Licenciatura em Artes visuais Percurso 4
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Organização e Gestão do Trabalho Pedagógico

Autor

Dr.Fábio José Rodrigues da Costa Pós-Doutor em Artes pelo Programa de Pós-Graduação em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (2017); Doutor em Artes Visuais pela Universidad de Sevilla - US/España (2007) com Bolsa Doutorado Pleno no Exterior do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ? CNPq; Mestre em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco ? UFPE (1999) com Bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível - CAPES. Curso de Aperfeiçoamento em Aprendizagem da Arte e Cultura Contemporânea pela Universidade de São Paulo - USP (2000); Graduado (Licenciatura) em História pela Universidade Federal de Pernambuco (1995. Aulas ministradas na Universidad Autónoma de Madrid (España); Instituto Superior de Arte de Cuba (Cuba) e Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (Portugal). Coordenador do DINTER Artes UFMG-URCA (2013-2017); Assessor de Relações Internacionais da URCA (2013-2017); Diretor do Centro de Artes Reitora Maria Violeta Arraes de Alencar Gervaiseau da URCA (2013-2017); Chefe do Departamento de Artes Visuais (2012-2015); Diretor do Centro de Artes (2008-2011); Pró-Reitor de Extensão (2011-2012. Líder do Grupo de Pesquisa Ensino da Arte em Contextos Contemporâneos - GPEACC/CNPq (2007); Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Ensino da Arte - NEPEA (1999). Membro do Projeto de Cooperação Internacional para América Latina com a Universidade Autónoma de Madrid (España) com participação do Chile, Cuba, Brasil e Venezuela (2009-2011). Representante do Brasil no Consejo Latinoamericano y Caribeño de Educación por el Arte - CLEA (2010); Presidente do Consejo Latinoamericano y Caribeño de Educación por el Arte - CLEA (2010-2012); Diretor de Relações Internacionais da Federação dos Arte/Educadores do Brasil - FAEB (2012-2014). Membro da Rede Iberoamericana de Educação Artística - RIAEA; Membro associado da Federação dos Arte/Educadores do Brasil - FAEB; Membro associado da International Society for Education througt Art - InSea. Atualmente é professor Associado da Universidade Regional do Cariri/Departamento de Artes Visuais. Atua e desenvolve pesquisas na área de Arte/Educação com ênfase na Formação de Professores de Artes Visuais, Didática do Ensino das Artes Visuais, Mediação Cultural. Ministra as disciplinas Pesquisa e Prática Pedagógica em Artes Visuais, Didática do Ensino das Artes Visuais, Estágio Supervisionado em Ensino das Artes Visuais, Teoria da Arte, Curadoria e Museologia no Curso de Licenciatura em Artes Visuais. Curador Independente.

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Apresentação

Querido(a) Estudante,

Fui convidado a compartilhar com você algumas ideias que tenho construído sobre o tema “A Escola como lugar de ações-mediações-interações-ações”. No entanto, chamo a atenção para o fato de que não se trata de um conteúdo, mas de problemáticas que afetam diretamente nossa compreensão sobre o papel e a função social de uma instituição que tem por objetivo a escolarização de crianças, jovens e adultos das diversas regiões de nosso País.

Essas problemáticas não devem ser vistas como um conteúdo complementar, mas sim como uma unidade didática que se propõe a estabelecer conexões com as disciplinas já estudadas, bem como com outras que serão em breve apresentadas a você.

O objetivo geral desta unidade é lançar ao debate questões sobre a gestão da escola, o papel dos sujeitos sociais que dela fazem parte e as atuais perspectivas para a construção de um imaginário pós-moderno exigido pelo tempo presente.

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No terreno das inquietações, esta unidade pretende situar o futuro professor de artes no contexto da escola de Educação Básica como protagonista do projeto político-pedagógico e das ações educativas dele decorrentes.

Unidade 1: Eu, o Outro e a Escola

Com o objetivo de oferecer uma organização didática à nossa trajetória, optei por dividir este texto em cinco unidades interligadas entre si. A primeira apresenta alguns questionamentos sobre a relação “Eu, o Outro e a Escola”, tendo por base um pequeno texto publicado por Dowbor (2001) que provoca inquietações sobre o papel da sociedade, da escola, do professor e das demais instituições de formação em todos os lugares e contextos culturais.

Terminada a última guerra mundial foi encontrada, num campo de concentração nazista, a seguinte mensagem dirigida aos professores:

“Prezado Professor, sou sobrevivente de um campo de concentração. Meus olhos viram o que nenhum homem deveria ver. Câmaras de gás construídas por engenheiros formados. Crianças envenenadas por médicos diplomados.

Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês fuzilados e queimados por graduados de colégios e universidades. Assim, tenho minhas suspeitas sobre a Educação. Meu pedido é: ajude seus alunos a tornarem-se humanos. Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados ou psicopatas hábeis. Ler, escrever e aritmética só são importantes para fazer nossas crianças mais humanas”.

DOWBOR, Ladislau. Tecnologias do Conhecimento: Os Desafios da Educação (2001). In: http://dowbor.org/tecnconhec.asp.

O aspecto central da mensagem do texto, diz respeito ao papel e função social do professor como sujeito histórico e, consequentemente, responsável por sua humanização e coresponsável pelo estado de humanização de seus alunos(as).

Tal posicionamento não indica que estejamos atribuindo responsabilidade à professor(a) como guardião da humanidade, salvador da pátria, soldado do exército da paz ou vigilante das fronteiras do desconhecido.

Na verdade, nosso esforço é para chamar este sujeito social e histórico para o exercício da reflexão no que diz respeito à ideia de progresso como o resultado do uso da razão e do conhecimento científico em favor de uma única forma de cultura humana (EFLAND, 2003).

