Licenciatura em Artes visuais Percurso 4
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Psicologia e Construção do Conhecimento

Autores

Dra. Eliane Leão Apresento expressiva carreira desenvolvida nas áreas de Psicologia Organizacional com Treinamento & Desenvolvimento e Recrutamento & Seleção, Psicologia Clínica no atendimento a crianças e adolescentes e Educação Profissional, com significativa trajetória há cerca de 20 anos. Neste período, atuei como: - Coordenadora na área de Gestão de Pessoas (T&D e R&S) e Instrutora de treinamentos técnicos e comportamentais voltados à capacitação e aperfeiçoamento dos profissionais; - Psicóloga Clínica na realização de avaliação diagnóstica para crianças e adolescentes com dificuldades de aprendizagem, como também orientação aos pais, professores e demais envolvidos no processo educativo. Condução do processo de Orientação Profissional; - Professora no Ensino Técnico em Administração de Recursos Humanos e na Educação Superior, disciplinas voltadas à Psicologia Aplicada ao Trabalho; - Instrutora e Educadora no Programa Jovem aprendiz, ministrando aulas e treinamentos com o objetivo de desenvolver habilidades técnicas e comportamentais para o desenvolvimento profissional dos jovens ao mercado de trabalho; - Consultora em Desenvolvimento Organizacional, na prestação de serviços por meio de diagnósticos, elaboração de projetos e realização de programas de treinamentos.

Saiba mais

Apresentação

Prezados(as) alunos(as),

Vamos descobrir muitos conceitos novos nesta disciplina. Para estes, faremos verificações práticas utilizando exemplos de desenhos realizados por crianças de diferentes idades. A intenção é que fique claro para você o significado de cada um e qual o nível de desenvolvimento daquele que o desenhou. Nossa proposta envolve trabalhar com a leitura e a avaliação dos conceitos que você aprende à medida que os exemplos vão sendo apresentados no texto. Faremos propostas de problemas para que você os resolva à medida que avançamos.

Imagino que você já teve muitas oportunidades de questionar como o ser humano cria o novo — os possíveis, como é o processo criativo do conhecimento e como o homem conhece o mundo e cria estruturas e esquemas internos para que este mundo tenha sentido. Provavelmente, você já deve ter discutido como o homem se desenvolve. Este texto tem o objetivo de continuar provocando em você todas estas questões para fazer com que procure, ao longo de sua prática pedagógica do ensino da arte, ajudar seu aluno a criar o conhecimento artístico do mundo de maneira satisfatória, efetiva, agradável e transformadora. Afinal, sabemos que a expressão artística é uma necessidade humana, criada de um ser para o outro, numa dança que busca a aproximação dos entendimentos, saberes, decisões e constatações das realidades.

Unidade 1: Discutindo o que é Aprendizagem e Desenvolvimento

1.1. Que é aprendizagem?

Se o homem cria o conhecimento do mundo em que vive, o que cria o ajuda a entender este mesmo mundo. Ele assimila, adapta e acomoda o novo, internamente. O que importa no estudo de como acontece o desenvolvimento do homem é saber que dentro de cada um há um processo lento e cuidadoso de internalização do que acontece ao redor, e ele progride em diferentes níveis. Para entender estes acontecimentos, a habilidade cognitiva de cada um cria caminhos internos que possibilitam este entendimento. Como professores de arte, temos que entender que conhecemos o mundo externo porque, ao longo de nosso desenvolvimento, criamos uma maneira individual de identificá-lo como tal. Temos que entender que somos criadores internos das realidades externas (o que está fora é registrado dentro pelo sistema interno) e criadores do novo (o que criamos dentro é reconhecido fora, através da comunicação do produto). Mas não deixamos de aprender com a prática e a vivência dos outros que nos rodeiam. E o que foi aprendido é sempre repensado.

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Definir aprendizagem como o processo de adquirir conhecimento, adquirir conteúdo e adquirir a erudição não satisfaz o pensador do século XXI. Esta definição é encontrada nos antigos dicionários de psicologia. Hoje, consideramos que é uma definição incompleta. Nós não adquirimos o conhecimento, mas o construímos. É essencial o papel da criação no desenvolvimento. Para se desenvolver, a criança cria algo de novo dentro de si mesma. Cria esquemas novos, estruturas mentais novas e preenche as lacunas internas (o que não sabe ou não entende) todas as vezes que torna o impossível (aquilo que não percebe ou entende) possível (aquilo que passa a compreender).

Você sabia?

Existem, na atualidade, três modelos de interação professor/aluno que levam à aprendizagem: 1) a aprendizagem presencial, providenciada pelo contado do aluno com o professor na sala de aula; 2) a aprendizagem à distância, providenciada pelo contato do aluno com o professor, via meio de comunicação e outras tecnologias; e 3) a combinação dos dois meios, presencial e à distância: que é o modelo que estamos vivenciando agora neste curso!

Não faz sentido pensar que os pais colocam os filhos na escola para que os professores garantam que adquirirão conhecimento e/ou conteúdo nas diferentes matérias importantes para a comunidade. De qualquer maneira, o que se tem que garantir é que a relação do professor/aluno tem que resultar na construção de conhecimento de ambos e no desenvolvimento de ambos. Aos alunos que têm como desenvolver-se cognitivamente (isto é garantido para aos que estão vivos e crescendo, pois o ser possui condições de se manter em equilíbrio biologicamente e psicologicamente) é imprescindível a colaboração e atuação do professor como intermediário, para garantir meios e métodos, além de vivências que garante que a aprendizagem ocorra. Feita a distinção entre desenvolvimento e aprendizagem, vamos comentar mais este conceito de aprendizagem

Agora, vamos falar de três concepções teóricas que explicam e servem de suporte para entendermos o conceito de aprendizagem. A primeira é a INATISTA; a segunda, a AMBIENTALISTA e a terceira, a INTERACIONISTA. Entenda estas concepções diferentes para saber como uma definição de aprendizagem pode ser discutida.

Concepções teóricas de aprendizagem
  1. Inatista: Afirmam que a herança genética emerge com o nascimento da criança e que se deve esperar que as qualidades desabrochem. Ex: “Filho de peixe peixinho é”.
  2. Ambientalista: O meio ambiente é o principal responsável pelos processos de aprendizagem. É a teoria do professor intervencionista.
  3. Interacionista: Propõe que seja levado em conta o que a criança traz ao nascer e as condições materiais de sua existência. O professor é o mediador que cria condições para que a criança aprenda a partir do que é...

Vimos que as definições de aprendizagem dependem das teorias de aprendizagem. Sabemos que essas são esforços de estudiosos de codificar e sistematizar as operações e hipóteses acerca dos mecanismos que explicam as mudanças relativamente permanentes das respostas em potencial que o aluno pode dar numa determinada atividade, ou em consequência dela. Como não existe uma teoria da aprendizagem única e, dadas todas as variações das explicações que resultam do que são estas respostas potenciais, podemos dizer que teorizar sobre a aprendizagem é um exercício de generalização que nos levará sempre às grandes polêmicas. A tendência é que sejamos empíricos para entender e definir a aprendizagem. Isto significa que partimos para anotar o que as experiências sobre o tema nos demonstram. E através de nossa prática pedagógica, vamos definindo o que é aprendizagem e como aprendemos.

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Para mostrar como este tema é complexo, podemos dizer que os estudiosos hoje estão discutindo até como aprender a aprender ou, melhor dizendo, como aprender a resolver problemas que levarão ao aprendizado. Interessante, não é?

Você sabia?

Em seu livro Psicologia do Desenvolvimento, David R. Shaffer apresenta uma discussão atual e detalhada, do ponto de vista da psicologia, acerca do desenvolvimento. Ele discute o desenvolvimento humano como uma nova ciência que deve ser estudada por todos os que pretendem lidar com crianças. O livro é organizado por tópicos, enfatizando os processos do desenvolvimento: Parte I – Teoria e Pesquisas nas Ciências do Desenvolvimento; Parte II – Fundamentos do Desenvolvimento; Parte III – Desenvolvimentos Cognitivo, da Linguagem e da Aprendizagem; Parte IV – Desenvolvimentos Social e da Personalidade; Parte V – A Ecologia do Desenvolvimento.

Dica

Vale a pena ler E o Aluno? Como Aprende?, do texto Aprendizes do futuro: as inovações, de Léa de Cruz Fagundes (MEC). Abaixo, transcrevemos um trecho pra que você conheça e discuta o que e como o aluno aprende na escola.

E o aluno? Como aprende?

