Licenciatura em Artes visuais Percurso 3
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Ateliê de Gravura

Autora

Drª. Manoela dos Anjos Afonso Sou professora e pesquisadora em artes visuais. Minha prática artística é influenciada pela geografia feminista, pelas epistemologias de fronteira e se articula como um diálogo entre fazeres individuais e coletivos focados na política da des/localização e da convivialidade. Estou interessada na prática artística como espaço autobiográfico de confronto à colonialidade e como lugar de enunciação para decolonial selves. Obtive o grau de PhD pelo Chelsea College of Arts, University of the Arts London - CCW/UAL (2017), sou Mestre em Cultura Visual pela Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás - FAV/UFG (2008) e graduada em Educação Artística com Habilitação em Artes Plásticas pela Faculdade de Artes do Paraná - FAP (2000), onde também obtive a Especialização em Fundamentos do Ensino da Arte (2003). Sou professora adjunto da FAV/UFG, onde atuo como coordenadora do curso Artes Visuais - Bacharelado. Desde fevereiro de 2017 coordeno o Núcleo de Práticas Artísticas Autobiográficas (NuPAA), grupo de pesquisa em arte originado no âmbito do projeto de pesquisa Práticas Artísticas Autobiográficas: intersecções entre prática artística, escritas de vida e decolonialidade, cadastrado no mesmo período junto à Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI) da UFG.

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Apresentação

Olá, seja bem-vindo(a)! Prepare-se para mergulhar no universo das artes gráficas!

Depois de ter passado pelos ateliês das linguagens bidimensional e tridimensional, agora você experimentará conceitos e práticas ligados à gravura e à estampa. Ao longo das próximas 16 semanas, você terá acesso ao conhecimento básico necessário para a compreensão da importância das ações “gravar” e “imprimir” não só para o campo das artes, mas também no que diz respeito à evolução de outros importantes setores da produção humana.

Por enquanto, olhe ao seu redor e procure identificar o que pode ser produto da impressão de uma matriz. Que tal começar pela sua carteira de identidade? Temos aí o princípio de toda a produção gráfica desde os tempos mais remotos: matriz-dedo e a sua impressão.

E o que mais pode ser fruto de uma marca/impressão deixada por uma matriz? Os textos e exercícios sugeridos neste livro e no ambiente virtual certamente têm muito a lhe revelar. Portanto, vamos ao trabalho!

Unidade 1: Gravar e imprimir

Para que você compreenda a gravura como história, técnica e linguagem, faremos, inicialmente, algumas reflexões sobre duas de suas operações fundamentais: a gravação e a impressão. Nesta unidade, você encontrará informações sobre fatos que antecederam a gravura, assim como conceitos introdutórios ligados ao universo das artes gráficas. A partir do conteúdo aqui apresentado, busque aprimorar algumas definições e, em seguida, enriqueça, constantemente, o nosso glossário coletivo disponível no ambiente Moodle.

1.1. Gravar

A ação de gravar está presente na vida do homem desde os mais remotos tempos. Incisões, sulcos e arranhões feitos em pedras deram forma aos desenhos de nossos ancestrais durante a pré-história. Peças utilitárias e de adorno foram produzidas a partir da gravação em dentes, ossos e chifres de animais no final do período Paleolítico Superior. Mais tarde, por volta de 3500 a.C., os sumérios criaram a escrita cuneiforme, a qual consistia na gravação de pictogramas sobre placas de argila através do uso de estiletes com um corte em forma de cunha. Ao dar mais um salto até o ano de 196 a.C., deparamos com um pedaço de granito egípcio chamado Pedra de Roseta, no qual foi gravado um texto em três versões: hieróglifo, demótico e grego. Graças a essa gravação é que os hieróglifos puderam ser decifrados posteriormente, em meados do século XIX.

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Para refletir

Ao longo da história da humanidade, existem muitos exemplos que revelam vestígios do ato de gravar. Você se lembra de mais alguns? E, atualmente, onde você pode observar sinais dessa ação?

Poderíamos continuar seguindo a linha da história com a finalidade de encontrar inúmeros exemplos do ato de gravar sobre as mais variadas superfícies (pedra, couro, ossos, chifres, argila, cascas de árvore, bambu, metais etc.) e com as mais diversas funções dentro de cada uma das culturas, como mostrado na Figura 1. Mas como o nosso foco está sobre o universo da gravura e da estampa, seguiremos agora para o ano 105 d.C., período em que o chinês Ts’ai Lun criou o papel.

Figura 1. Parede de uma igreja em Ouro Preto/MG com ranhuras e inscrições. Fotografia: Virgínia Regozino.
Olho vivo

Faça um levantamento dos papéis disponíveis em sua cidade, a partir dele crie uma lista com informações sobre as referências, formatos, cores, composição e gramatura encontradas em cada um deles. A qualidade do papel interfere profundamente no resultado final de uma gravura e em sua posterior conservação ao longo dos anos. Os papéis mais utilizados por artistas gravadores são o Washi (papel japonês para xilogravura) e os papéis 100% algodão com pH neutro (para a gravura em metal). Antes de começar seus exercícios práticos, você deverá reunir folhas de pelo menos dois tipos de papel: um mais fino (papel jornal e/ou sulfite) e outro com gramatura mais alta, ou seja, mais encorpado (papel Canson ou similar). Você poderá também observar a riqueza desse universo, pesquisando os sites das marcas mais conhecidas de papéis especiais para uso artístico. São elas:

Canson: http://www.canson.com.br/interno.html
Fabriano: http://www.cartierefabriano.it
Hahnemühle: http://www.hahnemuehle.com/
Papéis japoneses no Brasil: http://madeinjapan.uol.com.br/2005/12/06/washi-arte-feita-de-arroz/

Pesquise, experimente e escolha os papéis que possam lhe oferecer os melhores resultados. Fique de olho!

Foi a partir da criação do papel que a ação de gravar uma superfície passou a exigir outra ação complementar: imprimir o relevo gravado. A partir do século II, a gravação de uma matriz de madeira — técnica chamada de xilogravura — ganhou destaque no Oriente e se manteve, por muito tempo, ligada à função de multiplicar a escrita. Apesar de a China ter sido a pioneira na criação do papel e da xilogravura, foi no Japão que as impressões xilográficas ganharam circulação massiva com o objetivo de multiplicar a informação. Uma única matriz gravada poderia, agora, receber tinta sobre os seus relevos para então ser impressa diversas vezes sobre o papel. Essa é a ideia fundamental da gravura tradicional: a produção de uma matriz gravada em baixo ou alto relevos com a finalidade de ser impressa inúmeras vezes e gerar gravuras semelhantes entre si. Talvez, nesse momento, tenham nascido os primeiros “panfletos” impressos em série da nossa história.

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Saiba mais

O termo “gravura” é utilizado para dar nome tanto à linguagem quanto ao seu produto, ou seja, tanto ao processo de produção quanto às cópias produzidas a partir da impressão de uma mesma matriz gravada. É muito comum o uso incorreto dessa palavra, sobretudo nas escolas. Ouvimos nossos professores pedirem: “Abram o livro na página 37 e observem a gravura da pintura de Leonardo Da Vinci”. Provavelmente, uma gravura dessa pintura de Leonardo nunca tenha existido. No livro, lidamos com reproduções mecânicas de uma imagem que nada tem a ver com gravura. Um livro pode conter gravuras, caso seja um livro-arte produzido manualmente numa tipografia, por exemplo. Pergunte aos seus alunos se eles sabem o que é gravura. Esse é um bom começo para a multiplicação do conhecimento que você está adquirindo nessa disciplina.

Dica

O livro infanto-juvenil “O velho louco por desenho” trata de uma história ambientada no período Edo. Belas ilustrações revelam o funcionamento dos ateliês de xilogravura no Japão desse período, além de dar destaque à produção de um de seus maiores artistas: Hokusai. Vale a pena conferir!
PLACE, François. O velho louco por desenho. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2004.

Como você pôde perceber até agora, caminhamos rapidamente por um curto pedaço da história, partindo do ato de “gravar” e chegando ao ato de “imprimir”. Prossigamos com nossas reflexões, aprofundando a leitura sobre a “impressão”. Fique atento à complementaridade dessas ações, pois dela dependem essencialmente o universo gráfico.

1.2. Imprimir

Imprimir é um ato inerente ao ser humano. Depois de dados os primeiros passos, nunca mais deixamos de gravar e imprimir marcas no mundo, a começar por nossas pegadas ou mãos — verdadeiras impressões-vestígios da nossa passagem (Figura 2). Num período distante, quando nossos ancestrais aprenderam a ler atentamente os sinais da/na natureza, certamente as pegadas impressas por animais selvagens ou por outros seres humanos funcionavam como verdadeiros textos indicativos de como agir e para onde ir.

E você? Ao caminhar sobre a areia relativamente úmida, pôde perceber marcas deixadas pelos seus pés ou sapatos sobre a superfície? O “desenho” dos seus pés ou da sola dos sapatos ficaram impressos devido à pressão exercida pelo peso do seu corpo sobre a areia. Esse é um caso de impressão sem o uso de tinta. Nas artes gráficas, chamamos essa técnica de “relevo-seco”, ou seja, uma matriz gravada que não é entintada, mas apenas pressionada fortemente contra a superfície do papel. O resultado é uma impressão a seco, sem tinta, tal qual uma marca d’água.

E se você pisar numa terra úmida e vermelha antes de andar sobre um piso branco? Certamente perceberá o desenho do solado do seu sapato impresso no chão, em vermelho. Nas artes gráficas, ocorre o mesmo: o papel criado pelos chineses passou a ser pressionado contra matrizes gravadas em madeira e entintadas com tintas à base d’água. Ao repetir incansavelmente esse processo, as imagens ou textos gravados iam sendo multiplicados.

Figura 2. Mão. Impressão feita com tinta guache preta sobre papel sulfite A4 por uma aluna do curso de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara. Goiânia, 2007. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
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Para experimentar

Materiais Necessários:

Selecione diversos objetos e superfícies que tenham relevos (texturas) e que possam ser entintados e impressos, como moedas, tampinhas, fundos de copos e garrafas, chaves, esponjas, buchas vegetais, solas de sapatos, enfim, todo objeto que apresente uma superfície com altos ou baixos relevos. Pressione o objeto sobre uma almofada de carimbo ou passe tinta guache com um pincel sobre a superfície a ser impressa. Em seguida, imprima a superfície entintada num papel canson formato A3. Repita a operação, diversas vezes e procure fazer, no mínimo, três composições harmoniosas. Antes de utilizar o papel canson você pode fazer testes em papel sulfite. Nas imagens (Figuras 3, 4 e 5) observe o resultado da impressão do relevo de um jogo americano de plástico sobre papel colorido.

