Esporte Educacional

Módulo 2

MÓDULO 2

Módulo 2
2.2 Esporte Recreativo

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Segundo a Política Nacional de Esporte o Esporte Recreativo ou de Lazer, é apresentado na legislação atual como “Esporte de Participação” e:

expressa, na adjetivação do conceito de Esporte, a compreensão de que em sua realização deve prevalecer o sentido lúdico, caracterizado pela livre escolha, busca da satisfação e construção, pelos próprios sujeitos envolvidos, dos valores ético-políticos a serem materializados. Ele se realiza em limites temporais e espaciais do lazer como expressão de festa e alegria. Por meio dele o ser humano só vivencia situações esportivas lúdicas e prazerosas, seja em pequenos grupos ou em multidão (BRASIL, 2005, P.25).

A rotina de vida das pessoas, principalmente as de menor renda, não permite que estas participem de atividades de lazer e recreativas. São horas em transporte público e trabalho. Quando estão em casa, a correria nas atividades de cuidado da casa e família permite no máximo algumas horas na televisão. Na maioria das vezes, as atividades de lazer são em pequenos grupos, principalmente familiares, movidos muitas vezes por falta de condições financeiras para outros programas. Assim, espaços de convivência comunitários são cada vez mais raros.

2.2.1 Liderança e Comunicação

A liderança e comunicação são habilidades importantes de serem desenvolvidas no espaço comunitário. Liderar é motivar, influenciar e comandar, e para isso a comunicação é fundamental. A comunicação eficiente no campo social é a troca de conhecimento com escuta sensível e atenta às necessidades da comunidade.

O espaço comunitário, da cidade, do bairro deve ser compreendido, dentro das políticas públicas, como espaços geográficos vivos e multifacetados. Portanto, há nestes lugares sentidos e significados diversos atribuídos pelos moradores/usuários, diferentes maneiras de uso e de pertencimento aos espaços públicos, equipamentos de esporte e lazer, às ações e serviços prestados por instituições públicas, privadas, religiosas, comunitárias e outras. Neste sentido, é importante compreender a dinâmica e as relações envolvidas no território, conversar com as lideranças comunitárias, identificar os serviços prestados à população, especialmente àqueles de caráter público e comunitário, e conhecer a percepção que a população daquela localidade tem sobre suas necessidades e anseios no que refere à política de esporte, saúde e a qualidade de vida.

Um elemento fundamental para que ações no âmbito do esporte na comunidade ocorram é fortalecer os espaços de decisão e organização coletiva. Os conselhos locais de esporte, de saúde e as organizações comunitárias são espaços importantes para que a população se envolva nas decisões, avaliações e debates em torno das necessidades sociais do bairro ou da comunidade. Neste sentido, é importante contribuir na organização destes espaços, nos seus encontros, identificando lideranças na comunidade para debater coletivamente as demandas e interesses locais. Estes dispositivos ampliam a participação dos moradores nas decisões que envolvem recursos públicos e contribuem para uma avaliação mais efetiva dos projetos e programas.

DICA

Os conselhos locais de esporte, de saúde e as organizações comunitárias são espaços importantes para que a população se envolva nas decisões, avaliações e debates em torno das necessidades sociais do bairro ou da comunidade.

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2.2.2 Escuta Sensível

As ações que envolvem o esporte na comunidade também devem se basear em uma escuta sensível, no acolhimento e nas necessidades da população. Isso quer dizer que é necessário ouvir às demandas dos moradores, acolher suas dificuldades, estar atento as suas necessidades e desejos, no sentido criar estratégias para elaborar projetos e programas que respeitem a cultura local.

A escuta sensível e o acolhimento do sofrimento e necessidades sociais dos sujeitos e sua família, sem pré-julgamentos e expectativas, são importantes para criar laços de confiança. O acolhimento auxilia na superação de ações que se estabelecem de forma normativa e impositiva, a partir de pré-conceitos estabelecidos sobre participação, desejo, corpo, esporte, performance, saúde etc. A elaboração de projetos sociais com estas características contribuem para que os moradores possam conquistar autonomia reelaborando suas dificuldades e potencialidades com apoio profissional e familiar. Além disso, podem fortalecer a relação dos sujeitos com o território onde vivem e ampliar suas maneiras de pertencimento quando envolvidos em projetos participativos, inclusivos, acolhedores e elaborados a partir da gestão democrática, como já trabalhado neste material.

2.2.3 Higiene e Saúde Pública

O termo higiene foi utilizado em um contexto histórico e político de ações do Estado brasileiro, especialmente no século XVIII e XIX, conhecidas por seu caráter autoritário e compulsório no controle social dos trabalhadores e escravos, de epidemias cíclicas e recorrentes, nas melhorias das condições de saneamento e higiene das cidades, em particular das habitações coletivas, das classes pobres consideradas “perigosas” não somente para a organização do trabalho e ordem pública, mas também no perigo de contágio (CHALHOUB, 2017).

