“Tem que colocar a mão na massa”: o audiovisual na Reitoria Digital
Murilo Ferraz Franco
Ana Paula Vieira de Souza
Introdução
Murilo Ferraz Franco nasceu em Jataí, em 21 de setembro de 1986. Formado em Ciência da Computação pela UFG, é servidor técnico-administrativo da Universidade desde novembro de 2012 e atua na Reitoria Digital desde junho de 2022. Originalmente da área da Computação mas também muito interessado nas Ciências Humanas, Murilo buscou formação complementar em diversos cursos e práticas relacionadas à Comunicação e traz todas essas vivências para o seu trabalho na Reitoria Digital.
Ana Paula Vieira de Souza: Qual é sua formação profissional e experiências anteriores à chegada na Reitoria Digital?
Murilo Ferraz Franco: Sou formado em Ciência da Computação pela UFG. Durante o curso, fiz algumas disciplinas nos cursos de Núcleo Livre da UFG: várias matérias na Filosofia e algumas na Comunicação, como Teoria da Imagem e introdução à Fotografia na antiga Facomb [Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia], que hoje é a FIC [Faculdade de Informação e Comunicação]. Depois, fiz especialização em Engenharia de Sistemas, especialização em assessoria de Comunicação e Marketing e cursos de fotografia. Fiz também algumas oficinas na Católica [Pontifícia Universidade Católica de Goiás], que eram de custo baixo, incluindo uma sobre desenvolvimento de roteiro. Também aprendi muita coisa sobre audiovisual na prática, principalmente trabalhando com áudio, porque eu fiquei durante cinco anos trabalhando no podcast Filosofia Pop, em que eu fazia edição e apresentação também, junto com o professor Marcos Carvalho Lopes, que hoje está na UFJ [Universidade Federal de Jataí]. Ele foi meu professor de História no Ensino Médio no IFG [Instituto Federal de Goiás] de Jataí, que na minha época era Cefet [Centro Federal de Educação Tecnológica]. A formação dele é em Filosofia; a gente tem uma amizade que dura até hoje e ele continua no podcast, mas eu saí porque não consegui manter a produtividade. Nos cinco anos em que fiquei à frente do podcast, eu aprendi muito sobre edição de áudio. Edição de vídeo eu trabalhei desde o Ensino Médio, porque lá no Cefet de Jataí a gente já fazia. Não tínhamos muitas câmeras digitais na época, entre 2001 e 2003, lá no interior, mas um amigo nosso tinha uma câmera com fita. A gente gravava, digitalizava os vídeos e eu fazia a edição depois no computador, usando o adobe premiere. Comecei a aprender a editar vídeo naquela época no Ensino Médio. Depois, no Instituto de Informática da UFG, passei a trabalhar na área de comunicação e editava vídeos e áudio. Fui aprendendo menos com cursos formais e mais na prática mesmo.
Ana Paula: Você tem uma abordagem laboratorial: se não sabe, estuda e aprende como fazer. De onde vem isso?
Murilo: Eu tenho muita curiosidade nas áreas que eu tenho interesse e tenho sempre o ímpeto de resolver as dificuldades técnicas para possibilitar que as ideias saiam do papel. É uma característica que ajuda a realizar as coisas. Considero que tenho pouca capacidade de pensar nos projetos, mas quando alguém vem com uma ideia, eu tenho essa iniciativa de ver onde vão surgir os problemas e procurar as soluções. E também, pela trajetória que eu tive de trabalhar no serviço público e nunca ter encontrado um local que tenha tanto acesso a recursos técnicos, aprendi a me virar com menos e fazer essas coisas com baixo custo. Então, se não tem câmera, usa o celular; se não tem microfone, usa headset; sempre tentando buscar a melhor qualidade que você pode tirar daqueles recursos que você tem, mas não esperando aparecer todas as condições se não você nunca vai fazer nada nesses ambientes em que você não tem tanto acesso aos meios. Tem que colocar a mão na massa e tentar extrair aquilo que dá para extrair daquele recurso da melhor maneira possível. Dessa forma, fui aprendendo com os desafios que foram aparecendo. Tem também aquele outro lado que é não ter aprendido a trabalhar com muito recurso, então talvez o software de ponta, o hardware de ponta, eu não tenha tanta habilidade para trabalhar hoje porque eu trabalhei com outros mais limitados.
