Licenciatura em Artes visuais Percurso 1
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Tema Transversal

Autora

Drª Débora Cristina Santos e Silva Mestre em Literatura Brasileira (UFG/1996/Bolsista CAPES). Doutora em Teoria Literária (UNESP /2002/Bolsista FUNADESP). Pós-doutora em Literatura e Hipermédia pela Universidade Fernando Pessoa (UFP-Porto/2010/Bolsista CAPES). Pós-doutoranda em Arte e Cultura Visual na Universidade Federal de Goiás (FAV-UFG/2016-2018). Docente do PPG Interdisciplinar em Educação, Linguagem e Tecnologias da Universidade Estadual de Goiás (PPG-IELT/UEG). Docente do curso de Letras do Campus Anápolis de Ciências Sócio-Econômicas e Humanas (CCSEH/UEG). Líder do GP ARGUS - Estudos de Cultura, Linguagem e Comportamento (CNPq/2004 -). Membro da Rede Goiana de Pesquisa em Leitura e Ensino de Poesia (REDEPESQ/ FAPEG/2007-2010). Pesquisadora do Projeto PO.EX ́70-80 - Arquivo Digital da Literatura Experimental Portuguesa?, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT/União Europeia/Refª: PTDC/CLE-LLI/098270/2008), no Centro de Estudos Culturais, da Linguagem e do Comportamento (CECLICO) da Universidade Fernando Pessoa (UFP/Porto/ 2010-2014).

Saiba mais

Apresentação

Você está iniciando um curso de formação superior na modalidade EAD! Isso é fantástico, não é?! Tudo lhe parece novo agora: uma nova forma de estudar, novos recursos, novos contatos, novos amigos... Daqui pra frente, muitas serão as possibilidades de aprendizagem e de crescimento individual e coletivo. Você está iniciando agora uma nova etapa de sua vida, cheia de surpresas e descobertas.

Roteiro de Viagem: Iniciando a Navegação

Navegar pelas páginas de um livro, pela internet e tantos outros mares, por diferentes mídias, pode ser uma experiência bem estimulante! Seguindo o exemplo dos ousados argonautas que, liderados pelo destemido e ambicioso Jasão, singraram os mares da Grécia em busca do cobiçado “velo de ouro”, símbolo da sabedoria e da glória no mundo antigo, os internautas de hoje também se aventuram em busca do conhecimento, moeda-corrente do mundo moderno. Venha agora mesmo fazer conosco essa viagem!

Pele de carneiro em ouro, disputada por todos os que buscavam a verdade (ouro) e a pureza espiritual (velo). Na procura desta, Jasão empreendeu uma viagem no navio Argo, cujos tripulantes eram chamados de argonautas. Representa, assim, o mito da busca de um tesouro, material ou espiritual. (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1994, p.934)

Em nosso percurso, muitas serão as descobertas e desafios. Você entrará em contato com as mais diversas modalidades de interação que a rede mundial de computadores permite, aproveitando os recursos e ferramentas disponíveis para sua aprendizagem. Estamos agora mesmo levantando âncoras e iniciando nossa viagem de volta ao mundo em quatro anos, em busca do saber. A expectativa é muito grande... Mas vamos a ela!

No Tema Transversal deste módulo, Leitura e Produção de Texto, você fará contato com os diversos gêneros textuais, adquirindo noções importantes sobre leitura e elaboração de textos em diferentes veículos de socialização: a mídia impressa e virtual, as artes visuais, a internet, entre outras. Seu desempenho agora será fundamental para todo o restante dessa trajetória.

