DEFINIÇÃO
- Anormalidades no enchimento e esvaziamento vesicais na ausência de doenças neurológicas.
- Disfunção vesical e intestinal” (DVI): associação de obstipação e disfunções do trato urinário inferior.
CONCEITOS
Capacidade Vesical Esperada (CVE) para a idade: volume miccional máximo esperado.
Lactente 1° ano de vida: CVE(ml)= 38 + [2.5 x idade (meses)] |
Idade de 1 a 12 anos: CVE(ml)= [idade (anos) x 30]+ 30 |
Frequência diurna: uma frequência normal de micções seria pelo menos 3 até 8 micções por dia.
Polaciúria: termo usado para relatar um aumento de frequência de micções em uma criança que já tem controle esfincteriano, sem evidência de infecção do trato urinário.
Incontinência: perda involuntária de urina contínua ou intermitente.
Urgência: vontade súbita ou inesperada de urinar.
Noctúria: hábito de levantar à noite para urinar.
Exitação: dificuldade para iniciar a micção ou tempo prolongada para inicia-la.
Estrangúria: uso de força abdominal para aumentar ou manter a micção.
Jato urinário fraco: ejeção de urina com pouca força.
Jato intermitente: ejeção não contínua de jato urinário.
Disúria: queimação ou desconforto ao urinar.
Manobras de contenção: manobras usadas para alívio ou contenção da urina como erguer na ponta dos pés, cruzar as pernas, segurar o períneo com as mãos.
CLASSIFICAÇÃO
De acordo com achados clínicos e urodinâmicos:
1. Bexiga Hiperativa
- Evidência urodinâmica de contrações involuntárias do detrusor (contração detrusora a partir de 15 cm de água, durante a fase de cistometria) em crianças neurologicamente normais;
- A eletromiografia nestes casos, não deve revelar atividade perineal durante a micção.
- Caracteriza-se por urgência miccional, com ou sem incontinência urinária diurna, frequentemente associada a posturas de contenção urinária.
- Na hiperatividade vesical isolada, a urofluxometria se apresenta com curva em “sino” e ultrassonografia sem resíduo pós-miccional significativo.
2. Disfunção Miccional
- Quando ocorrem alterações na fase de esvaziamento vesical, ocorre uma incoordenação entre a contração detrusora e o relaxamento esfincteriano externo no momento da micção, levando a uma situação de obstrução infra-vesical funcional, denominada de incoordenação vésico-esfincteriana, nas crianças sem doença neurológica.
- Ocorre pela falta de relaxamento do esfíncter uretral externo no momento da micção.
- Clinicamente apresentam sintomas de esforço miccional, jato interrompido e presença de resíduo pós-miccional significativo à ultrassonografia.
- Estudo urodinâmico evidencia uma urofluxometria com curva achatada e alongada (“staccato”), fluxo urinário reduzido, padrão de obstrução infra-vesical com redução de fluxo máximo, pressão detrusora no fluxo máximo elevada e presença de resíduo significativo ao estudo urodinâmico.
- Na eletromiografia, ocorre a persistência de atividade eletromiográfica perineal, no momento da micção.
3. Postergador da Micção
- Padrão de micção infrequente (03 ou menos vezes ao dia), em grandes volumes e com o esvaziamento vesical completo.
- A ultrassonografia não apresenta resíduo pós-miccional.
- Padrão urodinâmico destas crianças geralmente é normal.
4. Bexiga Hipoativa
- Redução na frequência das micções (máximo de 03 micções diárias);
- Hipotonia vesical (hipo ou acontratilidade detrusora), associada à presença de grande volume de resíduo pós-miccional.
- Padrão urodinâmico nestes casos se apresenta com uma micção intermitente associada à pressão detrusora no fluxo máximo reduzida, manobras de prensa abdominal para auxílio do esvaziamento vesical e resíduo pós-miccional significativo.
CAUSAS
- Multifatorial;
- Fatores genéticos;
- Pela teria de neuroplasticidade: alteração primária da musculatura pélvica, levando a contração persistente deste grupo muscular, que por sua vez, estimularia a ocorrência de alterações na inervação vesical e intestinal;
QUADRO CLÍNICO LABORATORIAL
Anamnese
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Exame Físico
- Estigmas na região lombo-sacra
- Alterações ortopédicas
- Massa fecal à palpação abdominal
- Genitália se sinais de perda urinária ou dermatites
- Exame anorretal
Investigação
Diário miccional (por pelo menos 72 horas)
(Sugestão de diário miccional em anexo)
Ultrassonografia
- Pesquisa de dilatação pieloureteral e presença de resíduo pós-miccional.
Uretrocistografia Miccional
- Recomendada nas crianças com história de infecção do trato urinário febril e recorrente. A
- Sinais que se correlacionam com maior frequência com a hiperatividade detrusora: baloneamento da uretra posterior (“uretra em pião”), serrilhamento da parede vesical, alongamento da bexiga e, em casos mais extremos, a presença de divertículos vesicais.