Vivemos em plena contemporaneidade, presos aos ditames das chamadas sociedades modernas, desenvolvidas, industrialmente avançadas. Essas nações determinam como todas as demais devem ser, agir e pensar de forma a atender aos interesses neoconservadores e neoliberais defendidos por essas mesmas sociedades.

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Para compreender melhor os termos neoconservadores e neoliberais consulte os links:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Neoconservadorismo.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Neoliberais.

Por essas e tantas outras questões, é urgente pensarmos no desenvolvimento de ações educativas que contribuam para nossa humanização e a humanização de nossos alunos(as).

A construção de ações educativas que rompam com ações que escravizam, exterminam, excluem, violentam e negam a dignidade do ser humano, tem sido insistentemente apontada e combatida por inúmeros teóricos.

Peter Mclaren (2000) defende, em sua obra Multiculturalismo Revolucionário – pedagogia do dissenso para um novo milênio, a esperança como possibilidade de superação do atual estado de desespero a que se encontra submetida a maioria da população mundial.

Essa esperança nasce na Pedagogia da Libertação tão amplamente defendida pelo Professor Paulo Freire, que durante sua caminhada lutou por uma Libertação de um novo colonialismo que invade as subjetividades, sequestrando sua autonomia. Libertação de um individualismo que obriga os sujeitos a viverem presos dentro de si sem a possibilidade de construir-se com o outro, condenados a essa solidão que arrasa o sujeito contemporâneo. Libertação das grandes narrativas que a tudo querem homogeneizar e não deixam lugar para a autoconstrução e para a diferença. Libertação do autoritarismo que nos priva da necessidade vital de agência (MCLAREN, 2000, p. 07).

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Uma esperança que depende de nossas ações a partir da desconstrução do dissenso, da sacudida da letargia, do despertar do afeto, da afirmação da autoria e da singularidade e do sentido da existência do outro (MACLAREN, 2000, p. 07).

Olho vivo

Para conhecer nosso mais importante e expressivo educador, vá ao seguinte endereço: http://br.youtube.com/watch?v=Ul90heSRYfE&feature=related e acesse sua última entrevista. Essa entrevista foi dividida em outros fragmentos que podem ser acessados durante a exibição da primeira parte.

Problematização

Assista ao documentário Paulo Freire Contemporâneo. Em seguida, elabore um pequeno texto para comparar as ideias apresentadas no documentário ao pensamento de Maclaren. Após a postagem do texto e a apresentação das inquietações em fórum específico, que será criado por seu (sua) professor(a), segue como sugestão a leitura de Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a pedagogia do oprimido.(1992), de Paulo Freire.

Unidade 2: A Função Social da Escola

Com o tema “A função social da Escola” proporcionará a compreensão do lugar da escola em nossa sociedade e, para tanto, iremos dialogar com autores(as), documentários e experimentar pequenos ensaios investigativos que respondam a seguinte pergunta: “Para que serve a escola?”.

Problematização

Antes de seguir com a leitura, por favor, acesse o seguinte endereço: http://br.youtube.com/watch?v=3JZzSed3loM

Após sua visita, leitura e escuta realize uma consulta por email com seus amigos, parentes e profissionais próximos a você perguntando-lhes: “Para que serve a escola?”. Ao receber a resposta, proponha a seus colegas de curso a realização de uma amostragem dos dados coletados e montem um painel. Para melhor organizar os dados e sistematizar os resultados, peça ajuda ao seu (sua) professor(a) ou a um(a) professor(a) de metodologia da pesquisa.

Para não ter ideia dos resultados, sigo minhas reflexões considerando que o presente está a exigir outras formas de pensar a Educação e a Escola. Portanto, um tempo presente que transgrida:

a visão da educação escolar baseada nos ‘“conteúdos, apresentados como objetos” estáveis e universais e não como realidades socialmente construídas que, por sua vez, reconstroem-se nos intercâmbios de culturas e biografias que têm lugar na sala de aula (HERNÁNDEZ, 1998, p. 12).

Esperança, libertação e transgressão são categorias que devem nortear nosso pensar e nossas práticas educativas.

Acreditamos e desejamos que a esperança, a libertação e a transgressão contribuam para uma ação educativa apaixonada pelo conhecer, aprender e compreender. Essa paixão deve nos conduzir para o complexo e contraditório universo das relações entre o eu e o outro no contexto da escola que se reivindica contemporânea.

O campo da complexidade e das contradições é grandioso e pode facilmente nos distanciar de nosso objetivo de construir um projeto político-pedagógico que rompa definitivamente com o pensamento moderno que tem tornado a escola um lugar que desloca as necessidades de meninos e meninas e dos e das adolescentes à etapa seguinte da escolaridade, ou ao final da mesma, marcados pela ideia de que a finalidade da infância é chegar à vida adulta, de que o desenvolvimento da inteligência tem que chegar à etapa das operações formais, ou que passar no exame de ingresso à universidade deva ser o objetivo de toda a educação básica (HERNÁNDEZ, 1998, p. 13).

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Nossa aventura não pode ser comparada à do romance “A Volta ao Mundo em 80 Dias”, de Julio Verne (1873), porque hoje não só damos a volta ao mundo como adentramos nos aspectos mais sensíveis de cada sociedade com apenas um clic na tela de um computador conectado a Internet.

Hoje, dispomos de outras ferramentas que nos auxiliam na busca de conhecer, aprender e compreender uma imensidão de informações sobre praticamente tudo.

