Jogando as tranças, pregando botões: uma iniciativa em prol da pluralidade

Resumo Este trabalho vem estimular a discussão sobre a aplicação dos temas transversais na educação, preconizando a criatividade em sala de aula. Outro objetivo é o de pensar soluções eficazes para um aprendizado de qualidade, utilizando de métodos tecnológicos como o uso das multimídias e a confecção de um blog para troca de experiência entre educadores e educandos e a todos que se interessem pelo assunto. Neste pensamento, a escola pode ser aproveitada como um espaço fundamental para a prática de promoção da cidadania e do respeito à valorização da diversidade humana.

Palavras-chave Educação, Temas Transversais, Criatividade.

Autoria

  • Ecion Rosa de Oliveira

    Especialização em Processos e Produtos Criativos- Uab. (carga horária 360h). Universidade Federal de Goiás UFG, Brasil. Titulo: Jogando as tranças, pregando botões : uma iniciativa em prol da pluralidade. Orientadora: Dânia Soldera. 2014 – 2015 Extensão universitária em Especialização Gênero e Diversidade na Escola. (Carga horária: 460h). Universidade Federal de Goiás. Universidade Federal de Goiás UFG, Brasil.

  • Wander Artiaga Luiz

    Possui graduação em Planejamento de Transportes pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás (2007), graduando em Pedagogia licenciatura através da Universidade Estadual de Goiás, pós graduado em Processos e Produtos Criativos FAV - Universidade Federal de Goiás (2018).

Orientadora

  • Dânia Soldera

    Mestra em Arte e Cultura Visual na linha Culturas da Imagem e Processos de Mediação pelo Programa de Pós-Graduação em Arte e Cultura Visual ? FAV/UFG; graduação em Artes Visuais - licenciatura plena pelo Centro de Artes e Letras da Universidade Federal de Santa Maria-RS (2011) e graduação em Desenho e Plástica - bacharelado pelo CAL/UFSM (2007). Atuou como tutora on-line no curso de Licenciatura em Artes Visuais-EaD ? FAV/UFG, entre 2012 e 2013. Possui experiência na Educação Infantil na área de Artes Visuais. Pesquisadora na área de modos de ver a partir da reflexão e produção fotográfica de deficientes visuais. Atuou como professora de Artes Visuais no Instituto Federal de Goiás,nos anos de 2015 e 2016, nos níveis de ensino: Técnico Integrado ao Ensino Médio; EJA em Modelagem do Vestuário; Graduação em Licenciatura em Dança e Graduação em Licenciatura em Pedagogia Bilingue. Principais disciplinas: Arte e Processo de criação; Desenho de Moda; Introdução à Estética e História da Arte; e, Fundamentos da Arte Educação. Atua como tutora online no curso de pós-graduação - Especialização em Processos e Produtos Criativos da UFG, desde 2016. Está professora temporária na Faculdade de Arte Visuais/UFG, desde maio de 2017, ministrando disciplinas na área de desenho e pintura.

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1. Introdução

A proposta inicial era desenvolver aulas que envolvessem os “temas transversais da educação,” trabalhando as temáticas propostas de modo criativo, usando de todos recursos disponíveis para chamar a atenção dos alunos. Os temas transversais foram escolhidos por acreditarmos que a instituição escolar tem uma função que vai além de transmitir conhecimentos de domínios do saber, mas também deve expor preocupações contemporâneas com o meio ambiente, com a saúde, com a sexualidade e com as questões éticas relativas à igualdade de direitos, à dignidade do ser humano e à solidariedade.

O trabalho foi desenvolvido e redigido na terceira pessoa do plural por ser feito em dupla, e parte de sua escrita foi elaborada na forma de relato de experiência. Dessa forma, o nós pesquisador é composto por Ecion Rosa de Oliveira, formado em Química e professor da rede municipal de educação da cidade de Itaberaí-GO, titular das turmas do 4° ano A e B em que foi feita a pesquisa. E Wander Artiaga Luiz, formado em Tecnologia em Planejamento Urbano e de Transportes, realizando uma segunda graduação em Pedagogia. Escolhemos a escola como campo de pesquisa pois percebemos que, além da carência e dificuldade de se trabalhar com temáticas mais próximas da realidade dos educandos, poderíamos propor maneiras de despertar maior interesse destes usando recursos midiáticos e materiais de audiovisual, e também trabalhos manuais e atividades em grupo, a fim de unir vivências e habilidades dentro das nossas áreas de conhecimento em prol da apresentação de propostas criativas no ensino em sala de aula.

