Acessibilidades às políticas públicas para pessoas com fissura labiopalatina
16Resumo: O presente artigo apresenta os dados da pesquisa para elaboração de monografia do Curso de Serviço Social da Universidade Federal de Goiás, sobre a Fissura Labiopalatina, realizada no período de dezembro de 2021 a abril de 2022 com sujeitos oriundos de diversas regiões brasileiras. A base epistemológica para estruturação deste estudo foi o materialismo histórico dialético e tem como objetivo conhecer a gênese, o desenvolvimento e as complicações clínicas e sociais da fissura labiopalatina. Para produção de dados utilizou-se de pesquisa bibliográfica, documental e pesquisa de campo.
Palavras-chave: Fissura labiopalatina; Direitos sociais; Políticas públicas.
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Introdução
O artigo em tela é o resultado da produção de dados oriundos da pesquisa para o trabalho de conclusão do curso de Serviço Social da Universidade Federal de Goiás (UFG) e versa sobre a Fissura Labiopalatina. O escopo da pesquisa se delineou a partir principalmente das experiências do autor que faz parte do grupo de pessoas com Fissura Labiopalatina. Nessa direção, ao buscar informações sobre os serviços públicos de atendimento, se deparou com as dificuldades de acesso e a falta de informações para auxiliar as famílias e dar suporte ao tratamento que pode durar até 20 anos dependendo do tipo de lesão e a época que inicia o tratamento.
No Brasil existem hoje 30 instituições de atendimento para sujeitos acometidos pela patologia supramencionada, a maioria das instituições clínicas que fazem o atendimento específico estão localizadas na região sudeste do país, o que dificulta o acesso de usuários de outras regiões.
A fissura labiopalatina é uma patologia que necessita de atenção especial e tratamento específico com diversos profissionais como médicos, odontólogos, psicólogos, fonoaudiólogos dentre outros, o que também exige conhecimento sobre as etapas específicas do tratamento. A fissura labiopalatina possui diversos graus, que serão detalhados no decorrer do texto, mas é importante ressaltar, nesse espaço diminuto, que a lesão ainda não é considerada legalmente uma deficiência. Tramita desde 2018 um Projeto de Lei para aprovação na Câmara dos deputados - Projeto de Lei 11217/18 - que versa sobre a inclusão da patologia nos direitos e garantias de pessoas com deficiência durante o processo de reabilitação, ou seja desde a inicialização do tratamento até a sua finalização, entretanto, por se tratar de uma modificação genética, alguns casos são inconclusos após a reabilitação estética, o que dá margem para diversas interpretações equivocadas sobre o assunto.
É mister explanar que a Fissura não é reconhecida legalmente como deficiência, mas como uma má formação congênita. Algumas lesões lábio-palatais são consideradas pela saúde pública mais severas, dessa forma existem algumas fissuras que ao término do tratamento não deixaram qualquer sequelas estético/funcional e outras que independente do seu grau, a alteração na fala não é passível de correção. A sequela na voz não está ligada diretamente às variações nomeadas por Spina (1972), mas sim na particularidade de cada sujeito, como por exemplo, a falta de acompanhamento fonoaudiológico, atraso das cirurgias primárias, lesão no ouvido interno (ocorrido no período da amamentação) e demais ações não realizadas desde o nascimento até a fase adulta (HRAC-USP).
Diante do exposto, ao falar sobre a fissura labiopalatina é necessário investigar casos isolados, haja vista, sua alta complexidade. Uma pessoa com fissura transforame incisivo bilateral (condição mais severa) que de acordo com SILVA FILHO E FREITAS (2007), pode não ter a voz alterada e uma pessoa com a fissura pós forame incisivo (condição mais amena), pode ter sua fala totalmente comprometida.
