2. TRAJETÓRIAS DE VIDA DOS PROFESSORES:
Cinco protagonistas e suas histórias de vida
Quem com pó de giz
Um lápis e apagador
Deu o verbo a Vinícius
Machado de Assis, Drummond?
Quem ensinou piano ao Tom?
Quem pôs um lápis de cor
Nos dedos de Portinari
Picasso e Van Gogh?
Quem foi que deu asas a Santos Dumont?
Crianças têm tantos dons
Só que, às vezes, não sabem
Quantos só se descobrem
Porque o mestre enxergou
E incentivou
É, só se faz um país com professor
Um romance, um croqui, com professor
Um poema de amor, dim dim
Um país pra ensinar seus jovens
É, só se faz um país com professor
Um romance, um croqui, com professor
Um poema de amor, dim dim
O Professor, por Tânia Maya,
composição de Celso Viáfora.
Este texto é construído a partir da análise de trechos de cinco entrevistas narrativas realizadas com professores de Matemática. Essas narrativas foram produzidas no contexto de uma pesquisa de mestrado, cujo objetivo foi buscar indícios de processos de identificação com materiais manipuláveis e seu uso em sala de aula de matemática, nas narrativas de egressos do curso de licenciatura em matemática da Universidade Federal de Goiás.
Trabalhar com narrativas de professores de Matemática, segundo Paula e Auarek (2012, p. 39), é uma maneira de “construir uma história da docência de Matemática a partir das próprias palavras daqueles que vivenciaram e participam do fazer da docência”.
As narrativas foram transcritas, lidas e relidas várias vezes até identificar algumas experiências semelhantes, mas vale ressaltar que Larrosa (2002, p. 27) afirma que a experiência é algo singular, ou seja, por mais que os professores “enfrentem o mesmo acontecimento, não fazem a mesma experiência”. Pois ainda segundo o autor, “ninguém pode aprender da experiência de outro, a menos que essa experiência seja de algum modo revivida e tornada própria” (LARROSA, 2002, p. 27).
Nesse sentido buscamos elementos nas narrativas que permitisse uma reflexão sobre as marcas deixadas durante a graduação, dando ênfase para os aspectos das políticas de permanência na universidade e alguns episódios de sala de aula, com o intuito de auxiliar outros professores em suas reflexões.
Apresento-lhes os protagonistas de suas histórias, homens e mulheres que se comprometeram com os desafios da sala de aula nos diferentes níveis de ensino da cidade de Goiânia. Decidimos manter o anonimato, por princípios éticos, então escolhi nomes fictícios, optando por Eduardo, Marina, Ricardo, Osvaldo e Larissa.
Esses protagonistas foram meus colegas, temos mais ou menos a mesma idade e compartilhamos mais ou menos as mesmas vivências e tensões. Tenho uma proximidade maior com alguns, mas muitos acontecimentos relacionados à trajetória profissional deles eu só pude conhecer através da entrevista narrativa.
Apresento inicialmente o Eduardo, ele estudou no interior de Goiás durante a sua infância e adolescência. Mudou para Goiânia para fazer o curso superior de licenciatura em Matemática na Universidade Federal de Goiás. Eduardo enfatiza que a escolha da profissão ocorreu por influências de brincadeiras durante a infância, no qual brincava de ser professor. Já a escolha pela matemática foi por afinidade, era a disciplina mais marcante durante a educação básica.
Ele relata que o ingresso no curso de matemática causa um impacto, pois é uma realidade no qual não estava adaptado e chegou a pensar na possibilidade de mudar de curso. O gosto pelo curso foi surgindo à medida que ele teve um contato mais direto com a universidade, momentos que foram proporcionados pelo grupo PETMAT e também pelas disciplinas específicas da área de educação. Dentro do grupo Eduardo teve a oportunidade de ter um contato com a prática docente e de perceber como se dá o funcionamento da sala de aula. Logo que concluiu o curso de licenciatura em matemática, foi aprovado no processo seletivo do mestrado em Educação em Ciências e Matemática e hoje atua nas escolas da rede estadual de Goiás.
A outra professora é a Marina, iniciou os estudos em Mato Grosso do Sul e ainda criança veio com sua família para Goiânia e deu continuidade nos estudos nas escolas públicas da cidade. Ela relata que durante a educação básica já tinha uma identificação pela área de exatas e recebia incentivos dos professores dessa área. Com isso, após concluir o Ensino Médio, Marina resolve ingressar no curso de licenciatura em matemática e para ela a adaptação ao início do curso foi difícil, chegou a se questionar se estava no curso certo e juntamente com a sua família decidiu sair do emprego e se dedicar aos estudos na universidade. Quando começou a fazer parte do grupo PETMAT, ela relata que a graduação começou a dar certo e ela foi entendendo o seu lugar dentro da universidade.
