Rodrigo Bastos Daude (UEG)
daude10@hotmail.com

Gabrielle Correia Silva dos Santos (UEG)
gabriellerepre2a2015@gmail.com

Um Diálogo entre a Profissionalização e Proletarização no Trabalho Docente

388

Resumo

Este trabalho é dos requisitos finais da disciplina trabalho docente: teoria e produção do conhecimento do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Goiás. Foi exigido um levantamento bibliográfico, em caráter ensaístico, que colocasse em evidência aspectos do trabalho docente, assim surge a temática de profissionalização e proletarização docente. Preocupado com a (des)valorização do trabalho do professor na sociedade moderna, o objetivo deste se concentra em realizar um paralelo entre estes dois conceitos e evidenciar que o trabalho docente conserva diversos aspectos que não permite falar em proletarização, nem profissionalização, surgindo a categoria de semiprofissões. Para este movimento a pergunta da pesquisa: De que maneira se dá a relação entre profissionalização e proletarização concernente ao trabalho docente? Permitiu admitir a profissionalização compreendido como autonomia sobre o processo de trabalho e proletarização como subordinação, perca do domínio sobre o processo de produção, e entre ambiguidade e antagonismo, o termo mais correto seria ambivalência entre proletarização e profissionalização. Utilizamos os estudos de Fernández Enguita (1991), Hypolito (1997), Vasconcelos (2004), Tumolo; Fontana (2008), para discutir a tese da existência de ambiguidade entre proletarização e profissionalização. Desta forma reforçamos a luta do docente em prol da profissionalização e uma série de benefícios, com melhores salários e condições de trabalho, prestígio social e autonomia e antes de referir a categoria docente como profissional ou proletário, na deveríamos tratar como semiprofissão ou semiproletário e ao assumir o sentido positivo, semiprofissões esclarece se bem a maneira que se dá a relação profissionalização e proletarização no trabalho docente.

Palavras-chave: Trabalho docente. Proletarização. Profissionalização.

Introdução

Tomar conta da temática proposta neste ensaio não é uma tarefa simples, visto que tratam de conceitos como profissionalização e proletarização, variáveis no tempo e espaço. A principal questão deste trabalho é entender de que maneira se dá a relação entre profissionalização e proletarização concernente ao trabalho docente.

Tão logo objetivamos realizar um paralelo entre estes dois conceitos a partir da literatura predominante sobre o tema. Ao tratar desses temas relacionados ao trabalho docente, tomamos a proletarização como a falta de condições de trabalho, rebaixamento de salários e queda de prestígio social, e a profissionalização como processo “aparentemente” oposto no âmbito social e ocupacional do trabalho docente.

A relevância deste tema fica caracterizada a partir da necessidade de discutir um tema que tem tido repercussão no atual contexto moderno da sociedade, de qualificação dos sujeitos para o mundo do trabalho e exigência de posicionamento crítico frente ao mundo social. E a escola, bem como o professor tem uma grande responsabilidade nesta tarefa. Ambos têm características específicas deste a existência do modo capitalista de produção social, porém a profissão professor não ganhou todos os elementos concernente a profissionalização como prestigio social, bons salários e controle sobre o trabalho. Destes elementos, o que se vê no trabalho docente, é o controle sobre os meios e fins de sua atividade.

Para isto, este ensaio, buscou em Fernández Enguita (1991), Hypolito (1997), Vasconcelos (2004), Tumolo; Fontana (2008), a tese da existência de ambiguidade entre proletarização e profissionalização. Na análise desta ambiguidade, admite-se que “A presença de mecanismos profissionalizantes interrompe a proletarização, e o contrário também é válido” (HYPOLITO, 1997, p. 21). Assim nos referimos a estas duas categorias que tomam caminhos diferentes, por vezes contraditórias, mas acima de tudo ambivalentes.

389

Análise Histórica do Trabalho Docente: Processos de Profissionalização e Proletarização

A discussão inicia-se separando dois movimentos que caracterizaram o magistério nos últimos cinco séculos, ora sob a tutela da igreja, ora sob os desígnios do estado moderno. Concernentes a estes dois polos algumas ideias transitam na esteira da história e ainda permanecem, no primeiro emergem termos como sacerdócio, doação, vocação, no segundo liberalismo e profissionalização.