O discurso higienista e eugênico, como já mencionado neste material, tem forte caráter moral, individualizante, normatizador e “têm a pretensão de realizar uma assepsia nesse meio físico – fonte de todas as misérias – na mesma medida em que pretendem impor-se à família, ditando-lhe uma educação física, moral, intelectual e sexual” (SOARES, 2012, p.20).

Atualmente, as políticas de saúde pública desenvolvidas no país orientam-se pelos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS foi criado em 1988, assegurado pela Constituição Federal na qual reconheceu pela primeira vez a saúde como um direito social, estabelecendo em seu artigo 196:

saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas econômicas e sociais que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988, n. p.)

De forma geral, os princípios de universalidade, igualdade e integralidade balizam o direito à saúde no país. Isto quer dizer que o direito à saúde é garantido a todos os brasileiros, sem qualquer discriminação ou preconceito; com acesso em todos os níveis de assistência, ou seja, na oferta de serviços de promoção, proteção e recuperação, garantindo uma atenção integral à saúde. Segundo a Constituição de 1988, os serviços públicos de saúde constituem um sistema único a partir de uma rede regionalizada e hierarquizada e das seguintes diretrizes organizacionais: descentralização, atendimento integral e participação da comunidade (BRASIL, 1988).

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Nos últimos anos alguns programas e projetos públicos foram desenvolvidos por diferentes setores como esporte, saúde e educação, com interfaces com a mobilidade urbana no fortalecimento do transporte público e apoio ao ciclista, saúde e qualidade de vida. Áreas nas quais a Organização Mundial de Saúde vem reconhecendo como fundamentais no âmbito das políticas públicas. A recente inserção de profissionais de Educação Física no SUS coloca para o campo profissional o desafio de articular políticas públicas intersetoriais que ofereçam ações e projetos no âmbito do esporte, lazer, saúde e educação como o Programa saúde na escola, Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB) e Academia da Saúde. O reconhecimento destes programas e serviços no território é de suma importância para o profissional de Educação Física que trabalha com o esporte educacional e inclusivo, pois contribui para fortalecer as iniciativas em andamento; não sobrepor ações e projetos já existentes; articular propostas ampliando ações em diferentes temáticas, grupos sociais, faixas etárias e períodos do dia/noite; e avaliar de forma participativa as demandas e necessidades da população a partir dos princípios da gestão democrática já trabalhados anteriormente neste material.

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Os princípios e pressupostos que alicerçam o trabalho do profissional de Educação Física nos programas e serviços citados anteriormente pautam-se, de maneira geral, na Política Nacional de Promoção da Saúde (2006) e nas Diretrizes do NASF (2009). “A promoção da saúde consiste em um conjunto de estratégias e formas de produzir saúde, no âmbito individual e coletivo, visando atender as necessidades sociais de saúde e a melhoria da qualidade de vida” (MALTA et al., 2018). São materiais importantes de serem conhecidos e estudados porque expressam certo avanço do campo da Educação Física na direção de uma perspectiva de saúde ampliada, como direito social e vinculada à produção da vida em sociedade. Essa aproximação vem ganhando força na área a partir dos estudos da Saúde Coletiva e é muito importante que esse debate seja incorporado ao campo do esporte e do lazer, o que ocorre de forma tímida.

Para finalizar essa pequena introdução dos debates mais recentes do campo da Saúde Pública, gostaríamos de chamar atenção para o vínculo histórico que esporte e saúde carregam, especialmente, no imaginário social, mas também nas concepções de muitos profissionais de Educação Física e políticas de esporte e lazer no Brasil. É corriqueiro em jornais, internet e debates políticos relacionar o esporte como uma ferramenta para “livrar” ou “resgatar”, especialmente, as crianças e adolescentes do consumo de drogas. Esta construção faz parte de uma compreensão de que a ociosidade, em especial das classes pobres, está relacionada a criminalidade e a drogadição. Esta forma de controle social tem herança nas políticas higienistas e eugênicas já citadas e precisa ser reelaborada a partir das perspectivas mais avançadas de saúde, esporte e lazer que resultem em uma ação mais humanizadora, inclusiva, integral e emancipatória.

TOME NOTA

Contribuições destes programas e serviços para o profissional de Educação Física que trabalha com o esporte educacional e inclusivo:

  • fortalecer as iniciativas em andamento;
  • não sobrepor ações e projetos já existentes;
  • articular propostas ampliando ações em diferentes temáticas, grupos sociais, faixas etárias e períodos do dia/noite;
  • avaliar de forma participativa as demandas e necessidades da população a partir dos princípios da gestão democrática.