17O estudo se torna relevante em termos sociais e científicos e por tais motivos a mesma foi realizada em diversos estados do território brasileiro, sendo os sujeitos também naturais do Brasil e que fazem uso das políticas públicas no país. Para estruturar a pesquisa de campo foi elaborado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para a realização de entrevista semi-estruturada com os sujeitos da pesquisa conforme a legislação para o desenvolvimento de estudos envolvendo seres humanos. Os sujeitos da pesquisa foram escolhidos de forma intencional por aceitabilidade. Os formulários de pesquisa foram elaborados na plataforma Google Forms, disponibilizados de forma integralmente gratuita via e-mail, grupos de whatsApp e instagram. Os 112 sujeitos que participaram da pesquisa são oriundos de todas as regiões brasileiras.
Nessa direção é salutar explanar que participaram três públicos diferentes, mas, que de forma direta e/ou indireta estão relacionados à fissura labiopalatina, participaram pessoas com fissura labiopalatina, mães e pais de pessoas com fissura labiopalatina e pessoas sem fissura labiopalatina (universitários, amigos e desconhecidos), sendo o último grupo importante para elaboração de quadro quantitativo sobre o percentual de pessoas entrevistadas que possuem ou não esclarecimentos sobre a fissura labiopalatina, as políticas de atendimento, às complicações clínicas/sociais e a aceitação social da fissura, haja vista que atualmente a fissura labiopalatina atinge 1 a cada 650 brasileiros de acordo com Souza Filho (2007) e também é motivo de discriminação, afastamento social, bullyng e outras complicações da vivência social.
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O que é a fissura labiopalatina?
Fissura labiopalatina é uma má formação congênita na região facial do ser humano, isso é, a não fusão da região do palato do rebordo alveolar e do lábio superior. O amparo teórico mais usado atualmente são as obras desenvolvidas por Spina em 1972, se debruçando no desenvolvimento durante a fase embrionária da gestação até as extensões anatômicas da patologia. Silva Filho e Freitas(2007) deram continuidade nos estudos, tornando se as principais referências sobre a temática ( SILVA FILHO; FREITAS, 2007, p. 17).
A terminologia Fissura labiopalatina é de origem latina, cujo significado é aberturas, fendas. Sob a ótica biológica é qualquer abertura anatômica que ultrapasse a normalidade do corpo humano. O Lábio - região carnuda externa da boca e Palatina também de origem latina, deriva de “palatum”, região óssea entre a cavidade nasal e oral, conhecida popularmente como "céu- da boca”, porém esta região pode ser dividida entre palato duro (primário) e palato mole (secundário) (SILVA FILHO; FREITAS, 2007, p. 17).
As fissuras Labiopalatais (pré e trans forame) são aquelas que atingem a região do lábio superior e podem ser identificadas a partir das 12° semanas de gestação por meio de exames de ultrassonografia, visto que é o período embrionário em que vai se formando a parte facial de cada ser humano. A fissura palatina (pós forame) só é possível ser identificada após o nascimento, haja vista, que a localidade anatômica da fenda não permite ser vista durante a gestação (SILVA FILHO; FREITAS,2007.pg 17).
Spina (1972) organizou as fissuras em 4 grupos, sempre utilizando o forame incisivo como marco principal usando os prefixo pré, trans e pós e incluindo as fissuras raras da face e suas extensões também envolvem as categorias de incompletas/completas, unilaterais, bilaterais e medianas.
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1 Descrição dos tipos de fissura existentes
Como já dito anteriormente, as variáveis das fissuras foram agrupadas em 4 partes, utilizando o ponto referencial, Forame e os prefixos pré, trans, pós e raras da face. Entretanto aqui detalharemos somente as fissuras pertencentes às lesões labiopalatais, visto que, as fissuras raras da face não fazem parte deste estudo e dos dados coletados.
No primeiro grupo (GRUPO I) é usado o prefixo pré, ou seja, fissura pré forame incisivo, isso quer dizer que a fenda atingiu o lábio superior e o rebordo alveolar, podendo ser unilateral ou bilateral, porém preservando o palato duro/mole (primário/secundário), não passando pela linha do forame. Nesse sentido, caso a fenda preserve também o rebordo alveolar, estará classificada como incompleta, caso contrário nomeamos como completa (SILVA FILHO; FREITAS, 2007.pg 21).
