As ferramentas do design thinking aplicadas no processo criativo do design de interiores: intervenção no espaço de convivência do Instituto Luz de Jesus em Anápolis

Resumo Sob a percepção da demanda de intervenção em um espaço comunitário, onde atualmente funciona uma cozinha, um refeitório e um berçário, o Instituto Luz de Jesus, casa de acolhimento para crianças e adolescentes em Anápolis-GO, se tornou objeto de um projeto de arquitetura e design de interiores. Para sua elaboração, foram abordados alguns conceitos do design thinking no processo de criação, a partir dos quais os problemas e as ideias que envolvem o projeto foram avaliados e desenvolvidos por meio de ferramentas específicas, o que gerou possíveis soluções que se destacam pela consideração dos usuários no processo. O resultado é o enlace da aplicação dessas técnicas, ao mesmo tempo incorporadas na realidade multifuncional relatada pelo espaço através da comunicação constante e da empatia em absorver as necessidades locais. Esta análise não contempla a etapa de execução, por mais próximo da qual este estudo preliminar pretendeu atingir. Caracteriza-se não somente por um projeto de intervenção em um ambiente, mas por um processo que elege a liberdade de criação através de novos instrumentos de análise, distanciando-se de aplicar métodos convencionais que podem “engessar” as soluções e correr o risco de criá-las de forma apenas intuitiva.

Palavras-chave Design thinking, Design de interiores, Espaço comunitário.

Autoria

  • Sara Cândida Gomes de Matos

    Possui graduação em ARQUITETURA E URBANISMO pela Universidade Estadual de Goiás (2011). Especialização em Docência Universitária pela Faculdade Católica de Anápolis (2017). Concluindo especialização em Processos e Produtos Criativos pela Universidade Federal de Goiás (2017). Possui experiência nas diversas áreas de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Planejamento e Projetos da Edificação e Projetos Industriais. Atua desenvolvendo projetos e consultorias personalizadas em Arquitetura e Urbanismo, Arquitetura de Interiores, Paisagismo, Identidade Visual e Tecnologias de Construções Alternativas. Possui interesse pelas discussões sobre teoria da Arquitetura, Urbanismo, Planejamento Urbano, Comunicação Visual, Artes e Educação.

  • Vinícius Marques de Paula

    Arquiteto e urbanista graduado pela Universidade Estadual de Goiás (UEG, 2011), especialista em Processos e Produtos Criativos pela Universidade Federal de Goiás (UFG, 2018) e discente do curso superior de Tecnologia em Gastronomia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás, 2019). Colaborou em escritórios de arquitetura de Anápolis e Goiânia, atuando em projetos arquitetônicos de tipologias variadas. Atualmente compõe o corpo administrativo do Setor de Obras e Manutenção da PUC-Goiás sob a função de analista-arquiteto.

Orientador

  • Carlos Hoelzel

    Graduado em Desenho Industrial pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)(1993), doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2004). Atuo como professor Associado I nos cursos de graduação em Design, Latu Sensu em Design para Estamparia e Strictu Sensu em Preservação do Patrimônio Cultura (Linha de Pesquisa - Cultura Material) da UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA até 2014 e atualmente na UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIAS . Como gestor ocupei a vice-direção do Centro de Artes e Letras. Na trajetória do trabalho acadêmico tive uma experiência extensa em design instrucional e IHC. Atuei também como coordenador da UAB-UFSM e de Equipe Multidisciplinar de Tecnologias de Informação e Comunicação. Na área de projeto de produto desenvolvo particularmente trabalhos em design de gemas e joias aplicando conhecimentos linguagem visual, estudando tendências, sues parâmetros e contextos semiológicos associando esta perspectiva a tecnologias de materiais e sustentabilidade. Líder do grupo de pesquisa Design Contemporâneo.