Temos como princípio norteador que a função da educação não é meramente um instrumento de transmissão do conhecimento, e que a escola é um espaço público de promoção da cidadania. Sendo o estado o responsável por assegurar o reconhecimento da diversidade de valores morais e culturais em uma mesma sociedade, sociedade esta, entendida como heterogênea e “comprometida com a justiça e a garantia universal dos direitos humanos e sociais. A vivência escolar permite a apresentação da realidade social em sua diversidade” (LIONÇO; DINIZ, 2009, p.12).

Sobre a vivência escolar, é inegável que hoje educadores enfrentam inúmeras dificuldades para ministrarem seus conteúdos perante a realidade atual da educação contemporânea do século XXI. “Neste contexto, a atenção do alunado nas aulas expositivas não só é frágil e flutuante, mas costuma perdurar poucos minutos e requer uma sedução constante, semelhante às táticas de um espetáculo” (SIBILIA, 2012, p. 73).

Em relação às dificuldades e desafios da docência no século XXI, Sibilia sintetiza esta realidade em dois parágrafos, onde ela afirma:

A apatia e o escasso entusiasmo que eles demonstram em tais contextos seriam sintomáticos desta falta de sentido, evidenciado também pelas altíssimas taxas de “deserção escolar” que se constatam em todo o mundo. Os professores, por sua vez, muitas vezes não sabem como enfrentar esse novo cenário, assim, além de suportarem a precariedade socioeconômica que assola a profissão em boa parte do planeta, têm que lidar com as aflições suscitadas pelos questionamentos acerca do significado de seu trabalho e com a dificuldade crescente de estar à altura do desafio (SIBILIA, 2012, p. 65).

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Ainda de acordo com Sibilia (2012), o “desinteresse” é o principal motivo de abandono da escola por parte dos jovens de quinze a dezessete anos, segundo um estudo realizado recentemente no Brasil sobre a desmedida “evasão escolar”. Esse resultado demonstra que manter o jovem na escola não é somente uma questão econômica.

Já em relação às práticas discriminatórias nas escolas, Lionço e Diniz (2009) afirmam que:

a discriminação é uma prática social que marca o cotidiano das escolas. Opera a desqualificação do outro, podendo acarretar graves danos pessoais e sociais. Entende-se a prática discriminatória como a valoração das diferenças de modo a promover desigualdades ou prejuízos para as partes desqualificadas. A educação é uma ferramenta política emancipatória, que deve superar processos discriminatórios socialmente instaurados, a fim de transformar a realidade pela reafirmação da ética democrática. Nesse sentido, a escola é um espaço de socialização para a diversidade (LIONÇO; DINIZ, 2009, p.13-14).

Acreditando no poder de emancipação que a educação possui, em detrimento a todas as formas discriminatórias existentes, o presente projeto põe-se a desenvolver aulas práticas e teóricas de forma criativa, usando de recursos audiovisuais e de aulas práticas com trabalhos manuais, no intuito de chamar a atenção do educando.

O objetivo deste trabalho foi pensar uma forma de desenvolver aulas dinâmicas que trabalhem os temas transversais na educação, relacionando aos temas da valorização da pluralidade cultural humana, diversidades étnicas e de gênero. Também propomos trabalhar de maneira criativa utilizando de recursos didáticos midiáticos que colaborem para despertar maior atenção do aluno. Para tanto, decidimos fazer um blog a fim de divulgar nossas experiências com educadores e a comunidade no intuito de promover a interação com o mundo do conhecimento, incentivando a troca de ideias, e a partir desse instrumento surgiu uma oportunidade onde podemos refletir sobre a prática docente. Com o propósito de enriquecer e diversificar o processo ensino/aprendizagem como espaço de interação e construção do conhecimento, temáticas como religião e gênero foram abordadas de maneira a reforçar os ideais de respeito a pluralidade humana e em promoção dos ideais de cidadania.