Diante de tudo o que você tem lido, visto e ouvido nos primeiros meses de contato conosco, quero sugerir que você mantenha uma ferramenta para registro constante de suas pesquisas, questionamentos e impressões, que sirva como veículo de reflexão pessoal sobre as temáticas desenvolvidas nesse curso. Esse poderá ser uma espécie de caderno de viagem, como aqueles “diários de bordo” nas grandes viagens de circunavegação. Agora, vamos traçar os primeiros passos da nossa viagem:

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Nesse módulo introdutório, você está fazendo seu primeiro contato com modo de aprendizagem diferente, que é a modalidade EAD. Para torná-la familiar, alguns temas se destinam a esclarecer a estrutura e os procedimentos desse tipo de curso. São eles: as formas de Acesso ao Curso, os Fundamentos de EAD, o Projeto Pedagógico do Curso, os Princípios norteadores da Educação nessa modalidade, e finalmente agora, como tema transversal, a Leitura e Produção de Texto.

Aqui você perceberá a gama de gêneros textuais que envolvem nossas vivências cotidianas, desde o núcleo familiar até os mais altos níveis acadêmicos, numa variação de maior ou menor formalidade. Aqui também poderá adquirir competência lingüística e comunicativa para interpretar os diferentes contextos de produção e recepção do conhecimento na sociedade tecnológica da atualidade, adquirindo noções claras de interdisciplinaridade. Então, vamos conhecer melhor o módulo “Leitura e Produção de Textos” Para começar, conheça a proposta desse módulo por meio de sua Ementa:

Ementa

Estudo comparativo e produção das diferentes modalidades de texto. Leitura sistemática dos suportes literário e midiático, com vistas à identificação dos pontos de confluência e interação que os interpretem em suas dimensões referencial e simbólica. Abordagem interdisciplinar que abrange os diversos níveis de apreensão da linguagem enquanto processo sócio-econômico, estético e cultural na sociedade.

Partindo dessa ementa, nosso objetivo principal nesse módulo é “habilitá-lo como um profissional competente no manejo da língua-mãe, na leitura e interpretação de diferentes textos, nos vários contextos sociais e veículos midiáticos, de maneira que isso se manifeste naturalmente no exercício de sua profissão”. (PPC – Artes Visuais) E para alcançar esse objetivo maior, é preciso perseguir, com interesse e dedicação, os objetivos específicos. São eles:

Porém, nessa trajetória, não se esqueça de que você está recebendo uma formação docente. Isso que dizer que está sendo preparado com habilidades e competências necessárias para ser um professor. E como tal, precisa saber como aprender, por meio da pesquisa; como ensinar, por meio das metodologias adequadas, e como aplicar, na prática, seus conhecimentos. Dessa forma, você atenderá à principal demanda do ensino superior, que se resume no tripé Ensino, Pesquisa e Extensão. Portanto, desde agora, você deve buscar, nesse curso, todos os meios que impulsionem sua aprendizagem e o qualifiquem a ser um bom professor.

Então, vamos navegar? Mas é claro que, para navegar, precisamos de um “mapa”. Portanto, vamos traçar nosso próprio “roteiro de navegação”. Como assim? Vamos descrever, passo a passo, nossa rota.

Esse módulo possui a carga horária total de 50 horas de aula, distribuídas em duas unidades. Cada uma delas aborda um aspecto importante de sua formação como professor no trato com a língua materna, o português, nos diferentes contextos sociais que a envolvem.

Nesta introdução, chamada por nós de “roteiro de viagem”, estamos tratando dos itens relativos ao próprio percurso do módulo: o que ele aborda, quais os seus objetivos, suas temáticas e como vai funcionar.

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Na Unidade I: Nas Teias da Tela

A produção do conhecimento em meios digitais, iremos focalizar o novo contexto de produção e aquisição do conhecimento na sociedade atual, destacando o papel das mídias para a construção coletiva do conhecimento. Nessa unidade, abriremos espaço para a discussão sobre as novas formas de escrita na sociedade tecnológica e o volume de informação produzida nesse contexto, levantando uma discussão a respeito do letramento e da inclusão digital. Desta forma, buscaremos abrir espaço para uma reflexão sobre a necessidade de alcançar certo nível de leitura e produção escrita numa sociedade letrada como a nossa.

