Wellington Gabriel de Borba
wellingtonborba@gmail.com

Débora da Silva Pereira
debbora.sp@hotmail.com

Enoque Gomes de Morais
enoque_morais@discente.ufg.br

Clara Lúcia Francisca de Souza
claretoile@yahoo.com.br

EIXO
Formação de Professores (Didática, Didáticas Específicas)

Sala de professores como espaço colaborativo: conversas sobre formação continuada, cidade e cidadania

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Resumo: O presente trabalho refere-se à participação de dois eventos organizados e oferecidos pela Rede de Ensino de Cidades e Cidadania - RECCI no biênio 2020-2021, que busca discutir o conhecimento e desenvolvimento profissional dos professores de Geografia de Goiás, tendo como foco o estudo da cidade e o exercício da cidadania. As Salas de Professores têm como objetivo explicar quais aspectos da comunidade de prática on-line foram adaptados aos eventos da Salas. Também, analisar se esses aspectos permitiram, um formato colaborativo, gerar reflexões sobre conteúdos específicos, práticas didáticas, necessidade formação, entre outros. Para a sistematização das atividades nas duas versões, usamos a pesquisa-ação crítico-colaborativa durante os dois encontros, bem como as anotações a partir das gravações. Portanto, nas duas salas constatou-se a importância das metodologias ativas, com o papel de instigar os estudantes a investigarem situações vivenciadas no seu cotidiano.

Palavras-Chave: Formação de Professores. Cidadania. Cidade.

Introdução

A Rede de Ensino de Cidades e Cidadania (RECCI) é uma atividade de extensão desenvolvida pela Universidade Federal de Goiás (UFG) em parceria com outras universidades goianas. Seu principal interesse é o de contribuir com a relação existente entre o ensino de cidade e a formação cidadã através da Geografia. Para que tal interesse se concretize, a RECCI promove diversas ações, entre elas as voltadas à formação continuada e colaborativa de professores.

Em relação à formação de professores, uma das ações foi a realização de duas edições de um evento denominado “Sala de Professores”, que aconteceram durante o biênio 2020-2021, caracterizado pela pandemia de COVID-19. Ambos os eventos aconteceram via internet e tiveram como público-alvo os professores que atuam na educação básica de Goiás. Já discussões estiveram relacionadas à relatar e problematizar o ensino de Geografia durante a pandemia e discutir quais são os desafios de se realizar um ensino de cidade voltado ao exercício da cidadania, independe do contexto, com ou sem pandemia.

Para planejar as Salas de Professores, a RECCI considerou as ideias contidas no conceito de Comunidade de prática on-line (CoP), apontado por Ferreira e Silva (2014) como uma estratégia para a formação continuada de professores na perspectiva socioconstrutivista, através da qual o desenvolvimento profissional dos professores pode ser melhorado com o uso de tecnologias de informação voltadas à educação.

Nossa investigação e literatura nos evidenciaram que a CoP pode ser, de fato, uma ferramenta valiosa para auxiliar a superação dessa situação, ao passo que proporciona um ambiente alternativo em que professores podem refletir sobre conteúdo específicos, práticas didáticas, necessidades de formação etc. (FERREIRA e SILVA, 2014, p. 59-60)

Tendo em vista este conceito, o trabalho pretende explicar quais aspectos da comunidade de prática on-line foram adaptados aos eventos da Sala de Professores. Também, analisar se esses aspectos permitiram, um formato colaborativo, gerar reflexões sobre conteúdos específicos, práticas didáticas, necessidade formação, entre outros.

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Metodologia

O presente trabalho está estruturado em uma abordagem de pesquisa-ação crítico-colaborativa, pois versa em uma ação para melhorar, proporcionar e colaborar com a formação continuada dos docentes. De acordo com Pimenta (2005, p. 534) entende-se que a pesquisa-ação crítico-colaborativa se trata:

Quando a busca de transformação é solicitada pelo grupo de referência à equipe de pesquisadores, a pesquisa tem sido conceituada como pesquisa-ação colaborativa, onde a função do pesquisador será a de fazer parte e cientificizar um processo de mudança anteriormente desencadeado pelos sujeitos do grupo.

Dessa forma, considera-se que a RECCI parte desse pressuposto de colaboração, principalmente nas atividades desenvolvidas nas Salas de Professores em que muitos participantes colaboraram de maneira significativa agregando conhecimento aos participantes. Portanto, foi formado um grupo de professores da educação básica, que se encontrava diante de situações complexas, ao novo modelo de aulas devido a pandemia. E os professores e alunos da graduação e da pós-graduação da universidade realizaram com eles uma pesquisa-ação colaborativa.

Para alcançar os objetivos desse trabalho foi necessário um levantamento bibliográfico sobre o assunto estudado, a participação nas Salas de Professores e a observação nas falas dos participantes, para isso, foi revisado a gravação das duas atividades.

Resultados e Discussão

A “Sala de Professores” aconteceu em duas edições durante o biênio 2020-2021 como ação da RECCI para aproximar professores de Geografia. Cada edição contou com a participação majoritária docentes da educação básica em Goiás, com diferentes anos de experiência e níveis de formação. Houve também alguns estudantes de graduação inscritos.