Problematização

Vamos fazer uma nova parada para ler o fragmento do vídeo A Escola “Gerando Traumas”. Vá ao seguinte endereço http://br.youtube.com/watch?v=E1eFnDI7bOA e, após sua leitura e reflexões, sugira a seus colegas a organização de um debate on-line sobre o vídeo. Este debate deverá gerar conhecimento sobre a história de vida de cada envolvido, no entanto, é muito importante que as narrativas sejam orientadas para o tema, ou seja, quais os traumas provocados pela escola ao longo da escolarização de cada participante.

Unidade 3: O Projeto Político-Pedagógico

Nesta unidade, o desafio é desconstruir o imaginário modernista que tem tratado a escola como uma empresa a ser gerenciada, administrada e centralizada nas mãos do diretor da escola. Tal concepção tem impedido que a escola seja um lugar da coletividade para ela, portanto, negando o princípio da participação e da construção coletiva. Na última parte, o desafio é anunciado por meio dos critérios essenciais para a construção de um projeto político-pedagógico que tenha na participação seu fundamento e na avaliação a mediação entre o proposto e o vivido.

Como instituição da cultura e para a cultura, a escola precisa repensar de maneira permanente, dialogar com as transformações que acontecem na sociedade, nos alunos e na própria educação (HERNÁNDEZ, 1998, p 13).

Portanto, o projeto político-pedagógico deve refletir o modelo de escola que desejamos, bem como, o perfil dos profissionais que dela farão parte.

Aliás, não existe projeto político-pedagógico sem os professores porque serão eles os responsáveis por sua materialização.

No entanto, exigir dos profissionais da educação que assumam previamente o compromisso com um fazer diferente do que estavam acostumados a vivenciar, não significa dizer que exista um processo de mudança qualitativa em relação a esse fazer.

Não podemos esquecer que as contradições existentes no interior da escola são concretas e reais, bem como refletem a dinâmica da sociedade em que vivemos. Assim, exigir mudanças no fazer, na prática pedagógica, na ação educativa do outro em relação ao que desejamos é, antes de mais nada, impor a condição de meros objetos e executores de tarefas consideradas aos profissionais da educação eficientes.

Pensar, refletir, desconstruir, construir; dar movimento ao estático deve começar por reconhecermos o outro como sujeito do processo social e nossa intenção em mudar uma dada realidade.

Nesse sentido, a intenção de mudança deve ser compartilhada com todos os sujeitos inseridos no contexto no qual verifica-se a necessidade de outro perfil de profissional, no intuito de tornar aquela prática mais significativa e realmente transformadora para todos os envolvidos.

O projeto político-pedagógico parte de uma proposição teórico-metodológica que atende a nossas expectativas no tocante a um exercício de envolvimento que ultrapassa a ideia da conjunção de pessoas e interesses comuns. Ou seja, ele é fruto da vontade, desejo, paixão; do compromisso político, ideológico, social e profissional de todos.

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Sendo a participação nosso princípio norteador e a convicção de que essa participação não é apenas “fazer parte”, mas “ser parte” do pensar ao agir, optamos por trabalhar com os pressupostos do Planejamento Participativo porque para esse participação (...) inclui distribuição do poder e a possibilidade de decidir na construção não apenas do “como” ou do “com que” fazer, mas também do “o que fazer” e do “para que” fazer (GANDIN, 2001, p. 88).

A opção pelo planejamento participativo encontra outras respostas que complementam a perspectiva de distribuição do poder e da possibilidade de decidir porque nele está inclusa a tarefa de contribuir para a construção de novos horizontes, entre os quais estão, necessariamente, valores que constituirão a sociedade (GANDIN, 2001, p. 87).

No tocante à sociedade, não se deve esquecer de que toda e qualquer instituição educacional, ou não, faz parte de um dado contexto social. Uma proposta educativa deve partir de tais considerações uma vez que não existe nenhuma ação ou prática que estejam ausente dos aspectos sociais, políticos, ideológicos e culturais do contexto do qual fazem parte.

O projeto político-pedagógico, segundo o critério da participação, abre exatamente a perspectiva de contribuição para modificar nossa forma de pensar e agir na sociedade em que vivemos, uma vez que buscamos como horizonte emancipador um estado de convivência social norteado pelos princípios democráticos e igualitários.

O papel e função social que cada indivíduo deverá exercer nessa concepção é esclarecida por Gandin (2001, p.87):

Nas escolas, por exemplo, não basta que os professores, isoladamente ou mesmo em conjunto, definam “como” e “com que” vão “passar” um conteúdo preestabelecido, dando, assim, um caráter de só administração ao trabalho escolar; é necessário que se organizem para definir que resultados pretendem buscar, não apenas em relação a seus alunos, mas no que diz respeito às realidades sociais, e, que a, partir disso, realizem uma avaliação circunstanciada de sua prática e proponham práticas alternativas para ter influência na construção social.

De todos os elementos presentes na citação acima, destacamos o aspecto referente ao desenvolvimento de práticas alternativas que possam contribuir ou influenciar qualitativamente para uma reconstrução social.

Embora o objetivo fundamental do planejamento participativo seja contribuir para a construção social, tal perspectiva só poderá ser contemplada se o projeto político-pedagógico estiver amparado por uma clara compreensão das práticas sociais excludentes e antidemocráticas que caracterizam a sociedade contemporânea.

O desejo por uma sociedade mais justa, igualitária, democrática e inclusiva encontra no planejamento participativo uma concepção de participação para além daquela presença, aquele compromisso de fazer alguma coisa, aquela colaboração, aquele vestir a camisa da empresa nem, mesmo, a possibilidade de decidir alguns aspectos esparsos e de menor importância; participação é aquela possibilidade de todos usufruírem dos bens, os naturais e os produzidos pela ação humana (GANDIN, 2001, p. 88).