Acreditando que as mudanças são possíveis, para a melhora da qualidade de ensino, este projeto visa ser uma iniciativa de combate às diferentes formas de discriminação nas séries iniciais do ensino fundamental, percebida pelos educadores dentro da unidade escolar, discriminação esta que entendemos como a distinção na qual segregamos indivíduos por serem de credo, raça ou gênero diferente daqueles que os excluem.

Deste modo, propomos realizar atividades que sigam os ideais propostos pela Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1966, em seu artigo 1º, que conceitua discriminação como sendo:

Qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio da vida pública (BRASIL, 1989, p. 2773).

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As aulas foram ministradas no ensino fundamental nas respectivas salas de aula do 4° ano A e B, da Escola Municipal Modestina Fonseca, localizada na cidade de Itaberaí (GO), no intuito de trabalharmos com os ideais de valoração da diversidade cultural, étnica e de gênero humano.

Para que estes temas fossem possíveis de trabalhar, os conteúdos foram previamente adaptados ao grau de entendimento dos alunos, além de termos como princípios norteadores os ideais de que uma escola tem que ser fundamentada na inclusão e no respeito da pluralidade humana. Deste modo, tentamos contemplar diferentes temáticas que abarcam o respeito à diversidade religiosa e cultural humana, quebra de padrões normatizantes machistas e homofóbicos e trabalho coletivo.

Pautando nos ideais de que escola deve ser um ambiente “laico”, ou seja, devemos ter um posicionamento neutro no campo religioso, respeitando todas as representações religiosas ou a ausência desta (ateísmo). A religião sempre esteve presente em nossa sociedade, tendo uma influência enorme na formação de nossa cultura. Podemos encontrar vestígios de religião nas leis que nos regem e em nossa educação, ou seja, em todas as esferas. A religião age como forma de controle, como um código no qual as sociedades e indivíduos estabelecem suas condutas.

Um dos fatos que faz a intolerância religiosa ser tão sangrenta e cruel é o fanatismo. Fanatismo é o fenômeno no qual o indivíduo adota uma verdade como absoluta e a defende como se a sua origem fosse divina. A força desse fenômeno faz com que as pessoas aficionadas tentem convencer outras sobre aquela verdade, podendo utilizar como forma de persuasão, palavras e atos de cunho violento. Acreditamos que uma educação de qualidade vá contra toda a forma de fanatismo, pois, acreditamos nos ideais de educação que trabalha em prol do respeito a toda manifestação cultural, religiosa e ideológica que a pluralidade humana constrói.

Cremos na ideia de que a população brasileira é formada a partir da miscigenação de diferentes povos (etnias), também optamos por trabalharmos a quebra dos padrões dos estereótipos de beleza que foram criados e difundidos em nossa cultura. Estereótipos estes que segregam e excluem os indivíduos que não se enquadram. Padrão este que tem como referencial o modelo grego de beleza, tão difundido na mídia e que é utilizado pela indústria capitalista como forma de vender seus produtos.

Outro ponto que trabalhamos foi a questão da sexualidade e do gênero, temas pouco abordados em nossas salas de aulas. E optamos por não nos calarmos, nem omitirmos nossas opiniões sobre tais temáticas, pois acreditamos que quando um educador se omite sobre estes assuntos de orientação sexual em sala, ele está contribuindo para o reforço das práticas homofóbicas no ambiente escolar.

Em relação a esta omissão que se faz nas unidades escolares quando o assunto em foco é a diversidade de gênero, Ivan e Joseli postulam em seu artigo:

Ao não se falar a respeito deles e delas, talvez se pretenda eliminá-los/as, ou, pelo menos, se pretenda evitar que os alunos e as alunas “normais” os/as conheçam e possam desejá-los/las. Aqui o silenciamento – a ausência da fala – aparece como uma espécie de garantia da “norma”. A ignorância (chamada, por alguns, de inocência) é vista como mantenedora dos valores ou dos comportamentos “bons” e confiáveis. A negação dos/as homossexuais no espaço legitimado da sala de aula acaba por confiná-los às “gozações” e aos “insultos” dos recreios e jogos, fazendo com que, deste modo, jovens gays e lésbicas só possam se reconhecer como desviantes, indesejados ou ridículos (JUNCKES, 2009, p.152-153).