Tendo em vista que o biênio 2020-2021 é caracterizado pela pandemia de COVID-19, que inviabiliza reuniões presenciais, o conceito de comunidade de prática on-line (CoP) foi fundamental para realização das edições da Sala de Professores. Ambas aconteceram em formato on-line, através de uma sala virtual criada dentro do serviço Google Meet e cujo endereço da sala foi enviado previamente aos inscritos no evento.

Ferreira e Silva (2014) informam que uma comunidade de prática é um conceito inserido por antropólogos no início da década de 1990 para se referirem a um grupo presencial que se baseia em três princípios, o domínio, a comunidade e a prática. O primeiro diz respeito ao tema que agregador, o segundo, a comunidade, o grupo de pessoas que se reúnem ao redor daquele tema, e a prática, por fim, inclui as rotinas, as ferramentas, as leituras, as experiências, entre outros aspectos. A definição on-line para se referir às comunidades de prática apareceu a partir dos anos 2000, quando a Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) viabilizaram tal possibilidade.

Outro aspecto informado por Ferreira e Silva (2014) é a existência de uma identidade e de um afeto dos membros de uma CoP para com ela. Essas características foram levadas em conta pela RECCI ao definir o nome dos eventos como Sala de Professores. Assim, ao definir os eventos como Sala de Professores, se buscou enfatizar a ideia de que aquele é um ambiente virtual feito por professores e para professores da educação básica, reconhecendo a mentoria e a participação de alguns professores universitários.

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De acordo com Ferreira e Silva (2014), a formação continuada do professor começa durante a graduação, se estende até os anos finais de atuação e independe do grau de formação. Outro aspecto é que todo professor tem um conhecimento próprio decorrente de suas leitura e atuação profissional e social. Portanto, todo professor pode compartilhar conhecimentos com o seu grupo de formação.

O aspecto central no professor da educação básica como o sujeito que traz informações, produz reflexões e compartilha conhecimentos foi constatado nas duas edições da Sala dos professores. Na primeira reunião houve falas de professores com diversos perfis, o que permitiu realizar discussões sobre diversas realidades escolares. Exemplo, as escolas públicas, particulares, urbanas, rurais, de tempo regular ou integral, da Educação de Jovens e Adultos, dos ensinos Fundamental e Médio, entre outras.

Incentivar a cidadania é o produto da Sala de Professores e é um conceito cujo significado vem se alterando com o passar do tempo. Atualmente ela é o status de quem vive no território de uma nação, goza de direitos sociais e políticos e que tem deveres em relação a esta nação (CLAUDINO e SOUTO, 2019).

Sendo a cidadania um objeto de preocupação do evento, nos diversos momentos da I Sala de Professores houve perguntados que culminavam no conceito. Os professores apoiaram ideias como a importância de se ter clareza do papel do professor em um ensino voltado a cidadania, a despeito de pressões burocráticas e de avaliações externas. Pontuaram também sobre a importância de uma compreensão da cidadania na escolha dos temas. Houve um professor relatando uma visita da escola à câmara de vereadores de sua cidade para acompanharem como uma lei, que dava direitos, era criada.

Cavalcanti (2019) aprofunda a formação cidadã ao defender o ensino da cidade ao se estudar a Geografia. A cidade é algo que extrapola ideia de um aglomerado de objetos, pois compreende o espaço vivido da maioria das pessoas. Esta concepção não exclui o campo, pelo contrário! O campo possui suas próprias características que o dicotomiza em relação a cidade e que por isso é importante considerá-las. Todavia, o campo o existe ao redor da cidade e estabelece relações de interdependência. A autora aponta documentos internacionais, como a Carta das Cidades, e princípios, como o direito à cidade, que corroboram a importância de se estudar a cidade considerando os sujeitos que vivem no campo. Desta forma, o bairro rural ou urbano, a cidade, quando pequena, são os lugares dos estudantes, o que torna importante compreender a cidade e o espaço ao seu redor para entender os problemas e buscar soluções.

De acordo com Barahona e Palácios (2019) dois aspectos explicam como a Geografia contribui com a formação cidadã dos estudantes. O primeiro tem relação com uma sociedade pluralista, onde é legítima a diversidade de pensamento, por isso, importantes as capacidades de argumentar e debater. Neste contexto, a Geografia contribui com um pensamento rigoroso e com o manejo da informação em uma atitude cívica responsável. Já o segundo aspecto se relaciona com o fato de que

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la formación ciudadana es inseparable de cómo los alumnos experimentan en su vida cotidiana, en sus casas, en su grupo de pares y en la institución escolar el pensamiento y la acción respecto a la naturaleza y la sociedad de la que forman parte en un territorio geográfico determinado. Estos ámbitos inmediatos de participación e influencia están a su vez inmersos en contextos mayores, que incluyen instituciones, procesos y valores en los dominios de la política, la economía y la cultura. La educación geográfica aporta con la identificación, comprensión y explicación del entorno en el que se desenvuelve el futuro ciudadano y los desafíos que, inevitablemente, deberá enfrentar. (BARAHONA e PALACIOS, 2019, p. 4)

No Brasil, reformas aconteceram nas últimas duas décadas e atualmente “afirmam o compromisso da educação nacional em prol da consolidação de cidadanias ativas e da construção de uma sociedade menos desigual e mais diversa.” (ASCENÇÃO e VALADÃO, 2014, p. 2) Os novos compromissos demandam novas atitudes entre os professores, tendo em vista estes serem os mediadores do conhecimento no ambiente escolar. Esta situação gera a necessidade de uma formação adequada aos novos propósitos.