A ideia de que, em uma sociedade, todos têm o direito de usufruir das riquezas naturais, bem como, das produzidas pelo homem define claramente o tipo de sociedade desejada. Assim, o projeto político-pedagógico, fruto da participação de todos, não é apenas a organização de ações, o estabelecimento de metas ou a organização de planos ou projetos de trabalho que não ultrapassam a relação conhecer-aprender.

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Vislumbrar outro modelo de sociedade e de prática social é antes de tudo garantir, por meio de uma ação educativa, que seus sujeitos sociais utilizem de três dimensões cognitivas: conhecer-aprender-compreender.

A relação intrínseca entre essas três dimensões descarta o entendimento de que só alguns poucos indivíduos são capazes de pensar, sugerir, refletir, propor, encontrar alternativas que sejam essencialmente qualitativas. Na verdade, com o planejamento participativo o poder deixa de estar nas mãos de poucos e passa a fazer parte de todos os envolvidos na tarefa de construir outra prática educativa e social porque

A construção em conjunto acontece quando o poder está com as pessoas, independentemente dessas diferenças menores, e fundamentado na igualdade real entre elas. Aí se pode construir um processo de planejamento em que todos, com o seu saber próprio, com sua consciência, sua adesão específica, organizam seus problemas, suas ideias, seus ideais, seu conhecimento da realidade, suas propostas e suas ações. Todos crescem juntos, transformam a realidade, criam o novo, em proveito de todos e com o trabalho coordenado (GANDIN, 2001, p. 89).

Tomar o planejamento participativo como referencial do projeto político-pedagógico não é uma tarefa fácil uma vez que estamos lidando com uma concepção teórico-filosófica que rejeita a ideia de modismo que tem caracterizado o pensamento pedagógico brasileiro.

Isso significa dizer que localizamos no planejamento participativo uma visão estratégica que

avança para questões mais amplas e complexas, como a de ver como se contribui para interferir na realidade social, para transformá-la e para construí-la numa direção estabelecida em conjunto, num pé de igualdade fundamental, mas com a contribuição própria de cada um, por todos os que participam da instituição, grupo ou movimento ou, mesmo, de uma cidade, de um estado e de uma nação (GANDIN, 2001, p. 91).

Essa visão estratégica compreende que planejar é desenvolver um processo técnico para contribuir num projeto político (GANDIN, 2001, p. 91). Assim, o que se pretende é vivenciar uma ação educativa que dê sua parcela de contribuição, a partir da tomada de consciência dos seus sujeitos sociais, para o fazer florescer outras práticas educativas regidas pelas dimensões: conhecer-aprender-compreender possam, de fato, transformar a escola.

Se entendemos por realidade o tempo presente, o lugar onde vivemos, o dia-a-dia e seus “altos e baixos”, é fundamental considerar a escola dentro das contradições da cidade e do seu contexto “histórico, político, social, religioso e artístico”.

Olhar para a cidade a partir da escola não significa limitar a problemática desse contexto histórico-social, mas sim, buscar ampliar nosso olhar para as relações internas e externas entre a escola e a cidade e respeitar as particularidades e identidades de cada contexto social e cultural. Sobretudo, é preciso identificar as semelhanças que unem estes lugares à questão da dignidade da pessoa humana, da exclusão social, da exploração do trabalho infantil, da prostituição infanto-juvenil, do desemprego, da fome, do racismo e dos inúmeros preconceitos que impedem o desenvolvimento integral de cada indivíduo e de sua localidade.

A ambição política do projeto político-pedagógico é ser a base de mediação entre a realidade existente e as possibilidades de transformá-la.

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As transformações no contexto social, político, econômico, religioso e cultural do lugar onde se situa a escola não podem ocorrer de fora para dentro e sim de dentro para fora. São as transformações operadas por dentro da escola que permitirão, essencialmente, outro modelo de sociedade.

Para que se construa outro modelo de escola e sociedade, fazem necessárias, então, mudanças internas nos sujeitos sociais no tocante ao seu papel e função social nessa instituição e localidade.

Agora o desafio é saber como você, licenciando(a) em Artes Visuais, pensará o outro e a Escola em que atua ou irá atuar!

Unidade 4: Socializando Experiências: O Planejamento Participativo e a Construção do Projeto Político-Pedagógico

O texto a seguir não deverá ser tomado como referência para a elaboração de propostas de qualquer instituição escolar porque foi sistematizado a partir das condições objetivas oferecidas pelo contexto cultural no qual os sujeitos sociais estavam insertos e atuavam. Meu intuito é o de demonstrar que é possível dar materialidade às proposições que fui encontrando ao longo de meu próprio processo como educador ao longo dos últimos vinte anos. Aproveito a oportunidade para partilhar uma pequena experiência que tive com uma instituição na cidade de Crato (CE), quando fui convidado para exercer a função de assessor pedagógico do Colégio Ágape Estudos nos anos de 2003 e 2004. Na ocasião, foi possível por em prática algumas das ideias que havia construído ao longo de minha trajetória como professor da educação básica em Recife e, posteriormente, no ensino superior. O texto a seguir foi inicialmente publicado no boletim da instituição e o reproduzo aqui sem qualquer alteração ao acreditar verdadeiramente que poderá contribuir para suas reflexões e, até mesmo, como objeto de análise quando você estiver na prática de ensino e estágio supervisionado.