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1. Introdução

A proposta nasceu ao se ter conhecimento das necessidades do Instituto Luz de Jesus, entender sua realidade e surgir uma oportunidade de intervenção após uma deliberação administrativa de se elaborar um novo projeto de implantação para o local, ou seja, ter a condição de colaborar com estudos que otimizem e organizem de forma criativa a vivência, praticidade e funcionalidade no dia a dia, conforto dos ambientes e uso consciente dos recursos, considerada a natureza da instituição.

Espera-se desenvolver uma proposta de projeto para um ambiente de uso comum, que se constitua de um local de interação entre todos os usuários, com variadas possibilidades de usos e funções. Para isso, estabelece-se uma estratégia de projeto que humanize e estimule atividades criativas e colaborativas no espaço, aplicada no âmbito da arquitetura, do mobiliário/ergonomia, da sinalização, da decoração, com o intuito de apresentar uma proposta acessível e sustentável, com uma atmosfera acolhedora e tranquila.

Será abordado o design de interiores como um produto criativo assim como o design thinking dentro do processo criativo, pois este se constitui de uma série de ferramentas que enriquecem o desenvolvimento de projeto a partir do levantamento dos problemas e de uma pesquisa especializada acerca das necessidades do usuário, o que gera soluções para espaços que simbolicamente se tornem parte de quem for usá-lo.

2. Caracterização do Local de Intervenção

O Instituto Luz de Jesus é uma casa de acolhimento localizada em uma região periférica a oito quilômetros do centro da cidade de Anápolis.

Atualmente, o instituto abriga em torno de 48 crianças e adolescentes, entre 0 e 18 anos, que foram expostas a uma situação de vulnerabilidade, tal qual uma situação de risco social e familiar. Funciona como um local transitório, uma vez que esses acolhidos permanecem até conseguirem um lar familiar seguro. Contudo, muitos não têm o êxito de voltar às suas famílias e nem mesmo de serem adotados, assim sua permanência se estende até alcançarem a maioridade, quando serão encaminhados a uma república, onde têm o direito de residirem até os 21 anos. Recebem visitas semanais de seus familiares, estão matriculados em escolas públicas e têm apoio de psicóloga e assistente social.

A instituição se mantém por um convênio, cuja verba é direcionada para o pagamento do salário dos funcionários e parte da alimentação - leite e pão. O restante de todas as despesas como vestuário, produtos de higiene, alimentação básica, como arroz e feijão, é arrecadado por meio de doações. Entre psicóloga, assistente social e monitores, dez funcionários atuam no local, sob a direção geral de Maria de Fátima Garcez Machado.

A instituição está instalada num terreno de aproximadamente 4.508,38 m² e possui um campo gramado onde as crianças brincam de bola, uma piscina e um espaço para horta que está desativado. Além disso, em sua implantação (Figura 1) existem alguns blocos construídos pelo terreno, como o alojamento masculino, o alojamento feminino, uma sala administrativa e um espaço de apoio que engloba tanto reuniões, triagem de materiais e roupas doadas como atendimentos de saúde (de forma itinerante, promovido pela prefeitura) e de assistência social; e por fim o bloco central, que abrange o berçário, a cozinha e o refeitório – o principal local comum, onde também recebem a maioria das visitas.

Figura 1. Implantação atual – Edição dos autores sobre imagem do Google Earth.
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De forma geral, a condição física das dependências da instituição é estruturalmente mal condicionada, as instalações têm frequentes defeitos, existe pouca acessibilidade entre os blocos e seus ambientes, carência de conforto térmico e de iluminação adequada, sobretudo no atual refeitório (Figura 2) o que deixa o convívio e a permanência dos usuários e funcionários ainda mais fragilizados.

Figura 2. Fotografias do bloco atual do refeitório. Fonte: os autores.

Já existe há algum tempo a demanda de intervenção nos espaços construídos. Perante isso, uma associação entre a direção do instituto, sua assessoria jurídica e de profissionais locais deliberou que será elaborado um projeto para uma nova implantação (Figura 3), que contemplará a adequação física geral, de forma a relocar, ampliar, eliminar ou criar espaços onde for necessário, em conformidade com diretrizes de economia, sustentabilidade e funcionalidade. Com esse projeto geral, a instituição poderá levantar custos, pleitear verbas e aproximar investidores.