Figura 3. Impressão de jogo-americano de plástico com tinta gráfica preta sobre papel colorplus colorido. Cada uma delas possui as dimensões 12 x 16,5 cm. Autora: Manoela Afonso.
Figura 4. Impressão de jogo-americano de plástico com tinta gráfica preta sobre papel colorplus colorido. Cada uma delas possui as dimensões 12 x 16,5 cm. Autora: Manoela Afonso.
Figura 5. Impressão de jogo-americano de plástico com tinta gráfica preta sobre papel colorplus colorido. Cada uma delas possui as dimensões 12 x 16,5 cm. Autora: Manoela Afonso.

Em diversas culturas, a impressão de imagens se fez presente. A pintura corporal, por exemplo, era produzida a partir da impressão (com tintas de fabricação natural) de carimbos feitos com pedaços de tronco ou barro. No Japão, carimbos chamados de hankô ou inkan foram criados com o objetivo de dar autenticidade a documentos, como se fossem uma assinatura pessoal. Atualmente, o hankô pode ser feito em madeira, bambu, pedra ou metais diversos, sendo, tradicionalmente, impresso com tinta vermelha. Mas, por volta de 57 d.C., eles eram feitos em ouro maciço e utilizados por imperadores, homens nobres e samurais.

Lembre disso quando for planejar as suas matrizes para não ficarem ao contrário! Observe as imagens abaixo (Figuras 7 e 8): os alunos esqueceram que a palavra gravada no sentido correto ficaria invertida na impressão. Para que a palavra saia no sentido certo, ela deve ser gravada invertida e espelhada. Se você for trabalhar técnicas de impressão com seus alunos, deixe que eles errem a primeira matriz. É na surpresa do erro que esse conhecimento fica gravado na memória.

Figura 7. Impressão feitas a partir de matrizes de borracha. Imagens: Acima: Dalniran — aluno do projeto Arte na Escola. Dimensões: 5,5 x 3,5 cm. Goiânia/2006. Abaixo: Aline — aluna do curso de Design da Faculdade Brasília. Dimensões: 1,5 x 4,5 cm. Brasília, 2005. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Figura 8. Impressão feitas a partir de matrizes de borracha. Imagens: Acima: Dalniran — aluno do projeto Arte na Escola. Dimensões: 5,5 x 3,5 cm. Goiânia/2006. Abaixo: Aline — aluna do curso de Design da Faculdade Brasília. Dimensões: 1,5 x 4,5 cm. Brasília, 2005. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Para refletir

Você tem carimbos em sua casa? Observe-os. O que acontece com as letras, palavras ou desenhos quando são impressos? Essa é uma das características fundamentais da gravura e da estampa: a inversão da imagem (figura 6).

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Figura 6. Carimbos. Fotografia: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Dica

Luise Weiss é uma gravadora paulistana que em 2002, publicou um livro infantil escrito todo ao contrário. Junto com o livro vem um espelho, através do qual o texto pode ser visto no sentido correto e, assim, lido sem problemas. WEISS, Luise. Dentro do espelho. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.

Sinetes, selos e chancelas também fazem parte do universo da impressão. O sinete, por exemplo, é também um objeto de autenticação, só que, ao invés de ser impresso com tinta, a sua marca é feita sobre cera colorida derretida. Antigamente, no Egito, Grécia e Roma, esse objeto era feito de madeira, mas, a partir de meados do século XVI, passou a ser fabricado em metal. Foi justamente nesse período que as técnicas de gravação em metal avançaram muito na Europa, em resposta, dentre outros fatores, ao minucioso e dedicado trabalho de profissionais da ourivesaria. Esse fato contribuiu definitivamente para o surgimento e ascensão da gravura em metal.

Antes de prosseguimos com o conteúdo relacionado às principais técnicas da gravura, vamos fazer uma pequena pausa. Até este momento, você percebeu que é na união dos atos de gravar e imprimir que está o berço dos processos de multiplicação da informação, seja através de imagens ou da escrita. A gravação e a impressão por si só não possuíam a força necessária para cumprir tal tarefa; somente em conjunto, transformaram-se na potente tecnologia de multiplicação, circulação e consequente massificação do conhecimento. Com a criação do papel e de posse de cada vez mais variedades de tintas, matrizes gravadas puderam ser impressas e transmitir a gerações futuras o conhecimento de sua época. Assim nasceu a gravura, um processo indireto de produção de imagens, ao contrário do desenho e da pintura, por exemplo, que são feitos diretamente sobre o seu suporte definitivo.

Levando em consideração a afirmação de que a gravura parte de uma matriz gravada em alto ou baixo relevos, sendo capaz de gerar múltiplas cópias semelhantes, como já foi explicado aqui anteriormente, pergunto-lhe: E quando uma matriz não é durável o suficiente e é capaz de gerar apenas uma cópia? Assim mesmo, pode ser chamada de gravura? Seu produto é uma gravura? Tradicionalmente, não.

Nesse caso, estamos falando de uma técnica de estampa: a Monotipia, da qual vamos tratar a seguir antes de voltarmos às técnicas tradicionais de gravuras.

Para refletir

No campo das artes gráficas, a nomenclatura sempre foi motivo de muita discussão entre artistas e especialistas. Nesta disciplina, consideraremos gravura todas as técnicas de impressão que possam gerar uma tiragem composta por cópias semelhantes entre si, originadas a partir de uma matriz gravada em relevo ou encavo. Métodos que possuem matrizes efêmeras (monotipia), ou planas (litografia), ou originadas por processos aditivos (colagraf), fotográficos (serigrafia) e digitais, serão chamados aqui de estampa. Isso não quer dizer que uma coisa seja melhor que a outra! Gravura e estampa ocupam lugares importantíssimos dentro das artes gráficas. Adotaremos esse critério com base na tradição apenas para organizar nossas ideias e nivelar a narrativa. Posteriormente, através de pesquisas e leituras complementares, você mesmo poderá fazer as suas opções com relação a esse e a outros problemas do campo conceitual das artes gráficas.

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1.3. Monotipia

Como o próprio nome delata, “mono” significa “um” e “tipia” quer dizer “impressão”, ou seja, trataremos, a partir de agora, de uma técnica de impressão capaz de gerar apenas uma única estampa. A monotipia é um processo de transferência de uma superfície a outra que se situa entre a gravura, o desenho e a pintura. Foi na Itália, por volta de 1650, que Giovanni Benedetto Castiglione (1609–1664) fez os primeiros experimentos utilizando essa técnica. Até hoje, diversos artistas pesquisam e produzem bons trabalhos artísticos, utilizando e explorando os recursos desse processo, como na Figura 9. Vale ressaltar, também, que a monotipia é uma técnica muito apropriada às práticas artístico-pedagógicas ligadas às artes gráficas na escola, pois não exige materiais complexos e é de simples execução.

Figura 9. Preparação da superfície de vidro para a impressão de uma monotipia. Aluna da Oficina de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara. Goiânia, 2007. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).

Observe, nas Figuras 10 e 11, monotipias produzidas por alunas do curso de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara, realizado em Goiânia em 2007. Foram utilizados, como materiais, apenas a tinta guache, alguns pincéis, papel sulfite e uma superfície de vidro. Evidenciam-se, nesses trabalhos, dois dos quatro métodos da monotipia: o aditivo e o subtrativo. Prepare-se para conhecê-los. Você pode perceber tanto as camadas de tinta adicionadas a pincel (método aditivo) quanto a tinta retirada com os próprios dedos pelas alunas (método subtrativo).

Figura 10. Monotipias (métodos aditivo e subtrativo). Jane Oliveira. Aluna da Oficina de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara. Dimensões: 29,5 x 21cm. Goiânia, 2007. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Figura 11. Monotipias (métodos aditivo e subtrativo). Marley. Aluna da Oficina de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara. Dimensões: 29,5 x 21cm. Goiânia, 2007. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
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Para experimentar

Materiais necessários:

Primeiro, vamos experimentar o método aditivo de impressão em monotipia, ou seja, adicionar tinta em uma superfície e transferi-la para o papel por meio da impressão.

  1. Pinte uma imagem com a tinta que você escolheu utilizar na superfície lisa e impermeável. Se usar uma tinta à base de óleo, poderá trabalhar com mais calma: as tintas a base d’água secam mais facilmente, inviabilizando, assim, a impressão da estampa.
  2. Depois de pronta a pintura, coloque o papel sobre ela. Pressione-o, uniformemente, com as mãos. Nunca use tinta demais, pois a imagem impressa poderá ficar borrada. Faça alguns testes em papel sulfite e, assim que você compreender a relação tinta x pressão, passe a utilizar papel Canson para os trabalhos definitivos.
  3. Ao retirar o papel da superfície pintada, perceba alguns detalhes: a tinta foi transferida para o papel, mas a imagem recém-obtida é bem diferente daquela pintada na superfície lisa; a imagem impressa adquiriu outros valores visuais e, além disso, está invertida. Sua pintura também se modificou após a impressão; você pode continuar trabalhando sobre os vestígios de tinta deixados na superfície pintada, mas observe que mesmo assim jamais obterá uma cópia igual àquela que você acabou de imprimir.

Agora vamos usar o método subtrativo (Figura 12), que consiste em retirar tinta da superfície pintada antes de imprimir a imagem. Observe o passo a passo:

  1. Crie uma camada uniforme e fina de tinta e, utilizando cotonetes, palitos, os próprios dedos ou outros instrumentos, produza desenhos, retirando a tinta. Atenção! Observe bem esse processo, pois ele será a base do seu pensamento, na Unidade 2, para a produção de matrizes de gravuras em relevo, tais como a xilogravura ou a gravura em linóleo.
  2. Ao final da sua composição, coloque o papel sobre a matriz e faça pressão. Retire o papel: sua monotipia está pronta.

Produza agora uma composição, misturando os dois processos: Aditivo e Subtrativo.