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Acreditamos, assim com Touraine (1998), que todos esses conjuntos de diferenças existentes na sociedade deturpam o desenvolvimento moral, intelectual e profissional dos indivíduos, gerando as discriminações e exclusões. Para que as pessoas vivam em conjunto harmonicamente e reconheçam a diversidade de interesses, é necessário que haja convicções e crenças, que cada identidade pessoal ou coletiva particular seja portadora de uma orientação de alcance universal.

2. Metodologia

A pesquisa foi construída a partir de pesquisa bibliográfica, que abrange as temáticas relacionadas à educação, cultura, sociedade e os temas transversais sobre pluralidade. Ela se fundamenta na análise e experiência de campo realizada em uma escola de educação básica dividida em quatro encontros, no texto chamamos de vivências.

Inicialmente, ocorreu a escolha dos temas transversais a serem trabalhados, a elaboração das aulas e a busca dos recursos financeiros e materiais necessários. Os temas, foram escolhidos após prévio consenso entre os autores do projeto e os professores regentes. As aulas seriam ministradas às sextas-feiras pelo professor Ecion e as professoras dariam suporte junto aos alunos, além da prévia ajuda na confecção dos materiais que seriam utilizados nas atividades. O registro e suporte técnico das aulas ficou a cargo do Wander. Cada aula elaborada conta com um roteiro prévio de execução, com metodologias específicas para cada tema e atividade planejada.

Optamos, neste artigo, por fazer um breve relato das experiências percebidas nestas aulas, os planos de aulas, as fotos e alguns vídeos foram disponibilizados no blog educacriativo.blogspot.com. O blog intitulado “Educa criativo”, foi criado para ser um canal aberto de troca de experiências e sugestões, onde as aulas foram postadas e disponibilizadas a todos os professores da referida unidade escolar e demais pessoas interessadas.

Relatos de uma Experiência de Vivência em Prol da Pluralidade

Primeira Vivência: Árvore de botões

Para a realização da atividade que tem como título “Árvore de botões”, usamos como recurso despertador do debate, uma gincana de tabuada. Gincana esta que já havia sido proposta para os alunos com uma semana de antecedência, onde a professora explicou as regras prévias do jogo para os educandos. Os alunos foram divididos em grupos, que primamos por iniciar uma maior interação e cooperativismos entre eles, além de servir para reforçar o domínio das quatro operações de matemática básica.

Posterior ao sorteio e participação de todos os alunos na gincana proposta, os professores deram mais uma bala a cada aluno como incentivo pela participação e cooperação de todos. Observamos a interação e a participação de todos os alunos presentes. Em seguida, foi proposto aos grupos, a confecção de uma árvore de botões.

As árvores foram confeccionadas coletivamente e os alunos usaram os botões trazidos pelos integrantes do grupo e os fornecidos pelos professores. Durante todos os momentos, a troca e a doação de botões entre os grupos foram estimuladas. Os botões foram utilizados pelos alunos para representar as folhas e frutos das árvores.

Os professores fizeram uma analogia com os botões, que em sua variedade de cores, tamanhos e formas, representam o quão rico e variado é a identidade cultura, étnica e de gênero humano. E que esta diversidade humana tem que ser respeitada, pois todos nós fazemos parte do conceito de um mundo plural. Trabalhando assim o respeito aos comportamentos atribuídos aos gêneros, culturas e religiões.

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Considero que a execução desta atividade que leva como título a Árvore de Botões, foi de grande valia para o desenvolvimento das atividades de cooperação entre os alunos. Observei que o trabalho foi bem recebido pelos alunos, que demonstraram boa aceitação da proposta feita pelos professores. Outro ponto positivo foi o interesse e a participação deles na gincana de tabuada feita pelos professores como tema despertador da atenção em sala. Ressalto que, no primeiro momento, da gincana de tabuada, alguns alunos ficaram com receio de competir, porém, conseguimos contornar esta resistência inicial de alguns indivíduos do grupo através do incentivo dos professores. Foi nítida a atenção que os alunos deram para a gincana. Assim, propomos repetir a gincana na sexta-feira seguinte, pois esta proposta despertou grande interesse por parte dos educandos.