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Figura 3. Implantação futura. Edição dos autores sobre imagem do Google Earth.

Com base na Figura 3, o berçário será relocado para o setor de alojamentos, por isso será considerado como objeto deste projeto de intervenção, o bloco central da cozinha, lavandeira e do refeitório, espaço sobre o qual serão aplicadas as ferramentas do design thinking no processo, que serão expostas posteriormente.

3. O Design de Interiores como Produto Criativo

A intervenção dos seres humanos nos espaços é uma expressão de suas necessidades e comportamentos. Sua busca por abrigo e sua organização por meio de agrupamentos sociais estão entre as suas mais primárias atitudes. Até os dias atuais, a busca pela adaptação e desenvolvimento tecnológico, social e cultural torna os espaços habitados uma representação histórica do legado humano.

Nesse âmbito, arquitetos de interiores têm uma importante função e atribuição técnica sobre pensar o design na criação e transformação dos espaços. Segundo Ching (2013: p.36), o design de interiores tem como objetivo ‘a melhoria funcional, o aprimoramento estético e a melhoria psicológica dos espaços internos’ e ainda, dentre tantas condicionantes dentro da elaboração de um projeto, o profissional pode optar por desenvolver, contrapor ou manter as características essenciais de um espaço.

Diante de uma demanda de intervenção espacial, o arquiteto ou designer de interiores se depara com uma série de questões a serem consideradas como: função, utilidade, economia, sustentabilidade, forma e estilo, imagem e significado, a fim de que o projeto esteja diretamente direcionado aos propósitos e habilidades dos seus usuários, assim como suas dimensões físicas adequadas (CHING, 2013: p.45).

Diante de tais questões, o designer de interiores desenvolve etapas no processo de criação, com a finalidade de gerar soluções e atender às expectativas do cliente/usuário.

A primeira etapa de qualquer projeto consiste na reunião e análise da informação, que constitui a base de trabalho que possibilita ao designer de interiores desenvolver suas ideias. A segunda etapa é o desenvolvimento criativo, que, apesar se ser em grande parte intuitivo, é norteado por certos princípios e normas fundamentais de design. (GIBBS, 2010, p. 70).

Apesar de existirem grandes afinidades entre esses princípios, Ching (2013: p. 39) estabelece um ciclo interativo como fundamento do processo de projeto (Figura 4), de forma que as soluções possíveis são sintetizadas a partir da análise dos problemas e podem ser repetidas até que o projeto seja ajustado adequadamente ao que se deseja.

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Figura 4. Ciclo interativo do processo de projeto, segundo Ching.

Pode-se notar que qualquer projeto de design é naturalmente uma atividade de criação. O design de interiores é um meio de transformar ou gerar espaços cujas finalidades envolvem os tipos de usuários, atividades e características de onde está inserido. Um espaço criativo, portanto, mais do que portar qualidade estética e funcional, permite uma nova oportunidade de percepção e vivência entre seus indivíduos.

4. O Design Thinking como Processo Criativo

Existem algumas opiniões diferentes sobre a definição de design thinking. Para Pinheiro & Alt (2011: p. 12), design thinking é ‘um modelo mental, uma abordagem, um olhar’. Já para Lupton (2015: p. 5), o termo ‘normalmente refere-se aos processos de concepção, pesquisa e prototipagem e interação com o usuário’. É um termo relativamente novo que passou a ser disseminado após o design começar a ser estudado como metodologia por profissionais de outras áreas e sintetizado por Tim Brow em 2008;

como uma disciplina que utiliza da sensibilidade do designer e métodos para atender às necessidades das pessoas com o que é tecnologicamente e economicamente viável se convertendo em valor para o cliente e oportunidade de mercado. (ALMEIDA, 2014, p. 29).