Figura 12. Monotipia impressa com tinta gráfica (método subtrativo). Martha Costa, aluna da Oficina de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara. Dimensões: 21 x 29,5cm. Goiânia, 2007. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Saiba mais

A tinta gráfica — offset ou tipográfica — é feita à base de óleo. A partir do seu devido preparo, ela pode ser usada em praticamente todas as técnicas de gravura e estampa artísticas: xilogravura, linoleogravura, calcogravura, colagraf, litografia, monotipia e outros processos de impressão em relevo e encavo. Das técnicas que comentaremos durante a disciplina, apenas a serigrafia não pode ser feita com esse tipo de tinta. Para o manuseio da tinta gráfica, são necessárias algumas ferramentas e materiais, tais como: espátula de metal, rolo de borracha, uma superfície lisa e impermeável, querosene, jornais velhos (Figura 13). O uso correto de todo esse material é fundamental para a boa produção de gravuras e estampas. A partir da Unidade 2, você começará a utilizar essa tinta, portanto, providencie um avental, luvas de borracha, creme hidratante para as mãos, esponjas, detergente, trapos velhos para limpeza das bancadas. Veja o vídeo número 1 para compreender o modo correto de manipular a tinta, quais são as quantidades ideais, como é o manuseio do rolo de impressão, dentre outras informações.

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Figura 13. Material básico para impressão de gravuras e estampas: latas de tinta gráfica, rolo de borracha e espátulas de metal. Fotografia: Manoela Afonso.

Os outros dois métodos de produção de monotipias são o Positivo (Figura 14) e o Negativo. Caso você queira exercitá-los, seguem algumas instruções:

Figura 14. Monotipia: processo Positivo. Alunas do Ateliê Livre de Gravura em Relevo do Projeto Arte na Escola/FAV/UFG – Goiânia, 2008. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Figura 15. Xilogravura chinesa. Fotografia tirada em fevereiro de 2008, durante a exposição “A arte popular da China”, que aconteceu no Museu de Arte de Goiânia/MAG. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Dica

Caso você queira aprofundar seu conhecimento sobre Monotipia, consulte a Biblioteca Digital da Unicamp: http://libdigi.unicamp.br. No campo “procurar por” digite a palavra “monotipia”. Você encontrará duas excelentes dissertações de mestrado sobre o tema. Para baixá-las em seu computador, você deverá fazer um cadastro, mas é muito fácil: coloque apenas o seu e-mail e crie uma senha. Vale a pena, é um material muito rico sobre o assunto, com imagens de trabalhos produzidos pelos autores-artistas: Paula Adriana Grizzo Serignolli e Norival Benedito Figueiredo. Bom proveito!

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Unidade 2: Relevo, Encavo e demais processos de produção de Gravuras e Estampas

A Unidade 2 apresentará técnicas introdutórias de gravação e impressão em relevo, encavo, litografia, serigrafia e processos digitais, sendo que algumas delas você conhecerá na prática. Temos muito trabalho pela frente, não deixe as atividades acumularem!

2.1. Relevo

Quando as partes ‘altas’ da matriz são entintadas e impressas, dizemos que houve uma impressão em relevo. Os sulcos da matriz não recebem tinta em hipótese alguma, ao contrário: eles são os responsáveis pelas partes brancas da imagem. Nesta unidade, você conhecerá três técnicas de impressão em relevo: a xilogravura, a linoleogravura e a colagraf.

2.1.1. Xilogravura

O termo Xilo vem de xylon, o qual significa madeira. Xilogravura é, portanto, uma técnica de impressão em relevo a partir de uma matriz de madeira (Figura 15). Na unidade anterior, chegamos ao advento da criação do papel, no século II, e do consequente desenvolvimento da xilogravura na China e no Japão com funções de circulação massiva da informação. No século V, carimbos e selos de madeira antes impressos sobre tecido (seda), passam a ter como suporte o papel recém-descoberto. No século IX, o primeiro livro do qual se tem notícia foi impresso também a partir da xilogravura: o Sutra Diamante, texto budista traduzido para o chinês em 868 d.C.

Dica

Um exemplar do Sutra Diamante pode ser encontrado na Biblioteca Britânica. Acesse o link: http://collectbritain.co.uk/onlinegallery/ttp/sutra/accessible/introduction.html#content e observe as imagens desse precioso livro. Repare que a xilogravura é uma técnica de impressão em relevo. Portanto, tudo o que você visualizar impresso no papel, ou seja, na cor da tinta, é o que estará em relevo na matriz. O que não aparece na impressão foi cavado, desbastado.

As primeiras xilogravuras europeias datam aproximadamente do século XV e muitas delas são anônimas. No ocidente, essa técnica também teve como principal função a comunicação, só que ao contrário dos orientais, as informações eram veiculadas mais por imagens do que pela letra. Tal fato se deve ao alto grau de analfabetismo entre as pessoas do povo na Europa. Os livros dessa época eram copiados à mão por membros da Igreja, a qual detinha a maior parte do conhecimento erudito. A xilogravura passou a servir como suporte à transmissão desse conhecimento: já que a maioria era analfabeta, as informações tinham que ser difundidas através de imagens, geralmente de santos e de passagens da Bíblia. Baralhos também foram impressos a partir da xilogravura (Figura 16). Os jogos de cartas foram muito populares na época das grandes navegações, pois serviam para distrair os tripulantes das embarcações.

Figura 16. Baralho francês do século XV. Xilogravura.

As matrizes de madeira, a princípio, eram conseguidas a partir do corte longitudinal ao tronco das árvores, ou seja, no sentido da tábua. Devido a esse fator, essa xilogravura ficou sendo conhecida como xilo a fio. No século XVIII, o gravador inglês Thomas Bewick (1753–1828) criou a xilogravura de topo, técnica obtida através do uso de matrizes provenientes do corte transversal ao tronco da árvore. Observe as Figuras 17, 18 e 19.

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Figura 17. Esquema demonstrativo dos cortes da madeira para xilogravura de topo (à esquerda) e xilogravura a fio (à direita). Fotografia tirada na exposição didática do Museu Casa da Xilogravura, situado em Campos do Jordão – SP. Acesse o site: “http://www.casadaxilogravura.com.br/”. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Figura 18. Maria Vieira Araújo. Xilogravura de topo. Diâmetro aproximado: 8,5 cm. Brasília, 2007. Fonte: Manoela Afonso. (arquivo pessoal)
Figura 19. Maria Vieira Araújo. Matriz de xilogravura de topo. Diâmetro aproximado: 8,5 cm. Brasília/2007. Fotografia: Manoela Afonso.

O artista francês Gustave Doré (1832–1883), grande ilustrador de livros clássicos, como as Fábulas de La Fontaine, Dom Quixote, a Divina Comédia e a própria Bíblia, teve muitos de seus desenhos transformados em xilogravuras de topo. Essa técnica possibilita a obtenção de linhas mais finas, favorecendo os detalhes da imagem que se quer gravar. Isso acontece porque a madeira, sendo cortada transversalmente ao tronco da árvore, apresenta uma maior dureza e uma disposição diferenciada de fibras. Enquanto, na xilo a fio, os gravadores utilizam instrumentos como facas, estiletes e goivas, na xilo de topo, o ideal é utilizar o buril (Figura 20).

Figura 20. Goivas (à esquerda) e buris (à direita). Fotografia: Manoela Afonso.

Na Unidade 1, você conheceu o caráter coletivo dos ateliês orientais de xilogravura. Desde o seu nascimento até meados do século XIX, essa técnica envolveu prioritariamente o trabalho em equipe: desenhistas, gravadores e impressores trabalhavam em conjunto. O artista Gustave Doré, por exemplo, não talhava a madeira; ele fazia as ilustrações e as repassava para uma equipe de gravadores, os quais, a partir dos desenhos, produziam as xilogravuras de topo. Muitos desses profissionais ficaram no anonimato. A autoria de diversas gravuras ficou, injustamente, por conta apenas dos ilustradores. Pannemaker, Heliodoro Pisan, Jonnard, Trichon são alguns dos gravadores que produziram matrizes a partir de ilustrações de Doré, e que, felizmente, coassinaram algumas das edições (Figuras 21, 22 e 23). Acesse o link http://www.catholic-resources.org/Art/Dore.htm e observe gravuras feitas a partir de ilustrações de Doré para a Bíblia. Amplie as imagens e perceba que, na parte inferior de cada uma delas, há a assinatura do ilustrador (Gustave Doré), à esquerda, e a do gravador (diversos profissionais), à direita.

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Figuras 21. Assinatura de Gustave Doré.
Figuras 22. Assinatura do gravador Pannemaker.
Figura 23. Xilogravura de topo ilustrada por Gustave Doré e gravada por Pannemaker. A tentação de Cristo, 1865.

Foi a partir da necessidade de reprodução de imagens e textos que a xilogravura ganhou força e se estabeleceu, antes de tudo, como uma técnica mais de reprodução documental, comercial e editorial do que propriamente artística. Mas certamente, desde o seu início, muitos gravadores se destacaram pelo admirável valor estético do exímio trabalho que realizaram. Dentre eles, estão Albrecht Dürer (Alemanha, 1471–1528) (Figura 24), Utamaro (Japão, 1753–1806), Hokusai (Japão, 1760–1849), José Guadalupe Posadas (México, 1851–1913), Ernst Ludwig Kirchner (Alemanha, 1880–1938), Edvard Munch (Noruega, 1863–1944), Erich Heckel (Alemanha, 1883–1970). Esses são apenas alguns dos grandes nomes da xilogravura.

Figura 24. Albrecht Dürer. Morte de Maria. Xilogravura, 1510. 29 x 22,7cm.

À medida que a gravação em madeira foi perdendo espaço para a gravura em metal, ela passou a ser utilizada com mais frequência para fins artísticos. A partir do século XIX, a maioria dos artistas começou a explorar a xilogravura poeticamente. No século XX, os gravadores contemporâneos buscaram — e ainda buscam no século XXI — algo que está além do domínio técnico e das funções tradicionais da gravura: o interesse em resolver questões conceituais ligadas não só ao universo das artes gráficas, mas também aos seus anseios e motivações como artistas e seres humanos. À medida que novas técnicas de impressão e reprodução foram surgindo, os processos mais antigos puderam transitar livremente pelo campo da produção poética.