Fora os obstáculos de subsídio do projeto, problemática comum enfrentada pelos professores, que dificulta a realização das atividades alternativas propostas, as outras dificuldades foram vencidas na primeira aula facilmente, superadas com o diálogo, onde o professor explicou a importância de se respeitar a diversidade humana. Dificuldades que podemos ressaltar a discriminação, exemplificada claramente nas falas de alguns alunos, quando criticam e se negam a realizar o trabalho proposto com alguns colegas. Falas que podemos citar: “– Não quero fazer este trabalho com ele! – Este grupo só tem mulher, não quero ficar nele! – Queria eu ter escolhido meu grupo. Não gostei deste grupo. – Não gosto de realizar trabalho em grupo. Não vou fazer!”

Foi observado que as falas discriminatórias estão presentes tanto nos discursos masculinos quanto nos femininos, narrados no parágrafo anterior. Ou seja, ao menos nas turmas escolhidas para a execução das atividades, tanto as mulheres quanto os homens demonstraram ainda ter alguns resquícios de preconceito em relação às questões de aceitação das diferenças em sala de aula. Contudo, devemos ressaltar que estas ações preconceituosas foram facilmente contornadas pelos professores, que não se omitiram e impediram que estas ações discriminatórias de alguns alunos viessem a reforçar os efeitos danosos que essas práticas trazem para quem sofre com os seus efeitos.

Deste modo, podemos concluir que durante a realização das atividades propostas, contribuímos para que os ideais de respeito à pluralidade cultural, religiosa e de gênero existente no mundo fossem reforçadas. Acreditando nos ideais transformadores que a educação pode criar.

Segunda Vivência: As tranças de Bintou

Tentando pôr um fim a toda forma de segregação racial e discriminatória sofrida pela população afrodescendente brasileira, durante toda a colonização até os dias atuais. Assim, está engajado nas lutas pela igualdade de gênero, étnico-racial e também pelo respeito à diversidade.

De acordo com o material Gênero e Diversidade na Escola, de 2009, apesar dessa fragmentação, gênero, raça, etnia e sexualidade estão intimamente imbricados na vida social e na história das sociedades ocidentais e, portanto, necessitam de uma abordagem conjunta. Para trabalhar estes temas de forma transversal, será fundamental manter uma perspectiva não essencialista em relação às diferenças. A adoção dessa perspectiva justifica-se eticamente, uma vez que o processo de naturalização das diferenças étnico-raciais, de gênero ou de orientação sexual, que marcou os séculos XIX e XX, vinculou-se à restrição do acesso à cidadania a negros, indígenas, mulheres e homossexuais.

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Devido ao grande interesse e participação dos alunos, já ressaltados na primeira aula, nós dividimos as salas em novos grupos. Mas, repetimos o método de recepção deles, seguido novamente da realização da gincana da tabuada. Visto que demonstraram grande interesse e pediram para que nós repetíssemos esta gincana. E desta vez apenas dois alunos, dos 72 envolvidos apresentaram resistência à gincana, entretanto, esta oposição foi facilmente revertida com o incentivo dos próprios colegas.

Partindo do pressuposto que o Brasil é um país desigual, utilizamos como tema despertador do debate o livro que intitula a atividade, As tranças Bintou (2004), de Sylviane A. Diouf, na versão digitalizada. O livro narra a história de uma menina que vive na África e que sonha em ter tranças longas, enfeitadas com pedras coloridas e conchinhas, como as de sua irmã mais velha e de outras mulheres de seu convívio. Esta obra traz a fantasia como valor capaz de recobrar o sentido mais profundo da infância. Suas belas ilustrações e os personagens bem delineados são capazes de trazer ao leitor uma visão da cultura africana, permitindo assim, repensar também a cultura brasileira.