Mas como o aluno aprende? Como se pode garantir a aprendizagem de conteúdos? A busca de soluções para as questões que estão sempre surgindo num ambiente enriquecido configura a atitude e a conduta de verdadeiros pesquisadores. São levantadas as dúvidas daquele momento, mas quais são as certezas que ficam? Em primeiro lugar, tratam-se de certezas provisórias porque o processo de construção é um processo continuado e ocorre numa situação de continuidade alternada com a descontinuidade. Uma certeza permanece até que um elemento novo apareça para ser assimilado. Para que um novo conhecimento possa ser construído, ou para que o conhecimento anterior seja melhorado, expandido, aprofundado, é preciso que um processo de regulação comece a compensar as diferenças, ou as insuficiências do sistema assimilador. Ora, se o sistema assimilador está perturbado é porque a certeza “balançou”. Houve desequilíbrio. O processo de regulação se destina a restaurar o equilíbrio, mas não o anterior.

Na verdade, trata-se sempre de novo equilíbrio, pois o conhecimento melhora e aumenta! E, justamente é novo, porque é um equilíbrio que resultou da assimilação de uma novidade e, portanto, da ampliação do processo de assimilação do sujeito, que se torna mais competente para assimilar outros novos objetos e resolver outros novos problemas.

Buscar a informação em si, não basta. É apenas parte do processo para desenvolver um aspecto dos talentos necessários ao cidadão. Os alunos precisam estabelecer relações entre as informações e gerar conhecimento. Não há interesse em registrar se o aluno retém ou não uma informação, aplicando um teste ou uma “prova” objetiva, por exemplo; porque isso não mostra se ele desenvolveu um talento ou se construiu um conhecimento que não possuía. O que interessa são as operações que o aprendiz possa realizar com estas informações, as coordenações, as inferências possíveis, os argumentos, as demonstrações. Pois, para construir conhecimento, é preciso reestruturar as significações anteriores, produzindo boas diferenciações e integrando ao sistema as novas significações. Esta integração é resultado da atividade de diferentes sistemas lógicos do sujeito, que interagem entre si e com os objetos a assimilar ou com os problemas a resolver. Finalmente, o conhecimento novo é produto de atividade intencional, interatividade cognitiva, interação entre os parceiros pensantes, trocas afetivas, investimento de interesses e valores.

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A situação de projeto de aprendizagem pode favorecer especialmente a aprendizagem de cooperação, com trocas recíprocas e respeito mútuo. Isto quer dizer que a prioridade não é o conteúdo em si, formal e descontextualizado. A proposta é aprender conteúdos, por meio de procedimentos que desenvolvam a própria capacidade de continuar aprendendo, num processo construtivo e simultâneo de questionar-se, encontrar certezas e reconstruí-las em novas certezas. Isto quer dizer: formular problemas, encontrar soluções que suportem a formulação de novos e mais complexos problemas. Ao mesmo tempo, este processo compreende o desenvolvimento continuado de novas competências em níveis mais avançados, seja do quadro conceitual do sujeito, de seus sistemas lógicos, seja de seus sistemas de valores e de suas condições de tomada de consciência.

Fonte: http://www.dominiopublico.gov.br; acesso em 06/03/2009.

Para refletir

Como você explicaria que alguém “aprendeu tudo ou nada”? O que você acha que significa “aprendizagem implícita? Dificuldade de aprendizagem”? Pode citar alguns exemplos? O que é “aprendizagem acidental”? O que é “aprendizagem a partir do caos”? E a “aprendizagem significativa”? Há também a “aprendizagem motora”, “a musical”, e a “aprendizagem latente”. A “aprendizagem perceptiva” também deve ser lembrada.

E o aprendizado dos alunos de arte? Você sabe o que os alunos aprendem quando desenham, pintam ou constroem imagens tridimensionais, quando cantam e tocam, dançam ou dramatizam? O que eles aprendem justifica a manutenção da arte no currículo? Pesquise mais aspectos e definições de aprendizagem.

No texto Aprendizes do futuro: as inovações, de Léa de Cruz Fagundes (MEC). Sugiro que enriqueça sua leitura sobre o tema e procure o significado deles no texto “Evolução do Pensamento Criador em Situação Musical”, de Figueiredo, E. L. UNICAMP, São Paulo (http://libdigi.unicamp.br/document/?code=vtls000115756, acesso em 06/03/2009). Depois que encontrar os significados, escreva um texto relacionando todos estes conceitos e coloque para debate na rede.

Observe os conceitos encontrados: aprendizagem de conteúdos; ambiente enriquecido; o processo de construção; o processo continuado; o elemento novo; o sistema assimilador; o desequilíbrio; o processo de regulação; o novo equilíbrio; o conhecimento melhora e aumenta; o equilíbrio que resultou da assimilação de uma novidade; resolver outros novos problemas; buscar a informação; as operações que o aprendiz possa realizar; as demonstrações; construir conhecimento; reestruturar as significações anteriores; integrando ao sistema as novas significações.

Para Célia Maria de Castro Almeida, em seu texto Concepções e Práticas Artísticas na Escola (no livro O Ensino das Artes — Construindo Caminhos, citado como referência no item 2.1. da Unidade 2), ao realizarem atividades artísticas, os alunos aprendem o processo de criar e que este requer tomada de decisões. Além de métodos e técnicas novas, aprendem a fazer julgamentos em situações nas quais os modelos estão ausentes. Aprendem a confiar em sua sensibilidade e percepção para determinar a adequação do que criam. Além disso, aprendem conteúdos novos e habilidades específicas para lidar com materiais, ferramentas e equipamentos e com os elementos constitutivos de cada uma das artes. Segundo ela, os alunos aprendem a dizer mais e melhor sobre si mesmos. Tornam-se mais flexíveis, críticos e demonstram mais capacidade de iniciativa se a eles são providenciados métodos para melhor atender cada um, nas suas especificidades e respeitadas sua interação com o mundo.

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Segundo a autora, os alunos também aprendem que a alegria, o poder e a raiva podem ser simbolizados pelas imagens, sons, gestos, movimentos e palavras que criam, pois o modo como o homem expressa o que sabe, assim como o meio que escolhe para isso, influencia profundamente o conteúdo da expressão. Cada vez mais, ele valoriza o poder da expressão através da arte. Em contato com as artes, os alunos aprendem muito mais do que pretendemos. Aprendem a observar, pensar, decidir e tomar decisões, além de valorizar o que fazem.

Nos estudos de Piaget, a aprendizagem é explicada pela teoria da equilibração. De uma maneira geral, trata-se de um ponto de equilíbrio entre a assimilação e a acomodação. É considerada um mecanismo autoregulador, necessário para assegurar à criança uma interação eficiente com o meio-ambiente. Nos estudos de Vygotsky, o aprendizado não é desenvolvimento, pois, adequadamente organizado, resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que seriam impossíveis de acontecer de outra forma.

Embora haja discordâncias entre os estudiosos sobre como a criança aprende, podemos enumerar quatro das categorias representativas dos estilos de aprendizagem:

Saiba mais

...: que KRISHNAMURTI (1895–1986), no seu livro On Learning and Knowledge (Sobre aprendizagem e Conhecimento), define o termo aprendizagem como movimento? E que ele considerava estática a acumulação de conhecimento? O que você entende por estes conceitos apregoados por ele? Você acha que as ideias da autora citada acima levam à aprendizagem como movimento ou ela é somente estática?

Problematizando

Você acha que Piaget e Vigotsky partem da mesma perspectiva ao estudar como a criança aprende? Será que não veem a mesma realidade baseados em pontos de vista diferentes, que levam a explicações diferentes do mesmo fenômeno?

Dica de filme

Assista ao filme O Homem-Elefante. Ele nos mostra que devemos ir além das aparências para descobrir as possibilidades do aluno e para explorar todo o seu potencial de aprendizagem.

Sobre esse filme, o escritor Eduardo Torelli comenta que o acesso aos meios culturais é, em última instância, determinante para o modo como assimilamos o mundo — e, também, para o modo como o mundo nos avalia. Ele entende que o personagem principal deste filme conquista cidadania ao revelar às pessoas certas sua inclinação natural para a música e para a poesia aprisionadas em um exterior monstruoso. Professor, como este aspecto do filme pode ajudar você a entender seus alunos nas suas individualidades? Como providenciar o aprendizado a partir de seus níveis de desenvolvimento?

Esse filme foi comentado no endereço abaixo, no site Educar para Crescer: http://educarparacrescer.abril.uol.com.br/aprendizagem/homem-elefante412769.shtml, acesso em 10/03/2009.

Para refletir

Depois de assistir O Homem-Elefante, faça uma lista dos principais temas explorados pelo filme. Reflita sobre as questões seguintes e discuta suas respostas com os colegas:

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1.2. O que é desenvolvimento?