Enquanto encargo da igreja, segundo Franca (1952), o ensino esteve alicerçado na escolástica tendo como método pedagógico a Ratio Studiorum tendo os próprios padres os professores. A esta época ‘aquele que ensinava’ eram os membros da igreja, que professava a fé, tendo um vínculo religioso, de fé com a igreja que dominava os recursos científicos e econômicos.

Em consonância ao pensamento explicitado, destaca-se que na visão de Hansen (2000), a escolástica perdera seu predomínio a partir da ruptura cartesiana e o movimento protestantista. Contudo, a organização administrativa e pedagógica continuara até meados do século XVIII com a intensificação das atividades das Companhias dos Jesuítas (HANSEN, 2000).

Para Hypolito (1997) foi apenas a partir da sociedade moderna e burguesa que o estado toma dianteira nas ações e mediações com os indivíduos em todas as esferas da vida. A religião não foi mais o elemento organizatório da vida social, conforme afirma Resende (2003), prevaleceram os contratos e princípios jurídicos.

Nesse momento de cisão social, o ato de ensinar também passou a ser exercidos por leigos que ainda deveriam fazer uma profissão de fé e para estes estava latente a ideia de magistério como vocação e sacerdócio. Porém, o discurso liberal (da liberdade de vender sua força de trabalho) exigia pessoas que saiba ler para atuarem nas indústrias e há uma demanda de escola para além do que a igreja e os leigos associados a ela conseguiriam fazer.

O liberalismo exigia maior desenvolvimento técnico-profissional na formação escolar e não apenas uma profissão de fé. Vasconcelos (2004, p. 60) resume afirmando que:

É nesse contexto que se constrói a gênese da escola moderna, cujo objetivo era de cuidar da formação e da educação das crianças, com concepções e atuações diferentes daquelas dos espaços de escolarização que existiam na Idade Média, como a escola religiosa dos mosteiros, a escola cavalheiresca, as escolas das corporações de ofício, cujos propósitos não eram esses.

Também ao Estado não interessava mais esta tutela da igreja, esta passagem mostra aos poucos um corpo educacional dito profissional. A maior justificativa para retirar das mãos da igreja a responsabilidade pelo ensino era a necessidade de maior desenvolvimento profissional.

Porém esta mesma sociedade que foi revolucionária na mudança do modo de produção, com relação ao sistema educacional se torna conservadora. Hypolito (1997), salienta que retirou a prerrogativa das mãos da igreja, contudo manteve o ideário religioso do paroquialismo, de vocação da docência e sacerdócio. Isto acarretou o que Fernández Enguita (1991) chama de ambiguidade da docência, entre profissionalização e a proletarização.

390

Sobre este assunto a tese que se sustenta é a de que existe uma ambiguidade entre proletarização e profissionalização. Esta afirmação pode ser notada em Fernández Enguita (1991), Hypolito (1997), Vasconcelos (2004), Tumolo; Fontana (2008). Logo entender este processo contraditório é tarefa deste ensaio.

Na maioria das profissões o processo de profissionalização acarretou uma série de benefícios com melhores salários e condições de trabalho, prestígio social e autonomia, já para a carreira docente isto não ocorreu. Isto fica claro na pesquisa de Hypolito (1997), que usando Kreutz (1985, 1986), Arroyo (1985a), afirma que o professor como membro de uma comunidade paroquial “[...] detinha prestigio social, autonomia e controle sobre seu trabalho” (p. 21). Estas características vão sendo perdidas quanto mais o professor se afasta da comunidade ao passo que se torna profissional. O Estado que agora emprega, regulamenta a profissão e paga os salários retira o controle, autonomia do professor e também da comunidade sobre a educação de seus filhos.

Para Diniz (1998) a tendência à racionalização do trabalho dos profissionais com ênfase na eficiência, preditibilidade e substituição de tecnologia humana pela não humana está presente nas organizações de grande parte desta sociedade. E os profissionais aí inseridos são tomados por processos de desprofissionalização e perda de bases que sempre se assentaram, como autonomia, independência sobre os clientes e prestação de serviços.

