Contextualização
Problem Based Learning (PBL), traduzido em português como “aprendizagem baseada em problemas” (ABP), foi desenvolvido em 1969, na Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de McMaster, no Canadá, com base na metodologia do estudo de casos da Escola de Direito de Harvard dos anos 1920. (SCHMIDT, 1993; SPAULDING, 1969).
Posteriormente, o número de escolas médicas que tem incorporado esse método em currículos, disciplinas e aulas é crescente e tem repercutido no mundo e no Brasil como importante processo de ensino-aprendizagem. (ALMEIDA; BATISTA, 2013; BORGES et al, 2014).
No Brasil, no final dos anos 1990, a Faculdade de Medicina de Marília, a Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Londrina e a Escola de Saúde Pública do Ceará são as primeiras instituições a utilizar o método PBL em sua base curricular (ALMEIDA; BATISTA, 2013).
As Diretrizes Curriculares Nacionais trazem uma mudança do foco educacional em saúde da aquisição de conhecimento e do treinamento prolongado para o alcance de objetivos de aprendizado e para a preparação dos graduandos em responder às demandas de saúde individual, coletiva e do sistema de saúde espera-se que o estudante desenvolva, em um processo interativo, competências específicas para o desempenho profissional. (BRASIL, 2014; PRICINOTE; PEREIRA, 2015). Para tanto, os currículos tradicionais, as metodologias de ensino e de avaliação tornaram-se ultrapassados. As tendências atuais no ensino em saúde apontam para a utilização de metodologias ativas, em que o aluno é o protagonista do seu próprio processo de formação, transformando-se o professor em um facilitador e motivador deste processo (ANASTASIOU; ALVES, 2010; PRICINOTE; PEREIRA, 2015). E o PBL veio ao encontro dessas necessidades, ganhando espaço nas escolas médicas brasileiras (CAVALCANTE, et al, 2018).
Definição
Acredita-se que o conhecimento aprofundado é desenvolvido quando o estudante torna-se responsável pelo seu aprendizado, utilizando de forma eficaz a análise crítica como parte do processo de aprendizagem. O pensamento crítico inclui a capacidade de: análise e síntese do novo conhecimento, avaliação dos novos conceitos, fazer conclusões e previsões, construção de um plano de trabalho, auto – regulação e tomada de decisão. (AZER, 2009)
Para alcançar o objetivo de desenvolver o conhecimento aprofundado, o PBL é um método de ensino em que os estudantes, separados em pequenos grupos (grupos tutoriais) são expostos a cenários ou situações problema. Para a solução, os alunos terão que entender princípios essenciais e coletar dados relevantes, definindo-se os objetivos de aprendizado. Posteriormente, os mesmos realizam estudo autodirigido com a finalidade de alcançar os objetivos propostos e, por fim, retornam-se ao grupo para discussão e construção do conhecimento. O professor ou tutor tem a função de facilitador desse processo. (WOOD, 2003)
Espera-se que os alunos, estimulados por esta experiência, vejam a relevância do que estão aprendendo para suas responsabilidades futuras, mantenham um alto grau de motivação e comecem a entender a importância de atitudes profissionais responsáveis. (SPAULDING, 1969).

Por se tratar de uma proposta pedagógica, o PBL pode compreender desde aulas específicas até todo o currículo de cursos, situação esta na qual a matriz curricular costuma ser dividida em módulos ou unidades temáticas, que são compostos de várias sessões e integram diversas disciplinas e o conhecimento básico e clínico (BORGES et al, 2014).