Cintilografia renal com DMSA
- Avaliação da presença de cicatrizes renais.
Ressonância Nuclear Magnética
- Da coluna lombossacra: recomendada nos casos em que há alterações no exame neuro-ortopédico, deformidades esqueléticas complexas na radiografia simples e ausência de melhora com a instituição de tratamento clínico.
Estudo Urodinâmico
- Padrão ouro no diagnóstico e acompanhamento das disfunções.
- Principais informações:
- Capacidade cistométrica máxima (reduzida: < 65%; aumentada: >115%);
- Complacência: relação entre o volume infundido e a pressão de detrusor (V/P= ml/cmH20), reflete a capacidade da bexiga em armazenar a urina até a capacidade normal com baixa pressão;
- Pressão intravesical e contratilidade no enchimento e esvaziamento:
- Hipercontratilidade quando ocorrem contrações involuntárias de detrusor. Elevada pressão intravesical é fator de risco para RVU e lesão renal.
- Hipocontratilidade quando a pressão intravesical é insuficiente (hipoatividade de detrusor) com falta de contração sustentada para iniciar e manter uma micção eficiente para promover um bom esvaziamento vesical.
- Atividade eletromiográfica do assoalho pélvico no enchimento e esvaziamento: uma contração inapropriada do assoalho durante a micção caracteriza a disfunção miccional.
- A interpretação conjunta dos resultados permite descrever a classificação das DTUI de acordo com a descrição do ICCS.
TRATAMENTO
- Multidisciplinar e individualizado.
- Fatores decisivos são a motivação, paciência e participação familiar.
- Uroterapia (terapia não intervencionista e não farmacológica):
- Micções em intervalos regulares programados e hidratação após cada micção.
- Opção de uso de relógio com alarme para programação das micções e ingestas;
- Postura da micção: adaptador de assento, suporte para os pés;
- Diário miccional.
- Biofeedback (terapia de retreinamento do assoalho pélvico)
- Reeducação da musculatura perineal a partir de informações recebidas por meio de eletromiografia de superfície.
- Conscientização da atividade muscular, do relaxamento, da força, tempo de contração e coordenação.
- Neuromodulação (NM) ou Estimulação Nervosa Elétrica Transcutânea (TENS)
- Tratamento da Obstipação
- Educação: orientar maior ingesta de água e fibras, orientar postura adequadas respeitar o desejo de evacuar evitando a postergação;
- Manutenção e desimpactação:
- Dose de desimpactação 1 a 1,5g/kg/dia por 3 a 6 dias.
- Dose de manutenção de 0,2 a 0,8g/kg/dia por 2 meses.
- Alarme
- Dispositivo colocado junto à roupa da criança, que emite som, no momento da micção.
- O dispositivo tem a intenção de acordar a criança e provocar a inibição do reflexo do ato miccional, estimulando o paciente a ir ao banheiro.
- Tratamento Farmacológico
- Anticolinérgicos
- Função de relaxar o músculo detrusor permitindo melhorar o armazenamento, reduzindo os sintomas de incontinência
- Dose: 0,4 mg/kg/dia em duas tomadas sendo um máxim de 15mg/dia.
- Efeitos colaterais: boca seca e constipação.
- Outros: tolterodina.
- Alfa-bloqueadores
- Objetivo de promover melhor esvaziamento vesical.
- Efeitos adversos: hipotensão e tontura.
- Alfa-bloqueadores seletivos como a Doxazosina (menos efeito colaterais).
- A terapia farmacológica para esvaziamento é um método off-label.
- Toxina Botulínica
- Indicado em casos refratários de hiperatividade de detrusor ou hipertonicidade de esfíncter uretral externo ou esfíncter anal, com resultados promissores, ainda mais utilizados nos casos de disfunção neurogênica.
- DDAVP (Desmopressina)
- Deve ser utilizado nas crianças em que a avaliação sugeriu poliúria noturna.
- Índice elevado de recidiva da enurese quando suspenso.
- O tempo de tratamento ainda não está definido.
- O DDAVP está disponível em comprimidos de 0,1 e 0,2 mg. A apresentação em spray nasal de 10 µg não é utilizada em crianças com enurese.
PEG 4.000UI:
Oxibutinina
Referências Bibliográficas
- TrappC et al. Boletim Científico de pediatria. Distúrbios de Miccção em Crianças. Vol 2, n*2, 2013.
- Austin PF, Bauer SB, Bower W, et al. The standardization of terminology of lower urinary tract function in children and adolescents: update report from the Standardization Committee of the International Children´s Continence Society. J Urol 2014; 191:1863;
- Gaither TW, Cooper CS, Kornberg Z, et al. Risk factors for Development od bladder and bowel dysfunction. Pediatrics 2018; 141.
- Martin G, Minuk J, Varghese A, et al. Non-biological determinants of paediatric bladder bowel dysfunction: a plit study. J Pediatr Urol 2016; 12: 109.e1.
- Bresolin NL et al. Disfunção vesical e Intestinal na Infância, Guia Pratico de Atualização da SBP, numero 3, maio 2019.