O design thinking é uma abordagem de problemas que busca a inovação com foco no ser humano e se baseia em três pilares: empatia, colaboração e experimentação. Visa criar produtos e serviços com criatividade e inovação para qualificar a vida das pessoas a partir do conhecimento de suas necessidades, por meio de insights gerados a partir da racionalização e análise as todas as variáveis de um projeto.

O design thinking é uma abordagem de problemas que busca a inovação com foco no ser humano e se baseia em três pilares: empatia, colaboração e experimentação. Visa criar produtos e serviços com criatividade e inovação para qualificar a vida das pessoas a partir do conhecimento de suas necessidades, por meio de insights gerados a partir da racionalização e análise as todas as variáveis de um projeto.

Sob o pilar da empatia, o designer é capaz de se colocar no lugar do outro, se distancia o suficiente de si mesmo, de modo que suas preferências não se sobressaiam às expectativas do usuário, fazendo-o avaliar o que é realmente significativo para ser aplicado no seu projeto. Por meio das ferramentas da empatia, é possível observar, ouvir e conversar com as pessoas, o que ajuda a compreender suas relações emocionais com o espaço e com as dinâmicas que podem ser proporcionadas.

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Como prática de colaboração, desde a concepção de um projeto até sua realização, muitas disciplinas precisam se sobrepor e colaborar para o desenvolvimento de um todo. Cabe ao designer avaliar todas as condições e tomar decisões, porém também integrar todos os envolvidos de forma que estabeleçam juntos quais os objetivos e as diretrizes do projeto. Ao unir o cliente, o usuário e todos os outros profissionais colaboradores, o designer constrói uma equipe com experiências diversificadas, que contribui para uma avaliação holística de todo o processo, gerando resultados mais eficientes, além de mais satisfação para todos os envolvidos.

Por fim, no âmbito da experimentação, o designer pode atestar suas ideias assim como voltar atrás quando elas não performam adequadamente como o esperado. Ao reunir todas as condicionantes de uma demanda e tomar as decisões necessárias, pode ser necessário se distanciar novamente e avaliar se o projeto está pronto para atingir uma experiência compatível com as expectativas tanto do cliente quanto da equipe.

Embora as ferramentas do design thinking não serem para uso exclusivo dos designers, a proposta de aplicá-las ao processo de projeto de arquitetura ou mesmo de interiores se mostra como um ponto positivo, pois aprimora as etapas de compreensão e análise dos problemas visando à criação de soluções mais efetivas.

5. O Design Thinking Aplicado no Projeto de Interior

Tendo em vista as demandas espaciais do Instituto Luz de Jesus, com foco sobre o bloco do refeitório existente que está inadequado, serão apresentadas a seguir algumas ferramentas do design thinking aplicadas ao processo criativo do design de interiores, que norteou o desenvolvimento das soluções e da formatação da proposta de projeto para o novo espaço de convivência e refeições do Instituto.

5.1. Brainstorming

Consiste em suscitar grande quantidade de ideias, onde o intuito é reunir e colaborar com pensamentos e ferramentas para rodear o problema com soluções mais assertivas, pois se acredita que um grande número de colocações aumenta a probabilidade de se ter ideias úteis.

Num grupo participativo são estudadas e analisadas uma tempestade de ideias a fim de gerar propostas rápidas e maior número possível de temas, um conceito que não há crítica nem julgamento, onde toda anotação faz-se importante ao ponto de trazer novas combinações e assim novas soluções. ‘Associações improváveis e contribuições aparentemente aleatórias muitas vezes tornam-se o centro da solução de design’. (LUPTON, 2001: p. 20).

Pelo brainstorming todas as considerações são relevantes e após uma análise total do problema e suas necessidades podem-se determinar possíveis direções de um projeto. ‘Trata-se de uma forma prática de abrir sua mente e libertar o poder das ideias inusitadas’. (LUPTON, 2001: p.16).

Segundo Zingales (1978) expor seu pensamento sem julgamento liberta o estado natural do cérebro, suspende toda crítica vinda de conceitos técnicos, culturais, sociais, e proporciona o indivíduo aventurar em ideias que exaltam a criatividade, contrapondo as reuniões convencionais, onde uma ideia pode vir a não ser aceita pelo crítico, provocando um bloqueio mental.