Estudar o desenvolvimento infantil é o mesmo que discutir a Evolução do Pensamento Criador. O movimento dos sistemas internos que leva às mudanças dos pensamentos, alargando-os e mantendo os já adquiridos, é a evidência de que há o desenvolvimento da criança. Este desenvolvimento ocorre quando ela exercita a construção do conhecimento acerca do mundo em que está inserida. A criança vive porque o seu corpo exercita o equilíbrio biológico e porque sua mente exercita o equilíbrio psicológico. Ela muda de idade e acresce ao seu mundo interno os conteúdos resultantes de suas relações em sociedade e as novidades que seu sistema interno é capaz de gerar. A cada novo conhecimento construído, engendra uma nova relação com o mundo que a rodeia, uma nova relação que leva à aprendizagem.

Leia a proposta de Projeto de Pesquisa abaixo (na figura) e tente imaginar o alcance e como seriam os dados resultantes desta pesquisa. No item 3.1, mostraremos como entender os dados resultantes de um projeto como este, para que você saiba como a criança muda através de níveis cada vez mais complexos de desenvolvimento. Ela aperfeiçoa seus sistemas mentais (esquemas, estruturas). Se você tiver fôlego, e eu gostaria que tivesse, faça esta pesquisa e a discuta com seus colegas:

Desenvolvimento do pensamento criador

Colete dados para este projeto piloto para fazer uma primeira leitura da realidade que você quer observar: o desenvolvimento de crianças. Procure e selecione crianças de 4 (quatro) a 13 (treze) anos. Pode ser 4 crianças para cada idade. Se você conseguir esse número para cada faixa etária, terá 40 crianças para observar. Você trabalhará individualmente com ela (uma criança não poderá ver o que as outras estão fazendo!).

Vamos dividir esse projeto, que será nosso experimento, em 5 fases.

Fase 1: Escolher uma figura interessante onde existam vários detalhes diferentes (Testar umas 5 figuras, de diferentes estilos, para ver qual a que desperta mais interesse da criança, antes de começar o experimento);

Escolhida a melhor figura, mostre-a a cada criança, individualmente (a entrevista é individual), longe das distrações do meio e peça que nomeie o que vê na figura;

Anote para a criança, numa folha, a lista de objetos, efeitos e detalhes que ela estiver vendo. Para cada criança, uma folha de anotações. Ela não precisará escrever o que vê porque você o estará fazendo por ela. O pesquisador (você) é que anota tudo. Anote na ordem exata o que a criança observa e diz.

Fase 2: Pedir que, olhando na lista de objetos citados e também consultando a figura (que será sempre mantida para observação e/ou conferência), a criança escolha os objetos que mais gosta. Anotar e manter a mesma ordem que ela estabelecer.

Fase 3: Pedir à criança que desenhe uma nova figura utilizando os objetos para compor o tema de seu desenho, na ordem escolhida na fase anterior. Leia para ela a lista e peça para compor mantendo a mesma ordem.

Deixe-a gastar o tempo que for necessário para compor sua figura, que, segundo você, “é uma obra de arte”! Tudo o que ela fizer é uma beleza! Estimule-a com elogios, mas não interfira na criação. Ela só pode usar os objetivos para inseri-los no desenho mantendo a ordem que determinou anteriormente (esta técnica se chama Relação Forçada).

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Fase 4: Anote no seu caderno de observações cada elemento novo que ela introduziu para “completar” as figuras e/ou objetos da lista que utiliza à medida que desenha. Essas variáveis da intermediação e/ou complementação necessárias à composição que a criança vai construindo são importantes para a sua coleta de dados, para a análise que você fará depois e para o entendimento dos elementos do Produto Final (a obra de arte).

Fase 5: Peça a ela que dê um título ao trabalho artístico que acabou de realizar.

Obs.: Se ela quiser usar cores, pode! Essa seria uma variável (detalhe) a mais para a sua observação!

Para melhor compreender o que significa o título deste projeto e sua relação com as concepções de Piaget sobre o desenvolvimento infantil, leia o capítulo III do trabalho Evolução do Pensamento Criador em Situação Musical, em: http://libdigi.unicamp.br/document/?code=vtls000115756, acesso em 10/03/2009, de Figueiredo, citado anteriormente.

Imagine comigo o que conseguiremos pensar a partir deste projeto:

  1. Analisaremos os elementos que foram engendrados (criados como ideias novas) por cada criança. Estes elementos surgiram do que lhes era familiar (as listas que observou na figura dada) e fluíram da observação de cada criança. Ela partiu do que sabia e do lhe fora dado para criar o novo, em acréscimos sucessivos. Aqui, você já poderá ver indícios do desenvolvimento da criança. A soma de todos os desenvolvimentos, das diferentes idades e os movimentos das diferenças vão mostrar que o desenvolvimento é possível em todas as faixas etárias! A criança só consegue se desenvolver quando, a partir de sua observação dos elementos e sua inserção no contexto em que vive, cria o novo dentro de seu sistema interno, nas diferentes fases de sua vida, à medida que resolve problemas que desafiam sua mente.
  2. Poderemos, assim, estudar como a criança cria a realidade interna através da observação em condições objetivas, subjetivas e contextuais, e como evolui na construção do conhecimento do mundo. Como constrói a “leitura da realidade” em que está inserida, externando, através da percepção, a compreensão artística do mundo.
  3. Também, o uso dos símbolos e sua organização individual num todo com sentido (diferentes sentidos ao longo dos diferentes desenvolvimentos) refletirá o que ela constrói como resultado de uma absorção cultural e nos dará a noção do que são arte e significação do ponto de vista infantil. Nada impedirá que, observando a evolução do pensamento artístico da criança, estejamos obtendo indicadores de como evoluiu o pensamento criador da humanidade. Uma realidade pode refletir a outra, por analogia.
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Para refletir

Pense no que já leu até aqui e veja que o estudo do pensamento criador é a oportunidade que temos de observar e constatar o Desenvolvimento Infantil. Lembre-se das crianças que conhece e como elas demonstram que se desenvolvem à medida que mostram, a cada dia, em diferentes idades, como constroem o conhecimento que têm do mundo. Às vezes, estando com a mesma idade, elas têm desempenhos e conclusões inerentes ou não ao seu desenvolvimento. É por isso que temos crianças tão diferentes na mesma faixa etária! Quando não conseguem ver ou fazer uma coisa em uma determinada época, o fazem mais tarde. Seus desenvolvimentos se manifestam à medida que acrescentam uma novidade a cada ação executada. Parece que a criança avança todos os dias para uma nova competência não exercitada anteriormente.

Por exemplo: você já viu um bebê tentando colocar uma chave na fechadura da porta, insistentemente, só parando quando consegue satisfazer sua curiosidade? Ele está praticando a construção do conhecimento sobre o assunto e sobre a ação. Ele se satisfaz quando constrói, para si, o conhecimento sobre como usar chaves. Neste momento, se dá um belo exemplo do que vem a ser o desenvolvimento infantil. E nós observamos e dizemos: Ele aprendeu!

1.3. Por que é determinante para o professor entender a construção do conhecimento?

O professor também aprende e constrói seu conhecimento sobre o mundo e sobre as disciplinas que leciona. Toda vez que precisa aprender, ele passa por processos de desenvolvimento individuais. Para que ele seja criativo e fomente a criatividade em sala de aula, ele precisa ter compromisso com os procedimentos criativos.

Este texto tem como objetivo continuar provocando em você todas estas questões para fazer com que procure, ao longo de sua prática pedagógica do ensino da arte, ajudar seu aluno(a) a criar o conhecimento artístico do mundo de maneira satisfatória, efetiva, agradável e transformadora.

Se o homem cria o conhecimento do mundo em que vive, o que cria o ajuda a entender este mesmo mundo. Ele assimila, adapta e acomoda o novo internamente. No estudo de como acontece o desenvolvimento do homem, o que importa é saber que, dentro de cada um, há um processo lento e cuidadoso de internalização do que acontece ao seu redor. Para entender estes acontecimentos, a habilidade cognitiva de cada um cria caminhos internos que possibilitam este entendimento. Você, ao ensinar arte, tem que entender que somos criadores internos das realidades externas o que está fora é registrado dentro, pelo sistema interno — e criadores do novo —, o que criamos dentro é reconhecido fora, através da comunicação do produto. Criamos pela ação, mas não deixamos de aprender com a prática e a vivência dos outros que nos rodeiam. A própria maneira de lecionar é uma invenção única. É sobre isso que falaremos agora.

Alguns professores costumam colocar a responsabilidade por não serem criativos em coisas e fatos do meio ambiente, fora de si mesmos, e tornam-se acomodados com o passar dos anos. É claro que existem na sociedade, no meio ambiente e nos sistemas educacionais muitas forças que inibem a individualidade do professor criativo e o leva à conformidade. Mas, neste texto, estamos falando sobre aprendizagem e desenvolvimento, dois conceitos essenciais para o professor de arte. E ele só pode trabalhar bem entendendo que a garantia de seu sucesso é o emprego da criatividade, criando um clima e meio ambiente favoráveis para que a aprendizagem e o desenvolvimento ocorram.