Unidade II: Gêneros Textuais

Você poderá desenvolver noções de textualidade, elaborando concepções de leitura e escrita e se familiarizando com diversas modalidades e naturezas de gêneros textuais em suas práticas sociais. Aqui você estudará as diferentes modalidades da linguagem no texto e na tela, vivenciando experiências de leitura que lhe mostrarão as múltiplas faces do discurso na sociedade contemporânea.

Balão: bem, agora que chegamos ao fim deste “roteiro de viagem”, tente elaborar seu próprio plano de navegação dentro deste primeiro módulo do curso. Estabeleça suas metas com objetivos práticos, por etapas, e aproveite ao máximo essa oportunidade de crescimento! Vamos, então, navegar? Pegue seu mapa e siga em frente!

Unidade I: Nas Telas da Tela – A Produção do Conhecimento em Meios Digitais

1.1 Ao Mar Largo

Iniciamos nossa conversa traçando um roteiro de viagem. Agora, vamos nos lançar ao mar largo! Nesta unidade, iremos discutir os fatores que determinam como se produz e se difunde o conhecimento na sociedade tecnológica atual, considerando-se a função das mídias, impressa e digital, não somente como veículos de socialização do saber, mas também enquanto formadoras de opinião.

Você terá acesso aos textos-base e complementar dessa temática, além de outros canais de pesquisa e aprofundamento de seus conteúdos em diferentes canais de informação. Fique atento e prepare-se para novas descobertas. Ao final desta unidade, você receberá orientações sobre como proceder quanto a seus estudos. Vamos conduzi-lo nisso. Então, vamos ao nosso texto-base?!

Texto-base: Aquisição e produção de conhecimento na sociedade tecnológica

Cena Urbana

"Cibele pulou cedo da cama. O cheiro do café, exalado pela cafeteira digital invadira seu quarto, antes mesmo de o celular despertá-la com seu bip costumeiro. Mamãe já se agitava na cozinha, programando o microondas para o jantar (pois ninguém vinha em casa para o almoço), pondo a roupa na maquina de lavar-secar e acionando o computador-central que dirigiria todas as tarefas de limpeza da casa durante o dia. Escova-elétrica na mão, fez sua higiene pessoal. Depois, tomou seu café e pegou rapidamente seu laptop para sair, como sempre, apressada para o colégio. Tinha que chegar antes à sala de aula e concluir a pesquisa que iniciara à noite passada na Internet. Era sobre as artes visuais na era da informática. Beijou a mãe e saiu correndo...”

Esse poderia ser o relato do dia-a-dia de uma família padrão da sociedade, daqui a poucos anos. Cibele, uma menina da cidade, entre seus 14 e 15 anos, cercada pelo conforto material e pelas facilidades de acesso ao conhecimento, possibilitados pelo desenvolvimento da telemática e da cibernética, (Inserir links com um conceito esclarecedor dos termos), é uma aluna privilegiada. No entanto, todo esse conforto e facilidade têm seu preço, e já começamos a perceber que a sociedade tecnológica tem compromissos bem maiores que seus privilégios.

TELEMÁTICA: Ciência que trata da manipulação e da utilização da informação através do uso combinado de computador e meios de telecomunicação (AURÉLIO, 1986, p. 1658)

CIBERNÉTICA: Ciência que estuda as comunicações e o sistema de controle não só nos organismos vivos, mas também nas máquinas (AURÉLIO, 1986, p. 402)

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A sociedade contemporânea orgulha-se de ser a “sociedade do conhecimento”, pois em nenhuma outra época da história o mundo produziu tanto em todas as diversas áreas da ciência e, sobretudo, jamais obteve tanto sucesso na difusão desse saber. A Renascença foi, sem dúvida, uma época promissora, com gênios na esteira de Galileu e Da Vinci. No entanto, o alcance do saber produzido era restrito a poucos eleitos. Hoje podemos constatar que o acesso à produção e à aquisição do conhecimento no mundo dito “globalizado” é quase imediato. O volume de informações veiculadas nos suportes de comunicação de massa e principalmente pela internet é insuperável por qualquer outra civilização. E um dos aspectos mais relevantes desse processo de crescimento que você acaba de acionar (para usar uma linguagem telemática) é exatamente desvendar a estreita relação entre o ser e o saber no mundo da tecnologia.