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Figura 5. Prancha de visualização do brainstorming aplicado.

A ferramenta foi aplicada (Figura 5) a partir da definição de quatro tópicos no formato de perguntas a serem respondidas com possíveis soluções. Os tópicos permearam questões sobre problemas gerais, referentes ao bloco como um todo, e problemas específicos, como soluções para o mobiliário. Para cada tópico foram estabelecidos 6 minutos, divididos em duas etapas.

5.2. Mapa Mental

Diagrama associativo para organizar e visualizar as ideias e o caminho de um projeto. De maneira solta e intuitiva, este método explora rapidamente o objeto central, pois trata o assunto de forma mais palpável dando forma e contexto, direção e planejamento estratégico para alcançar objetivos específicos.

O elemento a ser explorado é posicionado ao centro, a partir de expressões que remetam a este assunto, cria-se uma rede de associações. Estas colocações podem ser organizadas por cores diferentes para cada ramificação do diagrama, e assim também representadas por sinônimos, antônimos, causa, efeito, simetria/ similaridade, frases feitas e assim por diante.

O resultado será sempre uma surpresa, sobretudo consciente e eficaz ao desenvolvimento do processo de criação do projeto.

Figura 6. Imagem da diagramação do mapa mental.

O mapa foi iniciado com o foco no conceito principal de espaço multiuso (Figura 6). A partir dele, foram ramificados os usos possíveis, que por suas vezes se organizaram em subitens. Foi estabelecido um eixo diagonal com duas características essenciais ao objeto central do problema. Por fim, quatro itens do mapa foram destacados e levados ao desenvolvimento do projeto.

5.3. Pesquisa Visual

Ferramenta de pesquisa qualitativa, ela proporciona a produção de um pensamento visual, através de informações que retratam a realidade e que revela dados essenciais.

A pesquisa visual consiste em especular e analisar o objeto de estudo por diversos ângulos, desencadear e provocar ideias criativas, de tal forma que a apresentação convencional não possibilita.

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Figura 7. Painel visual com projetos de referência desenvolvido pelos autores. Legendas na próxima página.

É necessário escolher uma área a ser analisada visualmente, características repetitivas, cores mais usadas, aspectos recorrentes investidos de valor cultural que reflitam as crenças culturais do local. O registro é a reprodução da percepção visual dos dados analisados, ele possibilita diferentes maneiras de criar soluções inovadoras, reais e adequadas às necessidades locais.

Para o desenvolvimento do painel (Figura 7), foram escolhidos espaços referenciais com usos semelhantes, como escolas, áreas de convivência e centros comunitários. Nota-se a predominância de uso de materiais regionais, que são influenciados pelo clima e entorno edifícios; o mobiliário que se ajusta, encaixa e integra os espaços; e o uso de paletas de cores para sinalização, delimitação dos ambientes, estética e fator de influência para o desenvolvimento da aprendizagem.

5.4. Briefing de Criação

Forma de comunicação eficiente entre o designer e o cliente, o briefing norteia e compartilha o conhecimento e necessidades do projeto.

É um documento prático composto de informações detalhadas referentes às especificidades do produto. Através de perguntas direcionadas que conduzam a um minucioso conhecimento do espaço e uso, todos os envolvidos no processo conseguem acessar as respostas e trabalhar em cima de um perfil montado pelo questionário.

Pesquisar temas semelhantes auxilia na descoberta de novas formas de compreender a atmosfera criada, entretanto é necessário sempre atualizar estes estudos ao briefing e estabelecer sua essência.

Figura 8. Quadro síntese do briefing.

Com base nas visitas ao local, nas respostas dos usuários as perguntas conduzidas referentes às necessidades do espaço, foram coletadas informações convertidas em um quadro síntese (Figura 8) com a descrição de todos os espaços e previsão de áreas e especificidades. O quadro pode ser consultado ao longo do desenvolvimento do projeto, bem como passar por alterações, caso sejam necessárias.