No segundo grupo (GRUPO II), cujo prefixo é trans, a Fissura Trans Forame Incisivo também considerada como a fissura mais severa, atinge desde da uvula até o lábio superior, transpassando os dois palatos e o rebordo alveolar. Podendo ser unilateral ou bilateral (SILVA FILHO; FREITAS ,2007.pg 29).
No terceiro grupo (GRUPO III) a fissura pós forame, já não atinge o rebordo alveolar, preservando o lábio superior se limitando apenas ao palato duro ( primário) e ao palato mole (secundário) (SILVA FILHO; FREITAS, 2007.pg 38).
Portanto, como ilustrado na tabela acima, fica nítido os níveis em que a má formação pode atingir. Dessa forma, dependendo do comprometimento anatômico a fissura pode ser enquadrada e/ou diagnosticada, norteando assim, qual tipo de tratamento a pessoa deverá receber e quais complicações terão em seu crescimento.
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2 As políticas de atendimento da Fissura Labiopalatina no Brasil
O Estado brasileiro iniciou a execução de políticas públicas pertinentes à patologia em 1994, instituindo a PORTARIA Nº 62, DE 19 DE ABRIL DE 1994, estabelecendo as normas adequadas para criar hospitais aptos a atender a má formação estético-funcional vinculados ao Sistema Único de Saúde. Na supracitada portaria tem a indicação de quais são os profissionais necessários para o atendimento, os equipamentos, os materiais específicos e a rotina de cadastramento a ser seguida para exercer o acompanhamento da anomalia facial.
A rotina de cadastramento de acordo com a mesma portaria, deve partir primeiramente do Hospital interessado, onde será encaminhada sua solicitação para Coordenação descrita, que em seguida enviará um representante legal que tenha conhecimento sobre a especificidade da Fissura Labiopalatina, articulando juntamente aos técnicos da Secretaria de Saúde, cujo objetivo é analisar os instrumentos adequados para o tratamento da fissura labiopalatina.
19O segundo passo, se dá por intermédio do relatório de vistoria, o responsável pela visita, em caso de aprovação da Unidade, realizará um relatório de conclusão. A fiscalização ocorrerá como finalização do processo de rotina de cadastramento (ALMEIDA et al., 2017, p.156).
A - ROTINA DE CADASTRAMENTO
1. Os Hospitais encaminharão as solicitações de cadastramento à Coordenação de Normas para Procedimentos de Alta Complexidade da Secretaria de Assistência á Saúde do Ministério da Saúde que solicitará um representante oficial do Hospital de Pesquisa e Reabilitação de Lesões Lábio-Palatais da Universidade de São Paulo em conjunto com técnicos da Secretaria Estadual de Saúde, verificaram in loco o devido cumprimento das normas estabelecidas nesta Portaria.
2. O relatório da visita realizada com parecer conclusivo, e sugestão de área de abrangência do serviço, será encaminhado à Coordenação que tomará as medidas necessárias junto à Secretaria de Assistência à Saúde para efetivação do cadastramento.
3. Serão realizadas avaliações semestrais do desempenho dos Hospitais cadastrados mediante informações técnicas fornecidas pelos mesmos em relatório específico elaborado e encaminhado pela Coordenação de Normas para Procedimentos de Alta Complexidade, que se responsabilizará pelo envio dos consolidados às Secretarias Estaduais de Saúde e ao Hospital de Pesquisa e Reabilitação de Lesões Lábio-Palatais para manifestação e verificação (MINISTÉRIO DA SAÚDE,1994)
Segundo (ALMEIDA 2017) Os Hospitais dentro das diretrizes impostas na portaria n°62/94, devem oferecer toda a equipe interdisciplinar e todos os equipamentos para o exercício de cada profissão, pois a patologia abordada se enquadra de acordo com o SUS, como procedimentos de alto custo e complexidade, ou seja, para total reabilitação é necessário uma abordagem interdisciplinar envolvendo áreas da medicina (clínico geral, pediatra, otorrinolaringologista,etc.), Enfermagem, Odontologia (endodontia,periodontia,etc.), Fisioterapia, Fonoaudiologia, Anestesia, Psicologia e Serviço social, bem como ter os equipamentos adequados a disposição dos profissionais, como centro de cirurgias, laboratório de prótese ,aparelho de Raio X e Ortopantomografia, Aparelho de Raio X para radiografia periapical e oclusal, Nasofaringoscópio, Videofluoroscopia, e outros inúmeros equipamentos necessários para o atendimento completo e eficaz (MINISTERIO DA SAUDE,1994).