Texto complementar: Banquete Ágape 2004

Fábio José Rodrigues da Costa
Assessor Pedagógico - CAE

A ação educativa a ser vivenciada neste ano pela equipe do Colégio Ágape Estudos – CAE é o resultado de um processo de elaboração-construção norteado pelos princípios do planejamento participativo e de uma imersão no pensamento e ideias de vários teóricos do discurso educacional contemporâneo.

Do diálogo com Paulo Freire, Danilo Gandin, Ladislau Dowbor, Efland, Peter McLaren, Fernando Hernández, Vigotsky, Peerenoud, Edgar Morin, Antônio Nóvoa, Jean Claude Forquin, Henry Girou e, fundamentalmente, apropriação das ideias e proposições do Prof. João Francisco de Souza, do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, resultou o que ousamos chamar de Proposta Pedagógica 2004.

A proposta pedagógica do Colégio Ágape Estudos – CAE tem como objetivo ofertar uma proposta educativa que dê sua parcela de contribuição, a partir da tomada de consciência de seus sujeitos sociais, para fazer florescer outras práticas educativas mediatizadas pelas dimensões cognitivas: conhecer-aprender-compreender; por uma concepção didática em que os conteúdos deixam de ter um caráter meramente instrumental e passam a ser concebidos como conteúdos educativos, conteúdos instrumentais e conteúdos operativos.

A resignificação dos conteúdos da educação é a sustentação da certeza do florescimento de uma ação educativa que intervenha na realidade para transformá-la qualitativamente. Por realidade entendemos o tempo presente, o lugar onde vivemos, o dia-a-dia e seus altos e baixos; é o contexto histórico, político, social, religioso e artístico e suas contradições situadas nas ruas e bairros que constituem a cidade de Crato.

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A proposta política da Proposta Pedagógica do CAE é ambiciosa porque se coloca como mediadora entre a realidade existente e as possibilidades de transformá-la. A perspectiva transformadora presente na ação educativa do(a) educador(a) do Colégio Ágape Estudos é vislumbrada por estar implicada numa concepção de educação compreendida com base em processos e experiências de ressocialização (SOUZA, 2004).

Nesse sentido, a ação educativa é por natureza transgressora, uma vez que se alimenta de uma esperança que liberta. Esperança, libertação e transgressão são categorias que norteiam nosso pensar para a contemporaneidade e, consequentemente, para as práticas educativas nessa mesma contemporaneidade. Por via do desejo, acreditamos que a esperança, a libertação e a transgressão contribuam para um fazer educativo apaixonado pelo conhecer, aprender e compreender.

Essa ação educativa não poderia estar dissociada de uma concepção de avaliação uma vez que a avaliação nos oferece os elementos essenciais denunciadores de um fazer educativo que transgride, rompe, desconstrói, se resignifica e resignifica a própria ação educativa. Portanto, a proposta pedagógica do Colégio Ágape Estudos – CAE é norteada por uma concepção de avaliação emancipatória e implicada num processo contínuo, valorizando as estratégias que os alunos utilizam para desconstruir suas impressões do mundo e/ou para construir outras compreensões.

O exercício de elaboração e construção da proposta pedagógica para o ano letivo de 2004 incorporou algumas inovações deliberadas pelo coletivo de educadores(as) que constituem hoje o colégio Ágape Estudos. Essas deliberações estão situadas na definição do conteúdo educativo a ser vivenciado durante o ano de 2004 em todos os níveis da Educação Básica.

Os educadores e educadoras, após identificarem os problemas, os desafios e as esperanças que a realidade concreta apresenta, chegaram à conclusão de que, para este ano, será trabalhado um único conteúdo educativo que deverá trazer para a pauta do dia a problemática que envolve o processo de humanização de homens e mulheres do tempo presente. Assim, elegemos o tema “Homem Kariri: Nossa Identidade”.

Vivenciar esse conteúdo educativo exigiu dos educadores(as) redefinir os conteúdos instrumentais de cada área do conhecimento, bem como, a própria concepção de escola e sala de aula. As áreas do conhecimento escolar passam a ter um papel essencial no trato com o conteúdo educativo porque o elenco de conteúdos instrumentais se constituiu em fontes de informação. As informações ofertadas pelos conteúdos instrumentais são confrontadas com outras fontes de informação (cultura cientifica, cultura de massa e cultura popular) presentes na contemporaneidade. Desse confronto de culturas e saberes emergirá um novo saber.

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Nesse movimento dialético, a escola é concebida como uma instituição da cultura e a sala de aula abarca círculos culturais. A ação educativa em estado de inquietude permanente oferece condições favoráveis para que o aluno(a) Ágape experimente o conhecer, o aprender e o compreender numa dialética didática em que o conteúdo educativo, o conteúdo instrumental e o conteúdo operativo geram um desejo de ressocialização, pois instauram a vontade de estabelecer outras formas de interação social. O conteúdo operativo constitui-se, então, na síntese do processo de ensino-aprendizagem no contexto de uma ação educativa escolar que se resignifica na contemporaneidade e, portanto, rompe com a cristalização, o engessamento característicos de muitas propostas educativas que são reféns de suas próprias contradições.

No afã de vivenciarmos uma proposta pedagógica em que a ação educativa objetiva a emancipação (libertação e transgressão) do sujeito, outras inovações foram implementadas, como por exemplo uma reformulação do RECREIO que passou a ser denominado PAUSA CRIATIVA. A pausa criativa consiste em um momento em que as crianças e adolescentes experimentam outras situações educativas que a escola oferece. Nesse sentido, instituímos os chamados ESPAÇOS EDUCATIVOS, ou seja, ambientes destinado à leitura de diversas fontes de informação como gibis, revistas, livros de contos, estórias, jornais, boletins e informativos. Paralelamente a esse espaço para o exercício da leitura, foi criado outro voltado à exibição de documentários, reportagens, filmes que abordam temáticas relacionadas com as diversas áreas do conhecimento.