Figura 25. Ernst-Ludwig Kirchner, Cabeça Nina Hardt. Xilogravura, 1921.
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2.1.2. E no Brasil?

A princípio, consta que a xilogravura chegou ao Brasil com a vinda da Família Real portuguesa e a consequente criação da Imprensa Régia, em 1808. Assim como na Europa há alguns séculos, no Brasil a xilogravura também prestou serviços comerciais e editoriais logo de início: rótulos, vinhetas, ilustrações, publicidade etc. eram produzidos através das matrizes de madeira. Quando a gravura em metal e a litografia chegaram ao País, a xilo perdeu espaço comercial: foi assim que a gravura artística brasileira começou a ganhar corpo. Figuras como Lasar Segall (Lituânia, 1891 — São Paulo, 1957), Oswaldo Goeldi (Rio de Janeiro, 1895–1961) e Lívio Abramo (Araraquara, 1903 — Assunção, 1992) transformaram-se em verdadeiros mestres da escola gráfica brasileira. Vale ressaltar também que, desde muito cedo, nosso País apresentou um time excepcional de gravadoras mulheres: Fayga Ostrower, Renina Katz, Regina Silveira, Maria Bonomi são apenas exemplos de artistas extremamente atuantes nas artes gráficas nacional e internacionalmente, com uma produção significativa em xilogravura.

Olho vivo

Os nomes citados até aqui são apenas exemplos. Certamente, existem muitos outros excelentes gravadores espalhados pelo nosso País. Você conhece algum? Na sua cidade existem gravadores? Quais são as técnicas gráficas que eles utilizam? Faça uma visita ao ateliê desse artista e descubra o que o fez optar por essa linguagem. Caso não existam gravadores em sua cidade, adote um virtualmente: procure o máximo de informações sobre ele, imagens de seus trabalhos e de seu ateliê. E se você tiver alguma questão pertinente, por que não enviar-lhe um e-mail com seus comentários e dúvidas? Conversar com um artista é uma experiência fundamental para a compreensão de alguns processos, linguagens e obras artísticas. Certamente, o envolvimento com a arte através da aproximação do artista será um grande diferencial na sua formação tanto didático-pedagógica — como professor de artes — quanto poética.

No Brasil, existe também um movimento muito rico e coeso de produção popular em xilogravura (Figura 26). Ela está diretamente ligada à literatura de cordel. Trazida pelos portugueses, esse tipo de livreto tornou-se veículo de informação e crítica popular nas regiões Norte e Nordeste do País. O nome “cordel” surgiu devido ao fato de pendurarem os livretos sempre em barbantes durante as feiras. Mestre Noza, J. Borges (e seus filhos), José Costa Leite, Dila, Damásio Paulo, Abraão Batista, José Lourenço (responsável atualmente pela tipografia Lira Nordestina) são apenas alguns dos importantes nomes da xilogravura dita popular.

Figura 26. J. Borges. Capa de cordel feita em xilogravura e tipografia, Pernambuco.
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Saiba mais

Tipos móveis são pequenas matrizes em relevo, unitárias, contendo letras e números individuais. Desde meados do século II, na China, os tipos móveis já haviam sido criados a partir de peças de barro cozido, embora a experiência não tenha sido bem-sucedida devido à complexidade e variedade dos caracteres existentes na escrita chinesa. Bem mais tarde, no século XIV, os coreanos aperfeiçoaram a utilização de tipos de cobre. No século XV, Gutemberg (Alemanha, 1390–1468) fez melhorias nos blocos de impressão, criou a prensa e aperfeiçoou a tinta gráfica. O título do cordel mostrado na Figura 27 foi impresso numa tipografia, ou seja, numa impressora que imprime tipos móveis. As palavras são montadas letra por letra, colocadas na máquina, entintadas e depois impressas inúmeras vezes. Quando a impressão é finalizada, as palavras são desmontadas e os tipos guardados conforme seus padrões de fonte e tamanho. É um método de impressão artesanal, muito diferente do que encontramos atualmente nas gráficas, onde o processo é quase todo digital.

Figura 27. Tipos móveis. Fotografia tirada na exposição didática do Museu Casa da Xilogravura, situado em Campos do Jordão/SP. Acesse o site: “http://www.casadaxilogravura.com.br/”. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Olho vivo

Qual é o principal jornal da sua cidade? Chame seus colegas de curso e faça uma visita à sessão de impressão dos periódicos. Peça para que um funcionário explique como se produz o jornal, da matriz à impressão. Lembre de tudo o que já estudamos até aqui e compare os meios de reprodução da informação conhecidos por você até o momento.

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Para experimentar

A partir das instruções abaixo, você poderá produzir uma xilogravura. Providencie os materiais necessários e siga o passo a passo.

1. O projeto

A primeira coisa a fazer é elaborar um projeto para a sua xilogravura. Lembre-se de que, a xilo a fio não vai lhe oferecer um nível alto de detalhamento. Portando, crie uma imagem mais simplificada, sem muitas minúcias. É importante também levar em consideração a expressividade da própria madeira: ela vai lhe fornecer elementos visuais tais como texturas, marcas, linhas resistentes ao corte da goiva etc.

Numa folha de papel no tamanho 20 x 30 cm, elabore o seu projeto, utilizando caneta hidrocor preta. Evidencie bem as áreas que deverão sair em preto na impressão. Lembre-se de que para que isso aconteça, as áreas brancas do seu desenho deverão ser cavadas na madeira. Caso você domine alguns programas de criação de imagem no computador, poderá realizar seu projeto digitalmente, como mostra na Figura 28. Depois de pronto, é só imprimi-lo e transferi-lo para a superfície da madeira, utilizando papel carbono ou desenho de observação.

Lembre-se de que, na impressão, a imagem sairá invertida (Figura 29).

Materiais necessários para a realização dessa etapa:

2. A madeira

A princípio, você pode utilizar qualquer madeira que esteja ao seu alcance. As melhores para a xilogravura a fio são: cedro, mogno, imbuia, louro, cerejeira e imburana. Você poderá utilizar também compensados, duratex e eucatex, só que tais materiais não poderão lhe oferecer a beleza da textura da madeira. Eles vão resultar numa impressão chapada, muito próxima das características da linoleogravura (gravura feita com matriz de borracha). A impressão final será algo semelhante à imagem representada pelas Figuras 28 e 29.

Providencie 1 taco de madeira no tamanho 20 x 30 cm, 1 lixa d’água 600 e 2 lixas para madeira (uma mais grossa e uma mediana). Inicie o preparo da superfície da madeira, utilizando a lixa grossa. Depois prossiga com a lixa média e, para dar acabamento, utilize a lixa d’água. No caso do compensado, utilize apenas a lixa d’água. Depois de finalizado esse processo, passe o seu projeto para a superfície da madeira, utilizando papel carbono. Cuidado para não pressionar demais o lápis, pois essa ação poderá arranhar a sua matriz. Se você se sentir seguro, poderá desenhar o seu projeto diretamente na madeira, utilizando nanquim ou até mesmo um pincel atômico preto, como faz o artista André de Miranda na Figura 30. Não esqueça de evidenciar as áreas negras: elas deverão ficar em relevo (Figura 31).

Materiais necessários para a realização dessa etapa:

3. As ferramentas e a gravação

Você já tem o taco de madeira com o projeto da sua xilogravura. Agora precisa começar a gravá-lo. Para isso, precisará de ferramentas chamadas goivas (veja novamente a Figura 20). Para gravar a sua matriz, você utilizará basicamente as goivas em formato de V, U e algumas facas (Figura 32).

Os cortes não precisam ser profundos, mas as goivas devem estar bem afiadas para que o trabalho seja satisfatório. Para evitar acidentes, cuidado para que sua mão de apoio não fique na frente da goiva. Devido à força exercida na gravação, a goiva pode escapar e atingir a sua mão (Figura 33).

Materiais necessários para a realização dessa etapa:

4. A entintagem

A entintagem é um passo muito importante para a obtenção de uma boa cópia (Figura 34). Tanto o excesso quanto a falta de tinta prejudicarão os resultados. No vídeo número 1, você teve noções do manuseio da tinta tanto para a monotipia quanto para as impressões em relevo. Assista a ele novamente e revise os principais cuidados a serem tomados antes de entintar a sua matriz de madeira.

Materiais necessários para a realização dessa etapa:

5. A impressão

Antes de iniciar essa etapa, passe talco nas mãos para evitar que algum resquício de tinta suje os papéis: o talco inibe a ação gordurosa da tinta.

Faça uma marca de orientação — chamado de registro — para que as diversas cópias saiam sempre na mesma posição (na Figura 35, o registro é a folha de papel sulfite que está embaixo da matriz. Uma marca feita a partir dos contornos da matriz sobre essa folha de papel será o guia para que a madeira seja colocada sempre no mesmo lugar a cada nova impressão.)

A impressão da xilogravura pode ser feita com uma colher de pau. Coloque o papel sobre a sua matriz entintada e, como num decalque, friccione a parte redonda da colher nas costas do papel. Esse é um trabalho minucioso e deve ser feito com calma. Depois de impressa, cada cópia deverá ser pendurada num varal para secar (Figura 36). Lembre: a tinta gráfica demora de 2 a 3 dias para estar totalmente seca. Veja na figura 37 uma secadora de papel encontrada em muitos ateliês de gravura. Assista ao vídeo número 3 para tirar suas dúvidas quanto aos procedimentos corretos de impressão.

Materiais necessários para a realização dessa etapa:

Lembre-se de imprimir no mínimo 5 cópias, numerá-las e assiná-las. Nessa pequena tiragem, todas as cópias devem ser o mais semelhantes entre si; por isso, o uso do registro é importante.

6. A limpeza

Depois de finalizado todo o trabalho, é hora de limpar o ateliê e as ferramentas. Esse processo é muito importante para a conservação do material. Veja logo abaixo como proceder:

7. A assinatura

Uma matriz de gravura pode gerar inúmeras impressões. Quando você define um número limitado de cópias para a sua matriz, está determinando a sua tiragem, ou seja, está fazendo a sua edição. Existe uma convenção para essa tarefa.