Além disso, ainda dentro do grupo PET, Marina teve contato com alguns projetos que foram importantes para sua formação, que foram: o Matemática no Circo e o Clube de Matemática, em ambos os projetos ela teve um contato mais próximo com um professor que lhe deixou marcas importantes na sua formação. Na sua graduação ela começa a fazer parte de um grupo de pesquisa que estuda a teoria histórico-cultural dentro dos processos de ensino e aprendizagem da Matemática. O gosto de pelos estudos levou Marina ao mestrado em Educação em Ciências e Matemática, e sua pesquisa foi sobre a formação inicial de professores dentro do grupo PET. Após concluir o mestrado, ingressou no doutorado para dar continuidade a sua pesquisa, que também é sobre o grupo PET, pois ela defende e acredita no potencial desse Programa.
O professor Ricardo é filho de pedagoga, então desde cedo teve contato com o ambiente escolar. Iniciou seus estudos em escolas particulares, mas ele relata que sua ida para a escola pública foi marcante pelo processo de politização que ele teve na escola pública. Além disso, o ensino público o formou como cidadão e o ensinou sobre a importância dos conteúdos, e teve um grande envolvimento com o grêmio estudantil. Durante sua trajetória no Ensino Médio Ricardo já se via como professor, e acabou escolhendo a matemática pela facilidade que tinha com a disciplina. Com isso fez o vestibular e foi aprovado para o curso de matemática na UFG. Ricardo relata que durante o curso teve sucessos e insucessos em relação às disciplinas, pois teve mais facilidades em algumas e, em outras, mais dificuldades. Ele foi bolsista do programa PET durante alguns semestres do curso, e ele relata que o grupo teve muita importância no início da sua docência, pois foi onde ele teve seu primeiro contato com a sala de aula, a escolha do tema do seu Trabalho de conclusão de curso e o público foi influenciado pelo grupo. Além disso, ele relata que no PET ele teve a oportunidade de experimentar a universidade, no sentido de vivenciar o que a universidade tem a oferecer e não apenas cumprir as disciplinas e ir embora para casa. Atualmente Ricardo trabalha há cinco anos no Centro de ensino em período integral (CEPI) e relata que sente falta de ter pesquisas voltadas para o CEPI.
O professor Osvaldo, assim como muitas crianças brasileiras, tinha o sonho de ser jogador de futebol, ele até mudou de cidade algumas vezes em busca desse sonho, mas percebeu que esse sonho não era uma realidade para ele. Durante o Ensino Médio, Osvaldo teve contato com alguns professores que o incentivaram a fazer o curso de matemática na universidade, e por meio desse estímulo ele foi aprovado no vestibular e iniciou o curso de licenciatura em matemática na UFG. O início da graduação foi bem marcante para ele, em relação a adaptação ao ritmo do curso e as disciplinas iniciais. Teve um momento no curso que o Osvaldo começou a se questionar, ele percebeu que todas as disciplinas que havia estudado até aquele momento não o capacitava para lidar com a sala de aula e começou a buscar meios dentro da universidade para nutrir esse questionamento. Então, ele acabou chegando no grupo PET e ali dentro percebeu que era um espaço que lhe dava subsídio enquanto professor em formação. Osvaldo relata que o grupo PET foi primordial na sua formação, pois teve experiências que o ajudaram a pensar no processo de ensino e aprendizagem da matemática.
A professora Larissa mudou-se de Imperatriz do Maranhão com a sua família para Goiânia quando ela ainda era criança. Durante o ensino básico teve a oportunidade de estudar tanto em escolas particulares quanto escolas públicas. Nesse meio tempo, Larissa tinha em mente que ia fazer o curso de psicologia, mas foi influenciada por um professor que a incentivou a fazer matemática, com isso Larissa fez o vestibular e foi aprovada no curso de matemática. Ela relata que o início da graduação foi bem difícil, pois ela percebeu que houve uma defasagem de conteúdo no Ensino Médio e isso acarretou as disciplinas iniciais do curso. Larissa também foi bolsista do grupo PET por alguns semestres e ela relata que não são todos que têm a oportunidade de vivenciar as experiências que o PET proporciona. Além disso, dentro do grupo Larissa entendeu que queria ser professora, pois ela conta que caiu de paraquedas no curso, mas através das vivências na universidade e no PET ela percebeu o seu lugar. O gosto pelos estudos a conduziu para uma Especialização em Educação Matemática, ao Mestrado em Educação em Ciências e Matemática e na época da entrevista, estava cursando o Doutorado na mesma área de pesquisa. Atualmente, Larissa atua nas escolas da rede estadual de Goiás.
A maior parte dos professores protagonistas tiveram alguma identificação com a matemática na educação básica, provavelmente, a matéria que tinha mais facilidade e mais gostava, em detrimento das outras, isso justifica a escolha do curso de licenciatura. Mas, mesmo gostando ou tendo facilidade com a matemática, a maioria deles tiveram algum tipo de dificuldade de adaptação com a rotina de estudos na graduação, isso ficou nítido em alguns relatos e houve a possibilidade de abandonar o curso. Diante desse cenário, comum a maioria dos protagonistas e inclusive da própria autora, o grupo PET teve um papel essencial em nossas trajetórias, pois a partir da inserção nesse grupo, começamos a enxergar nosso lugar dentro da universidade e ter a convicção da escolha correta do curso e da profissão.