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Analise as forças mais comuns que inibem a procura de nossa única invenção da melhor maneira de lecionar. Leia e tente explicar como estas 10 variáveis abaixo nos inibem, prejudicam nossa aprendizagem e dificultam tanto o nosso desenvolvimento quanto o do aluno. Depois que tiver discutido com seus colegas, veja, no final do texto, os comentários do autor sobre cada uma delas.

São inibidores do professor criativo:

Problematizando

O que significa cada um dos inibidores acima? Leia e analise as respostas no final desta Unidade.

Segundo Baldwin, Piaget divide o desenvolvimento da criança em quatro períodos principais: a infância, o período pré-operacional, o período de operações concretas e o período de operações formais. À medida que cresce, a criança vai se organizando organicamente e psicologicamente. Vai construindo o seu conhecimento, ampliando cada vez mais suas conquistas, adquirindo novos esquemas sistemáticos, organizando suas estruturas mentais, preparando-se para atividades cada vez mais complexas. Ela pratica o pensamento reversível (o seu sistema “lembra” do que já sabe) e mantém o que sabe; vivencia desequilíbrios e equilíbrios e consegue uma eficiência comportamental através da ação e da consciência da ação. Seu sistema cognitivo funciona como uma espiral que se amplia e alcança outros níveis mais eficientes. Ela é atraída por problemas que levam à equilibração, para, depois, avançar para outras conquistas. E ela cria o novo.

Neste mesmo texto, você verá a discussão de que não existe somente a teoria de Piaget para explicar o desenvolvimento. Segundo o autor, são seis teorias diversificadas, mas que tem algo em comum: apregoam que o desenvolvimento acontece através de vários níveis que se sucedem e garantem a construção do conhecimento. O segundo nível assume o controle do primeiro e assim sucessivamente. Ele comenta, ainda, que uma teoria confirma a outra e, no seu conjunto, são promessas de um estudo mais amplo sobre as potencialidades da criança, ajudando os pesquisadores

*Teorias de Desenvolvimento da Criança
T.D.C* Comentários
Teoria Estímulo-Resposta Tem rigor operacional, parcimônia e verificação operacional.
Teoria de Piaget Considera a teoria acima (E-R) excessivamente passiva e mecânica. Trata do funcionamento cognitivo das crianças. A criança cria e/ou constrói o conhecimento do mundo.
Teoria Freudiana Critica todas as outras teorias psicológicas, pois elas não acentuam suficientemente os impulsos como causas dos comportamentos.
Teoria de Lewin Respeita as intuições de Freud, mas destaca que faltava a ele linguagem mais científica. Não supõe que os acontecimentos da infância tenham influencia no comportamento adulto.
Teoria de werner Vem da tradição da teoria de Gestalt e da teoria organística. Destaca que a teoria E-R era mecanística. Volta-se para aquisições moleculares de novos comportamentos que se acrescentam ao repertório já existente na criança.
Teoria de Parsons Incorpora a teoria psicanalítica integralmente à sua teoria de socialização. Acentua a participação da criança na família como um sistema social. Analisa o sistema social como parte do processo de socialização.
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Citada no quadro anterior, a teoria de Vygotsky apregoa que o aprendizado está relacionado ao desenvolvimento. É ele que possibilita o despertar de processos internos de desenvolvimento que, não fosse o contato do indivíduo com certo ambiente cultural, não ocorreriam. A criança depende das relações em sociedade para adquirir informações do meio ambiente, das pessoas. O autor acredita na interdependência dos indivíduos envolvidos no processo que inclui o aprendiz. Para ele, o desenvolvimento fica prejudicado quando faltam situações propícias ao aprendizado. O papel do professor como intermediário se torna realçado pelo autor.

Dicas

Este quadro foi inspirado no livro de Baldwin. Você pode acessar o site abaixo, onde pode ler o texto O desenvolvimento humano na Teoria de Piaget, de Márcia Regina Terra (acesso em 10/02/2009). Pesquise mais informações em:

http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/d00005.htm.

http://www.clubedoprofessor.com.br/recursos/teorias/index.html. O site artigos educacionais de interesse nesta temática do desenvolvimento e aprendizagem (acesso em 11/03/2009).

http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=549 alguns textos sobre o estudioso Vygotsky (acesso em 11/03/2009).

Anexo
Forças que inibem o professor criativo O que significam, segundo o autor
1) Pensamento aleatório versus pensamento centrado num tema Quando você tenta ser o único inventor de sua maneira de lecionar, há horas em que você tem que se concentrar completamente no problema. Algumas pessoas incorretamente associam a invenção e a descoberta com o acaso, com o comportamento aleatório. É verdade que muitas boas ideias parecem ocorrer quando a pessoa está relaxada (naw banheira, nos serviços religiosos, no clube...). Entretanto, estas ocorrências são SEMPRE precedidas de atenta concentração durante a qual a mente se manteve ocupada com o problema em questão, em outra oportunidade.
2) Falta de tempo para pensar e para sonhar O pensamento centrado num tema toma seu tempo. O relógio é um tirano e muito se pode fazer para abrandar sua tirania. As atividades têm que ser desenvolvidas com legitimidade. Não se apavore. Deixe uma parte de seu dia sem tarefas, não tenha receio de sonhar ocasionalmente e não fique com vergonha se alguém o surpreende fazendo ou demonstrando estar totalmente fora da realidade, pensando e concentrando-se em alguma coisa de interesse só seu.
3) Falta de honestidade intelectual Nós nunca somos sinceros conosco mesmos, fazendo coisas que realmente nos interessam. Para você se tornar o criador de sua própria maneira de ensinar, você tem que se libertar de todas as coberturas e máscaras que escondem você dentro de seu próprio trabalho. Liberte-se de todas suas falsas crenças, de todas as convenções e formas que estão ultrapassadas.
4) Mente despreparada Algumas pessoas acham que, quanto mais você sabe, menos é capaz de inventar e descobrir. Isto é falso. As chances aumentam para as mentes preparadas. Mas encontramos um paradoxo aí. Familiaridade com conhecimento existente é necessário para conseguir mais conhecimento, no entanto, a existência de conhecimento anterior acerca de um determinado problema pode se tornar um entrave para a solução do mesmo. Pré-conceitos são acusados de atrapalhar as descobertas.
5) Deixar de investigar e explorar Nunca poderá haver para o professor um período sequer em que o processo de experimentação e teste cesse.
6) Deixar de investigar coisas novas em profundidade Os alunos geralmente reclamam de estudar e repetir certos tópicos. Acham que a ênfase não os motiva. Isto ocorre porque os alunos não dominaram a habilidade de olhar para os assuntos abordados como coisas diferentes e em grande profundidade. Dos estudos sobre a percepção, entretanto, é sabido que o significado do objeto muda à medida que mudamos o ponto e a perspectiva através da qual nós observamos. Detalhes previamente esquecidos podem, de repente, tornarem-se extremamente importantes. Depois de mudarmos as metas ou depois de obtermos informação adicional, o significado de alguma coisa familiar também muda. Muitas são as invenções e descobertas através do uso deliberado de métodos que tornavam o familiar estranho e o estranho familiar.
7) Empobrecimento da reserva de imaginação A pessoa terá dificuldade de pensar criativamente se ela não tem uma reserva rica de imagens cerebrais. Uma reserva mental repleta de imagens será útil para o professor criativo quando estiver à procura de sua própria invenção. Uma maneira de enriquecer a imaginação é através do desenvolvimento da consciência do meio ambiente, conseguido pela experimentação detalhada. Isto será possível vivenciando experiências sensoriais, através de experiências de primeira mão, através da identificação pessoal com outros profissionais, através de envolvimento com a vida. Outra maneira eficaz é através da imersão na literatura mundial.
8) Deixar de anotar ideias Nós nos sentimos desprovidos de ideais até o dia em que decidimos anotá-las. Aí nossa vida muda! Frequentemente nós deixamos de nos fixar nas próprias ideias e falimos em capturá-las, mais porque elas ocorrem em lugares impróprios e incomuns do que porque ocorrem onde gostaríamos que elas ocorressem. Mesmo as crianças têm que ser orientadas sobre a importância de “segurar” as ideias, anotando-as para serem usadas no futuro, ou para desenvolvê-las quando a oportunidade chegar.
9) Medo da individualidade É difícil libertarmos-nos da opinião que as pessoas têm de nós. Estamos sempre tentando nos ajustar às expectativas de outrem, à recomendação de que não devemos prejudicar ou ofender. Isto faz com que reduzamos severamente nossas potencialidades. Foram muito poucas as pessoas criativas que contribuíram magnificamente para a sociedade por serem populares ou bem aceitas por todos. De fato, muitos deles foram odiados. A pessoa criativa tem sempre algumas coisas urgentes para dizer e, constantemente, procura novos aspectos da verdade.
10) Deixe de ser você mesmo(a) Talvez o melhor conselho para ser dado ao professor que está querendo garantir que a aprendizagem ocorra em sua sala de aula, respeitando o desenvolvimento cognitivo de seus alunos e providenciando para que eles construam o conhecimento do mundo, é invistir na habilidade de ser criativo:
“Seja você mesmo se deseja contribuir com qualquer coisa original e que acredite que valha a pena”. Esse é um conselho difícil de receber porque sempre estamos impedidos pela nossa pretensão e/ou timidez, nossas dúvidas e fraquezas além dos auto-conceitos confusos que alimentamos”.
“Procure saber o valor de suas intuições. Trate-as com carinho e cultive as condições para dar-lhes meios de florescerem. O processo de se tornar um professor criativo é, finalmente, uma aventura excitante, que traz retornos inesperados. Confie nos seus sonhos e faça deles a realidade. Use os processos e meios criativos para garantir a aprendizagem de seus alunos, para dar-lhes oportunidades de se desenvolverem cognitiva-mente, no seu próprio ritmo e passo.”
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Unidade 2: Oportunidades do sujeito criar o novo

