português no GEPLIGO; c) os relatos sobre as práticas linguísticas e educacionais de participantes focais do GEPLIGO.

Para o desenvolvimento e fundamentação da pesquisa recorremos a diversos estudos. Dentre eles, os de Blommaert (2014), Signorini (2008) e Cáceres (2014) são muito úteis para o entendimento e conceituação do termo “ideologias linguísticas” e são a base para que as demais discussões da pesquisa sejam feitas.

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Outros estudos como os de Holliday (2014), Oliveira (2014) e Garcia e Wei (2014) trazem importantes reflexões a respeito de algumas ideologias linguísticas mais específicas. Por meio desses estudos, é possível observar e problematizar várias ideologias linguísticas, como a de que, “para falar bem uma língua estrangeira é preciso falar como um nativo” ou de que é preciso falar inglês padrão, pois esse que é o correto. Ideologias como essas atravessam o processo de ensino e aprendizagem de inglês e acabam oprimindo as verdadeiras identidades de alunos/as e professores/as nesse processo.

Este estudo é de grande relevância por encorajar novas perspectivas no ensino de línguas estrangeiras, visando trazer diversas reflexões e problematizações que possibilitem um repensar de todo o processo de ensino e aprendizagem de línguas, tanto em relação à forma de ensino, quanto ao posicionamento dos sujeitos envolvidos nesse processo. Quando se fala em ensino mediado por tecnologias esse repensar também se faz necessário. Assim, um outro aspecto importante dessa pesquisa é o de que, a partir dos relatos de práticas pedagógicas das professoras, que abordam o uso de tecnologia em algumas atividades desenvolvidas por elas, foi possível identificar alguns aspectos nessas práticas que contribuem para que esse ensino mediado por tecnologias seja menos opressor. Portanto, nesse estudo, além de problematizar as ideologias linguísticas e as práticas pedagógicas das professoras, discutimos o processo de ensino/aprendizagem de inglês mediado por tecnologias, tendo em vista a adoção de perspectivas menos opressoras e que valorizem mais a identidade de alunos/as e professores/as.

Metodologia

Essa pesquisa focaliza situações reais de interação e se caracteriza como interpretativista. Ela também se insere na perspectiva qualitativa. O processo de geração do material empírico foi diferente em cada uma das duas etapas da pesquisa.

Na primeira delas os instrumentos de pesquisa utilizados foram a participação e gravação de três encontros do GEPLIGO, notas de observação desses encontros, aplicação de questionário e entrevista. Utilizando esse material empírico gerado anteriormente como suporte, na segunda etapa, aplicamos um novo questionário, uma nova entrevista e analisamos os portfólios desenvolvidos pelas professoras para o GEPLIGO.

É importante ressaltar que as duas etapas se complementam, tendo em vista que a primeira teve como foco apenas problematizar e descobrir quais ideologias linguísticas estavam presentes nas ideias/percepções dos/as professores/as em relação a situações dentro e fora do GEPLIGO.

Já na segunda etapa, procuramos juntar e comparar essas ideologias linguísticas presentes nas percepções das professoras com o relato de suas práticas linguísticas e educacionais para entender se ambas as situações se complementam ou se existe contradição entre elas.

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Resultados e discussões

A partir da leitura de vários estudos relacionados ao tema da pesquisa e da análise do material empírico gerado, pudemos chegar a algumas conclusões. A primeira delas é que o material empírico nos mostrou quatro ideologias linguísticas: 1. Ideologia do/a falante nativo/a; 2. Ideologia do inglês padrão; 3: Translinguismo; 4. Pluralidade de repertórios linguísticos. As duas primeiras são consideradas mais opressoras e as duas últimas mais críticas. Além disso, foi possível identificar que existem movimentos de aproximação e afastamento das professoras e de suas práticas em relação a essas ideologias linguísticas. Foi perceptível também que, apesar de as ideologias linguísticas opressoras estarem presentes em suas falas e práticas de sala de aula, de modo geral, as identidades das professoras e dos/as alunos/as se tornam muito evidentes e elas tentam sempre trazer a realidade/gostos/necessidades dos/as alunos/as para a sala de aula.

Outro ponto muito importante é que duas, das três participantes focais da pesquisa, utilizam tecnologias digitais no processo de aprendizagem do inglês, com alunos/as de escolas públicas. Além disso, nos relatos de atividades a que tivemos acesso, foi perceptível que a utilização dessas tecnologias aconteceu de forma que elas conseguiam abranger e valorizar as identidades e realidades vivenciadas pelos/as estudantes, sem que essas tecnologias fossem utilizadas apenas para a reprodução e reforço de ideologias linguísticas opressoras, como muitas vezes acontece no ensino de inglês.

Portanto, a partir dos relatos das práticas das professoras, foi possível perceber não apenas ideologias linguísticas opressoras que circundam o ensino de língua inglesa como também perspectivas menos opressoras no ensino de inglês mediado por tecnologia.

Referências

BLOMMAERT, J. Ideologias linguísticas e poder. Trad. Ive Brunelli. In: SILVA, D.N; FERREIRA, D.M.M; ALENCAR, C.N. (Orgs.). Nova pragmática: modos de fazer. São Paulo: Cortez, p. 67-77, 2014.

CÁCERES, G. H. Políticas linguísticas em uma escola pública de ensino médio e tecnológico: a oferta de línguas estrangeiras. Trabalhos em Linguística Aplicada. Campinas,v. 1, n. 53, p. 103-129, 2014.

GARCÍA, O.; WEI, L. Translanguaging: Language, Bilingualismand Education. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2014.

HOLLIDAY, A. R. Native Speakerism. Canterbury Christ Church University (CCCU). p. 1-5, 2014. Disponível em: http://adrianholliday.com/wp-content/uploads/2014/01/nism-encyc16plain-submitted.pdf. Acesso em: 16 Jul. 2019.

IRVINE, J. T. When talk isn’t cheap: Language and political economy. American Ethnologist, v. 16, n. 2, p. 248-267, 1989.

OLIVEIRA, L. A. Oito questões teóricas básicas. In: ______. Método de Ensino de Inglês: teorias, práticas, ideologias. 1. ed. São Paulo: Parábola, p. 21-71, 2014.

PINTO, J. P. Ideologias linguísticas e a instituição de hierarquias raciais. Revista ABPN, v. 10, p. 704-720, 2018.

SIGNORINI, I. Metapragmáticas da língua em uso: unidades e níveis de análise. In: ______. Situar a língua[gem]. São Paulo: Parábola, p. 117-147, 2008.