1.2 Letramento e Inclusão Digital

Para compreender melhor como se processa o conhecimento na sociedade contemporânea, é necessário discutir as noções de letramento e inclusão digital. Vamos começar, portanto, com as concepções de letramento, uma vez que não buscamos aqui um conceito fechado, pois o termo é polêmico e abrangente. Dentre os possíveis conceitos, eis alguns deles:

Segundo Kleiman (1995, p. 19), “podemos definir hoje o letramento como um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”

Nessa concepção, podemos destacar algumas expressões-chave: “práticas sociais”, “sistema simbólico”, “contextos específicos”. Tais expressões nos ajudam a compreender que os textos produzidos em nosso cotidiano carregam os traços das próprias convenções da sociedade, incluindo os da escrita, e dependem de contextos dados previamente. Portanto, ler numa sociedade letrada é muito mais que decodificar uma escrita.

Letramento é uma tradução para o português da palavra inglesa “literacy”, que pode ser entendida como “a condição de ser letrado”. Assim, um indivíduo alfabetizado não é necessariamente um indivíduo letrado. Alfabetizado é aquele indivíduo que sabe ler e escrever; letrado é aquele que sabe ler e escrever, mas que responde adequadamente às demandas sociais da leitura e da escrita. Alfabetizar “letrando” seria, portanto, ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita. Dessa forma, o aluno deve ser alfabetizado e letrado.

A linguagem, como fenômeno social, estrutura-se de forma ativa e grupal do ponto de vista cultural e social. O letramento é um fator importante no processo de inserção numa cultura letrada como a nossa. Sendo assim, esclarece Leda Tfouni (1995, p. 20), “enquanto a alfabetização ocupa-se da aquisição da escrita por um indivíduo, ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade”. E esse é o diferencial entre ser apenas alfabetizado em certo código (língua) e ser letrado. Vamos explorar mais esse assunto.

Ainda segundo Tfouni (1995, p. 20), letramento são as consequências sociais e históricas da introdução da escrita em uma sociedade, “as mudanças sociais e discursivas que ocorrem em uma sociedade quando ela se torna letrada”.

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Portanto, como você percebeu, em ambas as autoras, o núcleo do conceito de letramento são as práticas sociais de leitura e de escrita, para além da aquisição do sistema de escrita, ou seja, para além da alfabetização.

Para Magda Soares (1998b), letramento é o estado ou condição de indivíduos ou de grupos sociais de sociedades letradas que exercem efetivamente as práticas sociais de leitura e de escrita, participando competentemente de eventos de letramento.

Um evento de letramento é “qualquer situação em que um portador qualquer de escrita é parte integrante da natureza das interações entre os participantes e de seus processos de interpretação”. (HEATH, 1982, citado por SOARES, 2002, p. 3) Parece complicado? Mas não é não. Vamos utilizar um exemplo.

Você poderia agora estabelecer a diferença entre os conceitos de alfabetização e letramento?

O que seria necessário para alguém conseguir ler esse texto, que é uma charge?

Deu para perceber, com esse exemplo, que não basta “saber decifrar letras e palavras” para entender um texto em seu contexto?

Então, considerando que letramento designa o estado ou condição em que vivem e interagem indivíduos ou grupos sociais letrados, pode-se supor que as tecnologias de escrita, instrumentos das práticas sociais de leitura e de escrita, desempenham um papel de organização e reorganização importante desse estado ou condição.