2.1. O desenvolvimento da aprendizagem criativa

Nesta unidade, trataremos da criatividade sob o enfoque construtivista: a criança cria o seu conhecimento do mundo e isto justifica sua individualidade. O professor tem que se informar acerca deste enfoque para entender que a criança aprende porque há uma evolução de seu pensamento criador. Seu sistema interno é capaz de criar e manter o conhecimento.

Após Piaget, talvez seja apropriado afirmar que o organismo é o ponto de partida do indivíduo mental, e que a parte criativa do comportamento é o motor principal da evolução. Seus pressupostos teóricos explicam como o sujeito constrói esse trajeto - o do adquirir conhecimento através do comportamento criativo. As colocações de Piaget em suas obras Psicologia e Epistemologia: por uma Teoria do Conhecimento (1978), Biologia e Conhecimento (1973), Investigationes sobre la Generalización (1984) e O Possível e o Necessário (1985) servem de suporte teórico básico para os estudos acerca do processo criativo para aqueles que querem ir além do estudo dos produtos criativos já existentes.

Ele afirma que o conhecimento não é um estado e, sim, um processo. Se todo conhecimento é sempre um vir a ser e consiste em passar de um conhecimento menor para um estado mais completo e mais eficaz, tanto a criança quanto o professor podem criar os seus conhecimentos e se desenvolverem.

Ele propôs que os sujeitos constroem o mundo a partir dos elementos (experiências) e dos instrumentos (operações mentais) disponíveis num dado momento de seu desenvolvimento. Assim posto, com seu existir relativamente pouco diferençável do biológico, constrói o mundo de necessidades e satisfações baseado nas condições inatas e nas experiências. O egocêntrico sujeito de 4 anos já constrói o mundo sendo não conservador, interagindo com outras pessoas que convivem e com as quais troca experiências. O adolescente, nos seus contatos com os outros, potencialmente entende a lógica dos princípios abstratos de um argumento sem procurar recursos em algum fato e/ou caso para poder entender o que está sendo dito.

Ele sugere que estudemos os sujeitos de todas as idades (inclusive adulta) para saber como eles impõem normas de criação de conhecimentos a si mesmos. Um exemplo deste estabelecimento natural de normas pelo sujeito em desenvolvimento observado por Piaget foi dado quando ele constatou que a criança de 5-6 anos ainda ignora a transitividade, pois reconhece a identidade qualitativa, mas rejeita a conservação quantitativa. Depois, aos 7-8 anos, ao contrário, a criança considerará necessárias ao mesmo tempo a transitividade e a conservação quantitativa. Com este exemplo, ele concluiu que o sujeito (independentemente do psicólogo) reconhece normas.

Com o método de Piaget, surge o seguinte problema: como aumentam os (e não o) conhecimentos? Podemos começar a responder esta pergunta estudando a psicologia da criança. Com suas descobertas, As crianças têm que alcançar certos sistemas como reversibilidade, invariância, identidade. A ausência de invariantes, tão característica do pensamento da criança pequena, não é consequência da irreversibilidade inicial do pensamento e da construção das primeiras noções de conservação. É, ao contrário, devida à reversibilidade constitutiva das primeiras operações da mente. Para ele, na verdade, transformação e identidade são sempre indissociáveis e é a possibilidade de compô-las entre si que constitui a obra própria da razão, constitui o estudo genético da inteligência.

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Para refletir

Como ocorrem estas mudanças? O sujeito constrói — criando — para conhecer o mundo? Para responder a estas perguntas, você não pode se basear unicamente nas teorias do desenvolvimento intelectual. É necessário discutir, igualmente, a evolução do conhecimento. Observar estas mudanças é uma tarefa difícil porque elas não ocorrem apenas dentro do sujeito ou são adquiridas apenas por simples observação. Você tem interesse nestas discussões? Pensa que é importante saber como funciona a cognição?

Para Piaget, estas mudanças são produtos da equilibração e da autorregulação. A equilibração pode ser definida como uma constante atividade do organismo em busca de um estado de ponderação entre a assimilação de uma informação que está em conflito com uma já existente e o ajustamento da nova informação. Chamamos esse processo de acomodação. Estes reguladores do desenvolvimento contêm a noção de autorregulação — o próprio sistema do organismo é que dita o que é para ser assimilado e o que é que deve ser acomodado.

Sabe-se que todos os sistemas feitos pelo sujeito são construções humanas e que o organismo não assimila passivamente a informação ao construir seus sistemas de conhecimento. O sujeito constrói uma representação mental do mundo, construindo a realidade. O pensamento criador não é somente resultado de transformação e, sim, de aberturas nos esquemas que levariam à extrapolação e extensão de um processo dado. Mas a identidade e a transformação estão ligadas ao conceito de conservação do pensamento e, de certa forma, caracterizam uma mudança nos esquemas que não podem, de maneira alguma, ser deixados de lado numa discussão como essa. Se a inteligência é ligada à criação humana — o homem constrói sua inteligência — então não há como não aproximar as razões da inteligência as da criatividade. Piaget diz que o estudo genético da inteligência fornece, a este respeito (transformação e identidade), um argumento decisivo. Para ele, nem a identificação e nem mesmo a semelhança precedem a organização da mudança ou da diferença. É solidariamente que se constituem os instrumentos operatórios aptos a coordenar uns e outros.

Na verdade, à medida que o problema aparece é que o sujeito se “instrumenta” para resolvê-lo. Aqui, reside a construção de sistemas de ação que, envolvendo o ato inteligente e o criativo, são, possivelmente, o resultado de aberturas nos esquemas já existentes.

Para refletir

Você não acha que Piaget estava se referindo ao processo de pensar quando disse que o pensamento completado é produto de longa construção? Até aqui, deu para você perceber como acontece o desenvolvimento? Como a criança vai construindo o seu conhecimento do mundo?

O mundo não é dado para ser ingerido passivamente. Mais do que isso, ingere-se o mundo ativamente, alcançando-o e colocando-o dentro de si. É através de experiências captadas não isoladamente que se ingere o mundo, e elas são organizadas em unidades chamadas esquemas.

133

Segundo Piaget, os esquemas são “unidades” ou “totalidades” de organizações da experiência que servem como contexto para os novos conhecimentos poderem ser assimilados. Portanto, através das assimilações e acomodações, os sujeitos constroem sua realidade, constroem o conhecimento que usam atualmente e que continuarão a usar. Há uma conservação do conhecimento. A assimilação leva a alguma acomodação. A nova acomodação cria um novo conceito ou esquema, que é assumido (conservado) até que uma outra experiência o estenda, mas sempre conservando o esquema anterior. O novo e o velho levam a uma nova síntese. Como o sujeito não tolera a contradição, porque tende ao equilíbrio, ele caminha sempre a procura de soluções. Nesta procura, ele cria soluções e conhece melhor o mundo em torno de si. O organismo vivo é capaz de antever, de antecipar... No mundo vivo, há toda sorte de antecipações.

Problematizando

As antecipações repousam sobre informações anteriores, sem as quais não seriam inteligíveis; essas informações são habitualmente ligadas a um esquema ou organizações susceptíveis de se transferirem de uma situação para outra. Você pode dar um exemplo de antecipação no pensamento de uma criança?