Visualize a imagem que você acabou de imprimir: essa é a sua mancha gráfica. Abaixo dela, do lado esquerdo, você colocará — a lápis — o número de cópias dessa edição. Se você fez 5 cópias no total, deverá numerar uma a uma da seguinte maneira: 1/5, 2/5, 3/5, 4/5, 5/5 (veja Figura 38). Do lado direito, também abaixo da mancha gráfica, você deverá assinar a sua gravura, sempre a lápis. Se quiser, após a assinatura, você pode colocar também o ano de sua produção. A parte do meio fica reservada ao título da obra, caso exista.

Atenção: tradicionalmente gravuras e estampas são assinadas a lápis.

Outros dados podem ser indicados durante a produção de uma tiragem. Do lado esquerdo, no lugar dos números da sua edição final, podem aparecer algumas siglas. As mais comuns são:

P.E. – prova de estado. Enquanto você estiver experimentando a impressão da sua matriz, provavelmente produzirá provas de estado, ou seja, impressões não muito boas ou apenas processuais e não farão parte da tiragem final. Geralmente, as P.E. são muito valorizadas por colecionadores e investidores em obras de arte, pois apesar de não terem sido consideradas boas o suficiente para integrarem a tiragem final, provavelmente são cópias únicas. Uma P.E. de Pablo Picasso, por exemplo, certamente vale muito.
P.A. – prova do artista. São os 10% da tiragem total à qual o artista tem direito. Caso você queira produzir uma P.A., imprima 6 cópias: 5 delas farão parte da sua edição numerada de 1 a 5, e a outra será a sua P.A.

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Figura 28. Manoela Afonso. Ilustração digital. Goiânia/2008. Um projeto para gravura em relevo deve prever o que será branco (áreas a serem cavadas) e o que será preto (áreas da matriz que ficarão em relevo).
Figura 29. Imagem invertida.
Figura 30. O xilogravador carioca André de Miranda nesta imagem passa seus projetos para a matriz de madeira. Você pode obter mais informações sobre xilogravura no blog do artista: “http://mirandart.zip.net/”. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 31. Manoela Afonso. Pausa. Detalhe de xilogravura a fio — matriz e impressão. Brasília/2004. Observe como a textura da madeira é expressiva. As únicas áreas cavadas foram ao redor da xícara e alguns de seus traços internos. Essa impressão foi feita com tinta gráfica vermelha sobre papel canson.
Figura 32. Sammuel Gonçalves, estudante do curso de Licenciatura em Artes Visuais da FAV/UFG, gravando a sua matriz. Goiânia/2008. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 33. Gravação na madeira. Gilzee Reichman, aluna do Ateliê Livre de Gravura em Relevo do Projeto Arte na Escola/FAV/UFG. Goiânia, 2008. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 34. Entintagem. Brasília, 2006. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 35. Impressão. Luzia Costa, aluna do Ateliê Livre de Gravura em Relevo do Projeto Arte na Escola/FAV/UFG. Goiânia, 2008. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 36. Secagem de xilogravuras recém-impressas, Goiânia/2006. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 37. Esta é uma típica secadora de Ateliê de gravura da Universidade de Brasília, 2005. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 38. Manoela Afonso. Lamparina. Linoleogravura. 5,5 x 3,5 cm. Brasília, 2004.
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2.1.2. Gravura em Linóleo

O linóleo foi criado na Inglaterra em meados de 1860, mas, só por volta de 1920, é que foi utilizado como matriz para gravura em relevo. Ele parece uma borracha; é um aglomerado feito com cortiça e óleo de linhaça sobre juta, extremamente macio ao corte das goivas. Como no Brasil não existe esse material, utilizamos uma gama variada de emborrachados para piso e solados de sapato, mas os chamamos igualmente de “linóleo” (Figuras 39 e 40). É preciso pesquisar as melhores borrachas, pois algumas são bastante resistentes ao corte, o que tira facilmente o fio das ferramentas. O linóleo não apresenta textura, como é o caso de algumas madeiras: sua impressão é chapada, pois a borracha geralmente é lisa. O interessante do linóleo é que ele pode ser facilmente recortado com estiletes e tesouras, característica que possibilitou a criação da técnica chamada de “matriz recortada (Figuras 41 e 42). Além de poder dar contornos curvos às matrizes — o que na madeira é bem mais complicado — , o linóleo possibilita a criação de um jogo colorido de impressão em que as partes recortadas da matriz podem ser entintadas separadamente, com cores e composições diferentes.

Figura 39. Matriz de linóleo (emborrachado para piso). Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 40. Manoela Afonso. Sonho. Linóleogravura, 10 x 10 cm. Curitiba, 2003.

Observe como cada uma das partes foi entintada separadamente e, na hora da impressão, montadas conforme o projeto original. Uma matriz dessa natureza pode também ser impressa com suas partes deslocadas, mudando a composição original do projeto (Figuras 41 e 42).

Figura 41. Matriz recortada de linóleo (emborrachado para piso). Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 42. Manoela Afonso. Gita. Linóleogravura, 22,5 x 16 cm. Curitiba, 2003.
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Pablo Picasso (Espanha, 1881 — França, 1973) criou, no final da década de 1950, a técnica da “matriz perdida”. A partir dela produziu belíssimas gravuras em linóleo, multicoloridas. Essa técnica pode ser aplicada também na xilogravura e noutros suportes alternativos e funciona da seguinte maneira: a cada nova cor que se quer imprimir, grava-se mais uma vez a mesma matriz. Por exemplo: a partir de um projeto, inicio a gravação da minha matriz (Figura 43) e, em determinado estágio da gravação, paro e imprimo cópias dessa etapa numa cor mais clara, o amarelo, por exemplo. Em seguida, limpo a matriz e continuo gravando-a para, sobre o amarelo, imprimir o vermelho. E assim por diante. Para cada cor a ser acrescentada, preciso limpar a matriz, cavar mais sulcos e imprimir a nova cor por cima das outras. O resultado é muito satisfatório, colorido, gráfico. Ao chegar à última cor, a matriz já estará quase que totalmente desbastada; por isso é que ela é considerada “perdida”. A imagem inicial se foi (Figura 44).

Este é o primeiro estágio de gravação: em preto você pode observar a imagem que foi impressa em amarelo durante o processo de confecção da matriz perdida da Figura 45. Se você observar a gravura final atentamente, perceberá que a impressão em amarelo é muito sutil, aparecem apenas filetes.

Repare que a imagem da Figura 44 é exatamente a mesma que está impressa na cor vermelha na gravura final (Figura 45).

Figura 43. Manoela Afonso. Linoleogravura, 22 x 14,5 cm, Curitiba, 2003.
Figura 44. Este foi o penúltimo estágio da gravação.
Figura 45. Manoela Afonso. Linoleogravura (matriz perdida, impressão final), 22 x 14,5 cm. Curitiba, 2003.
Figura 46. Matriz em seu último estágio.

Repare que as áreas que estão em preto na impressão final (Figura 45) correspondem exatamente ao relevo que sobrou na matriz (Figura 46).

Existe outra técnica de inserção de cor na gravura: é a impressão através de duas ou mais matrizes. Isso quer dizer que, para cada cor que você quiser colocar na gravura, terá que gravar uma matriz diferente. É praticamente o mesmo raciocínio da serigrafia: para cada área de cor, é preciso revelar uma tela diferente.

Na Figura 47, existem duas matrizes: a primeira, em ocre (Figura 48), gravada apenas com alguns cortes que na impressão aparecem em branco — que é a cor do papel. A segunda matriz é a que está em preto e foi sobreposta (Figura 49). Para trabalhar com a impressão de camada sobre camada, é preciso tomar alguns cuidados: a princípio, as matrizes têm que ter o mesmo tamanho, e é preciso fazer um registro bem preciso para que todas elas sempre sejam impressas exatamente umas sobre as outras, sem deslocamentos. Outro cuidado é deixar cada camada secar bem, pois a sobreposição de impressões com tinta úmida não ficam boas. Como a tinta gráfica demora de 2 a 3 dias para secar, quer se dizer, que se você for trabalhar com 3 camadas de cor, demorará no mínimo 1 semana de trabalho para obter o resultado final.

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Figura 47. Manoela Afonso. Persona. Linoleogravura (impressão com duas matrizes), 22 x 16 cm. Curitiba, 2002.
Figura 48. Primeira matriz: impressão em ocre.
Figura 49. Segunda matriz: impressão em preto.

2.1.3. Colagraf

Colagraf — chamada também de Colagrafia, Cologravura, Papelografia, Papelogravura — é uma técnica alternativa de impressão em relevo (Figuras 50, 51 e 52). Levando-se em consideração o conceito tradicional, ela não é uma técnica de gravura, mas sim de estampa, simplesmente pelo fato de sua matriz não ser composta por incisões, mas sim por adição de materiais. Os gravadores cubanos são grandes produtores de Colagraf, que nada mais é do que a criação de matrizes através de colagens de materiais diversos sobre papelão.

Figura 50. Manoela Afonso. Colagraf feita com relevos de cola branca sobre papelão paraná, 21 x 9,5 cm. Curitiba, 1999. Matriz impressa com prensa-parafuso para encadernação.
Figura 51. Manoela Afonso. Colagraf feita com bombril colado sobre papelão paraná, 19 x 12 cm, Curitiba/1999. Matriz impressa com prensa-parafuso para encadernação.
Figura 52. Priscila Paz. Colagraf feita com barbante colado sobre papelão paraná. Brasília, 2005. Matriz impressa com colher de pau.
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Para experimentar

Materiais necessários:

Crie uma matriz de Colograf feita com barbante sobre papel paraná ou similar. Em seguida, crie outra matriz, só que agora colando materiais diversificados de sua escolha. Após a confecção das matrizes, devem ser impressas no mínimo 5 cópias de cada uma delas, assinadas e numeradas.

Você deverá fazer uma composição tanto com o barbante quanto com os demais elementos colados sobre pedaços de papelão resistente. Recorte o papelão no formato que você desejar, com o tamanho máximo de 15 x 20 cm, e utilize uma boa cola branca para fixar os materiais sobre ele. Não descuide da composição visual!

Depois de bem secas, passe verniz sobre as matrizes com um pincel: Essa etapa é muito importante para que os elementos colados não saiam grudados no rolo de entintagem, que é o próximo passo. No manuseio da tinta, você deverá proceder como na xilogravura. Relembre o passo a passo, revendo o vídeo número 1.