Ana Paula: Como você chegou à Reitoria Digital? O que o motivou a vir para o nosso setor?
Murilo: Eu estava no Instituto de Informática como analista de Tecnologia da Informação, que é o meu cargo na UFG, e lá eu comecei a trabalhar na parte de Comunicação. Nessa época, o diretor era o professor Sérgio [Sérgio Teixeira de Carvalho] e a gente fez uma visita à Reitoria Digital quando ela estava começando. A convite do Pablo, fui com o professor Sérgio e outras pessoas da equipe de Comunicação do Instituto de Informática. Acho que fomos eu, o Maycon e a Valeska [Maycon Batista Spirlandelli e Valeska Sales Martins Fernandes, servidor e estagiária do INF], conhecer o que vocês estavam fazendo, o local e a partir daí comecei a acompanhar o trabalho da Reitoria Digital. Às vezes a gente trocava algumas ideias de vídeos, alguma coisa que eu via publicada eu dava algumas dicas: “podia fazer de tal forma, modificar assim, corrigir esse áudio assim”, mas continuava trabalhando lá no INF, na parte de Comunicação. Depois do retorno do trabalho presencial, após a pandemia, eu voltei para o INF mas acho que já tinha cumprido uma etapa de trabalho lá, onde fiquei nove anos, e senti a necessidade de procurar outros desafios dentro da Universidade. Lá na Propessoas [Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas] eles criaram um mural para as pessoas colocarem intenção de remoção, ou seja, intenção de ir para outros locais dentro da Instituição. Eu coloquei que tinha interesse de ir para a Secom, para a Rádio Universitária ou para a Reitoria Digital, que eram os locais em que eu via que poderia ter novos desafios na área de Comunicação. Eu estava começando a trabalhar mais nessa área, mas eu também sentia uma certa limitação de experiência própria, então eu queria ter outras pessoas para trocar experiências, aprender mais e achei que nesses locais eu ia ter essa oportunidade. Então o Sauli [Sauli dos Santos Júnior, pró-reitor de Gestão de Pessoas da UFG], que é o responsável por gerenciar o pessoal, falou com o Pablo, a gente começou esse processo para mudar para a Reitoria Digital e foi aí que eu passei a integrar essa equipe.
Ana Paula: Como você vê a mudança de setor dentro da instituição, ao longo da carreira?
Murilo: É uma coisa que, para mim, foi muito positiva. Acho que fui para um ambiente onde eu consigo, hoje, entregar mais do que eu estava entregando em termos de trabalho. As pessoas entram na Universidade e, às vezes, o técnico vai ficar 30 anos no mesmo lugar. Para alguns isso pode ser confortável mas, para outros, não. Então é bom ter esse trânsito de buscar novas experiências dentro da Instituição. Acho que é positivo para a Instituição ter pessoas mais motivadas a trabalhar em um ambiente onde se encaixam melhor. É bom também para a pessoa, pois se ela não está se sentindo bem, talvez por já ter passado muito tempo, pelo desgaste natural de qualquer relação de trabalho, ou até mesmo pela questão de se acomodar muito, ficar fazendo as mesmas coisas, no mesmo lugar, pode ser cansativo, então é bom mudar. Por outro lado, acho também que a Universidade e qualquer instituição pública, na maioria das vezes, tem muita dificuldade de lidar com isso. Não tem tantos caminhos fáceis, não é tão tranquilo para você ter essa mobilidade dentro da instituição. Geralmente tem uma burocracia que impede as pessoas de fazerem isso mais livremente. No meu caso, a gente conseguiu fazer essa transferência muito tranquilamente, mas eu conheço várias pessoas que tentam mudar de lugar dentro da instituição e têm dificuldade.
Ana Paula: Como você desempenha o seu trabalho? Quais tarefas executa na Reitoria Digital?