Piaget notou que esta construção humana da realidade poderia ser observada e estudada através da ação da criança. Ele ficou imediatamente interessado pela maneira como a criança raciocinava e pelas dificuldades que ela sentia; pelas faltas que cometia; as razões pelas quais ela as fazia; e pelos instrumentos que ela utilizava para chegar às soluções justas. Depois desse interesse inicial, ele começou e continuou fazendo a análise qualitativa, ao invés de fazer estatísticas sobre as respostas justas ou falsas. Ele acreditava que, existindo uma interação entre o indivíduo e o objeto, isto era feito através de uma estrutura que não era dada anteriormente, como se estivesse predeterminada no espírito humano. Ele concluiu que o indivíduo constrói seus conhecimentos. Seu verdadeiro problema era explicar o que há de novo no conhecimento de uma fase à outra do desenvolvimento. Como seria possível atingir o que há de novo?

Quando falou de criatividade na entrevista dada a Bringuier, ele se referiu a lacunas, ou contradições possíveis, e disse que: “...a infância é a fase criadora por excelência, …nela devemos concentrar nossos estudos de criatividade.” (Bringuier, 1978, p. 160)

O autor ensina que a criança cria o conhecimento quanto isso é possível, e que as possibilidades só se abrem degrau por degrau. Esses são essencialmente funcionais (sem estruturas já construídas), sob forma de um poder progressivo de coordenação. Piaget diz que as funções biológicas conduzem à manutenção da vida e as cognoscitivas conduzem ao conhecimento e à compreensão. Nas funções cognoscitivas, temos a antecipação como um dos caracteres gerais. Para ele, as antecipações intervêm desde a percepção, os condicionamentos e os esquemas de hábitos. Estas antecipações cognoscitivas possibilitam ao sujeito buscar soluções diferentes e até mesmo recorrer, extrapolar. O conhecimento consiste não apenas em adquirir e acumular informações, mas, sobretudo, em organizá-las e regulá-las por sistemas de autocontrole. Esses sistemas são orientados no sentido das adaptações, ou seja: no sentido da solução dos problemas. Se solucionar problemas é criar, então o conhecimento consiste em adquirir informações para que, organizadas e reguladas levem o sujeito à criação.

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A Evolução do Pensamento Criador, ou melhor, a construção do conhecimento, mostra que cada nível de estrutura, e seus antecedentes e/ou consequentes revelam uma organização que reflete o aparecimento da novidade na construção do conhecimento humano. O pensamento antecipado prevê acontecimentos, deduz pelo espírito e providencia, através do equilíbrio orgânico, o aparecimento da novidade no processo de conhecer o mundo. É o pensamento em ação que leva o organismo a criar, que leva à produção circular de aberturas e fechamentos que engendram o espírito. Este pensamento possibilita o começo de novas aberturas, de novas criações.

Aos conceitos de antecipação e conservação, Piaget adiciona o terceiro caráter notável da acomodação: o de alças. Este permite a antecipação através da aplicação ou transferência do esquema a uma situação nova antes de seu desenrolar temporal. Este caráter mostra que um esquema, inicialmente não antecipador, veio a tornar-se por ter duas extensões: uma para frente e outra para trás, sendo, cada uma, suficiente, pois podem se decompor em extrapolações e em recorrências na medida em que qualquer delas é esquematizada. Se o esquema se mantém por si mesmo, isso justifica o estudo da Evolução do Pensamento Criador, pois se o sujeito conhece extrapolando, ele está criando e, se recorre, não há perda, pois está mantendo o conhecimento inicial. Não há perda no ato de pensar criadoramente. O ato de pensar resulta em manutenção ou produção de novidades.

Falando sobre o que constitui os dois grandes mistérios do conhecimento, Piaget escreve que a organização do conhecimento engendra estruturas constantemente novas que não estão contidas nas iniciais. Uma vez construídas, elas aparecem como o produto necessário das primeiras. Tal construção sempre se apóia no que está em processo vindouro e, por conseguinte, no que ainda não está acabado, de uma maneira mais frequente e quase constante do que o adquirido anteriormente.

Para refletir

As crianças criam a novidade ao criarem os pensamentos sobre o mundo em que vivem?

Se o seu sistema (mecanismo) interno permite que elas criem, fica justificado que elas podem se desenvolver?

Se elas podem se desenvolver a cada momento que usam todos estas capacidades cognitivas internas, elas podem mostrar que são capazes de aprender, de serem aprendizes, de participarem das aprendizagens que nós, professores, tanto lutamos por promover?

A criatividade é a ultrapassagem do sistema que observa, assimila, conserva e está aberto às mudanças. Constitui-se de ação exterior ao objeto observado. Ela cria o novo e está além da simples observação das propriedades do objeto. Só o sujeito extrapola, pois é criativo. A extrapolação é a mudança no esquema; a generalização, a sua extensão a outros conteúdos ou sua extensão a uma rede mais organizada de esquemas e conteúdos. A extrapolação é a compreensão das possibilidades nas relações novas e não só a constatação de possibilidades nas relações observáveis (diferenciações e reintegrações). Ela engendra o novo e supera as necessidades, ultrapassa a verdade atual para o organismo psicológico. A criatividade não é só um enriquecimento complementar da extensão ou da compreensão do objeto e de suas relações: é a antecipação, a organização do conhecimento e a extrapolação de situações, a resolução de problemas, a mudança dos esquemas e a criação de estruturas mentais novas.

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Agora, podemos afirmar que há um desenvolvimento do pensamento criador, e a criança cria a novidade à medida que constrói seu conhecimento a respeito do mundo, à medida que aprende espontaneamente a conhecer o mundo. E o melhor é que isto pode ser observado através de um problema proposto através do desenho que, neste caso, não é nada mais que uma outra manifestação cognitiva da criança como outra qualquer. Será que é possível observar a Evolução do Pensamento Criador pelos grafismos (desenhos) de pessoas criativas quando criam? Esta é mais uma pergunta a ser respondida. Vejamos o que pode ser observado no item 3.1., quando discutiremos alguns desenhos que coletamos de crianças.

2.2. Como podemos providenciar que o sujeito aprenda sendo criativo?

Para que o sujeito aprenda, devemos levar em conta o seu nível de desenvolvimento. Isso significa respeitar o conhecimento adquirido até o momento, o contexto em que está inserido, o ritmo de seu envolvimento na atividade, sua predisposição para a concentração e suas tentativas de entender o que é novo e o que está sendo proposto. Crianças da mesma idade não necessariamente estão no mesmo nível de desenvolvimento.

Para isso, temos que respeitar o movimento da criança nas atividades da qual faz parte. É preciso que sejamos os intermediários entre a criança e o mundo (leia-se sala de aula e fora dela) para que se promova o desenvolvimento. Respeitado o nível de desenvolvimento de cada criança, garante-se o meio propício para que a aprendizagem ocorra. Qualquer que seja a matéria lecionada, estar-se-á respeitando as diferenças individuais, as limitações e os talentos.

Problematizando

Possíveis respostas para as questões acima envolvem saber que:

Nossa sociedade não dá credibilidade e apoio para a educação como recurso político. Nos moldes como é exercitada hoje no mundo acadêmico, as características intelectuais exercitadas não são as requisitadas pelo mundo atual. Muitos alunos saem da faculdade sem noção dos desafios que a sociedade lhes reserva na sua atuação prática. Saem formados e sem preparo para transformar a realidade; não resolvem e não criam o novo para resolverem os problemas postos pela cotidianidade. Convém observar que os jovens acharão as escolas mais fascinantes e interessantes se tiverem a chance de tentar todas as possibilidades de raciocínio, criação e improvisação; ao mesmo tempo em que estiverem aprendendo os conteúdos obrigatórios. Criar condições para o desenvolvimento do pensamento criador abrange ações através da vivência da percepção em sala de aula dando oportunidades para que a criança por meio da prática artística exercite a imaginação e a fantasia no ato criador.

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Unidade 3: A prática docente na construção do conhecimento em arte

3.1. Por que temos que saber qual é o nível de desenvolvimento de nossos alunos?

Imagine que você tem que preparar uma aula e não sabe quem são seus alunos. Não sabe como eles aprendem e em que estágio ou nível de desenvolvimento eles se encontram. Existem várias maneiras de você descobrir. Uma delas é observando o desenho e a evolução do desenho ao longo das diferentes idades.

Ana Mae ressalta que, em 1914, com a vinda do professor italiano Ugo Pizzoli para o Brasil, iniciou-se estudos que indagavam sobre a natureza da criança e consideravam necessárias para o nosso país investigações sobre as suas potencialidades orgânicas e funcionais. Entre os trabalhos publicados, Ana Mae comenta o de Adalgiso Pereira, que usou a representação gráfica da criança como teste. Além de medir a memória visual, a memória cinética e a aptidão para as artes visuais, ele media e classificava os tipos intelectuais. Iniciava-se, nesta época, a noção de que o desenho infantil pode providenciar índices de um processamento lógico-mental e ser um meio para investigá-lo.