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5.5 Brain Dumping Visual

Intensivos esboços são criados a partir do objeto de estudo e direcionado pelas necessidades do espaço, esta técnica transforma as palavras em desenhos, ‘coletam imagens para construir bancos de dados de ideias visuais’. (LUPTON, 2001: p. 66). Representados por pequenos croquis rápidos, eles são mais eficientes se forem feitos em um tempo determinado e posicionados na mesma página a fim de comparar, visualizar, e então poder escolher a representação visual da proposta.

É preciso ir além do que se vê, é necessário descobrir respostas e associações mais profundas, captar a essência ‘atingindo resultados surpreendentes que nos tocam por sua originalidade’. (PHILLPIPS & LUPTON, 2015: p. 13).

Figura 9. Croquis do desenvolvimento do projeto.

Esta ferramenta, em projetos de design de interiores, é bem representada pelos croquis do processo de criação (Figura 9). Não seria possível estabelecer um estudo real dos fluxos, usos e necessidades se a cozinha, a lavanderia e os sanitários não fossem incluídos na planta geral da área disponível, entretanto esses espaços não serão detalhados.

A forma de se apropriar o espaço dá-se por várias formas, e por esta ferramenta foi importante ver como o desenho em sucessivas tentativas mostra um caminho para uma solução e até mesmo a escolha do melhor produto. (Figura 10).

Figura 10. Estudos de disposição do mobiliário de acordo com os possíveis usos.

5.6. Jornada do Usuário

Também representada por gráficos demonstrativos da relação do usuário com o projeto, esta ferramenta é o percurso, a visualização descrita por um diagrama do movimento espacial de todas as etapas de relacionamento do cliente com o produto e suas expectativas em cada momento. Explorar melhor cada perfil de pessoas e enxergar pelos olhos do usuário permite examinar detalhadamente as propostas de fora para dentro.

Por meio de pesquisas qualitativas o usuário compartilha suas experiências, o que permite ao designer observar os pontos fracos do serviço e assim melhorar de forma eficiente e aprimorar por meio da cocriação com seu cliente. É pela observação do cliente e sua relação com o espaço que se faz o diagrama de uso, se identifica possíveis problemas, e quando associados com outros usuários pode proporcionar um espaço amplamente flexível e aberto aos diversos usos e funções.

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Figura 11. Gráficos das jornadas dos usuários.

Foram estabelecidos quatro fatores que delinearam os gráficos (Figura 11): à esquerda, os usuários divididos em faixas etárias; acima, os turnos do dia; à direita, os locais de permanência; e abaixo, as rotinas, separadas em dias úteis – períodos em que os acolhidos vão para a escola ou creches – e fins e semana, quando recebem visitas dos familiares e maior uso dos espaços de lazer.

5.7. Painel Conceitual

É um método criativo amplo e aberto, que colabora com as soluções do programa de necessidades e ajuda na compreensão da essência do projeto. Seguir uma unidade visual e definir um padrão contextual são caminhos para se formatar um painel de apresentação que caracteriza o produto.

Por muitas vezes são montados através de colagens de revistas, jornais, retalhos de tecido, imagens ilustrativas que retratam todo o conteúdo, expressa o estilo e combina variados pontos em comum. ‘Uma simples combinação de cores ou formas pode gerar uma ideia que produzirá um trabalho muito mais original e inspirador que a simples cópia de um interior já existente’. (GIBBS, 2010: p. 66).

Usualmente as cores são recorrentes no painel semântico e escolhidas em variadas formas. Inspira, direciona e organiza os pontos em comum do tema abordado. São ainda úteis para compreender a relação afetiva do usuário com o espaço, acumulam valores simbólicos, mapeiam e referenciam este quadro visual em solução, apresentação, a fim de analisar estas composições e transportá-las em criativas representações imagéticas do projeto.