1.3 Ciberespaço: os espaços da escrita na era digital

Diante do que vimos até agora, é possível distinguir alguns espaços da escrita na sociedade atual. Espaço de escrita, na definição de Bolter (1991, citado por SOARES, 2002, p. 6), é “o campo físico e visual definido por uma determinada tecnologia de escrita”. Todas as formas de escrita são espaciais, todas exigem um “lugar” em que a escrita se inscreva/escreva, mas a cada tecnologia corresponde um espaço de escrita diferente.

Há estreita relação entre o espaço físico e visual da escrita e as práticas de escrita e de leitura. O espaço de escrita relaciona-se também com os gêneros e usos de escrita, condicionando as práticas de leitura e de escrita, sobretudo, as relações entre escritor e leitor, entre escritor e texto, entre leitor e texto.

Pierre Lévy (1993) inclui as tecnologias de escrita entre as tecnologias intelectuais, responsáveis por gerar estilos de pensamento diferentes; para ele, as tecnologias intelectuais não determinam, mas condicionam processos cognitivos e discursivos.

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Assim, há uma inegável diferença entre a escrita linear e analógica dos leitores do livro, ou seja, da página impressa, e a dinâmica e dialógica, feita pelos internautas de hoje na tela do computador. Neste, tanto a noção de autoria quanto a de leitor se modificam pelas próprias condições da interatividade envolvida. No computador, o espaço de escrita é a tela, ou a “janela”, ao contrário do que ocorre quando o espaço da escrita são as páginas do papel.

A escrita na tela possibilita a criação de um texto fundamentalmente diferente do texto no papel, o hipertexto que é, segundo Lévy (1999, p. 56), “um texto móvel, caleidoscópico, que apresenta suas facetas, gira, dobra-se e desdobra-se à vontade frente ao leitor”.

O texto no papel é escrito e é lido linearmente, seqüencialmente – da esquerda para a direita, de cima para baixo, uma página após a outra; o texto na tela — o hipertexto — é escrito e é lido de forma multilinear, multi-seqüencial, acionando-se links ou nós que vão trazendo telas numa multiplicidade de possibilidades, sem que haja uma ordem predefinida.

A dimensão do texto no papel é materialmente definida: identifica-se claramente seu começo e seu fim, as páginas são numeradas, o que lhes atribui uma determinada posição numa ordem consecutiva – a página é uma unidade estrutural.

Ontem, o texto era escolar, hoje ele é a própria sociedade. Ele tem forma urbanística, industrial, comercial, televisiva ou hipertextual (PARENTE, 1999). Por isso é preciso maior reflexão sobre as mudanças técnicas e lingüísticas que ancoraram a construção social de diferentes tipos de cultura: a cultura oral, a escrita e a cibernética.

Portanto, é preciso admitir, juntamente com Lévy, que essas novas modalidades de texto e discursos construídos pela tecnologia digital fizeram emergir também novas formas de raciocínio e cognição. Há que se ressaltar aqui, entretanto, que a noção de texto abordada no curso de Artes Visuais não se limita ao texto escrito, uma vez que a mesmo uma palavra isolada pode assumir seu papel de imagem, como ocorre naturalmente com as marcas (Nike, Coca-Cola, Sadia) e nos poemas visuais da arte moderna. Uma tela de Van Gogh é também um texto, como também uma escultura de Rodin, uma sonata de Mozart e as pinturas rupestres (de cavernas), feitas pelo homem primitivo como narrativas de seu dia-a-dia. Estamos caminhando agora para o final de nosso texto. Mas antes de concluirmos, faz-se necessário refletir um pouco sobre as conseqüências práticas do que foi exposto aqui.

Vamos distinguir o que poderíamos chamar de demandas de letramento, ou seja, quais são as solicitações exigidas ao leitor comum na sociedade moderna e, diante disso, quais são os novos desafios da formação docente. Para isso, é preciso considerar, pelo menos, os seguintes pontos:

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Pense agora: As vivências de leitura e escrita proporcionadas pelas instituições de ensino são satisfatórias para o desempenho das funções dos acadêmicos e futuros profissionais desse novo mundo?