Ao mesmo tempo em que alunos(as) de diferentes idades estão manuseando o acervo de material escrito, outros estão assistindo vídeos, enquanto outros estão na quadra, junto à mesa de pingue-pongue, sinuca, com o jogo de damas e demais jogos disponíveis. Essa diversidade de ambientes e atividades permite que possam estabelecer novas relações e fortalecer as já existentes, assim como, aprender a ter tolerância na convivência com o outro.

A ação educativa do Colégio Ágape Estudos – CAE não tem início na sala de aula, mas sim desde o momento de chegada de cada criança e adolescente à instituição e se estende por todo o tempo de sua permanência na escola.

Com a Proposta Pedagógica 2004, buscamos transformar o CAE em uma instituição em movimento permanente no qual o conhecimento apresenta-se de todas as formas e traduzido em linguagens diversas. Nessa perspectiva, ousamos ainda, reconceituar o papel da avaliação.

Se antes a avaliação era concebida única e exclusivamente como um momento separado da ação educativa, agora ela assume um papel essencial para a mesma, ou seja, o processo de avaliação não é mais um instante de atribuirmos um código de valores e notas em relação ao desempenho de nossos(as) alunos(as) em relação aos conteúdos instrumentais; agora, tornou-se o resultado de um processo de acompanhamento da evolução desse aluno.

Por evolução entendemos o processo que vai do estágio em que o aluno chega à escola, abrangendo os processos e experiências vivenciados durante a ação educativa que lhe permitem utilizar estratégias para conhecer, aprender e compreender o conteúdo educativo e os conteúdos instrumentais e, dessa relação, construir os conteúdos operativos. A avaliação, portanto, ocorrerá de forma contínua e permanente.

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Unidade 5: Das Utopias à Realidade: É Possível uma Didática Específica ou Especial para a Formação Inicial do Professor de Artes Visuais?

A pergunta do título estabelece conexões entre os estudos curriculares, as didáticas específicas ou especiais e a didática geral no terreno da formação inicial do professor. Surge a partir da pesquisa realizada no Programa de Doutorado em Educação Artística da Universidade de Sevilla-Espanha e teve como resultado a tese Didática das Artes Visuais: uma proposição pós-moderna que sistematizou uma didática especifica para a formação inicial do professor de Artes Visuais.

No âmbito epistemológico, fundamenta-se na teoria pós-moderna e, por isso, tem exigido uma ressignificação da formação inicial do professor e reinvidica outras áreas de conhecimento para o currículo das licenciaturas.

O conceito de mudança de Paulo Freire e Joe Kincheloe que, considerando o professor um pesquisador, exige uma reformulação de seus conhecimentos bem como de sua formação inicial é fundamental para essa proposta. Aliás, trata-se mesmo de uma ruptura com os modelos modernos de formação inicial por considerar que esses oferecem uma formação tecnicista.

Nessa perspectiva os pressupostos da pesquisa qualitativa são suas principais ferramentas com inclinação para os estudos etnográficos e semióticos.

A formação inicial deve, então, estar centrada na experimentação entendida como “experiência reflexiva”, promovida pelo pensar como um processo de indagação, de observação das coisas, de pesquisa (DEWEY, 2004). Partindo de uma educação pós-moderna e de uma perspectiva crítica e pós-formal, desconstrói a concepção de ensino como transferência neutra da verdade. Desconstrói a forma absolutista de certeza já que o pensamento pós-formal vislumbra um desenvolvimento cognitivo ou emancipatório (KINCHELOE, 2001).

No contexto da didática geral e das didáticas específicas, essa teoria compreende a cognição para além do essencialismo e destaca-se pela adesão aos estudos críticos como a teoria sociocognitiva pós-piagetiana com base no pensamento pós-formal e a teoria feminista. A didática geral orientada por esta teoria vislumbra uma ação educativa crítica e centrada nos múltiplos saberes, nos múltiplos lugares e tempos em que o conhecimento tem origem e desenvolve-se para analisar a formação inicial do professor. Essa ressignificação tem no Multiculturalismo Crítico sua explicação e justificativas teóricas (CANDAU, 2001) já que a cultura, por ser dinâmica, reformula as instituições e seu papel na formação humana.

A didática geral reconhece sua natureza incompleta e encontra nas didáticas específicas contribuições complementares (DE LA TORRE, 1993). A didática específica não substitui a didática geral, porém, estabelece conexões diretas com a ação educativa do professor na escola e com os conteúdos educativos, instrumentais e operativos (SOUZA, 2004). A incorporação da didática específica passa pela estrutura curricular das universidades que, em sua maioria, não renunciam a um tipo de formação inicial do professor proposta pela educação moderna (ZABALZA, 2001).

5.1. O lugar de onde falo!

Para mediar a leitura que cada um fará deste texto e que poderá servir como subsídio às discussões, não posso deixar de contextualizar sua “gênesis”, ou seja, como tomaram corpo minhas próprias indagações nascidas das contradições que acredito ainda permeiem a formação inicial do professor da área de Artes Visuais.

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Responder aos questionamentos que foram levantados obrigou a formulação de um projeto de pesquisa que hoje se materializou na tese de doutorado intitulada Didáctica de las Artes Visuales: una proposición posmoderna (Didática das Artes Visuais: uma proposição pós-moderna) defendida em junho de 2007 na Universidade de Sevilla – Espanha.