Murilo: Hoje trabalho muito com a parte de vídeos: edição e produção. A gente tem uma organização de tempo para ter disponibilidade de fazer as gravações de entrevistas, o que também requer uma certa organização pessoal minha para lidar depois com a quantidade de arquivos e não se perder no desenvolvimento da edição. Em geral, o que tenho feito como mais rotineiro na Reitoria é fazer cortes de vídeos que são divulgados no Instagram como reels e no YouTube, como shorts; ou seja, vídeos curtos de até um minuto no formato vertical de celular. O pessoal da equipe de Jornalismo faz a seleção, no vídeo original, de qual é o tempo do corte e aí eu uso o editor de vídeo Kdenlive, que é um software livre de edição. Ali tem toda uma gama de arquivos que eu uso para fazer a montagem visual, como algumas máscaras de imagem. Eu gosto de usar software livre na produção porque não tem gastos com licença e muitas vezes são os únicos softwares que são compatíveis com os equipamentos que dispomos. Os softwares de edição de vídeo proprietários demandam um hardware mais robusto do que o que temos no momento. Para edição de áudio eu o Audacity, para gráficos vetoriais, o Inkscape, para edição e tratamento de imagens, o Gimp e para efeitos visuais, o Natron, que é um pouco mais pesado. Faço também algumas edições de áudio e vídeo por linha de comando com o FFmpeg e já utilizei o OBS para fazer transmissões quando trabalhava no INF. Todos são softwares livres e gratuitos, disponíveis para vários sistemas operacionais e qualquer um pode instalar, usar, estudar, modificar e redistribuir livremente. Também faço a transcrição, com legendas, que é importante ter por uma questão de acessibilidade, já que não contamos com intérprete de libras. Para fazer as legendas, hoje eu estou usando, de forma integrada ao Kdenlive, um sistema de legendagem automático que é o Whisper, da Open AI, que é a mesma empresa do Chat GPT. Ele está tendo uma boa qualidade para gerar legendas. Depois eu faço uma correção do texto, mas são poucas coisas para corrigir. Também faço algumas ações relativas ao tratamento de imagens, quando o pessoal faz alguma cobertura e às vezes a imagem vem um pouco escura ou precisa de algum ajuste. Às vezes, quando a equipe não está disponível, faço também a parte de criar as manchetes. Também realizo o monitoramento de estatísticas dos canais do YouTube e, agora, do site da Reitoria Digital, para configurar e analisar, fazendo alguns relatórios sobre como está o andamento dos canais da Reitoria Digital.
Ana Paula: Qual a sua participação no projeto UFG Memória? Conte um pouco sobre como está sendo desenvolvido.
Murilo: A minha parte é trabalhar no registro, porque o UFG Memória é para registrar a história oral, a memória das pessoas mais antigas da Universidade. Estamos entrevistando os decanos e alguns aposentados para registrar como essas pessoas participaram da construção da Instituição. Geralmente, eu e o Pablo vamos fazer as gravações. Eu faço a parte técnica, relacionada à câmera e ao áudio, e depois faço também a edição, que consiste em colocar a legenda com o nome das pessoas, uma abertura e uma finalização dos vídeos. Uma outra coisa que também já fiz na Reitoria Digital foi a montagem e desmontagem de exposições sobre alguns temas como a da covid, juntamente com a turma de Museologia . São exposições institucionais para as quais já prestei esse suporte técnico, tanto essa da covid como outra exposição sobre o Jornal 4º Poder.
Ana Paula: E em relação ao YouTube, quais são as suas tarefas?
Murilo: Quando eu entrei na equipe da Reitoria Digital, comecei a observar e ver como funcionava o canal da UFG no YouTube, que é administrado pelo nosso setor. Fiz uma análise me baseando na minha experiência com essa rede e em alguns documentos de outras pessoas que sugerem formas de melhorar o desempenho de canais. Fiz um relatório com algumas sugestões de como a gente poderia melhorar o alcance do YouTube da UFG. Eu acredito que muitas coisas a gente não consegue fazer porque não temos muito controle sobre a produção, que é muito descentralizada, pois são as unidades que produzem. Então, a gente não tem muita gerência sobre como vão ser as artes, como o pessoal vai falar no canal e são coisas que às vezes contam muito no YouTube, relacionadas à linguagem, à comunicação. Mas no que a gente consegue alterar, a gente foi tentar trabalhar principalmente com SEO [Search Engine Optimization], que é a otimização de serviços de busca. Procuramos trabalhar com hashtags, colocar algumas coisas no texto para melhorar a posição de busca, algumas questões assim. Hoje o canal da UFG já é bastante grande: chegamos a mais de 46 mil inscritos e a gente está sempre tentando melhorar esse alcance para atingir melhor os objetivos comunicacionais da Universidade.
Ana Paula: Como é trabalhar na Reitoria? É um ambiente formal e institucional, mas as redes sociais e o seu trabalho são mais modernos. Como você vê essa integração?
