Luan do Carmo da Silva
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EIXO
Educação e Formação de Professores

Implicações da Pandemia de Covid-19 no Ensino Técnico-Integrado no IFB/campus Riacho Fundo – Primeiros Olhares

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Resumo:O texto objetiva averiguar encaminhamentos tomados por parte dos Colegiados de Ensino Médio do Campus Riacho Fundo do IFB, os quais congregam docentes dos cursos técnicos integrados de Cozinha e Hospedagem, no que se refere aos procedimentos de ensino assumidos com a adoção do chamado ensino remoto e quais os impactos destes no processo de ensino-aprendizagem no primeiro ano dos referidos cursos. Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório e com resultados ainda preliminares. De toda forma, entende-se que no atual contexto, os horários de planejamento coletivo dos docentes e a busca por práticas cada vez mais interdisciplinares e desafiadoras para os alunos são imprescindíveis para a obtenção de melhores resultados em relação às aprendizagens.

Palavras-Chave:Ensino remoto, Covid-19, educação profissional, ensino integrado.

Introdução

Apesar do forte discurso negacionista acerca dos impactos da pandemia na sociedade brasileira, é inconteste que a Covid-19 alterou os rumos do cotidiano nas diferentes esferas da vida no Brasil e no mundo. Davis (2020, p. 5) afirma que “a Caixa de Pandora está aberta, e o nosso implacável sistema econômico está tornando tudo muito pior”, numa evidente alusão ao processo de pauperização da população mundial frente aos avanços do neoliberalismo.

De acordo com o autor, a política econômica em voga tem tornado o combate a esse e a outros surtos pandêmicos um movimento quase que sem resultado em determinadas porções do globo. Apartar a questão econômica de outros enlaces da vida cotidiana não é o melhor caminho para alcançar sucesso frente a um inimigo invisível a olho nu, mas potente o suficiente para superlotar leitos hospitalares e levar a óbito considerável contingente populacional em curto intervalo de tempo.

Da mesma maneira, entende-se que não é possível desvincular a questão educacional de outros espectros do cotidiano. Uma vez que a escola é constituída por sujeitos sócio-históricos concretos, com diferentes trajetórias de vida e percursos espaciais, não é possível “pinçar” apenas a pauta educacional desses sujeitos, isolá-la e desenvolver atividades como se o cotidiano não fosse impactado direta e indiretamente pela pandemia.

É com base nessas premissas que o Instituto Federal de Brasília suspendeu as aulas e outras atividades presenciais em seus campi no dia 13 de março de 2020. Desde então, sucessivas notas têm sido divulgadas à comunidade a fim de reafirmar o compromisso da instituição com sociedade, até que a nota de número 5 suspendeu por completo o calendário acadêmico.

Antes disso, algumas atividades foram desenvolvidas de maneira remota, mas a partir da nota número 4, também esta modalidade de ensino foi suspensa, conforme pode se verificar no excerto a seguir: “o IFB usou como critério preponderante a dificuldade de acesso às tecnologias de informação e comunicação dos estudantes da instituição. Dados da Plataforma Nilo Peçanha apontam que 82% dos estudantes do IFB são de baixa renda” (IFB, 2020, s/p).

Interessante pontuar que ao longo das datas referentes a publicação das notas da instituição em tela, o número de casos de doentes e mortos pela pandemia tem aumentado no Distrito Federal, no entanto, no dia 19 de junho, o Conselho Superior (Consup/IFB) aprovou o retorno das atividades acadêmicas de maneira remota, com data de início em 03 de agosto.

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Tal decisão mobilizou a comunidade escolar de modo a se preparar para os novos desafios e, a fim de evitar a ampliação das desigualdades, foram lançados editais de inclusão digital para estudantes carentes, bem como seleção de estudantes para atuar como mediadores virtuais de suas turmas.

Ainda que a instituição, em suas diferentes instâncias, venha procurando minimizar os prejuízos educacionais ao conjunto de estudantes, cabe questionar: em um universo de tanta desigualdade e diferenças, retomar o calendário escolar de maneira remota e sem amplo consenso da comunidade acadêmica é o meio mais eficaz para desenvolvimento das aulas?