Com a matriz entintada, faça as impressões, utilizando uma prensa (Figura 53). Prensas são equipamentos caros: provavelmente, no seu polo, você terá acesso a uma prensa adaptada através do uso de um cilindro para massas acoplado a uma estrutura de madeira (Figura 54). Esse equipamento será fundamental para a prática da gravura em metal. Caso você não tenha acesso a ele, também poderá imprimir as suas colagraf manualmente, embora o resultado às vezes deixe a desejar. Para o manuseio da pequena prensa adaptada, assista novamente ao vídeo número 3. Depois de impressas, deixe as cópias secarem num varal e, posteriormente, assine-as conforme a convenção.

Vá guardando seus trabalhos no portfólio! E não esqueça de avaliar, desde já, qual será o escolhido para participar da Galeria Virtual. Fique atento!

Figura 53. Prensa-parafuso para encadernação. Ateliê de Gravura 508 Sul, Brasília. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 54. Prensa para gravura em metal. Ateliê de Gravura da FAV/UFG, Goiânia. Fotografia: Miguel Ambrizzi.
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2.2. Encavo

Até esse momento, você lidou com matrizes em relevo, ou seja, as partes altas da matriz é que foram impressas. A gravura em encavo é exatamente o oposto: a parte a ser impressa é o sulco, logo, a tinta precisa ser empurrada para dentro dos baixos relevos. É por isso que a prensa é fundamental nesse processo: o papel é umedecido e, sob alta pressão, cede até alcançar a tinta que está dentro dos sulcos. Outra diferença é que, enquanto, na gravura em relevo os processos de gravação são todos físicos, ou seja, as ferramentas ferem diretamente a matriz, na gravura em encavo, a maioria das técnicas acontece também pela ação química de diversos produtos, tais como o ácido nítrico e o percloreto de ferro. Devido à complexidade tanto de obtenção quanto de manuseio desses químicos — alguns deles são tóxicos e necessitam de certos cuidados , praticaremos, nesta unidade, apenas uma das técnicas da gravura em metal: a ponta-seca, procedimento exclusivamente físico, ou seja, a gravação se dá pela incisão direta de uma ponta dura sobre a chapa de metal.

A gravura em metal — também chamada de calcogravura — nasceu em meados do século XV, a partir da ourivesaria, na Europa. O uso do metal desbancou a xilogravura, pois as matrizes de cobre eram bem mais resistentes e podiam oferecer mais detalhes às imagens. Albrecht Dürer (Alemanha, 1471–1528) era filho de ourives e, além de xilogravuras (Figura 24), produziu muitas gravuras em metal, utilizando diversas técnicas, tais como buril, ponta-seca e água-forte. Enquanto as gravações a buril e ponta-seca são processos puramente físicos, a água-forte envolve o uso de ácidos. Foi no século XVI que Urs Graf (Suíça, 1485–1527-9) criou essa técnica, que funciona da seguinte forma: primeiro, passa-se um verniz protetor sobre a placa de cobre; em seguida, com uma ponta de metal, desenha-se sobre o verniz, retirando-o; o próximo passo é mergulhar a chapa no ácido, o qual corroerá apenas as partes abertas pelo desenho, ou seja, aquelas que estão sem verniz. O resultado oferece linhas bem definidas. Veja, na Figura 55, uma água-forte do gravador francês Jacques Callot (1594–1635 ).

Outro exímio gravador da época foi Rembrandt (Holanda, 1606–1669), a quem Callot influenciou. Rembrandt ficou conhecido por utilizar a água-forte em seu trabalho artístico, independentemente das suas funções comerciais de reprodução. Observe, na Figura 56, como o artista trabalhava o claro-escuro: uma de suas características marcantes não apenas na gravura, mas na pintura também.

Repare que o artista trabalha com três técnicas de gravura em metal na mesma matriz: cada uma delas oferece um resultado diferente.

A gravação a buril é um processo físico que, como a água forte, produz linhas delicadas, exatas. Já na ponta-seca, ao riscar diretamente o metal, obtém-se uma rebarba que resultará numa linha aveludada, borrada. Observe, na Figura 57, como as linhas são diferentes das que compõem a gravura de Callot (Figura 55).

Figura 55. Jacques Callot. O mendigo. Água-forte, 1622 - 1623. 14 x 8,7 cm.
Figura 56. Rembrandt. Autoretrato, desenhando junto à janela. Água-forte, ponta-seca e buril, 1648. 16 x 13 cm.
Figura 57. Auguste Rodin (França, 1840–1917). Victor Hugo (detalhe). Ponta-seca, 1884. 22 x 16 cm.
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Para experimentar

Nesta atividade, você deverá produzir três boas impressões de gravura em metal, utilizando a técnica da ponta-seca. A primeira coisa a fazer é o projeto. Lembre-se de que a gravura em encavo é bem diferente da gravura em relevo: agora, você pode inserir detalhes e explorar melhor o desenho sobre a chapa. Mas não esqueça que a linha gravada é que sairá impressa, ao contrário da xilo, em que tudo o que era gravado ficava em branco na impressão final.

Material Individual:

Material Coletivo (Figura 58):

Objetos pesados para colocar sobre as impressões: podem ser livros, placas de madeira, ou qualquer outro elemento que faça pressão uniforme sobre o papel recém-impresso. Essa etapa é muito importante, pois evita que o papel no qual está impressa a sua gravura fique todo ondulado.

Assista ao vídeo número 5. Ele apresenta, didaticamente, todo o passo a passo a ser cumprido para que você obtenha bons resultados com a ponta-seca. Você deverá seguir, corretamente, cada uma das etapas:

  1. Preparação da matriz: chanfrar as bordas da chapa e dar-lhe polimento.
  2. Gravação: gravar/riscar o seu projeto sobre a matriz com uma ponta resistente.
  3. Preparação da tinta: adicionar óleo de linhaça à tinta para que fique adequada (Figura 59).
  4. Preparo do papel: umedecer adequadamente o papel (Figura 60).
  5. Entintagem: entintar a matriz com cuidado, pois a pressão excessiva pode danificar as rebarbas deixadas pela ponta-seca ao redor das linhas gravadas. (Figura 61)
  6. Limpeza para impressão: com jornais e papel de seda, limpe as superfícies da chapa que estão em relevo, pois o que nos interessa agora é apenas a sutil impressão do sulco provocado pelas linhas riscadas por você no metal (Figura 62).
  7. Impressão: através do uso da prensa, imprima a primeira cópia. Lembre-se de que, para produzir mais cópias, é preciso sempre entintar e limpar novamente a matriz (Figura 63).
  8. Secagem: coloque a cópia recém-impressa sob objetos pesados que possam exercer uma pressão uniforme sobre o papel úmido.
  9. Limpeza do ateliê: após o término das três impressões, reúna os colegas para limpar o ateliê.
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Figura 58. Materiais e ferramentas para gravura em metal. Da esquerda para direita, você pode observar uma placa de cobre, dois roulettes (que são ferramentas específicas para calcogravura), pontas de metal (dois riscadores de azulejo, uma ponta-seca autêntica e uma ponta-seca adaptada com prego e cabo de pincel), lima e tesoura para chapa de metal. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 59. Preparo da tinta. Fotografia: Miguel Ambrizzi.
Figura 60. Exemplo de cuba para molhar papéis. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 61. Exemplo de entintagem feita com uma pequena trouxa de tecido, chamada de “boneca”. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 62. Limpeza da matriz com jornal.chamada de “boneca”. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 63. Colocação do papel umedecido sobre a matriz utilizando pinças feitas de cartão telefônico usado. Fotografia: Miguel Ambrizzi.

A calcogravura oferece uma variedade muito grande de técnicas de gravação. Você já soube algo a respeito de três delas: gravação a buril, ponta-seca e água-forte. Existem outras como a maneira negra, o verniz mole, o carborundum, a água-tinta etc. Para fechar essa parte sobre gravura em metal, você não poderia deixar de conhecer, mesmo que apenas teoricamente, a água-tinta. Assim, quando você for a uma exposição de gravuras, já poderá compreender os processos mais usuais da calcogravura.

A água-tinta é uma técnica de gravação de áreas negras através do uso de uma resina em pó: o breu. O breu é aquecido e derretido sobre a matriz, transformando-se em pontos que vedam a chapa. Quando mergulhada em ácido, a chapa terá os pequenos espaços descobertos gravados. O artista Francisco Goya (Espanha, 1746 — França, 1828) foi um grande gravador dessa técnica. Com o aperfeiçoamento da calcogravura através de pesquisas e descobertas feitas por gravadores, a ilustração de livros, produção de mapas, divulgação e documentação de obras de pintura, arquitetura, paisagens, viagens, retratos tiveram um grande avanço a partir do século XVIII (Figura 64).

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Figura 64. Francisco Goya. Chinchillas. Buril, água-forte e água-tinta, 1799. 19,5 x 13,5 cm. Perceba as áreas preenchidas com variados tons de cinza: esse é o efeito da água-tinta.
Dica

Assista ao filme “Sombras de Goya”, do diretor Milos Forman. Você terá a oportunidade de conhecer, rapidamente, o funcionamento de um ateliê de gravura em metal, em pleno século XVIII. E já que muitos gravadores costumam dizer que a gravura possui uma “cozinha”, ou seja, pitadas de muitos saberes/sabores técnicos, desejo-lhe um bom degustação!

2.3. Litografia

A litografia, técnica de impressão planográfica, foi descoberta pelo músico alemão Alois Senefelder (1771–1834), em meados do século XVIII, quando a gravura em metal estava a pleno vapor na Europa. Sua matriz é uma pedra calcária extraída de jazidas alemãs e russas, as quais se encontram hoje praticamente esgotadas. Sendo assim, pedras litográficas são objetos preciosos e devem ser manuseadas com muito cuidado. O processo de gravação das pedras é complexo: envolve uma série de procedimentos químicos. Mas, resumidamente, pode-se afirmar que a litografia provém da repulsão entre água e materiais gordurosos, os quais são utilizados para fixar a imagem. Após preparada a superfície da pedra, feitos a sensibilização e o desenho, parte-se para a impressão da estampa. Quando a tiragem é concluída, apaga-se a imagem de sua superfície. Uma pedra litográfica não é descartável, ela pode ser reutilizada inúmeras vezes. Por exigir uma prensa específica (Figura 66), essa é uma técnica menos acessível: você só poderá praticar a litografia ao trabalhar em ateliês que possuam as pedras e a prensa litográfica (Figura 65).