O Brasil contava com 19 centros especializados em 2008, aptos a atender pessoas com fissura labiopalatina, porém em 2022 de acordo com o Ministério da Saúde (2022), chegou a 30 instituições espalhadas pelo país, sendo sua maior concentração na região Sudeste, vale salientar que no estado de São Paulo existem 9 hospitais cadastrados (DATASUS, 2022, n.p).
De acordo com a Tabela disponibilizada pelo DATASUS, a região sudeste detém o maior número de locais de atendimento, isto é, com a maior concentração de locais de atendimento na região sudeste a população dessa região, tem maior facilidade de alcançar o atendimento do que a população nortista e nordestina, visto que, há apenas um hospital apto na região norte do país, mais especificamente no estado do Tocantins, enquanto que no estado de São Paulo há 9 centros aptos, induzindo aqueles que procuram o tratamento a terem que se deslocar de seu município de origem e irem a outro estado/município para conseguir sua total reabilitação.
Devido a falta de atendimento no Norte e Nordeste brasileiros, muitos gozam da política pública de saúde no Tratamento Fora a Domicílio- TFD, que visa garantir o acesso àqueles que necessitam de atendimento médico quando o município não oferece serviços de saúde. O próximo item, versa sobre a política mais utilizada pelo público com fissura labiopalatina.
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3 O tratamento fora de domicílio - TFD
Diante do exposto e da concentração de hospitais especializados na região sudeste brasileira, aqueles que dependem do tratamento de reabilitação e estão dentro das vulnerabilidades psicossociais pertinentes à patologia e distante da sua localidade fica nítido a necessidade de transporte visando a garantia do acesso ao direito à saúde, como diz o Artigo 196 da Constituição de 1988.
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL,1988)
Sendo assim, foi implantada na PORTARIA Nº 55, DE 24 DE FEVEREIRO DE 1999 objetivando a garantia de acesso à saúde dentro das diretrizes do SUS, quando município não oferece o atendimento clínico solicitado e adequado, logo a política TFD custeia todos meios necessários que o usuário possa precisar em suas consultas médicas, como por exemplo, transporte, hospedagem e alimentação. A depender das demandas do usuário, o TFD pode custear também as despesas do acompanhante, quando solicitado previamente com a devida justificativa dada pela equipe médica.
Art. 1°- Estabelecer que as despesas relativas ao deslocamento de usuários do Sistema Único de Saúde - SUS para tratamento fora do município de residência possam ser cobradas por intermédio do Sistema de Informações Ambulatoriais - SIA/SUS, observado o teto financeiro definido para cada município/estado.
§ 1°· O pagamento das despesas relativas ao deslocamento em TFD só será permitido quando esgotados todos os meios de tratamento no próprio município.
§ 2° - O TFD será concedido, exclusivamente, a pacientes atendidos na rede pública ou conveniada/contratada do SUS.(MINISTÉRIO DA SAÚDE,1999)
O Tratamento Fora de Domicílio-TFD, é de suma importância para o público desta temática diante das defasagem de estabelecimentos já citados anteriormente. Entretanto, mesmo com o Portaria 55/99 em rigor ainda encontramos lacunas na execução desta política, visto que, além de acompanhar a situação orçamentária de cada prefeitura/município a política também se limita às decisões particulares de cada profissional em suas respectivas áreas de atuação, por exemplo, mesmo se tratando da mesma política, o assistente social, profissional responsável por executar esta política, pode se limitar apenas na garantia do transporte, haja vista, o cenário atual de seu campo de trabalho (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1999, n.p).