Analisando por esta ótica e com o distanciamento histórico percebe-se que o discurso da profissionalização foi um agravo para a carreira docente. Fernández Enguita (1991) traz a competência, vocação, licença, independência e auto-regulação como características para definir uma profissão ou um profissional.

A partir deste autor entendemos a competência quando o profissional supõe-se tecnicamente competente em um campo de conhecimento do qual estão excluídos os que não o são; a vocação pela ideia de serviço a humanidade; a independência pela demarcação de um campo exclusivo reconhecido e protegido pelo Estado; tendo na licença dupla autonomia no exercício de sua profissão (frente as organizações e aos clientes); por fim a auto-regulação, como profissão que regula a si mesma por meio de um código ético e deontológico, com base na identidade e solidariedade grupal.

No caso da carreira docente, em seu campo de atuação a educação, qualquer pessoa considera-se competente a opinar, por não reconhecer o conhecimento do professor como sagrado, ou até mesmo a ser professor, o que desmerece, desprestigia a formação e carreira docente mesmo que esta seja reconhecida. Este processo ficou mais latente quando da abertura ao ensino propiciada com o liberalismo.

Conforme Hypolito (1991), retirado em Kreutz (1986), na gênese do termo professor, está à profissão de fé. Adjetivos como vocação e doação são recorrentes para o professorado. Diferentemente das profissões ditas liberais como medicina e advocacia que prestam um valoroso serviço a humanidade e por isto tem boa remuneração, aqui a remuneração deveria ser modesta, por seu caráter donativo.

391

A demarcação do campo de atuação do professor é parcial e esparsa. A licença é reconhecida pelo Estado, mas não é exclusiva e protegida. Isto não nos defende da intrusão, da competência alheia e não nos outorga a capacidade exclusiva de ensinar. A liberdade de vender sua força de trabalho abriu este precedente, que desta forma, vem a comprometer o prestígio e exclusividade do trabalho docente.

Ter autonomia frente as organizações e ao seu público é peça chave para a independência do trabalho do professor. Comparativamente as outras profissões ela é parcial, visto que o público atendido (alunos e pais) podem participar na gestão das escolas e estes não se sentem na posição de dependência dos professores. Por outro lado, tem autonomia nas decisões colegiadas que possa interferir em seu trabalho, pois os próprios membros delegam sobre si mesmos.

Outra questão que torna deficitário o trabalho do professor é a falta de uma ordem, código ético e de conduta. A diferença dos professores com as atividades liberais é que eles têm um conselho/ordem que “vigia” e regula as ações do profissional. Atua também na proteção da classe, no que diz respeito a competência, licença, independência.

Note que os atributos que torna um segmento profissional, ao trabalho docente é imputado minimamente. Mesmo seguindo esta tendência de profissionalização, a completude de suas características não foi incorporada para professorado. A ambiguidade no qual Fernández Enguita (1991) se refere reside neste fato, ao passo crescente da profissionalização do trabalho docente segue-se de mudanças no que diz respeito ao prestigio social, remuneração e principalmente a autonomia.

Tumolo; Fontana (2008) criticam isto afirmando ser um equívoco tratar profissional e profissionalização como sinônimos e sua descaracterização pela simples perda da autonomia. Neste caso deve-se tomar a profissionalização como processo, este é o mais correto.

Neste processo, Diniz (1998) coloca que o conhecimento técnico altamente especializado do profissional, ou seja, sua expertise, por sua relevância e escassez se põe como o maior obstáculo a alienação técnica. Contudo na sua ausência uma miríade de alienações leva ao surgimento da condição proletária.

Para Diniz (1998) a tendência à racionalização do trabalho dos profissionais com ênfase na eficiência, preditibilidade e substituição de tecnologia humana pela não humana faz parte das organizações de grande porte da sociedade capitalista. Os profissionais inseridos neste são tomados por processos de desprofissionalização e perda das bases as quais sempre se assentaram, como autonomia, independência sobre os clientes e prestação de serviços.

No sentido de entender como o rebaixamento do prestígio social, da remuneração e a perda da autonomia são sintomas que converge para a proletarização docente. Estas três características listadas acima que foram transformadas a partir da revolução burguesa advém de um processo de mudança de toda sociedade. Marx; Engels (1986) faz um retrato da história humana tendo como pressuposto a existência de sujeitos sempre acompanhada da necessidade de prover novas formas de sobrevivência. Isto é o que distingue homens de animais, tão logo começam a produzir seus meios de vida.