Estruturação
No contexto da estruturação da metodologia PBL, destacam-se: a instituição, os pequenos grupos, os casos- problemas, os atores (tutor e alunos), sessão tutorial e a avaliação (BORGES et al, 2014; DAVIS; HARDEN, 1999)
Instituição (AZER, 2011) |
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Pequenos Grupos (AZER, 2004; TORRES; VAN DER VLEUTEN; DOLMANS, 2016) |
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Casos – problema (AZER et al, 2013; DAVIS; HARDEN, 1999; WOOD, 2003) |
Gatilho para discussão
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Pequenos Grupos (AZER, 2004; TORRES; VAN DER VLEUTEN; DOLMANS, 2016) |
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Atores | Tutor (BORGES et al, 2014; DAVIS; HARDEN, 1999; NESARGIKAR, 2010) |
Facilitador do aprendizado
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Aluno (BATE; TAYLOR, 2013; BORGES et al, 2014; RODRIGUES; FIGUEIREDO, 1996) |
Protagonista do aprendizado
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Sessão Tutorial Estratégia de aprendizagem através da Técnica dos Sete Passos |
Primeira fase: abertura do problema |
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Segunda fase: fechamento do problema |
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Avaliação (BARROWS, 1988; DAVIS; HARDEN, 1999) |
Influenciador do comportamento do estudante
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Coordenador | Secretário | Membro do grupo |
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Liderar a sessão tutorial | Registrar pontos relevantes apontados pelo grupo | Acompanhar todas as etapas do processo |
Encorajar a participação de todos | Ajudar o grupo a ordenar o raciocínio | Ouvir e respeitar a opinião dos colegas |
Manter a dinâmica da sessão tutorial | Registrar as fontes de pesquisa utilizadas pelo grupo | Fazer questionamentos |
Controlar o tempo | Participar das discussões | Procurar alcançar os objetivos de aprendizagem |
Assegurar que o secretário possa anotar adequadamente os pontos de vista do grupo | Compartilhar as informações obtidas | |
Garantir que o grupo foque na tarefa e alcance os objetivos de aprendizagem | Participar das discussões |
Contrato social | Abertura | Fechamento |
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Assiduidade | Identifica as lacunas do conhecimento | Compartilha o conhecimento adquirido |
Pontualidade | Levanta os problemas | Demonstra capacidade de síntese |
Relacionamento interpessoal | Participa do brainstorm | Alcança os objetivos de aprendizagem |
Participação ativa e focada na sessão tutorial | Elabora os objetivos de aprendizagem | Adota postura crítica ante às informações compartilhadas |
Consideração Final
Apontam-se várias vantagens na utilização do PBL como metodologia de ensino aprendizagem: estruturação do conhecimento para utilização no contexto clínico com aproximação entre a teoria e a prática, desenvolvimento do raciocínio clínico e crítico, ser motivacional da aprendizagem significativa, desenvolvimento de competências e atitudes (solução de problemas, comunicação, trabalho em equipe, facilitador de grupos, respeito aos colegas, escuta, apresentação de idéias, avaliação crítica da literatura, autoaprendizagem com respeito à autonomia do estudante), valorização da interdisciplinariedade e aprofundamento da aprendizagem com construção do conhecimento (BORGES et al, 2014; DAVIS; HARDEN, 1999).
As desvantagens também devem ser abordadas: requer maior comprometimento e investimento pelo professor na preparação e estudo para as sessões tutoriais, sessão tutorial malconduzida pode gerar desestímulo por parte do aluno e dificuldade na organização do conhecimento, existe custo elevado de implementação tanto para estrutura física e recursos humanos e demanda consumo de tempo livre do estudante para estudo prévio às sessões tutoriais (DAVIS; HARDEN, 1999; LEON; ONÓFRIO, 2015).
Para a manutenção e/ou aprimoramento da qualidade do método detalhes ao longo do tempo de vivência do PBL não podem ser negligenciados: treinamento de novos tutores e capacitação docente contínua, esclarecimento aos estudantes sobre o método e a importância de desenvolver suas habilidades, manutenção dos debriefing nas sessões tutoriais, atuação precoce em grupos tutoriais disfuncionais, elaboração de avaliações que reflitam os princípios do PBL, revisão do programa na luz do feedback do ano anterior, monitoramento da execução do programa (currículo oculto), revisão do papel institucional, encorajamento a pesquisas e publicações sobre pbl e premiação de pessoas engajadas na melhoria do método (AZER et al, 2013)
Assim, o método PBL tem se mostrado, ao passar dos anos, uma iniciativa viável e efetiva para a educação no ensino em saúde, através do respeito à autonomia e do estímulo à aprendizagem ativa. Ademais, é uma metodologia que estimula o autoconhecimento e a capacidade de trabalho em grupo, preparando o aluno para sua vida professional onde lidar com a diversidade e a multidisciplinaridade é imprescindível.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, E. G.; BATISTA, N. A. Desempenho docente no contexto PBL: essência para aprendizagem e formação médica. Revista Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro, v. 37, n. 2, p. 192 – 201, 2013
ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para estratégias de trabalho em aula. 9. ed. Joinville: Univille, 2010.