Por outro lado, apesar da cidadania estar presente nas reformas educacionais há mais de 20 anos, exemplo os Parâmetros Curriculares Nacionais, ainda é possível constatar a reprodução de velhas práticas docentes entre os professores de Geografia. Exemplo, conteúdos estudados de maneira separada, fragmentada e tratado como um fim, ao invés de um meio. Uma contrapartida para se ter uma Geografia voltada à formação cidadã é a prática da interpretação da espacialidade do fenômeno. Conforme Ascenção e Valadão (2014), esta prática se baseia em três princípios: localizar, descrever e interpretar os fenômenos que acontecem no espaço. O domínio destes princípios viabiliza uma prática na qual o estudante pode identificar os problemas e consequentemente buscar soluções e mitigações.

Desenvolver um pensamento geográfico a partir da cidade e a sua relação interdependente com o campo, conforme defende Cavalcanti (2019) apareceu nas duas edições da Sala de Professores. Na primeira, foi relatada uma experiência pedagógica na qual se buscou responder quem são as pessoas as pessoas que ocupam os espaços urbanos.

Na II Sala de Professores a atividade teve como metodologia a situação geográfica, que de acordo com Silveira (1999, p. 25): “é um resultado do impacto de um feixe de eventos sobre um lugar e contém existências materiais e organizacionais”. Estas situações foram escolhidas pelos membros da RECCI para serem apresentadas e discutidas pelos participantes.

Ao todo foram quatro situações apresentadas que versavam sobre segregação e a mobilidade na cidade, a catástrofe ambiental em Brumadinho – MG, a reconfiguração do rural e do urbano e a relação entre tempo e clima por meio de elementos cotidianos.

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Durante a apresentação das diferentes situações pode-se destacar que, nas diferentes propostas, houve consonância em relação a levar as discussões para o ambiente de vivência dos estudantes, neste sentido ressaltando a importância da mediação do professor de modo a fomentar e construir a discussão tendo como base cada vivência e realidade cotidiana e não de apresentar o problema junto a um único viés ou solução genérica.

A interpretação da espacialidade do fenômeno, proposta por Ascenção e Valadão (2014), é uma preocupação que apareceu na fala dos professores participantes nas duas Sala de Professores. Na primeira, foi falado de experiências didáticas que tratam a cidade como conteúdo e a necessidade de um pensamento crítico da realidade, a despeito das pressões por padronização. Na segunda, em algumas situações foram ressaltadas a importância das metodologias ativas, com o papel de instigar os estudantes a investigarem mais a fundo as situações colocadas, de modo a melhor compreenderem as diferentes dinâmicas que envolvem cada situação sob distintos modos de vista. Como exemplo podemos citar o júri simulado, que foi mencionado como comumente usual em situações que envolvam interpretações distintas ou até mesmo antagônicas, na busca de uma compressão geral.

Referências

ASCENÇÃO, V. de O. R; VALADÃO, R. C. Professor de Geografia: Entre o Estudo Fenômeno e a Interpretação da Espacialidade do Fenômeno. In.: Anais XIII Colóquio Internacional de Geocrítica. El control de espacio y los espacios de control. Barcelona, 5-10 de mayo de 2014.

BARAHONA, S. A; PALACIOS. F. A. Desarrollo del pensamiento y formación ciudadana A: una mirada desde el espacio vivido. In.: Signo Geográficos. Boletim NEPEG de Ensino de Geografia. Goiânia, V. 1, p. 1-16, 2019.

CAVALCANTI, L. de S. A Geografia escolar e a cidade: Ensaios sobre o ensino de Geografia para a vida urbana cotidiana. Ed. Papirus, Campinas, 2016.

CLAUDINO, S; SOUTO, X. M. Construímos uma Educação Geográfica para a Cidadania Participativa. O Caso do Projeto Nós Propomos! In.: Signo Geográficos. Boletim NEPEG de Ensino de Geografia. Goiânia, V. 1, p. 1-16, 2019.

FERREIRA, A. de A; SILVA, B. D. da. Comunidade de Prática On-line: Uma Estratégia para o Desenvolvimento Profissional dos Professores de História. In.: Educação em Revista. Belo Horizonte, V. 30, n. 01, p. 37-64, mar. 2014.

PIMENTA, Selma Garrido. Pesquisa-ação crítico-colaborativa. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 31, n. 3, p. 521-539, set.-dez. 2005.

SILVEIRA, M. L. Uma situação geográfica: do método à metodologia. In.: Revista Território, ano IV, n. 6, jan.-jun., p. 21-28, 1999.

Notas