392

Assim, Marx; Engels (1986, p. 39) também afirmam que “[...] os homens devem estar em condições de viver para poder fazer história. Mas para viver, é preciso antes de tudo comer, beber, ter habitação, vestir e algumas coisas mais [...]”. Para satisfação destas necessidades estão imbricadas as relações dos indivíduos entre si, no que se refere ao material, ao instrumento e ao produto do trabalho.

Nisto, a partir do ponto de vista de Fernández Enguita (1991), aquele que vive no limite de sua sobrevivência, produzindo mais do recebe é um trabalhador proletário. Próximo a esta discussão e explicando-a, Marx (2004) refere-se ao termo estranhamento como condição deste trabalhador que não se reconhece em sua produção e no objeto, pois quanto mais o trabalhador produz menos tem para consumir.

Este trabalhador produz um excedente, um sobre trabalho, a chamada mais valia, que fica para o empregador. Este faz tudo o possível para controlar e organizar o resultado do trabalho de forma que o trabalhador não perceba que produz muito mais que recebe. Neste contexto, o agora proletário perdeu o controle sobre os meios, objetivo e o processo de seu trabalho (FERNÁNDEZ ENGUITA, 1991). Parcialmente concluímos que esta tríade caracteriza um trabalhador proletário e está presente no trabalho docente.

Diniz (1998) afirma que a tese da proletarização dos profissionais é o próprio processo de desprofissionalização e que realidade análoga ocorreu com os artesãos e depois aos operários especializados. Para a autora, usando Braverman (1977) a desqualificação do trabalhador e a degradação do trabalho é a base onde se assenta a mote do processo de proletarização dos profissionais.

Pode-se notar uma característica comum a Marx (2004), Enguita (1991) e Diniz (1998) no que diz respeito a centralidade no assalariamento para aquele trabalhador que perdeu o controle sobre os meios de produção. Marx (2004) generaliza afirmando que o salário é uma consequência imediata do trabalho alienado/estranhado.

Há que ressaltar que estas perdas se deram num período prolongado de tempo e a partir de mudanças nos modos de produção e formas de propriedade (MARX; ENGELS, 1986; MARX, 2004). Concorrendo a isto, Weber (2011) afirma que isto advém do processo de racionalização da sociedade, o mundo cada dia mais pensado, ordenado, organizado.

Pensar em que medida o trabalho docente tem sido afetado por esta dinâmica que envolve toda a sociedade é muito importante neste momento. Nesta ótica do assalariamento, citamos como exemplo a docência no ensino superior no Brasil, que na sua institucionalização na década de 1930 já nasceu como profissão assalariada (DINIZ, 1998). Enguita (1991) afirma que “[...] os docentes estão submetidos a processos cuja a tendência é a mesma para a maioria dos trabalhadores assalariados: a proletarização (p. 169)”.

Sendo mais enfático, usamos os cinco pontos que Hypolito (1997) discute para apresentar a tese da proletarização docente: choque de realidade ao ingressar no mercado de trabalho; submissão as tecnologias educacionais previamente planejadas para serem executadas; nível de organização do trabalho na escola que determina a própria prática; modificações no que se entende por qualificação (de pensante a executante); dependência do docente em relação a tecnologia educacional e determinações externas.

393

Estes cinco pontos levantados por Hypolito contribui para esclarecer como o professor em processo de proletarização perde autonomia sobre os meios, objetivo e fins de seu trabalho. Acerca desta autonomia, Braveman (1977) admite que ela é solapada quanto mais ocorre a divisão técnica do trabalho, primeiro a perda do controle, depois da autonomia.

Hypolito (1997) parte do pressuposto que o professor é um trabalhador assalariado, faz uma perspectiva de análise tomando o trabalho docente na esteira capitalista, que passa um processo de desqualificação, no qual ao final se identifica pela perda do prestigio social.