1.4 Encerrando nosso papo

Assim, caro estudante, chegamos ao final do nosso primeiro texto e apenas ao começo de nossas reflexões. O letramento é um tópico instigante e complexo de nosso estudo, pois muitos são os fatores envolvidos, inclusive o próprio nível de letramento de vocês mesmos, acadêmicos da Licenciatura em Artes Visuais.

Portanto, está posto diante de todos nós o desafio: encarar a tarefa do auto-aprendizado e da formação docente. Para isso, é necessário explorar as potencialidades de cada um e reconhecer as limitações que devem ser superadas. O exercício da leitura e da reflexão constante do processo de ensino-aprendizagem nesse curso e fora dele é um caminho possível. Vamos, então, assumir com garra essa tarefa! Importante; Reserve tempo para leitura dos textos-base e complementar. Faça pesquisas em outras fontes!

Textos para consulta

KLEIMAN, A. “Modelos de Letramento e as Práticas de Alfabetização na Escola.” In: KLEIMAN, A. (Org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado de Letras, 1995, p. 15-61.

LÉVY, P. As Tecnologias da Inteligência: O Futuro do Pensamento na Era da Informática. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993.

_____. Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 1999.

PARENTE, André. O Virtual e o Hipertextual. Rio de Janeiro: Núcleo de Tecnologia da Imagem/ECO-UFRJ, 1999.

SOARES, Magda. Letramento: Um Tema em Três Gêneros. Belo Horizonte: Autêntica,1998.

TFOUNI, L.V. Letramento e Alfabetização. São Paulo: Cortez, 1995.

Unidade II: Gêneros Textuais – A Produção de Texto como Prática Social

2.1 Complementando a Rota

Na primeira unidade desse módulo, você teve contato com importantes conceitos para compreender o processo de produção e aquisição do conhecimento numa sociedade letrada e tecnológica. Até aqui, você familiarizou-se com o novo contexto de circulação de ideias do mundo tecnológico e percebeu a necessidade, cada vez mais premente, de atender às demandas de letramento que a sociedade atual exige para a efetivação de sua aprendizagem.

Agora, vamos ver, na prática, como isso acontece. Vamos explorar os diferentes gêneros textuais difundidos pelos diversos meios de comunicação de massa, a exemplo de um e-mail, um blog, um diário, sua agenda ou a lista de compras de supermercado. Você ficará surpreso com a gama de textos que vai encontrar e com os múltiplos fatores que envolvem a produção deles no meio social.

Convém lembrar que, nesse curso, estamos trabalhando com uma noção muito mais ampla e completa de texto, não se restringindo esse à produção escrita, mas integrando também às expressões orais e imagéticas. Vamos, então, começar por esse tópico.

2.2 Noções de textualidade: concepções de leitura e escrita

“Texto”, palavrinha curiosa que se origina do latim textum, cujo significado é “tecido, entrelaçamento...”. O texto resulta de um trabalho de tecer, de entrelaçar várias partes menores a fim de se obter um todo inter-relacionado. Decorre disso a ideia de “textura ou tessitura” de um texto; isto é, a rede de relações que garantem sua coesão, sua unidade. (INFANTE, 1991). Assim, o texto conjuga todos os termos ligados à construção elaborada de uma rede, na qual cada fio tem sua função, e o arranjo dos elementos conspira para um produto final predeterminado! Não é sem razão que o sistema www (world wide web) fundamenta-se nessa noção tão complexa e intrincada de “rede”!

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Exemplar da obra de Camões – poeta Português do séc. XVI
Composição com vermelho, amarelo, azul e preto. (PIET MONDRIAN, 1921)

E agora que você faz parte dessa grande teia, vamos discutir juntos algumas noções de textualidade. Das representações abaixo, qual delas você identificaria como texto?