Após a leitura coletiva, iniciamos um debate sobre as temáticas abordadas pelo livro, com o intuito de questionar a discriminação étnica e os estereótipos/padrões de beleza que são normatizados em sociedade. Posteriormente, foi proposto aos alunos, pelos professores, a confecção de uma atividade artística de produção de autorretratos, confeccionados em coletividade. Os professores reuniram todos os desenhos em um grande mural, e em torno uma frase que prega os dizeres: “Na minha escola todo mundo é igual”. Assim, o professor tenta fazer analogia entre a miscigenação das etnias que ajudaram a compor a população brasileira com a variedade de representação de formas de cabelos e semblantes produzidos pelos alunos.

Outro diferencial exaltado pelos professores foi a queda dos estereótipos de grego, assimilados pela população ocidental.

Para tentar romper com este padrão de beleza “branca, de cabelo liso, loira, magra e jovem,” o professor Ecion propôs, anteriormente e em segredo, a algumas alunas do 4° ano B, que viessem neste dia com tranças nos cabelos, dreads e diferentes tipos de penteados. Dessa forma, eles poderiam estabelecer algumas relações entre os diferentes tipos de cabelos, a influência genética e os diversos tipos de penteados e tranças como representação e influência cultural do indivíduo. Deste modo, reafirmando os ideais que não cabe a nós julgarmos ninguém pela sua aparência física.

Consideramos que a execução desta atividade foi de grande valia para o desenvolvimento da atividade de cooperação entre os alunos. Observamos, na segunda semana de trabalho, maior maturidade por parte dos alunos na execução das atividades propostas. Outro ponto interessante neste dia foi a presença em massa de todos os alunos dos quartos anos A e B. Fato incomum, já que alguns costumam se ausentar das aulas na sexta-feira. Compreendemos isto como uma boa aceitação da proposta feita pelos professores aos alunos. Outro ponto positivo já postulado é o interesse e a participação deles na gincana com tabuada realizada no primeiro momento da aula.

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Outras dificuldades vencidas na primeira aula proposta pelo projeto foram facilmente superadas com o diálogo, onde o professor explicou a importância de se respeitar a diversidade humana. Uma das dificuldades que podemos ressaltar foram os olhares de estranhamento das outras crianças, ao tentarem compreender os diferentes penteados que algumas meninas exibiam no início da aula.

Outro fato bem peculiar aconteceu quando o professor liga para agradecer ao responsável por uma das meninas pela linda trança feita na criança e a pessoa diz: - “Obrigado eu!”. A menina em questão se sentia feia, não gostava de ter seus traços negros nem de fazer tranças em seu cabelo. “Mas, hoje, quando ela chegou da escola ela veio correndo me contar que tinha visto uma história na escola cujo personagem era igualzinha a ela. Além de todos terem elogiado ela a tarde toda na escola”.

Foi muito gratificante ouvir este depoimento de um pai no final do expediente. Outra importante mudança foi a melhora no comportamento desta aluna nos dias que sucederam, melhorou o seu modo de interagir com seus colegas de classe, teve grande avanço em sua autoconfiança e até mesmo no seu processo de aprendizagem e em sua autoestima.

Deste modo, podemos concluir que durante a realização da 2° atividade proposta, contribuímos para que os ideais de respeito à pluralidade cultural e étnica foram reafirmados. Acreditando assim nos ideais transformadores que a educação pode propor.

Terceira Vivência: A diversidade das borboletas

Para a realização da atividade que tem como tema A diversidade das borboletas, usaremos como recursos despertador do debate a fala dos professores, que usaram de frases de impacto transcritas em cartolinas, para dar início ao diálogo e à discussão sobre os temas de respeito à diversidade cultural, étnica e de gênero humano.

Em seguida, é proposto pelos professores que os alunos se dividam em grupos, já previamente formados. Alguns grupos ficaram responsáveis pela confecção de cartazes e outros pela confecção das dobraduras de borboletas de variadas cores, formatos e tamanhos. Borboletas as quais o professor faria uma analogia com a diversidade cultural, religiosa, étnica e de gênero, pois acreditamos que só a educação e respeito mútuo é capaz de proporcionar maior valoração humana. Outra analogia proposta pelos educadores é o livro que apresenta duas figuras humanas que se encontram, de onde borboletas aparentam sair, representando o poder de transformação da educação.