Art. 4° - As despesas permitidas pelo TFD são aquelas relativas a transporte aéreo, terrestre e fluvial; diárias para alimentação e pernoite para paciente e acompanhante, devendo ser autorizadas de acordo com a disponibilidade orçamentária do município/estado (MINISTÉRIO DA SAÚDE,1999)
A verba destinada para cobrir as despesas decorrentes das consultas médicas, transporte, alimentação e hospedagem são disponibilizadas de acordo com a disponibilidade orçamentária do município/estado, ocasionando condições diferenciadas no atendimento em cada estado.
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Análise e interpretação dos resultados da pesquisa
Foram elaborados 03 modelos de entrevista semi-estruturada a partir das particularidades de cada grupo supracitado, sendo em cada modelo, reservado um espaço para identificar a faixa etária dos participantes, escolaridade, município que residem e quais informações tinham sobre a fissura labiopalatina em âmbito geral. O primeiro grupo foi composto por 44 pessoas com fissura labiopalatina e responderam questões como: identificação do grau da patologia, isto é, se tinha fenda labial, fenda palatina, fenda labial unilateral/bilateral, entre outros graus da patologia. Se o tratamento estava dentro das normas e direitos descritos na constituição brasileiras, se faziam uso e conheciam as políticas públicas amparadoras do SUS, o acompanhamento médico, as dificuldades que tinham para ter acesso ao tratamento adequado e por fim, se houve empecilhos sociais decorrentes da fissura labiopalatina.
O segundo grupo foi composto por 54 pessoas sem fissura labiopalatina, direcionadas a questões com o objetivo de saber o quão a fissura labiopalatina é conhecida popularmente, quais processos a pessoa com a patologia passa, quais hospitais atendem e se a fissura labiopalatina deve se considerada deficiência pela legislação e seguir as mesma regras e validação de direitos. Por fim, o terceiro grupo com 14 pessoas composto por mães e pais de pessoas com a fissura labiopalatina cujo objetivo era ver quais orientações e apoio tiveram do poder público enquanto gestantes e responsáveis de pessoas com fissura labiopalatina.
De início foi feita a identificação dos sujeitos em cada formulário, destacamos aqui cada grupo com as seguintes siglas: PESSOAS COM FISSURA LABIOPALATINA: PC-FLP, PESSOAS SEM FISSURA LABIOPALATINA: PS-FLP , MÃES E/OU PAIS DE PESSOAS COM FLP: MP-FLP.
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1 Pessoas com fissura labiopalatina - PC-FLP
Neste grupo participaram 44 pessoas, sendo 82%(37 pessoas) do gênero feminino e 18% (7 pessoas ) do gênero feminino, entre as idades de 18 a 60 anos, todos com fissura labiopalatina, classificados em termos mais simples como fenda labial, fenda palatina unilateral esquerda/direita e fenda labial/palatina bilateral. O público atingido reside em diversas regiões do Brasil, porém, majoritariamente da região sudeste brasileira e realizam tratamento no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo( HRAC-USP) e outros no ambulatório CERFIS, localizado do Hospital Estadual da Criança e Adolescnete, na cidade de Goiânia-GO, etc.
Dos entrevistados, 88,6% realizam seu tratamento pelo Sistema Único de Saúde, o que remete a importância do SUS e suas políticas a se atualizar para oferecer um tratamento íntegro e de qualidade,essa mesma porcentagem relata que não faz nenhum acompanhamento médico na rede privada de saúde.
Foram feitas perguntas sobre a toda a equipe interdisciplinar que fissura labiopalatina necessita, e obtivemos que somente 60,5% dos entrevistados acessam toda a equipe, 39,5% não acessam, parcialmente ou totalmente, os profissionais adequados para a reabilitação.Nesse sentido, foi detalhado quais profissionais mais se carece, sendo majoritariamente,as áreas da psicologia( 27,8%),fonoaudiologia(16,7%) e odontologia (16,7%).