Palavras listadas num papel
O terapeuta (MAGRITTE, 1941)
Sonho causado pelo vôo de uma abelha.. (DALÍ, 1941)

Tente justificar sua resposta. Partindo de que critérios você defenderia sua escolha? Ou melhor: o que é necessário minimamente para se considerar uma representação verbal ou visual como texto?

Pelo que você pode perceber nesse pequeno exercício, não é suficiente apenas um amontoado de palavras ou imagens para que haja um texto. É necessário primeiro que ess texto “faça sentido”, ou mesmo, “sentidos”. A capa de um livro ou uma tela abstrata de Mondrian obedece a certa ordem, a um arranjo que confere um significado a essa representação. As palavras escritas na folha de papel, embora isoladamente signifiquem algo em nossa língua, não fazem qualquer sentido juntas. Desta forma, não constroem um texto, pois não há conexões possíveis de alcançar um significado.

Diante disso, talvez você questione por que certos textos parecem fazer questão de “não fazer sentido”, como ocorre no poema moderno ou nas telas surrealistas de pintores como Magritte e Dali. Nesses casos, os objetos familiares são facilmente reconhecidos por nós: gaiolas e pássaros, um chapéu, a manta vermelha ou a bengala do terapeuta de Magritte; o corpo nu do modelo feminino, tigres raivosos, o peixe dourado, a abelha e a romã, no quadro de Dali. No entanto, o contexto no qual estão insertos é completamente insólito, ou seja, não faz sentido!... Mas aqui existe uma intenção (re)veladora da falta de sentido. E é esta que dá sentido à obra!! Parece complicado? Não é tanto assim. É como acontece com os contos de fadas: a presença de animais fantásticos, de ogros, gigantes e bruxas, num cenário surreal, não nos causa estranhamento, pois já sabemos de antemão que estamos no terreno do “maravilhoso”, onde tudo pode acontecer! Nesse contexto, até o insólito faz sentido. Como nas telas de Dali, que nos reportam às imagens de sonho, “naturalmente” desconexas e estranhas!

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Um texto não é simplesmente uma sequência de frases isoladas, mas uma unidade linguística com propriedades estruturais específicas.(KOCH, 1989. p. 11)

Assim, um texto é também um evento comunicativo em que convergem as ações linguísticas, cognitivas e sociais, e não apenas a sequência de palavras que são faladas ou escritas. (BEAUGRANDE, 1997)

Como você já deve ter percebido, a leitura e a compreensão de um texto verbal ou escrito envolve muito mais que a simples capacidade de reconhecer o código linguístico, mas a habilidade de perceber as várias conexões do contexto sócio-cultural gerativo daquele texto em dado momento, ou seja, interpretar as condições de produção de um texto.

Você vai compreender bem tudo isso quando descobrir alguns aspectos dessas condições de produção do texto, ou seja, todos os fatores que envolvem sua elaboração, socialização e recepção por parte do público-alvo. Para isso, vamos estudar de perto os gêneros textuais ou gêneros do discurso: a natureza, a estrutura, os aspectos formais, a função social de cada um deles e, obviamente, as condições de produção e recepção desses gêneros. Com certeza, vai ser interessante!

Atividade

Veja o quadro abaixo e, depois de uma breve pesquisa exploratória em revistas, jornais e mídias (TV, rádio e internet), faça um levantamento das condições de produção de texto de dois desses gêneros apresentados (ex: jornalísticos x escolares). Compare as situações, estabelecendo as peculiaridades de cada um deles. Para isso, considere os fatores: emissor (quem escreve), receptor (para quem escreve), referente (assunto), mensagem (conteúdo), linguagem, suporte (mídias impressa ou digital), intenções do emissor, etc.

Bom exercício!