Neste raciocínio acima, de desqualificação e consequente queda de prestígio, a pesquisadora Marli Diniz (1998) buscou descobrir até que ponto os profissionais assalariados ainda preservam a totalidade de suas qualificações técnicas, o controle acerca do conhecimento e sobre o processo de trabalho. E isto pode ser também estendido aos docentes, que como em qualquer segmento trabalhista incide uma divergência entre o trabalhador e os meios de trabalho.

Não se impõe ao docente apenas sobre o que ensinar, mas o que usar para ensinar. Os livros didáticos e tecnologias educacionais definem sequência e o tempo destinado a cada conteúdo, a forma de transmiti-lo, quais exemplos podem ser explicitados. Ressaltamos que livro didático é importante, o problema é quando ele funciona como manual, um passo a passo que deve ser aplicado.

Outra problemática é quando ocorre o estranhamento do professor com relação aos objetivos da educação. O docente tem perdido progressivamente a competência de deliberar qual será o resultado de seu trabalho (FERNÁNDEZ ENGUITA, (1991); HYPOLITO, (1997)) Os livros didáticos, programas curriculares, horários pré-estabelecidos retira do professor a prerrogativa decidir o resultado.

Da mesma forma que se impõe sobre o que usar para ensinar, o como ensinar tem sido definido por todos, menos pelo professor. O processo de trabalho fica comprometido quando lhe é imposto formas de organizar as turmas, procedimentos de avaliação, critérios de disciplinas de alunos e principalmente quais métodos são possíveis.

Exposto as duas discussões conceituais que toma a temática deste ensaio, ainda temos a esclarecer qual melhor relação existente (se é que existe) entre profissionalismo e proletarização.

A discussão mais presente nos textos estudados diz respeito a proletarização, contudo esta é feita com base na profissionalização. Fernández Enguita (1991) entende existir uma relação ambígua na docência entre profissionalismo e proletarização ao tomar o último como sinônimo de menor prestígio e controle de trabalho. Em consonância com esse apontamento, Hypolito (1997) a traz como processo de assalariamento e precarização profissional, Braverman (1977), Diniz (1998) como desqualificação e degradação do trabalho.

Por outro lado, mas não muito diferente, tomamos a síntese de Tumolo; Fontana (2008, p. 164) como importante para o clareamento das diferenças entre profissionalização e proletarização.

É possível constatar que a proletarização é percebida como um processo inerente à desqualificação e precarização do trabalho docente, em decorrência das mudanças ocorridas na sociedade capitalista e, como consequência, no processo de trabalho do professor. Ao contrário da proletarização, a profissionalização é afirmada como um movimento que promove a categoria do magistério à consolidação desses trabalhadores como profissionais.
394

Não podemos erroneamente tomar todas as conceituações feitas na discussão do trabalho fabril, produtivo e não produtivo, material e imaterial nas obras de Marx e suas implicações para o que é profissionalização e proletarização do trabalho docente. Então pode-se afirmar que há características e especificidades no trabalho do professor que o faz diferente do trabalho fabril e das profissões liberais.

O rigor no uso destes termos não pode ser usado para a categoria dos docentes, ela se posiciona no intermediário entre dois polos, na chamada semiprofissões (FERNÁNDEZ ENGUITA, 1991, p. 172). Isto se explica por ainda exercerem tarefas de alta qualificação e deterem certo controle sobre seu processo de trabalho, contudo “já perderam a capacidade de determinar os fins de seu trabalho”.

Tumolo; Fontana (2008) reforça esta tese trazendo os docentes como proletário quando a padronização dos programas de ensino e currículos escolares diminui sua participação no resultado de seu trabalho, mas também como profissionais pela qualificação requerida. Seria mesmo esta uma relação ambígua? Ou de quase proletário? Ao mesmo tempo um pouco profissional?

Em suas considerações Tumolo; Fontana (2008, p. 172) critica duramente Fernández Enguita ao confundir classe proletária com classe social e caminha para negação da ambiguidade, afirmando que:

[...] profissionais (e também semiprofissionais) e proletários são duas compreensões de planos analíticos e políticos distintos. Ele não percebeu que a discussão sobre profissionais, ou categoria profissional, é referente ao processo de trabalho e que a de proletário diz respeito ao processo de produção de capital.