Figura 65. Acervo de pedras litográficas da Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás. Fotografia: Manoela Afonso, 2009.
Figura 66. Prensa de litografia da Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás. Fotografia: Manoela Afonso, 2009.
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A pedra pode ser trabalhada, dentre outros materiais, com bastões gordurosos ou lápis litográficos É interessante comparar tais ferramentas com aquelas utilizadas na xilo e na gravura em metal: goivas, buris, facas, pontas-secas: na litografia não há incisão feita na matriz. Ao manusear bastões e lápis, o artista pôde recuperar a liberdade do seu traço, próprio do ato de desenhar. São visíveis em algumas impressões litográficas, texturas típicas dos trabalhos feitos com crayon e até mesmo com lápis grafite (Figura 67).

A litografia teve importante participação no início da imprensa moderna, no século XIX. Tudo aquilo que antes vinha sendo reproduzido pela gravura em metal — mapas, documentos, panfletos, rótulos etc. — passou rapidamente à lito. Honoré Daumier (França, 1808–1879), Toulouse-Lautrec (França, 1864-1901/ figura 68), Pierre Bonnard (França, 1867–1947), Henri Matisse (França, 1869–1954) foram alguns dos representantes expressivos dessa técnica. Pesquise-os! E para saber um pouquinho mais, acesse o link “http://tipografos.net/tecnologias/litografia.html”. Lá você encontrará informações adicionais importantes e bem resumidas. Aproveite para navegar no site, pois é sobre tipografia, boa leitura!

Figura 67. Manoela Afonso. Meu jardim. Litografia, 19 x 22 cm, Brasília/2005.
Figura 68. Henri de Toulouse-Lautrec. Litografia, 1896.

2.4. Serigrafia

Da Europa vamos agora à América do Norte: nos Estados Unidos, nasce a serigrafia, por volta dos anos 1920. A serigrafia impulsionou ainda mais a multiplicação dos impressos, dando escala industrial às estampas. Papel, tecido, cerâmica, plástico, vidro e tudo mais que você possa imaginar transformaram-se em suporte para impressão.

Essa técnica consiste num processo de gravação feita pela luz numa tela de nylon sensibilizada por uma emulsão fotossensível: é considerada uma técnica de permeação. A matriz agora é um fotolito: pode ser, por exemplo, um desenho feito em preto sobre o acetato. As partes pretas do desenho ficarão vazadas, como numa máscara ou estêncil, portanto serão impressas. No decorrer da história da arte, observa-se que foi a partir dos anos 1950, especialmente durante a Pop Arte, que a serigrafia foi utilizada intensamente com finalidades artísticas. Robert Rauschenberg (EUA, 1925-2008), Roy Lichtenstein (EUA, 1923-1997) e Andy Warhol (EUA, 1927-1987) foram alguns dos artistas que utilizaram amplamente essa técnica.

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Saiba mais

O estêncil já era utilizado desde o período da descoberta da xilogravura, no Oriente, para estampar móveis, paredes e tecidos.

Para experimentar

Para realizar a serigrafia fotográfica, são necessários equipamentos muito específicos, tais como mesa de luz, emulsões fotossensíveis, tintas serigráficas, rodos para impressão etc. Devido a tais dificuldades, faremos aqui um exercício, utilizando o estêncil, visto que conceitualmente, tal técnica possui inúmeras semelhanças com a serigrafia. No estêncil, assim como na serigrafia, a impressão se dá através de moldes vazados. A diferença está apenas no processo, mas o raciocínio é o mesmo.

Observe as imagens: a Figura 69 refere-se ao molde vazado, a Figura 70, à impressão. Você notou alguma coisa diferente? Em que posição está o molde vazado (matriz) e a sua impressão?

Neste exercício, você deverá produzir três impressões no tamanho A4 a partir da criação de um molde vazado. Você poderá utilizar, como matriz, uma folha de acetato, uma radiografia velha ou até mesmo papéis mais grossos. Com um estilete bem afiado, corte as partes que deverão ser impressas. Depois de pronto o seu molde vazado, pincele as aberturas com tinta guache sobre um papel canson. Assista ao vídeo número 6 e acompanhe o passo a passo. Bom trabalho!

Materiais necessários à execução dessa tarefa:

Figura 69. Matriz de estêncil feita com papel canson: molde vazado. Manoela Afonso. Curitiba, 2002.
Figura 70. Impressão com tinta serigráfica em papel canson: repare que não há inversão da imagem! Manoela Afonso. Curitiba, 2002.

2.5. Técnicas digitais

Pensando muito superficialmente pela linha histórica no tempo, temos a seguinte situação: partimos do estêncil e seguimos para os carimbos, a xilogravura, a tipografia, a gravura em metal, a litografia, a linoleogravura, a serigrafia e processos alternativos de impressão como a colagraf, por exemplo. O próximo salto na história da reprodução de imagens está ligado ao universo digital e ao uso do computador: estamos vivendo esse momento, nesse instante! Se transferirmos todo o conhecimento gráfico adquirido até aqui à esfera digital, é possível dizer que há a produção de estampas ou gravuras? Como seria essa matriz? Qual seria o processo de criação de imagens e da sua impressão?

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Certamente, ao considerar o universo digital, estamos tratando também de técnicas de criação e reprodução de imagens através da sua digitalização e pelo uso de programas específicos de criação e manipulação de imagens. Talvez agora, lidemos com matrizes binárias (arquivos gerados por programas de computador), impressoras e plotters no lugar de prensas, barens ou colheres de pau. Se isso é gravura ou estampa, fica aqui a questão em aberto para você pensar, argumentar e chegar a uma conclusão — mesmo que provisória. É importante fundamentar seus pontos de vista. Mas, apesar de ser uma questão importante, a criação e a experimentação vêm na frente. Tais conceitos não podem funcionar como amarras, mas sim como tomada de consciência, com a finalidade de amadurecer os processos de produção artística, sobretudo na contemporaneidade, com tantos recursos passíveis de serem explorados artisticamente. E nada impede que o artista misture todas essas técnicas, indo do mais antigo conhecimento à tecnologia de ponta.

Para refletir

Para incrementar suas reflexões a respeito da gravura/estampa digital, acesse o link www.anpap.org.br/2008/artigos/165.pdf e baixe o arquivo em pdf referente ao texto “Infografia impressa: a estampa artística e as tecnologias digitais”, de Leopoldo Tauffenbach.

Desfrute a seguir do texto escrito pela artista portuguesa — radicada em São Paulo - Constança Lucas (Figuras 71, 72 e 73). Além de gravuras, pinturas e ilustrações, ela tem desenvolvido também muitos desenhos e gravuras/estampas utilizando recursos digitais. Para conhecer um pouco mais sobre o seu imenso universo poético, acesse o site http://www.constanca.lucas.nom.br/.

“Vivemos numa cultura em que a visualidade é uma intensa mistura das mais diversas formas de construção de imagens. Temos um panorama de técnicas, formado por diversos estágios — artesanal, mecânico e eletrônico — que nos dá acesso à realização das mais variadas experiências, em múltiplos procedimentos na construção da imagem: tela, tinta, pincel, papel, lápis, película fotográfica, aparelhos óticos, equipamentos eletrônicos, computadores, programas digitais, pixel, luz...
É nessa multiplicidade de meios, para construção de imagens, que venho desenvolvendo o meu trabalho de arte. Tenho utilizado o desenho, a poesia, a pintura, a fotografia e a imagem digital.
A manipulação das palavras, como desenho, faz parte do meu percurso de artista; e, com uso do computador o meu campo foi alargado e multiplicadas as possibilidades de realização dos meus trabalhos de arte.
O uso do computador não vem apenas da possiblidade de multiplicidade tão óbvia e interessante em si mesma, mas também pelo uso de seus recursos gráficos que os programas nos fornecem e são ótimos auxiliares num pensamento gráfico, na realização de tramas, manchas, colagem/composição etc.
A repetição dos elementos, algo com o qual eu trabalho intensamente, com o uso do computador trouxe - me novos caminhos para experiências do meu pensamento gráfico. Realizo pactos e encontros entre os diferentes meios materiais e virtuais, numa leitura gerada não apenas pelas memórias vivenciadas, mas também pelas memórias inventadas.”
(Texto de Constança Maria Lima de Almeida Lucas 2008).
Figura 71. Constança Lucas. Cabeças 07. Gravura digital. São Paulo, 2008..
Figura 72. Constança Lucas. Cabeças 09. Gravura digital. São Paulo, 2008.
Figura 73. Constança Lucas. Terra. Gravura digital. São Paulo, 2008.
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Para experimentar

A partir de um dos trabalhos feitos nos exercícios anteriores, crie uma estampa digital.

Como proceder?

Unidade 3: Artes Gráficas na sala de aula

Na Unidade 3, você será provocado a pensar e a criar recursos, atividades e possibilidades do ensino das artes gráficas na sala de aula. Acompanhe o conteúdo dessa Unidade e, desde já, vá pensando num possível plano de aula referente à gravura ou à estampa para os ensinos médio ou fundamental. Quais conceitos das artes gráficas são fundamentais no ensino de artes? A reprodução, a multiplicação, a inversão da imagem, a importância histórica e artística e o que mais? Essa será a atividade prática que você deverá desenvolver logo mais.

3.1. Estampa na sala de aula: monotipia, colagraf, carimbo e serigrafia

Você pôde observar que as técnicas da Monotipia, Colagraf e Molde Vazado são de fácil aplicabilidade. A partir dos exercícios práticos feitos para essa disciplina, você pode desenvolver outras propostas de ensino, sempre congregando prática e conceito. Vamos nos deter, aqui, em algumas práticas ligadas à produção de carimbos.

3.1.1. O Carimbo

Você percebeu, nas Unidades 1 e 2, que o carimbo é uma técnica utilizada, há muito tempo, por nossos ancestrais. Conosco não é diferente, muitos de nós já tiveram a oportunidade de passar pela experiência de confeccionar carimbos de batata na escola ou então de pintar os carimbinhos impressos nos cadernos pelas professoras do antigo “primário”. Você pode, através do carimbo, extrapolar a simples experiência de criação de matriz e impressão (Figura 74): pode discutir com seus alunos as diferentes funções do carimbo ao longo da história, criar painéis coletivos, enveredar pelo movimento da Arte Postal, da criação de Ex libris, entre outras abordagens.