Partimos do pressuposto que atitudes devam ser tomadas para que haja a quebra da omissão nas falas dos professores, por receio de sofrerem represálias ao abordarem temáticas tidas como polêmicas nas unidades escolares. Temáticas que podem mencionar os temas religiosos e aquelas relacionadas à sexualidade e gênero, que quase sempre são inviabilizadas e quando são abordadas só estão relacionadas ao conceito de reprodução humana e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Excluindo, assim, praticamente por completo os temas relacionados às minorias de gênero das unidades escolares. Tal atitude gera em grande parte dos casos comportamentos e sentimentos de segregação, isolamento e solidão. Segundo Lionço e Diniz, “a solidão é um efeito marcante da homofobia. O recolhimento, a impossibilidade de partilhar experiências ou a exclusão do grupo escolar que comprometem a meta educacional” (2009, p.12).

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As dificuldades foram vencidas facilmente com o diálogo, onde o professor sugeria a leitura e a discussão da proposta da mensagem. Falas preconceituosas, homofóbicas e discriminatórias surgiram, mas foram contornadas pelos professores. Observamos que os alunos têm pouco conhecimento sobre as temáticas ligadas ao gênero, logo fazendo uma analogia equivocada sobre a diversidade sexual ou reproduzindo frases de intolerância às minorias de gênero (homofobia). É nítido que o preconceito e a homofobia são mais acentuados nas falas dos alunos do sexo masculino. Fato que atribuímos em parte a esta cultura machista, normatizada e instaurada em nossa sociedade.

Com o intuito de melhorar a qualidade do ensino, concluo que esta atividade vem contribuir de maneira positiva para o desenvolvimento das temáticas relacionadas à diversidade cultural, religiosa e de orientação sexual de maneira ampla e não excludente.

Quarta Vivência: No fundo do mar ninguém é igual

Para a realização da atividade que tem como título “No fundo do mar ninguém é igual”, usamos como recursos despertadores do debate vídeo de autoria de Artur Paiva, intitulado “Diversidade”, que vem exaltar os ideais de igualdade e respeito às diferenças, à liberdade e à diversidade. Neste vídeo é exaltada a ideia de igualdade e respeito entre as diferentes etnias, religiões, nações, pessoas que constituem a pluralidade humana.

Em seguida, exibimos o clipe da música Ser diferente é normal, música de autoria de Chico Xavier e Vinícius Castro, na intenção de reforçar os ideais de igualdade e de respeito às diferenças humanas. No clipe aparece imagem de deficientes físicos, idosos, crianças, jovens, adultos, pessoas com Síndrome de Down, pessoas famosas e desconhecidas cantando em coro que “ser diferente é normal”. Além da própria imagem das pessoas que aparecem no clipe, a própria letra da música é todo um reforço aos ideais de igualdade entre as diferenças humanas, se tornando uma iniciativa para a quebra de padrões normatizando os estereótipos pré-moldados de belezas vistos em sociedade.

Em seguida à apresentação do vídeo e do clipe, os alunos foram divididos em grupos para confecção de um trabalho artístico, onde cada pessoa faria um peixinho diferente um do outro que simbolizaria os ideais de diversidade e igualdade e de direito entre as pessoas. Grupos estes que primamos pela interação entre eles.

Os peixinhos foram confeccionados coletivamente, onde os alunos usaram de casca de ovos e raspas de lápis para ornamentar e diferenciar seus trabalhos. No momento da confecção, o professor incentivou a partilha dos materiais entre os integrantes dos grupos.

Como resultado, tiveram peixinhos com variedade de cores, tamanhos e formas, e os professores aproveitaram isso para fazer uma analogia como representação da diversidade humana. E que esta diversidade humana tem que ser respeitada. Esta iniciativa é uma ação social que prima pelo respeito às diferenças.