Baseou-se a pesquisa em quatro tópicos norteadores para conceituação do espaço: materiais construtivos e de acabamento, mobiliário, paleta de cores e comunicação visual. Dessa forma, o painel (Figura 12) foi montado como uma colagem, a partir da sobreposição de texturas, contrastes, formas e versatilidade dos elementos e, acima de tudo, materializa um portfólio de referências que propõem uma linguagem ao projeto.

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Figura 12. Painel conceitual elaborado pelos autores atráves da montagem de imagens selecionadas no Pinterest.

6. Conclusão

Este projeto não teve o intuito de criar um ambiente que nunca foi visto ou desenhar um mobiliário único, que ainda não fora inventado, mas de elaborar um espaço cujas soluções fossem originadas e fundamentadas através da aplicação das ferramentas do design thinking. Vê-se, portanto, que a inovação do projeto encontra-se na forma de desenvolver e solucionar problemas por meio de uma abordagem que não é usualmente praticada em projetos de interiores, o que direciona o objeto de intervenção numa estrutura lógica e organizada, permitindo maior clareza na análise dos problemas e rapidez nas soluções.

O objetivo inicial era resultar em um refeitório que além dessa configuração, funcionasse como um espaço flexível, que pudesse ser apropriado de várias formas conforme outras necessidades da instituição. Por esse motivo, a escolha das mesas em formato trapezoidal permite grande variedade de montagens de layout, tanto em pequenos quanto em grandes grupos (Figura 13). Além disso, foram desenhadas com os princípios do desenho universal, atribuindo acessibilidade para pessoas com deficiência.

Figura 13. Imagem superior em maquete da intervenção do refeitório.

Para um espaço flexível, uma mesa coletiva contínua, por exemplo, não se mostra prática, pois se torna pesada e difícil de adequar-se a outras configurações. Dessa forma, optar por mesas separadas e ao mesmo tempo em que se encaixem e formem novos desenhos, foi essencial para proporcionar adequações a todos os usos deste espaço. O conjunto especial de mesas e cadeiras com dimensões menores é ergonomicamente adequado para igualdade de uso do espaço pelas crianças e por pessoas com baixa estatura, se for o caso.

As estruturas em concreto ao longo das laterais (Figura 14) do salão atuam como bancos e prateleiras permanentes que além de abrigarem os objetos necessários para as atividades no local, possuem diferentes alturas para o alcance de todos.

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Figura 14. Imagem em maquete com visão para os bancos e prateleiras.

Por uma questão de fluxo, os lavatórios (Figura 15) foram disponibilizados entre as portas de entrada e, além de terem duas alturas, possuem um desenho que se integra visualmente ao espaço com acabamento nas mesmas cores da paleta geral utilizada.

Figura 15. Imagem em maquete com visão para os lavatórios.

O espaço dos bebês foi determinado em um canto que facilita o seu monitoramento e é delimitado por um cercado removível (Figura 16). E a parede ao fundo, que divide com a cozinha, recebeu sinalização que integra, porém setoriza visualmente esse espaço com o de serviço das refeições.

Figura 16. Imagens em maquete com visão para espaço dos bebês e para parede que divide com a cozinha.
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As portas de entrada, juntamente com as demais vidraças, foram locadas na fachada sul, por não receber incidência solar e não haver desnível para o acesso. As fachadas laterais, que são visualizadas por todos os outros blocos construídos, receberam trechos em pareces coloridas e faixas de elemento vazado cerâmico, material regional, barato e que funciona como ventilação permanente para uma região que tem o clima bem quente durante o dia (Figura 17). Ao norte foi previsto o setor de serviços – cozinha e lavanderia – com seus acessos isolados pelo fundo.

Figura 17. Imagens em maquete da fachada frontal e lateral.

Essas imagens representam o fruto do envolvimento do usuário como parte fundamental para a determinação das soluções, em observar de forma holística a realidade da instituição. A integração das cores associadas à demarcação dos espaços e do mobiliário, ao optar por materiais da região, ao uso de tecnologia construtiva que beneficie o conforto e a estética aliada ao baixo custo, também foi considerada dentro do processo. E, por conseguinte, ressaltar em todos os olhares a especificidade de vários usos e idades dos usuários, permitindo ao espaço transparecer descontração e acolhimento.