Com base nesta provocação o texto em tela busca averiguar os encaminhamentos tomados pelos Colegiados do Ensino Médio do Campus Riacho Fundo do IFB, os quais congregam docentes dos cursos técnicos integrados de Cozinha e Hospedagem, no que se refere aos procedimentos de ensino adotados com a instituição do chamado ensino remoto e quais os impactos destes no processo de ensino-aprendizagem no primeiro ano dos referidos cursos.

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório e com resultados ainda preliminares, visto que se teve poucos encontros síncronos entre a retomada do calendário escolar e a escrita deste texto. Porém, entende-se que o processo de reflexão e avaliação sobre as práticas docentes deve ser contínuo de modo a favorecer discussões ampliadas e olhares diferenciados acerca da questão levantada.

A seguir são apresentados dois pontos fulcrais para entender as dinâmicas de aulas na instituição na qual este estudo é desenvolvido: os encaminhamentos do colegiado e as práticas de ensino desenvolvidas no âmbito do conhecimento técnico-integrado.

O Colegiado de Ensino Médio e a organização das aulas

Instâncias colegiadas que buscam integrar diferentes atores que compõem o cotidiano escolar, têm como premissa básica o estabelecimento dos preceitos democráticos e de gestão participativa na instituição de modo que as decisões não sejam unilaterais e verticalizadas (ANTUNES, 2002). Ou seja, busca-se com esse modelo de gestão que as decisões que dizem respeito a todos que fazem parte do processo educativo, não sejam tomadas pela direção e cumpridas pelos docentes no cotidiano da sala de aula, mas amplamente discutidas e viabilizadas pelos diferentes grupos de atores sociais que compõem a escola.

Os colegiados do campus Riacho Fundo do Instituto Federal de Brasília (IFB) têm dinâmicas específicas de funcionamento a partir das características de cada curso e dos coletivos que os compõem. Atualmente o campus conta com dois cursos integrados de nível médio – Cozinha e Hospedagem. Cada curso conta com um grupo de professores da “área técnica”, mais docentes das áreas propedêuticas e estudantes dos respectivos cursos. Esses atores compõem, consequentemente, colegiados específicos.

Esses colegiados têm como característica de funcionamento a articulação das reuniões de modo que os docentes consigam transitar pelas especificidades de cada curso e propor pautas que atravessem os dois cursos. Para as reuniões também são convocados alunos regularmente matriculados em ambos os cursos de modo que possam pautar as demandas específicas do coletivo de estudantes.

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Com a definição da retomada das aulas, os colegiados dos cursos de nível médio, conjuntamente com a Coordenação Pedagógica do campus, buscaram contatar a totalidade dos estudantes por duas vias – e-mail e ligação telefônica – a fim de saber das possibilidades de acesso e execução de atividades de maneira remota, quer seja utilizando celular, computador, ou outro equipamento com acesso à internet, quer seja por meio de material impresso e regularmente distribuído.

O levantamento alcançou 88,4% do total de estudantes matriculados no primeiro ano (110 alunos responderam). Desse total, 92,9% declarou possuir acesso à internet por meio de wi-fi, 5,4% disse que acessa a internet por meio de dados móveis e 1,8% declarou não ter acesso. Majoritariamente os alunos apontaram acessar a internet por meio de computador e/ou celular (58%), 36,6% apontaram que acessam por meio de celular apenas e 2,7% afirmaram acessar somente por meio de computador.

Com base nessas informações os colegiados dos cursos técnicos integrados ao ensino médio buscaram possibilidades efetivas de retorno às aulas de maneira remota, ainda que tenham sido consideradas ponderações como as apresentadas em Santana Filho (2020) e em França Filho, Antunes e Couto (2020) acerca da complexidade do processo educacional na educação básica mediada completamente por meios remotos.