AZER, S.A. Becoming a student in a PBL course: twelve tips for successful group discussion. Medical Teacher, Dundee, v. 26, n. 1, p. 12 – 15, 2004.
AZER, S.A. Interactions between students and tutor in problem-based learning: the significance of deep learning. The Kaohsiung Journal of Medical Sciences, Taiwan, v. 25, n. 5, p. 240 - 249, 2009.
AZER, S.A. Introducing a problem-based learning program: 12 tips for success. Medical Teacher, Dundee, v. 33, n. 10, p. 808 – 813, 2011.
AZER, S.A; MCLEAN, M.; ONISHI, H.; TAGAWA, M.; SCHERPBIER, A. Cracks in problem-based learning: What is your action plan?. Medical Teacher, Dundee, v. 35, n. 10, p. 806 – 814, 2013.
BARROWS, H.S. The tutorial process. Springfield: Southern Illinois School of Medicine; 1988.
BATE, E.; TAYLOR, D. C. M. Twelve tips on how to survive PBL as a medical student. Medical Teacher, Dundee, v.35, n. 2, p. 95 – 100, 2013.
30BORGES, M. C.; CHACHÁ, S. G. F; QUINTANA, S. M; FREITAS, L. C. C.; RODRIGUES, M. L. V. Aprendizado Baseado em Problemas. Medicina, Ribeirão Preto, v. 47, n. 3, p. 301- 307, 2014.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução nº 3, de 20 de junho 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina. Brasília, DF: CNE/CES, 2014. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=15874-rces003-14&category_slug=junho-2014-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 20 jan. 2019.
CAVALCANTE, A. N; LIRA, G. V.; CAVALCANTE NETO, P. G.; LIRA, R. C. M. Análise da Produção Bibliográfica sobre Problem- Based Learning (PBL) em Quatro Periódicos Selecionados. Revista Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro, v. 42, n. 1, p. 13 – 24, 2018.
DAVIS, M. H.; HARDEN, R. M. AMEE Medical Education Guide No. 15: Problem-based learning: a practical guide. Medical Teacher, Dundee, v. 21, n. 2, p. 130 – 140, 1999.
IAMADA, C. F. Avaliação formativa na aprendizagem baseada em problemas: fortalezas e fragilidades. [dissertação]. Sorocaba: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; 2018.
LEON, L. B; ONÓFRIO, F.Q. Aprendizagem Baseada em Problemas na Graduação Médica – Uma Revisão da Literatura Atual. Revista Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro, v. 39, n. 4, p. 614 – 619, 2015
NESARGIKAR, P. N. From student to tutor in problem based learning: na unexplored avenue. British Journal of Medical Practitioners. the United Kingdom, v. 3, n. 2, p. 313 – 315, 2010.
PRICINOTE, S. C. M. N.; PEREIRA, E. R. S. Feedback efetivo na avaliação formativa em saúde. In: Costa NMSC, Pereira ERS (Org). Ensino na saúde: transformando práticas profissionais. Goiânia: Gráfica UFG; 2015. p. 35 – 56.
RODRIGUES, M. L. V.; FIGUEIREDO, J. F. C. Aprendizado centrado em problemas. Medicina, Ribeirão Preto, v. 29, n. 4, p. 396 - 402, 1996.
SCHMIDT, H. G. Foundations of problem-based learning: some explanatory notes. Medical Education, Oxford, v. 27, n. 5, p. 422– 432, 1993.
SPAULDING, W. B. The undergraduate medical curriculum (1969) model: McMaster university. Canadian Medical Association Journal, v. 100, n. 14, p. 659– 664, 1969.
TORRES, D.M.; VAN DER VLEUTEN, C.; DOLMANS, D. Theoretical perspectives and applications of group learning in PBL. Medical Teacher, Dundee, v. 38, n. 2, p. 189 – 195, 2016.
WOOD, D. F. Problem based learning. The BMJ, London, v. 326, n. 7384, p. 328 – 330, 2003