De forma geral, a inovação do projeto é demonstrada pelo processo, na forma de construir o conceito e associá-lo aos recursos físicos disponíveis e à realidade financeira da instituição; assim como quanto ao resultado que habilitou este estudo a outros instrumentos técnicos capazes de buscar respostas com maior precisão e foco tanto para o usuário quanto para o(s) arquiteto(s). O design thinking, por ser constituído por ferramentas práticas que sistematizam as informações em ações, transformou o projeto em um processo criativo e inusitado ao ambiente aplicado, sensível a um planejamento de forma limpa e aberta, parâmetros fundamentais para a proposta e realidade da instituição.

Referências

ALMEIDA, Amanda M. Contribuições do Design Thinking a partir de um projeto de acessibilidade na aviação. São Paulo: FAU-USP, 2014.

BAXTER, Mike. Projeto de produto: guia prático para o design de novos produtos. São Paulo: Blucher, 2000.

CHING, Francis D. K. Arquitetura de interiores ilustrada. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013.

GIBBS, Jenny. Design de interiores: guia útil para estudantes e profissionais. Barcelona: Gustavo Gili, 2010.

LUPTON, Ellen & PHILLIPS, Jennifer C. Novos fundamentos do design. 2. ed. São Paulo: Cosac Naify, 2015.

LUNPTON, Ellen. Intuição, ação, criação – Graphic Design Thinking. São Paulo: Editora G. Gili, 2013.

PINHEIRO, Tennyson & ALT, Luis. Design Thinking Brasil: empatia, colaboração e experimentação para pessoas, negócios e sociedade. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

ZINGALES, Mario. A organização da criatividade. São Paulo: EPU: Ed. da Universidade de São Paulo, 1978, p. 17-29.

Legendas das imagens do painel visual

A – We+ Coworking Space, MAT Design. Chaoyang, China - 2015. Foto: Kangshuo Tang. Fonte: https://www.archdaily.com/779238/yuanyang-express-we-plus-co-working-space-mat-office.

B – Espaço Alana, Rodrigo Ohtake Arquitetura e Design. São Paulo, Brasil - 2015. Foto: Rafaela Netto. Fonte: https://www.archdaily.com.br/br/800524/espaco-alana-rodrigo-ohtake-arquitetura-e-design.

C – Projeto Social JAMDS, Tavares Duayer Arquitetura. Rio de Janeiro, Brasil -2016. Foto: João Duayer & Nathalie Ventura. Fonte: https://www.archdaily.com.br/br/888108/projeto-social-jamds-tavares-duayer-arquitetura.

D – Escola Secundária Lycee Schorge, Kéré Architecture. Koudougou, Burkina Faso - 2016. Foto: Iwan Baan. Fonte: https://www.archdaily.com.br/br/886981/escola-secundaria-lycee-schorge-kere-architecture.

E - RE-AINBOW, H&P Architects. Hà Tĩnh, Vietnã - 2015. Fonte: Doan Thanh Ha. Fonte: https://www.archdaily.com.br/br/779053/re-ainbow-h-and-p-architects.

F - FCA Srbija Kindergarten / IDEST Doo. Kragujevac, Serbia – 2014. Fonte: Jelena Arsenijević. Fonte: https://www.archdaily.com/773150/fca-srbija-kindergarten-idest-doo.

G - Little England Bilingual School, Massimo Adiansi Architetto. Collebeato, Itália – 2009. Foto: Massimo Adiansi. Fonte: http://www.archilovers.com/projects/70929/little-england-bilingual-school.html.

F - Moradas Infantis de Canuanã, Aleph Zero + Rosenbaum. Tocantins, Brasil – 2017. Foto: Leonardo Finotti. Fonte: https:// www.archdaily.com.br/br/879961/moradias-infantis-rosenbaum-r-plus-aleph-zero.