A pesquisa buscou dialogar com três importantes campos do conhecimento que constituem a formação inicial do professor e a teoria crítica pós-moderna permitiu trabalhar com a categoria ressignificação. Essa categoria orientou a identificação dos elementos resignificadores para a formação inicial do professor, a didática geral e as didáticas específicas e, a partir desses elementos, foi possível conceituar e sistematizar uma didática específica para a formação inicial de professores para a linguagem das Artes Visuais tomando como proposição a Proposta Triangular formulada e amplamente experimentada pela Profª Drª. Ana Mae Barbosa para o contexto brasileiro.

Essa didática foi tecida tendo como eixo norteador a leitura da imagem, a alfabetização visual para a leitura da imagem/cultura visual, a partir da concepção de alfabetização como leitura de mundo segundo Paulo Freire.No entanto, a didática das Artes Visuais, como a concebo, não se propõe a dizer ao professor como ele deve ensinar, mas sim, com ele deve conhecer, aprender e compreender as pedagogias contemporâneas e seus modelos educativos para a alfabetização visual, ou seja para a decodificação das visualidades do tempo presente. É no currículo da licenciatura em Artes Visuais ou similares que se dá a inserção dessa didática, o que impõe a reconceitualização dos currículos destinados à formação inicial do professor.

Desse modo esta proposição orientou-se em primeiro lugar pela compreensão de que a pós-modernidade exige um novo conceito da formação inicial do professor de artes visuais já que, no mundo considerado global, há outras formas de compreendê-lo e estas formas configuram uma metodologia centrada nos aspectos culturais que explicam o eu e o outro em seu próprio contexto, como também a relacionalidade como modo operante da teoria pós-moderna (CHANG, 2003).

Essa relacionalidade orienta-se pelo princípio de pertença, de pertencer a um lugar, um grupo, uma comunidade, um país, um gênero e, ao mesmo tempo, pertencer a todos. Isso porque, no contexto atual homens e mulheres caminham em busca de sua própria identidade guiados não por uma verdade única mas, sim, por suas necessidades de respostas para sua condição humana.

Uma vez que as contribuições da teoria pós-moderna estabelecem outras relações entre o passado e o presente, entre o tempo e o espaço, entre o homem e a mulher de antes e o homem e a mulher de hoje impõem-se a compreensão crítica da realidade, sua denúncia, e também o aviso do que ainda não existe (FREIRE, 2001). Deste modo esta pós-modernidade tenta abrir caminhos em direção a outra forma de organização humana, do saber, da educação, de formação inicial do professor, de escola e de ensino e aprendizagem.

As contribuições da teoria pós-moderna para a Arte e seu ensino começam pela compreensão da Arte como um conhecimento implicado no mundo, rompendo com o isolamento característico da modernidade, ao mesmo tempo em que a Arte na pós-modernidade busca conectar-se com o público de forma interdisciplinar e pela exposição de temáticas que se aproximam do cotidiano (GISBERT, 2002).

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Nesse sentido, a Arte na pós-modernidade é um produto cultural devendo ser entendida no contexto em que teve origem e recepção (EFLAND, 2003) e que reflete o retorno ao real, ao tempo presente (GISBERT, 2002).

5.2. A proposta triangular no contexto da pós-modernidade e a formação inicial do professor de Artes Visuais

Os pressupostos teórico-filosóficos que fundamentam a Proposta Triangular intencionam uma formação inicial do professor de Artes Visuais para além do contexto brasileiro porque partem de uma visão interdisciplinar e contextual do fenômeno artístico, do artefato artístico e do sujeito produtor, nas relações que estabelecem com diferentes culturas, fatores ambientais e da relação com outros grupos sociais (GISBERT, 1993).

A Proposta Triangular recebe influências do pós-moderno entendido como um fenômeno estético, cultural e intelectual que se manifesta concretamente nos estilos, práticas e formas culturais nas artes visuais contemporâneas (HAGREAVES, 1998).

Inserida no contexto da pós-modernidade e de seu movimento cultural, a Proposta Triangular reconhece que o conhecimento em Artes Visuais se dá na intersecção da experimentação, da decodificação e da informação uma vez que a Arte-E ducação é epistemologia da Arte como pressuposto e como meio de relacionar Arte e público, ou seja, a intermediação entre o objeto de arte e o público (BARBOSA, 1998).

Nesse sentido, nem a Arte-Educação como pesquisa dos modos pelos quais se aprende arte, nem a Arte-Educação como facilitadora entre a arte e o público podem prescindir da relação entre contextualização da Arte, leitura da obra de arte e das imagens do cotidiano e do fazer artístico (BARBOSA, 1998).

A Arte na escola pretende formar o conhecedor, o decodificador da obra de arte e das imagens do cotidiano ou da cultura visual. A ação educativa do professor de Artes Visuais deve organizar o currículo entrelaçando o fazer artístico, a contextualização da arte-imagem e da leitura de forma que sejam respeitadas tanto as necessidades, os interesses e o desenvolvimento da criança, oferecendo ao próprio ensino outros valores de forma a contribuir para a cultura (BARBOSA, 2001).

A Proposta Triangular vislumbra um campo de formação inicial do professor de Artes Visuais em que teoria e prática fundem-se em um todo e, por essa razão, é imprescindível a experimentação, caminhando lado a lado com os pressupostos teóricos e metodológicos. Nesse sentido, a proposição pós-moderna pretende uma educação crítica por meio do conhecimento construído pelo aluno, com a mediação do professor, acerca do mundo da cultura visual (BARBOSA, 1998) a partir de uma leitura do mundo como prática da liberdade (FREIRE, 1970).