Consideramos que a execução desta atividade que leva como título No fundo do mar ninguém é igual foi de grande valia para o desenvolvimento das atividades de cooperação entre os alunos. Observamos que o trabalho foi bem recebido pelos alunos, que demonstraram boa receptividade e aceitação da proposta feita pelos professores.

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Outras observações que julgamos pertinente ressaltar é a existência de preconceitos enraizados nos alunos. Como quando a professora citou o exemplo de uma pessoa homossexual, em sua explicação de igualdade entre os indivíduos, um aluno do sexo masculino do quarto ano A falou: “- Há, veado ou sapatão tio!”. Um exemplo claro de homofobia e machismo em sala de aula. Nós como professores reforçamos os ideais de igualdade entre as pessoas e justificamos ao aluno que a orientação sexual homoafetiva não torna uma pessoa inferior ou superior a uma pessoa heterossexual. Quando questionado este aluno com o discurso de igualdade, eu percebi por meio de sua fala que ele havia absorvido o discurso politicamente correto em sala de aula. Mas, que não punha ele em sua prática cotidiana.

Entretanto, tivemos outros alunos que entenderam o discurso e o puseram em prática, pois logo algumas vozes saíram em defesa da pessoa homossexual citada pelo professor no exemplo. Interpretei esta situação como um sinal de mudança de comportamento e construção de novos valores entre os alunos.

Deste modo, podemos concluir que durante a realização das atividades propostas, contribuímos para que os ideais de respeito à pluralidade cultural, religiosa e de gênero existente no mundo fossem reforçados. Acreditando nos ideais transformadores que a educação pode criar.

3. Considerações Finais

Esta iniciativa mostrou ser de grande valia em defesa dos ideais de valoração do respeito à diversidade cultural, de gênero, étnica e religiosa, que diversidade humana nos é apresentada. As aulas foram elaboradas como iniciativa de combate a todas as formas de normatização da educação, que por sua vez excluem a diversidade humana e também como sinal de alerta a certas tendências evangelizadoras que tenho observado em algumas unidades de ensino, pois acredito nos ideais de uma escola laica.

Outras ponderações também aqui são o interesse nítido dos educandos por aulas diferenciadas. Ressalto também a necessidade de novas iniciativas como esta, pois, como outrora citado neste projeto, as pessoas fingem absorver um discurso politicamente correto, mas, são omissas ou mesmo contraditórias na hora de colocar estes ideais em prática. Em suma, concluo que este projeto veio para reforçar os ideais de solidariedade, cooperativismo, caridade e como uma iniciativa positiva, em prol do respeito à diversidade cultural, étnica, religiosa e de gênero humana.

Referências

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GDE: Gênero e Diversidade na Escola. Módulo 1, Gênero, Unidade 1, Texto 1: Gênero e outras formas de classificação social, Ministério da Educação, UFPA, 2009. Disponível em: http://estatico.cnpq.br/portal/premios/2014/ig/pdf/genero_diversidade_escola_2009.pdf. Acesso em: 06 dez. 2017.

JUNCKES, I. J.; SILVA, J. M. Espaço escolar e diversidade sexual: um desafio às políticas educacionais no Brasil. Revista de Didáticas Especificas, n. 1, p. 142-161. Disponível em: file:///C:/Users/Usu%C3%A1rio/Downloads/9218-20625-1-PB.pdf. Acesso em: 06/8/2017.

LOURO, Guacira Lopes (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

LIONÇO, T.; DINIZ. D. Homofobia & Educação: um desafio ao silencia. Brasília, DF: Editora UnB, 2009.

TOURAINE, Alan. Igualdade e diversidade: o sujeito democrático. Bauru: EDUSC, 1998.

SIBILIA, Paula. Redes ou paredes: a escola em tempos de dispersão. Tradução Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.

BRASIL. Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989. Dispõe sobre punição dos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou precedência nacional, alterando assim, a Lei 7.716/89, página 2773, vol. 5, de tal forma que ampliou o seu objeto que inicialmente estava restrito ao combate dos atos resultantes de preconceito de raça ou cor. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3097/o-principio-da-igualdade-e-a-discriminacao-do-trabalhador/1. Acesso em: 09 dez. 2017.