Quadro de esferas de atividade e gêneros de discurso na sociedade.
FONTE: ROJO, BARBOSA e COLLINS, 2006, p. 116.
GÊNERO
Cotidiano Chat
Fórum
Blog
Jornalístico Notícia
Reportagem
Artigo de Opinião
Escolares e Científicos Verbete
Relatório
Resumo
Resenha
Artigo Científico
Burocráticos Formulário
Perfil
Cadastro
Literários Poema
Letra de Canção
Paródia
Conto
Romance
Outras Linguagens Música Pop
Pintura
Escultura
Artes Digitais

Cada um desses gêneros, em seus diferentes contextos, apresenta condições específicas de produção e recepção, isto é, obedecem a certas “regras” de elaboração, mais ou menos rígidas, de acordo com o nível de exigência de cada um desses contextos. Assim, numa situação mais formal do discurso, a exemplo de uma palestra, uma aula ou na produção de um texto escolar ou artigo científico, as “regras” são mais rígidas, visto que a linguagem se volta para a norma padrão de escrita. Por outro lado, em se tratando de uma conversa no barzinho, na caminhada, num chat com amigos ou na escrita de um e-mail, praticamente não há regras, pois a linguagem será livre, mais próxima do modelo coloquial da fala. Podemos dizer, por analogia, que nossa linguagem é como a roupa que usamos: há sempre uma apropriada para cada ocasião.

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É por esse motivo que você, como futuro professor de Artes Visuais, precisa se familiarizar com essas formas de atuação discursiva numa sociedade letrada como a que vivenciamos hoje, conduzindo também seus futuros alunos no caminho do letramento. Ontem, o texto era escolar, hoje ele é a própria sociedade. Ele tem forma urbanística, industrial, comercial, televisiva ou hipertextual. (PARENTE, 1999).

Dessa forma, a sala de aula tornar-se-á um ambiente, no qual estudantes analisam sua realidade para o propósito de participar em suas transformações. O professor poderá levantar problemas para compartilhar e comparar experiências, analisar causas, origens e explorar estratégias para mudanças. Assim, o conhecimento, ao invés de ser “transmitido” de professor para aluno, é colaborativamente construído, envolvendo a transformação dos papéis tradicionais professor-estudante.

2.4 Concluindo nosso estudo

Então, como você percebeu nessa unidade, enquanto futuro professor de Artes Visuais, você precisa criar estratégias interessantes de leitura, apreciação e produção, em mídias digitais e impressa, de linguagens verbal, musical e visual (imagens estática e em movimento), de enunciados em gêneros literários (poemas, letras de canção, entre outros), musicais e obras visuais (artes plásticas, digital e gráfica), dentro das especificidades de sua área, numa proposta inter e/ou multidisciplinar.

Essa é, sem dúvida, uma tarefa desafiadora, mas bem possível de ser realizada. Por enquanto, tome nota em seu “diário de bordo” sobre os temas que lhe chamaram atenção nesse módulo, reunindo material para futuras pesquisas, quem sabe até para seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), que pode ser voltado para os aspectos didático-pedagógicos de sua formação. Organize seu tempo, verifique seus “instrumentos de navegação”, trace sua rota e prepare-se para essa empreitada!

E boa viagem!


Referências bibliográficas

ARANTES, Marilza Borges. Gêneros Discursivos: Prática Pedagógica para Conscientização do Contexto Sócio-Cultural do Educando. Uberlândia: UFU, 2006. (CD-R/SILEL 2004)

LÉVY, P. As Tecnologias da Inteligência: O Futuro do Pensamento na Era da Informática. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. “Gêneros Textuais: Configuração, Dinamicidade e Circulação”. In: KARWOSKI, Acir Mário et al. Gêneros Textuais: Reflexões e Ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006.

PARENTE, André. ,O virtual e o Hipertextual. Rio de Janeiro: Núcleo de Tecnologia da Imagem – ECO-UFRJ, 1999.

ROJO, Roxane.; BARBOSA, Jacqueline Peixote; COLLINS Heloisa. “Letramento Digital: Um Trabalho a Partir dos Gêneros do Discurso”. In: KARWOSKI, Acir Mário et al. Gêneros textuais: Reflexões e Ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006.