O carimbo de borracha pode ser feito com goivas ou estiletes (Figura 75). Consiste na gravação tal qual é feita na xilogravura e na linoleogravura. É uma ótima oportunidade para se trabalhar os conceitos ligados a tais técnicas, inclusive para realizar experiências de impressão colorida, tais como a impressão com duas matrizes ou a técnica da matriz perdida. Ao invés de utilizar tinta gráfica, você pode usar apenas tinta de carimbo.

Caso você não possua as goivas ou pretenda trabalhar com uma faixa etária menor, a confecção de carimbos feitos com e.v.a. pode ser uma ótima solução (Figuras 76, 77, 78, 79 e 80). Você poderá trabalhar conceitos como a silhueta e, com os retalhos de seus recortes, aproveitar para inserir o conhecimento ligado ao molde vazado.

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Figura 74. Carimbos feitos com borrachas e rolhas de garrafa. Fragmento de painel coletivo feito durante atividade didática, na exposição ‘GG em Brasília’, 2004. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Figura 75. Gravação de borracha escolar com goiva. Oficina de carimbo na Feira do Livro de Brasília/2004. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 76. Impressão de carimbos feitos com borracha escolar. Oficina de carimbo no Ateliê da Prefeitura de Porto Alegre, 2005. Fotografia: Manoela Afonso
Figura 77. Impressão de carimbos feitos com borracha escolar. Oficina de carimbo no Ateliê da Prefeitura de Porto Alegre, 2005. Fotografia: Manoela Afonso
Figura 78. Carimbos de e.v.a. colados a tacos de madeira. Ação educativa, Jataí/2008. Fotografias: Miguel Ambrizzi e Manoela Afonso.
Figura 79. Carimbos de e.v.a. colados a tacos de madeira. Ação educativa, Jataí/2008. Fotografias: Miguel Ambrizzi e Manoela Afonso.
Figura 80. Carimbos de e.v.a. colados a tacos de madeira. Ação educativa, Jataí/2008. Fotografias: Miguel Ambrizzi e Manoela Afonso.
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3.2. Gravura em relevo na sala de aula: matriz em isopor

Para trabalhar conceitos básicos da xilogravura e da linoleogravura, você tem como recurso a utilização de bandejinhas de isopor. Podem ser facilmente gravadas com a unha, lápis, canetas ou qualquer outro instrumento. Técnicas como a matriz recortada, a impressão colorida a partir de duas ou mais matrizes e a matriz perdida podem ser realizadas a partir desse material (Figura 84). Você pode substituir a tinta gráfica por tinta a óleo ou até mesmo acrílica (desde que trabalhada com certa rapidez, devido à fácil secagem). A colher de pau se presta também à impressão do isopor. Essa é uma maneira eficaz de trabalhar técnicas tradicionais das artes gráficas com poucos recursos.

Figura 81. Impressão de gravura em relevo a partir de matriz de isopor. Luzia Costa, aluna do Ateliê Livre de Gravura em Relevo, do Projeto Arte na Escola, Goiânia, 2008. Fotografia: Manoela Afonso.

Veja a seguir, imagens de duas impressões feitas a partir de matrizes de isopor.

Figuras 82. Impressão feitas por alunas da oficina de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara, Goiânia/2007. Matrizes de isopor impressas com tintas gráficas preta e vermelha. Goiânia/2008. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).
Figuras 83. Impressão feitas por alunas da oficina de Introdução à Gravura da Fundação Jaime Câmara, Goiânia/2007. Matrizes de isopor impressas com tintas gráficas preta e vermelha. Goiânia/2008. Fonte: Manoela Afonso (arquivo pessoal).

Você pode instigar seus alunos à pesquisa de outros suportes, ferramentas, materiais e modos de instalar a gravura e a estampa. Além disso, é muito importante que a técnica não seja passada como uma simples receita: é preciso incentivar a olhar poética e esteticamente. A partir do conhecimento das artes gráficas, o que é possível criar? Tudo o que você quiser. Veja o exemplo das figuras a seguir.

Figura 84. Instalação de Mainês Olivetti chamada “De véu e grinalda”. Impressões serigráficas sobre tule. Curitiba, 2000. Fotografia: Manoela Afonso.
Figura 85. José César Teatini Clímaco. Gravação em papelão. Brasília, 2008. Observe que o objetivo deste trabalho não é a impressão: o artista, que é fundamentalmente um gravador, passou a trabalhar a partir dos conceitos de gravação e a construir painéis de papelão gravados, colados, sobrepostos – mas não impressos. Perceba como a prática da gravura cumpre um papel importante na criação dessa proposta artística. Fotografia: Manoela Afonso.
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Conheça agora a Xilocidade: uma proposta artística do xilogravador carioca André de Miranda, em que a xilogravura é impressa sobre jornais do caderno imobiliário. Veja como sua proposta poética é bem fundamentada e vai muito além da técnica pela técnica. O domínio técnico é importante, sem sombra de dúvida. Mas, a partir dele, o que você quer fazer poeticamente? Quais são seus anseios e desejos? O que você quer expressar? Boa leitura!

Xilocidade: memória urbana gravada

“Através da série XILOCIDADE, inicio uma denúncia sobre o descaso com a memória da arquitetura em muitas cidades brasileiras. São xilogravuras impressas sobre folhas de jornal (offset) retiradas dos cadernos dos classificados. Em anúncios de novos prédios, imprimo elementos da arquitetura antiga antes presentes nesses mesmos terrenos em que agora prevalece o novo em sacrifício do antigo. Sem nenhum critério e já há muito tempo, estes antigos casarões — alguns tombados — estão sendo vendidos e cedendo lugar a modernos e esqueléticos prédios. Bairros do Rio de Janeiro, como Santa Teresa, Catete, Tijuca e Centro, ainda tentam manter seus antigos casarões do início do século XIX. Muitas dessas maravilhosas construções foram transformadas em pensões na década de 1930, quando, em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, ainda não havia a especulação imobiliária. Neles residiam jovens estudantes e famílias inteiras que alugavam seus quartos. Muitos imigrantes que aqui chegavam subiam suas escadarias e encontravam abrigo nesses sobrados onde estava registrada sua história.
Encontrei, nessa forma de impressão, a maneira mais poética de chamar a atenção para esse problema urbano.
Fica aqui estampada minha denúncia.”
André de Miranda

3.3. Gravura em encavo na sala de aula: ponta seca sobre placas de plástico

É possível trabalhar ponta-seca sobre placas de plástico: poliestireno, acrílico, acetato, até mesmo sobre radiografias. Basta que seus alunos tenham à disposição pontas duras de metal e a prensa. A prensa feita com cilindro para massa é de fácil confecção e baixo custo se comparada às prensas originais: basta apenas que exista algum dinheiro em caixa e muita vontade por parte de professores e escolas.

O processo de trabalho é o mesmo da ponta-seca sobre metal: grava-se a imagem, entinta-se a placa, utilizando tinta gráfica ou tinta a óleo, limpa-se a matriz e imprime-se a imagem, utilizando a pequena prensa e papel umedecido.

Para experimentar

Elabore um plano de aula a partir da criação de uma nova proposta de trabalho para as artes gráficas na sala de aula. Não se esqueça de listar os materiais necessários, prever a faixa etária e a quantidade de alunos, descrever o passo a passo da técnica e embasar, conceitualmente, a sua proposta de trabalho.

Chegamos ao fim dessa disciplina...

Espero que ela tenha contribuído tanto para a sua formação, como futuro professor, mas também na ampliação do olhar para o mundo. O universo gráfico é vasto e muito importante para a história da humanidade. Desejo que das sementes que joguei, algumas tenham encontrado solo fértil nos seus anseios e desejos por conhecimento. Continue pesquisando e, se possível, produzindo gravuras e estampas!

Referências Bibliográficas

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CAMARGO, Iberê. A gravura. Porto Alegre: Sagra-DC. Luzzato, 1992.

CLÍMACO, José César Teatini de Souza. A gravura em matrizes de plástico. Goiânia: Editora da UFG, 2004.

___________________. Manual de litrografia sobre pedra. Goiânia: Editora da UFG, 2000.

COSTELLA, Antonio F. Introdução à gravura e à sua história. Campos do Jordão: Mantiqueira, 2006.

___________________. Breve história ilustrada da xilogravura. Campos do Jordão: Mantiqueira, 2003.

___________________. Xilogravura: manual prático. Campos do Jordão: Mantiqueira, 1986.

DAWSON, John. Guia completa de grabado e impresion: técnicas y materiales. Madrid: H. Blume Ediciones, 1982.

EICHENBERG, Fritz. The art of the print: masterpieces, history, techniques. New York: Abrams, 1976.

GRAVURA: arte brasileira do século XX. São Paulo: Cosac & Naify / Itaú Cultural, 2000.

GRAVURA brasileira hoje: depoimentos. Rio de Janeiro: SESC Tijuca, 1995.

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GRAVURA em metal. Marco Buti, Anna Letycia (orgs.). São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo/Imprensa Oficial, 2002.

HERSKOVITS, Anico. Xilogravura: arte e técnica. Porto Alegre: Tchê!, 1986.

LEITE, José Roberto Teixeira. A gravura brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1966.

PLACE, François. O velho louco por desenho. São Paulo: Companhia das letrinhas, 2004.

SENAC – DN. Oficinas: gravura. Elias Fajardo; Felipe Sussekind; Marcio do Vale (orgs.). Rio de Janeira: Ed. Senac Nacional, 1999.

WATSON, Leda. Sonhos, momentos, emoções: técnicas e gravuras. Brasília: edição da autora, 2008.

WEISS, Luise. Dentro do espelho. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.

Links úteis:

Atelier Piratininga: http://atelierpiratininga.blogspot.com/

Centro de Pesquisa em Gravura da Unicamp: http://www.iar.unicamp.br/cpgravura/

Estampe.be:http://www.estampe.be/

Galeria Gravura Brasileira: http://www.gravurabrasileira.com/index.asp

Graphias: http://www.graphias.com.br/

Museu Casa da Xilogravura: http://www.casadaxilogravura.com.br/

Museu Olho Latino: http://museu.olholatino.com.br/

Regina Silveira: http://reginasilveira.uol.com.br/

Tita do Rego Silva: http://www.titadoregosilva.de/

Xylon Argentina: http://www.xylonargentina.com.ar/