5.3. Reconceituação ao lócus de formação inicial do professor de Artes Visuais no contexto do pós-moderno

A formação inicial do professor de Artes Visuais faz parte do sistema de educação superior das sociedades contemporâneas e, para sua plena realização, exige releitura do lugar de formação do professor na contemporaneidade, ou seja:

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a) Define a licenciatura como o campo de formação inicial do professor na educação superior;

b) Considera a formação inicial do professor como preparação profissional que possibilita aos professores experimentarem, em sua própria aprendizagem, o desenvolvimento de competências necessárias para atuar neste novo cenário de transformações;

c) Toma para si o conceito de experiência a partir do pragmatismo deweyano e o fato de que o aluno-professor em formação estabelece as relações e conexões tanto dentro de seu próprio processo de aprendizagem como a partir de seu encontro com as situações geradas nos momentos de por em prática suas primeiras iniciativas como docente na escola;

d) Compreende o sentido da experiência no processo de formação inicial do professor mediada pela leitura do mundo como proposto por Paulo Freire;

e) Define no âmbito institucional problemas e especificidades das diferentes etapas e modalidades da educação básica, estabelecendo o equilíbrio entre o domínio dos conteúdos curriculares e sua adequação à situação pedagógica;

f) Define a licenciatura como o lugar da docência onde se constrói competências e se configura a identidade profissional do professor em geral e, em específico, para o ensino das Artes Visuais;

g) Assume como eixo da matriz curricular que a ação educativa não é só histórica, filosófica, educativa e pedagógica, mas também disciplinar, interdisciplinar, multidisciplinar e transdisciplinar.

5.4. Didática das Artes Visuais e suas categorias

As ideias e categorias sistematizadas por Gallego (2002) definem os elementos que devem constituir toda e qualquer didática específica e, em nosso caso, a didática das Artes Visuais.

Categoria organizada do conhecimento: constituiu o âmbito da didática das Artes Visuais que objetiva a alfabetização visual e a educação para a experiência estética, para gerar, no processo de formação inicial do professor, outras possibilidades de desenvolvimento de modos de ensinar e aprender Artes Visuais.

É um campo emergente que incorpora estudos e pesquisas que ultrapassa os territórios do como se aprende, para o território do como se ensina/aprende artes visuais no contexto da educação básica e na universidade.

O principal enfoque da didática das Artes Visuais é vencer os imaginários que limitam a formação de identidades (AGUIRRE, 2006) ao superar o próprio ideário modernista de ensino-aprendizagem das Artes Visuais, ainda, centrado na auto-expressão criativa, na obra de arte como o “refinamento” e o “bom gosto” caracterizadores do neoclassicismo.

A didática das Artes Visuais no contexto da formação inicial do professor busca desenvolver uma concepção do currículo pluridisciplinar crítico e não reprodutivo, portanto, centrado nos significados e na preparação de pessoas que se desenvolvem e atuam em contextos cada vez mais dominados pelo visual (AGUIRRE, 2006).

A didática das Artes visuais deve basear-se em uma concepção interdisciplinar do problema atual do ensino das Artes Visuais que considera a arte como experiência (BARBOSA, 2005).

Os fundamentos de Paulo Freire (2004) são acolhidos pela didática das Artes Visuais já que, em seus esforços por explicar e interpretar a realidade, parte da compreensão de que a educação deve ser entendida como a construção de identidades (GIROUX, 1997; AGUIRRE, 2006);

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Explicar e interpretar a realidade é para a didática das Artes Visuais identificar os limites do currículo atual da formação inicial do professor e o papel das instituições formadoras. A própria didática deve ser agente de explicação e interpretação da realidade por ser uma disciplina do processo formativo imbricada na educação básica.

A didática das Artes Visuais apresenta como categoria o significado e suas vinculações sociais uma vez que as disciplinas e matérias escolares se construíram ao longo da história da educação escolar buscando estabelecer relações entre a escola de educação básica, a matéria escolar, os professores, a universidade e as relações de poder que cada uma das instâncias representa (GOODSON, 2000).

O imaginário é outra categoria da didática das Artes Visuais. A didática pretende desenvolver um imaginário pós-moderno para o perfil do professor: reflexivo, crítico, sujeito implicado e que dialoga com a realidade, que compreende sua ação educativa nas dimensões sociocríticas e ideológicas, que busca desenvolver uma compreensão crítica do fenômeno artístico e que, além disso, atue e exista mediado pela cultura e as instituições culturais.

A didática das Artes Visuais inserta na pós-modernidade apresenta um repertório dinâmico de significados que acompanha as mudanças da realidade (AGUIRRE, 2006).

A didática das Artes Visuais, como uma comunidade de conhecimentos identifica-se, no âmbito metodológico pela ação-reflexão-ação como possibilidade de compreender os processos, significados e interpretações que as pedagogias contemporâneas e seus modelos educativos propõem para a formação inicial do professor de Artes Visuais e para a concepção de ensino-aprendizagem. (DEWEY, 2004/FREIRE, 2001).

Com base no exposto, levando em conta o contexto da pós-modernidade, a sistematização e proposição da Didática das Artes Visuais compreende a educação como uma constante reorganização das experiências humanas (GISBERT, 1994), e sua mais sensível crença reside no fato de que toda atividade humana começa na observação.

Do mesmo modo, a aprendizagem ou construção de novos conhecimentos começa com a observação de acontecimentos, objetos ou ideias a partir dos conceitos prévios. O ensino tratará, portanto, de construir a trama estrutural do conhecimento a partir das proposições que formam os conceitos e o significado (GISBERT, 1994).

Referências Bibliográficas

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