Sobre a política TFD, foram direcionadas questões sobre as despesas derivadas das consultas médicas, e 52,4% respondeu que usava de recursos próprios para garantir o acesso ao tratamento, ou seja, usava do próprio orçamento para hospedagem, transporte , alimentação e hospedagem e o restante, usufruir do TFD porém custeada parcialmente suas despesas, especialmente a respeito de hospedagem e alimentação.
22Sobre os espaços de educação, principalmente na fase juvenil, 58,1% responderam que tiveram dificuldade de aprendizagem na escola e seu principal desafio foi o bullying, destacado por 67,8% dos entrevistados e o constrangimento com colegas/profissionais da educação , que ocupa 20,6% dos resultados. Nessa mesma direção,27%,9% já pensou em desistir dos estudos, enquanto 72,1% relata que não. Com isso, após a vivência com o bullying e os obstáculos sociais, 58,1% têm dificuldades de se relacionar, podendo ser um dado importante visto que muitos desenvolvem timidez e outros transtornos mentais devido a fissura labiopalatina.
E por fim, abordando os direitos e políticas destinadas a essas pessoas, direcionamos questões norteadoras neste sentido, logo 77,3% desconhecem seus direitos e 63,6% acham que a fissura labiopalatina deve ser incluída nas leis de pessoas com deficiência.
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2 Pessoas sem fissura labiopalatina PS-FLP
O interesse da entrevista deste grupo é entender como a patologia é conhecida popularmente. Foram 54 contribuições da faixa etária entre 18 a 61 anos, sendo 77,7% do gênero feminino e 22,2% do gênero masculino, também de diversas regiões brasileiras.
As respostas obtidas apresentaram que 96,3% conhecem a fissura labiopalatinas , e dentro 74,1% tem proximidade com a temática , pois conhece tem amigos,familiares, conhecidos com a anomalia.Entretanto, 49,1% não sabem os impactos funcionais a fissura causa no indivíduo e 22,6% responderam que a fissura labiopalatina não interfere no cotidiano do sujeito com FLP.
Sobre a reabilitação da fissura labiopalatina, 61,1% não conhecem o processo de reabilitação e 72,2% não sabem quais hospitais atendem a demanda. E para finalizar o questionário, 33,3% respondeu que sua principal preocupação ao ter um filho com fissura labiopalatina, seria a falta de um tratamento adequado e completo e 22,2% o bullying.
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3 Mães e/ou pais de pessoas com fissura labiopalatina MP-FLP
O processo de reabilitação pode durar de 20 a 25 anos, sendo necessário o acompanhamento dos responsáveis, na maior parte do processo, até completar a maioridade e o paciente não depender mais da presença de um responsável legal em suas consultas. Logo, pesquisar os amparos governamentais no âmbito familiar da fissura labiopalatina se torna importante na mesma proporção que os demais grupos.
Participaram 14 pessoas,entre 26 a 53 anos, sendo, 13 do gênero feminio e 1 do gênero masculino, também de diversos estados brasileiros. A entrevista destacou desde o conhecimento prévio da fissura até o apoio de políticas públicas deste público.
O primeiro contato com a fissura labiopalatina deu se , para 57,1% , durante a gestação e 42,9% descobriu depois da nascimento, mas que antes de ter um(a) um(a) filho(a) com a patologia, apenas 50% conhecia a fissura labiopalatina, e o mesmo não conhecia 50%.
As primeiras orientações que tiveram 42,9% receberam no próprio hospital especializado em fissura labiopalatina ,28,6% buscou informação em meios digitais e 28,6% receberam no mesmo local que realizaram o parto.
23Sobre os hospitais, 35,7% descobriram os locais de atendimento por amigos,familiares,etc, enquanto 21,4% receberam orientações de profissionais da rede SUS e 21,4% da rede privada de saúde e 21,4% procuraram informações por conta própria, através de pesquisa em meios digitais, jornais, etc.