Coletivamente chegou-se ao consenso de que a forma menos danosa para alunos e professores, considerando os apontamentos trazidos na Nota Técnica 11/2020 do Ministério Público do Trabalho (MPT, 2020), seria o desenvolvimento de atividades coletivas por meio de projetos que levassem em consideração o cotidiano vivenciado pelos estudantes, promovessem a autonomia nos estudos, tivesse a pesquisa como uma premissa básica e possibilitasse a correlação das demandas específicas do campo profissional com os conhecimentos das demais componentes curriculares.

Dessa maneira foram propostos dois projetos para cada ano escolar, sendo que para o primeiro ano estabeleceu-se Cidadania e participação no mundo e Desafios da Alimentação e Hospedagem em contextos de pandemia. As disciplinas ficaram distribuídas equilibradamente e a realização das atividades se dá em dias alternados considerando encontros síncronos e momentos assíncronos.

Ainda que se esteja em fase de ajustes para adaptar as dinâmicas e demandas às expectativas e possibilidades reais dos estudantes, verifica-se que o feedback tem sido positivo (Fig. 1).

Assinala-se que as atividades ainda estão em curso de modo que a coleta de dados tem sido realizada de maneira permanente. De toda forma, entende-se que no atual contexto, os horários de planejamento coletivo dos docentes e a busca por práticas de ensino cada vez mais interdisciplinares e desafiadoras para os alunos são imprescindíveis para a obtenção de melhores resultados em relação às aprendizagens.

Por meio do feedback dos alunos, o grupo de professores tem buscado trabalhar diferentes dinâmicas e planejado intervenções de modo que não caiba aos estudantes somente ficar ouvindo o grupo de docentes discutir questões relacionadas ao projeto. Esse feedback tem sido importante inclusive na orientação das atividades realizadas em momentos assíncronos, para evitar a dispersão e possibilitar o real alcance dos objetivos propostos para as atividades.

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Figura 1.Feedback da turma de primeiro ano frente às atividades do projeto Desafios da Alimentação e Hospedagem em tempos de pandemia. Captura de tela do Google ClassRoom, 2020.
Feedback da turma de primeiro ano frente às atividades do projeto Desafios da Alimentação e Hospedagem em tempos de pandemia

Referência

ANTUNES, A. Aceita um conselho? Como organizar um colegiado escolar. Guia da escola cidadã, v. 8. São Paulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 2002.

DAVIS, M. A crise do coronavírus é um monstro alimentado pelo capitalismo. In: DAVIS, M. Coronavírus e a luta de classes. Terra sem amos, Brasil, 2020. Disponível em: http://www.ensp.fiocruz.br/portal-ensp/informe/site/arquivos/ckeditor/files/coronav%C3%ADrus-e-a-luta-de-classes-tsa.pdf Acesso: 07.jun.2020.

FRANÇA FILHO, A. L.; ANTUNES, C. F.; COUTO, M. A. C. Alguns apontamentos para uma crítica da educação a distância (EaD) na educação brasileira em tempos de pandemia. In: Revista Tamoios. Ano 16, n. 1. São Gonçalo, 2020. Disponível https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/tamoios/article/view/50535/33468 Acesso: 20.jun.2020.

IFB. Instituto Federal de Brasília. Nota oficial #5 Covid-19 – Calendários acadêmicos 2020 estão suspensos. Brasília, 2020. Disponível em: https://www.ifb.edu.br/reitori/23679-nota-oficial-5-covid-19-calendario-academico-2020-esta-supenso Acesso: 20.jul.2020.

MTP. Ministério Público do Trabalho. Procuradoria Geral do Trabalho. Nota técnica – GT Covid 19 – 11/2020. Brasília, 2020. Disponível em: http://abet-trabalho.org.br/wp-content/uploads/2020/06/PGT.MPT-NOTA-TE%CC%81CNICA-11-PROFESSORES-AS-1.pdf Acesso: 10.ago.2020.

SANTANA FILHO, M. M. Educação geográfica, docência e o contexto da pandemia Covid-19. In: Revista Tamoios. Ano 16, n. 1. São Gonçalo, 2020. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/tamoios/article/view/50449. Acesso: 20.jun.2020.