Olho-vivo

Vale a pena ler A Experimentação psicológica e o ensino do desenho. Liderança de São Paulo no ensino primário e normal, Capítulo 6 do livro Série Debates: Educação (São Paulo: Perspectiva, 1978), de Ana Mae Barbosa. Com ele, você pode notar que, já em 1978, a autora demonstrava ser a pioneira na discussão e na defesa da arte infantil para a criança. Ela faz uma retrospectiva do interesse dos educadores e psicólogos pela expressão infantil através do desenho e comenta os rumos que tomou o ensino do desenho ao longo das décadas.

Com os positivistas, passou-se a definir desenho como um elemento que informava ao professor a natureza psicológica, como se fosse um teste mental que mostrasse o estado da cultura, o valor, a extensão do patrimônio ideativo da criança. Em outras palavras, com o desenho, poderíamos distinguir as ideias das crianças. Se a criança faz o desenho e expressa suas ideias a partir de sua consciência do mundo ou a partir de solicitação de alguém, o que importava era investigar as atividades cerebrais usadas na ação de realizar o grafismo. Era o começo da averiguação de como se inicia e como se desenvolve na mente da criança a representação figurada das coisas mais comuns que a circundam.

Nos seus estudos, Pizzoli concluiu que a inexatidão do conceito visual ou falta de lógica dos desenhos infantis foi devidos a: 1º – a deficiente educação da mão; 2º – a deficiência do espírito de observação, mola impulsionadora da síntese mental; e 3º – ao cansaço fácil da atenção. Suas conclusões foram muito importantes na época, mas penso que temos, nesta discussão, a oportunidade de perguntar:

137
Problematizando

Tente responder a cada uma destas perguntas. Você estará discutindo como a criança constrói o conhecimento do mundo através de sua ação!

Você lembra que, no inicio da Unidade 1, eu propus discutir conceitos novos sobre desenvolvimento e que, para estes conceitos novos fossem aprendidos, faríamos verificações práticas, utilizando exemplos de desenhos realizados por alunos(as) de diferentes idades? A intenção é que você se inicie na busca pelos significados presentes em cada um deles, que comece a entender sobre os conceitos de Piaget e sobre os níveis de desenvolvimento da criança que desenhou algo. Como exemplo, apresento um dos desenhos (grafismos — ver Figura) que integra a Análise 1. A proposta desta análise é comentar as evidências dos diferentes elementos que demonstram o desenvolvimento das crianças a partir de suas criações.

Dica

Para visualizar a imagem a seguir e conhecer as análises e os desenhos que compõem o projeto, consulte o AVA da disciplina.

Figura. Desenho de Léo, 5 anos.

O sujeito mais novo não é capaz de pensar como o adulto porque ele ainda tem muito para evoluir. Ele simplesmente não tem as estruturas lógicas, a organização do pensamento e os métodos de raciocínio que poderiam ajudá-lo a lidar com os problemas propostos. Se o sujeito novo apresenta certa evolução que surpreende, se está aprendendo precocemente, é porque ele tem as estruturas mentais e/ou mecanismos citados. Ao invés de pesarmos somente em níveis como etapas do desenvolvimento, devemos conceber estes níveis como parte de uma espiral contínua, que cresce para patamares cada vez mais altos, sempre em progressão. Cada curva leva ao crescimento se baseando no que a precedeu, direcionando ao que imediatamente se segue. Com tudo isso, temos a possibilidade de observar as partes que o formam mais de perto. Ou seja, podemos olhar os níveis e subníveis mais concretamente, para, por outro lado, termos a visão mais aproximada de como e quanto esta espiral é um sistema equilibrado e integrado.

A Evolução do Pensamento Criador é um bom exemplo de como a organização é inerente ao funcionamento intelectual e impõe estruturas ao pensamento à medida que o próprio exercício do pensamento cria as mais variadas estruturas. São essas que sustentam o sistema que leva o sujeito a conhecer o mundo. Aqui, se pode afirmar, mais uma vez, que, como dizia Piaget, as estruturas que possibilitam o conhecimento não são nem inatas nem inscritas a priori no sistema nervoso do sujeito, nem são criadas pela sociedade por imposição do meio. Elas aparecem e evoluem das trocas ente o sujeito e outras pessoas, entre eles e o mundo físico no qual se desenvolvem.

O processo de equilibração se repete a cada nível do desenvolvimento, mostrando que as atividades individuais do sujeito proporcionam a elucidação de que, conhecendo o mundo, o sujeito concretamente vivencia e exercita a Evolução do Pensamento Criador à medida que traça o ciclo da própria progressão intelectual. As estruturas do pensamento são mais ricas a cada nível, mais complexas e mais inclusivas. Nada se perde. Quando o equilíbrio é estabelecido, o incansável organismo mental começa a explorar outras áreas.

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Finalmente, o sujeito cria seu pensamento, evidenciando em sucessivos níveis uma ação que a mente pratica sobre a realidade que a circunda ao tentar se preparar para conhecer o mundo. Neste esforço, o sujeito cria sua própria capacidade de pensar, sua inteligência. Cada um no seu ritmo. A inteligência cresce dentro do próprio sujeito, ela é a capacidade de mudança, a evolução, a passagem de um nível ao outro; é a construção de um ciclo integrado que se movimenta através de aberturas, de possíveis primeiramente concretos, depois abstratos, quaisquer; ultrapassando barreiras antes intransponíveis, vencendo pseudo-necessidades e/ou pseudo-impossibilidades. O sujeito, de maneira concreta, no exercício da Evolução de seu Pensamento Criador, cria e conserva, conserva e cria o pensamento. Isto pode ser uma explicação de como são criadas as coisas novas, de como é engendrado o espírito.

3.2. Como construir propostas provocativas que levem a construção do conhecimento, do novo e do original?

Nas minhas aulas de arte-educação, fui presenteada com o texto que relato a seguir. Leia com atenção e, depois, vamos discutir sobre o seu conteúdo:

O menininho

Autor desconhecido

...Era uma vez um menininho.

Ele era bastante pequeno. E ele estava numa grande escola.

Quando o menininho descobriu que podia ir à sua sala, caminhando através da porta da rua, ele ficou feliz.

Uma manhã, quando o menininho estava na escola, a professora disse:

—‘Hoje nós iremos fazer um desenho’.

Que bom! ... , pensou o menininho.

Ele gostava de fazer desenhos. Ele podia fazê-los de todos os tipos: leões, tigres, galinhas, vacas, trens e barcos; e ele pegou sua caixa de lápis. E começou a desenhar. Mas a professora disse:

—‘Esperem! Ainda não é hora de começar!’. E ela esperou até que todos estivessem prontos.

—‘Agora — disse a professora — nós iremos desenhar flores’.

Que bom! ... , pensou o menininho! Ele gostava de desenhar flores. E ele começou a desenhar flores com seu lápis rosa, o laranja e o azul.

Mas a professora disse:

—‘Esperem! Vou mostrar como fazer!’. E a flor era vermelha, com caule verde.

—‘Assim!’ — disse a professora.

–‘Agora, vocês podem começar!’.

O menino olhou para a flor da professora. Gostava mais da sua flor, mas não podia dizer isso a ela.

Ele virou o papel e desenhou uma flor igual à da professora. Era vermelha com o caule verde.

Num outro dia, quando o menininho estava em aula ao ar livre, a professora disse:

—‘Hoje iremos fazer alguma coisa com o barro’.

Que bom! ..., pensou o menininho. Ele gostava de barro. Mas a professora logo foi dizendo:

—‘Esperem! Não é hora de começar!’ E ela esperou até que todos estivessem prontos para começar.

—‘Agora — disse a professora — nós iremos fazer um prato’.

Que bom! ... , pensou o menininho. Ele gostava de fazer pratos. E começou a fazer pratos de todas as formas e tamanhos. A professora disse:

—‘Espere! Vou mostrar com se faz’. E ela mostrou como fazer um prato fundo.

—‘Assim — disse a professora — Agora vocês podem começar!’

O menino olhou para o prato da professora. Em seguida, olhou para os seus pratos. Ele gostava mais dos seus pratos do que do da professora. Mas ele não podia dizer isso. Ele amassou os seus pratos numa grande bola, novamente, e fez um prato igual ao da professora. Era um prato fundo. Só isso!

E muito cedo o menininho aprendeu a esperar e a olhar, e a fazer as coisas exatamente como a professora queria. E muito cedo, ele não fazia mais nada por iniciativa própria.

Nesta época, aconteceu que o menininho mudou-se para outra casa em outra cidade, e teve que começar a estudar em outra escola. Esta escola era ainda maior do que a outra. E não havia porta da rua para a sua sala. Ele tinha que subir grandes degraus até sua sala. E no primeiro dia, ele estava lá esperando pela professora.