A respeito do financiamento das consultas, apenas 42,9% teve auxílio de políticas públicas e 57,1% durante o processo de reabilitação, na mesma vertente 57,1% fez uso de recursos próprios para acompanhar seu filhos em suas consultas médicas, 35,7% acessou o TFD , e 7,1% recebeu ajuda de familiares e amigos.
Por terem que acompanhar seus filhos nas consultas médicas, que por muitas vezes pode durar dias, semanas e até meses, pois questionado se os compromissos pessoais eram afetados, como por exemplo, os empregos. Sendo assim, 28,6% perderam seu emprego em decorrência da necessidade de acompanhar o tratamento, e 71,4% não perderam.
E por fim, 35.7% responderam que sua principal preocupação com seus filhos é o bullying e ocupando o 2° lugar desta pergunta, 28,6% responderam não conseguir a total reabilitação e 28,6% em ter sequelas severas na voz.
Considerações finais
A efetivação de políticas públicas destinadas a lesões labiopalatais tem início no país a partir de 1994 com a inserção de hospitais vinculados ao Sistema Único de Saúde. Nessa direção, as normas pré estabelecidas para as instituições clínicas estarem aptas ao atendimento contribuíram para o tratamento da patologia abordada. Vale ressaltar que a fissura labiopalatina não se limita apenas a pessoa, mas sim a todos os espaços que ela está inserida, pois a mesma pode modificar toda uma estrutura familiar e ampliar para outros espaços sociais de vivência e convivência social.
A patologia está inserida em todas as classes sociais e causam projeções discriminatórias relevantes principalmente quando se trata das lesões com graus mais elevados, o que torna a patologia um caso de saúde pública a ser considerada como um problema social, que necessita de cuidados específicos e de políticas públicas estruturantes para o cuidado e o bem estar dos usuários acometidos pelos desconfortos físicos, sociais e emocionais causados pela patologia supramencionada.
Os dados obtidos trazem a baila considerações importantes no que tange a falta de conhecimento referente aos primeiros procedimentos pelas equipes de profissionais destinados a prestação dos serviços públicos de saúde para essa especificidade. Outrossim, foi verificado por meio da pesquisa a desatualização de dados sobre os equipamentos sociais de atendimento no país pelo site do Ministério de Saúde, haja vista, que até os hospitais especializados em lesões de lábio palatais estão fora da tabela fornecida. Por exemplo, o Estado de Goiás oferece o serviço no Centro de Reabilitação de Fissura Labiopalatina, localizado no Hospital Estadual da Criança e do Adolescente, na cidade de Goiânia-GO, dentre outras instituições que não estão inseridas nos dados públicos, dificultando o acesso por falta de informações sobre os locais de atendimento no território brasileiro.
Em suma, Os dados oriundos da pesquisa demonstram que apesar da inserção no SUS ainda existe uma lacuna histórica a ser resolvida em termos de direitos a serem validados pelo estado brasileiro enquanto gestor de políticas públicas.
24Referências
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DATASUS, Secretaria de Atenção à Saúde. Indicadores Habilitações Habilitações - 0401- CENTRO DE TRATAMENTO DA MÁ FORMAÇÃO LÁBIO PALATAL. In: Indicadores Habilitações - 0401- CENTRO DE TRATAMENTO DA MÁ FORMAÇÃO LÁBIO PALATAL. Disponível em: http://cnes2.datasus.gov.br/Mod_Ind_Habilitacoes_Listar.asp?VTipo= 0401 &VListar= 1 & VEStado= 00 & VMun= & VComp= & VContador= 28 & VTitulo=H. Acesso em: 3 jul. 2022.
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SILVA FILHO, O. G; FREITAS, J. A. S. Caracterização morfológica e origem embrionária. In: TRINDADE, I. E. K.; SILVA FILHO, O. G. (Coordenadores). Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Ed. Santos, 2007. p.17-49.