Nesse sentido, não cabe falar em antagonismo, por se tratar de planos diferenciados (processo de trabalho e processo de produção de capital) e principalmente os docentes que compartilha características de ambos os extremos.

Tendo os atributos, competência, vocação, licença, independência, auto-regulação são profissionais, não tendo são ocupações. Ao professor cabe ir se encaixando em parte destes elementos, ficando numa posição intermediária, o das semiprofissões.

Considerações Finais

Ao final destas reflexões podemos admitir a profissionalização compreendido como autonomia sobre o processo de trabalho e proletarização como subordinação, perca do domínio sobre o processo de produção. Termos como fragmentação, perda de autonomia são sinônimos da proletarização.

Contudo, não podemos pensá-los de um extremo a outro. Ter a obrigação de classificar o trabalho docente como profissional ou proletário. Isto porque não dá para fazer analogia direta do trabalhador da fábrica com da escola, proletário lá, proletário aqui! O melhor seria pensar em processos esparsados no tempo que caracterize uma profissionalização ou proletarização.

Antes de falar entre ambiguidade e antagonismo, o termo mais correto seria ambivalência. Ao invés de referir a categoria docente como profissional ou proletário, na concepção de Fernández Enguita, deveríamos tratar como semiprofissão ou semiproletário. Assumindo o sentido positivo, semiprofissões esclarece bem a maneira que se dá a relação profissionalização e proletarização no trabalho docente.

Referências

BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital monopolista – a degradação do trabalho no século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1977.

DINIZ, Marli. Repensando a teoria da proletarização dos profissionais. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 10(1): 165-184 maio de 1998. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v10n1/a11v10n1.pdf

FERNÁNDEZ ENGUITA, Mariano. A ambiguidade da docência: entre o profissionalismo e a proletarização. Teoria e Educação, n.4, “Dossiê: interpretando o trabalho docente”, p. 41-61, Porto Alegre, 1991.

395

FRANCA, Leonel. O Método Pedagógico dos Jesuítas. O “Ratio Studiorum”. Rio de Janeiro. Agir.1952. O Método Pedagógico dos Jesuítas - O "Ratio Studiorum" - Organização e Plano de Estudos da Companhia de Jesus. In:http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/ acervos.html

HANSEN, João Adolfo. A civilização pela palavra. In.: LOPES, Eliane Marta Teixeira et all (orgs.) 500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

HYPOLITO, Álvaro L. M. Trabalho docente, classe social e gênero. Campinas: Papirus, 1997.

MARX, K. Manuscritos Econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004.

MARX, K; ENGELS. A ideologia alemã (Feuerbach). Trad. José Carlos Bruno e Marcos Aurélio Nogueira. 5 ed. São Paulo: Hucitec, 1986.

RESENDE, Anita. C. A. O processo de individualização do homem: alienação do homem. Estudos, Goiânia, v.30, n.1, p.201-215, jan.2003.

TUMOLO, Paulo S; FONTANA, Klalter B. Trabalho docente e capitalismo: um estudo crítico da produção acadêmica da década de 1990. Educação & Sociedade. Campinas, vol. 29, n. 102, p. 159-180, jan./abr. 2008

VASCONCELOS, Maria Celi Chaves. Um estudo sobre a gênese da profissão docente. Revista Poiésis – Volume 2, Número 2, pp.57-72, janeiro/dezembro 2004.

WEBER, M. A ética protestante e o espirito do capitalismo. 4 ed. 8ª reimp. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2011. Coleção a obra-prima de cada autor.

Notas

1. Doutor em Educação (UFG); Mestre em Educação, Ciências e Matemática (UFG); Licenciado em Matemática (UEG); Docente do Curso de Matemática UEG/Campus Cora Coralina.

2. Acadêmica do Curso de Matemática UEG/Campus Cora Coralina.

3. Franca (1952).

4. Franca (1952).

5. Outras traduções tratam este termo como alienado, por exemplo: MARX, K. Manuscritos econômico-filosóficos: terceiro manuscrito. Trad. José Carlos Bruni. São Paulo: Ed. Abril, 1974. (Coleção Os Pensadores)

6. Fernández Enguita (1991) fala que o proletário perdeu o controle sobre os meios, objetivo e o processo de seu trabalho.