A professora começou a aula e disse:

—‘Hoje nós vamos fazer um desenho’.

Que bom! ... , pensou o menininho. E ele esperou que a professora dissesse o que fazer. Mas a professora não disse nada! Ela apensas andava na sala, de um lado para o outro. Quando ela veio até o menininho, perguntou:

—‘Você não sabe desenhar?’

—‘Sim!’ — disse o menininho — ‘O que é que nós vamos fazer? Como vamos fazer?’

—‘ Eu não sei, até que você o faça! — disse ela.

—‘Como eu posso fazê-lo?’ — perguntou o menininho.

—‘Da maneira que você gostar’ — respondeu a professora.

—‘E de que cor?

—‘Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas cores, como eu posso saber quem fez o quê? E qual o desenho de cada um?’

—‘Eu não sei!’ — falou o menininho.

E ele começou a desenhar uma flor vermelha com um caule verde!

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Como você pode notar, o aluno participou de vivências em que não foi garantida a ele a oportunidade construção do conhecimento, do novo e do original. A sua criação inicial não foi notada e/ou respeitada pela professora. Ele aprendeu por imitação, mas não criou nada novo, apesar de ter assimilado, adaptado e acomodado os conteúdos que a professora ministrou. Não houve chance de participar de um processo criador.

Para nós, o importante é o aluno vivenciar processos criativos para, depois, por necessidade interna, poder agir para superar lacunas no seu sistema cognitivo, deixando para trás os impossíveis e avançando à procura de coisas possíveis de serem feitas, criadas. Ele tem que participar de atividades de desequilíbrio e poder procurar o equilíbrio desse sistema. Tem que ser proposto a ele problemas e a ele ser dada a oportunidade de resolvê-los. Somente assim ele aprende conteúdos novos, a partir de criações propostas pela consciência da ação sobre os conteúdos anteriores, resgatados, utilizados e mantidos pelo seu sistema.

O aluno aprende, mantém o aprendido, tem espaços internos para utilizar o que já conhece e cria a partir das lacunas (o que está faltando e que ele ainda não entende) que seu sistema percebe. Assim ele cria, desenvolve-se e aprende. E ele aprende, desenvolve e cria. O sistema é fechado e perfeito! Não haverá aprendizagem sem desenvolvimento e não haverá desenvolvimento sem a aprendizagem que antecede o equilíbrio e o preenchimento das lacunas. O novo é o que foi possível para ele entender e manipular, criando. O aluno aprende modelos de ação, conteúdos, estratégias, habilidades e atitudes somente porque tem à sua disposição a potencialidade de aprender. Seu equilíbrio psicológico leva-o ao aprendizado através do desenvolvimento e da construção do conhecimento do mundo que o rodeia,

Nesta parte, entrego-lhe propostas e ações para que você dê aos seus alunos a oportunidade de aprender criando. Você deve levar em conta as diferenças individuais, sabendo que crianças com a mesma idade poderão estar em níveis distintos de desenvolvimento e que precisam ser olhadas como indivíduos que aprendem de maneira diferenciada, dentro do seu próprio ritmo: o ritmo providenciado pelo seu nível de desenvolvimento. O aluno não é o que você quer que ele seja. Ele é o que é capaz de ser!

Ações visando garantir o desenvolvimento de seus alunos e levá-los à aprendizagem:

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Proposta: Agora que você leu sobre desenvolvimento, aprendizagem e sobre como ocorrem estas mudanças no sistema de equilibração cognitiva do ser, leia o texto abaixo, de minha autoria, apresentado no II Seminário de Educação Estética, CEFET, Goiânia–GO, 2001. Ele fala do professor criativo e de como ele pode se tornar mais criativo pela prática.

Tornando-se um professor criativo

A própria maneira de lecionar é uma invenção única. O processo de se tornar um professor criativo é como o processo do pensar criadoramente. Se você contar com os cursos em educação, com aulas que você já deu, com a contribuição de seus alunos, você se desapontará. Pode até aprender sobre a matéria a ser dada, a natureza das crianças, o processo de aprendizagem, os métodos e materiais instrucionais. Nunca tudo isso será o suficiente. Você poderá se informar sobre o que é estudante com altas habilidades, o estudante com necessidades especiais. Ainda assim, você não terá descoberto tudo. Todos eles somados não o capacitarão. Eles precisarão ser combinados com suas próprias habilidades e potencialidades, somados às necessidades de seus estudantes, de uma maneira tal que levarão a criar sua única e própria invenção — sua maneira de lecionar. Tem que levar em conta o seu desenvolvimento e o de seus alunos. Você terá que visar a aprendizagem — a sua e a deles. Esta invenção única é tremendamente importante para lecionar criatividade ou lecionar criativamente, levando os próprios estudantes à descoberta e ao uso de suas potencialidades. A procura de alguma meta preestabelecida, a invenção de sua própria maneira de ensinar emerge de seu próprio processo criativo.

Se falhar, você tomará consciência de suas deficiências (lacunas) internas, defeitos e saberá das falhas existentes nas suas técnicas e estratégias; descobrirá os furos no seu repertório de conhecimentos e/ou conteúdos. Você se baseará nas experiências vividas e procurará indicativos para melhorar seu desempenho nas próximas tentativas. Terá que ler muito. A partir deste ponto, você estuda o que lê e suas questões aumentarão cada vez mais. Passará a ver coisas que antes não se conscientizara existentes. O que era impossível passa a ser possível e você preenche suas lacunas na construção dos conhecimentos novos e na elaboração de esquemas e estruturas mentais mais complexas. Você se desenvolve e aprende. Passará assim a apostar, formular hipóteses, procurar soluções. Estará sendo criativo e solucionando problemas. Estará, você mesmo, tentando ser um bom professor através da vivência da Metodologia da Atividade Criadora. Através das tentativas, dos êxtases nos acertos, das aceitações dos erros somados à exclusão dos mesmos no processo, você estará vivificando a ocorrência de sua própria invenção — você sendo o professor que gostaria de ser!

Paul Torrance já dizia que os seus próprios recursos de personalidade, suas necessidades, seus recursos intelectuais e suas habilidades, as necessidades e as habilidades de seus alunos e as expectativas da comunidade para as quais você está lecionando interagem para determinar os materiais e os métodos mais efetivos. É possível, entretanto, derivar da experiência e da pesquisa alguns princípios gerais que aumentarão as chances de que seu ato de lecionar se incremente e fomente o potencial das crianças talentosas. É possível criar métodos de ensino e materiais instrucionais que se basearão em princípios já testados. É tarefa criativa do professor, você, combiná-los para atender às necessidades e habilidades dos estudantes, mantendo a harmonia com as necessidades e habilidades próprias.

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Dica

Leia sobre Paul Torrance, no livro Criatividade: Medidas, Testes e Avaliações. Editora IBRASA. São Paulo: 2009.

Atividade

Faça um resumo do texto lido acima e elabore 4 (quatro) atividades a partir do texto:

Escreva um Memorial que mostre detalhadamente a sua própria maneira de ensinar, defendendo se é uma invenção única ou uma cópia de outros modelos aprendidos anteriormente;

Descreva uma experiência em que pôde observar que crianças de mesma idade apresentavam desenvolvimento cognitivo diferenciados. Procure argumentar o porquê das diferenças;

Faça um plano de curso, descreva os conteúdos e mostre como vai avaliar se houve aprendizagem (aferição do conhecimento adquirido pelos alunos);

Descreva quais tópicos, conceitos e novidades deste curso que o surpreenderam. O que não sabia? O que aprendeu? Foi difícil o contato com os conceitos novos? Você tinha muitas lacunas acerca dos assuntos/temas tratados aqui? Foi difícil desenvolver competência à medida que lia e procurava entender? O que era impossível aprender se tornou possível à medida que os conhecimentos novos foram acrescidos aos antigos? Como foi o seu desenvolvimento? Como foi a sua aprendizagem?

“Você percebeu quando criou conhecimentos novos para a sua atividade pedagógica? Percebeu quando aprendeu e praticou a novidade? Foi ao tentar resolver os problemas? Como foi?”

Referências Bibliográficas

PINKER, Steven. Tabula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

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BALDWIN, A. L. Teorias de desenvolvimento da criança. São Paulo: Pioneira. 1980, pp. 159–360.

BRINGUIER, J.C. Conversando com Piaget. Rio de Janeiro: DIFEL, 1978.

FERREIRA, S. O ensino das artes: construindo caminhos. Campinas: Papirus, 2001, pp.139–221.

FERRAZ, Maria Heloísa C. T., FUSARI, Maria F. Resende. Metodologia do ensino da arte. São Paulo: Cortez, 1993.

TORRANCE, Paul. Criatividade: medidas, testes e avaliações. São Paulo: IBRASA, 2009.