Murilo: A comunicação digital é uma tendência na comunicação e acredito que a UFG, no Brasil, hoje, é uma das mais avançadas. É uma coisa que não tem escapatória hoje em dia. Toda instituição tem essa necessidade de aprender a fazer essa comunicação mais digital e eu acho que o trabalho da Reitoria Digital nesse sentido é muito importante. A Universidade é muito grande, então é muito difícil você, na comunicação, dar ênfase para a produção acadêmica da Universidade e para as várias ações que a Reitoria desempenha. Então o trabalho da Reitoria Digital é bom para a comunicação da UFG porque a gente consegue dar foco nessas duas coisas. Acho que a gente consegue fazer essa assessoria da Reitoria e dar visibilidade para o que a administração da Universidade está fazendo de uma forma muito dinâmica, moderna e até de vanguarda, pois se você olhar para outras instituições de ensino superior do Brasil, acho que deve ter pouca gente que faz essa comunicação da Reitoria. Vai ser cada vez mais importante ter esse enfoque na comunicação digital pois não é uma demanda passageira. E eu acho que a gente faz de forma bastante sóbria e organizada. É uma comunicação muito bem estruturada, não tem aquela coisa que é uma armadilha que muita gente cai na comunicação digital, que é, às vezes, pecar um pouco na linguagem de querer fazer uma coisa muito engraçadinha, acabar se atrapalhando e entrando em coisas que depois vão ser prejudiciais para a própria instituição. Eu acho que nessa armadilha a gente não cai, a gente faz uma comunicação muito sóbria, muito bem feita, muito efetiva dessa parte da Reitoria.
Ana Paula: Qual a ação mais marcante entre as que você fez na Reitoria Digital?
Murilo: Dois projetos principais me marcaram. Um foi esse que está sendo mantido até hoje, que são os cortes do Boa Semana para os reels. Acho que é uma coisa que o perfil da Reitoria não utilizava, tinha até um problema técnico que a gente conseguiu solucionar, e é uma coisa que tem dado muito certo em termos de visibilidade. Dá para a gente fazer uns recortes desse programa que é mais longo, dura em torno de 20 minutos na Rádio, pinçar informações que a gente julga que são mais centrais e jogar para um público diferente, que não é o público da Rádio nem do YouTube, é o público do Instagram. Com essa ligação, a gente tenta puxar o público do Instagram para o YouTube, para continuar vendo esses vídeos e pegar algumas informações mais importantes. E a outra ação mais marcante é essa que a gente está fazendo agora, o UFG Memória. Vai ter um impacto muito grande na Universidade pelo registro da história das pessoas. Acho que é um projeto que vai ser de longo prazo, para ter tempo de registrar mais pessoas que passaram pela UFG e têm grande importância para sua construção, mas às vezes ficam esquecidas, tanto professores como técnicos. A UFG é uma das instituições mais importantes e sólidas de Goiás e essa história vai se perdendo porque a gente não faz esse registro. É um projeto que está sendo muito importante e muito marcante para mim. Além disso, eu agradeço muito a oportunidade de integrar essa equipe, pois para mim foi muito importante a mudança do Instituto de Informática para a Reitoria Digital. Tem contribuído muito para a minha formação ter contato com a equipe, porque tem muita gente que tem experiências diversas, passaram por TV, rádio, outras experiências na Comunicação muito ricas e eu tenho aprendido muito com elas. É um ambiente onde eu tenho gostado muito de trabalhar, pois acho que me permite desenvolver minhas potencialidades e me acolhe. Em 2022 eu tive o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista e várias coisas da minha vida passaram a fazer mais sentido depois deste diagnóstico. É muito comum para pessoas dentro do espectro terem muita dificuldade de se inserirem no mercado de trabalho pelas dificuldades de interação social, de alterar a rotina e também de incômodos sensoriais. O acolhimento na Reitoria Digital é muito importante para desempenhar melhor o meu trabalho e ser bem integrado à equipe. Então eu agradeço a oportunidade de trabalhar na Reitoria Digital. Tem sido muito bom trabalhar nessa equipe e contribuir com a Universidade cada vez mais e com o desenvolvimento dessa Instituição que para mim é muito importante. Me graduei aqui, continuei trabalhando aqui até hoje, então é uma Instituição que faz parte da minha vida.