Adentrei o grande salão e lá estavam todos eles: alunos, mestres e demais convidados. Eu esboçava um misto de expectativa, alegria e insegurança. Éramos todos formandos de um curso que perecia ter durado toda uma existência; e aquele momento era o mais importante de nossas vidas, pois receberíamos das mãos de nossos mestres nossa primeira missão.
Feitas as apresentações, o patrono de nossa turma deu início as designações:
— Formando Itzananohk’u, pela grandeza de suas ações, alcançadas durante os treinamentos, eu, mestre Kukulkán, com grande satisfação confio-lhe a seguinte missão: liderar uma comissão científica na recém-descoberta galáxia MZ78, durante os próximos 128 anos.
— Obrigado, oh! Grande Kukulkán. Não sou digno de tamanha generosidade — agradeceu o formando com os olhos inundados.
A cerimônia seguia lentamente, restavam apenas mais dois formandos além de mim, quando a poderosa voz de Kukulkán ecoou por todo o salão chamando pelo meu nome:
— Formando Bolon Yokte K’uh? Faça-se presente — ordenou-me o mestre com toda pressa do mundo. — Você venceu suas limitações e conseguiu se formar. Por isso confio-lhe a seguinte missão: Irás para um pequeno planeta, denominado Terra, situado no braço de Orion da Via Láctea, distante de nossa galáxia cerca de 2,54 milhões de anos-luz, na direção da constelação de Andrômeda.
Agradeci a generosidade do grande mestre, mas não pude conter o meu desespero em relação àquela missão.
Captando a minha mente em desespero, disse-me o mestre Kukulkán:
— Bolon, acalma-te a alma, pois, as dúvidas que ora lhes sufocam a mente ser-lhe-ão as bênçãos de amanhã. Embora, ainda não tenhas a permissão de saber sobre suas vidas passadas, posso lhe adiantar que o planeta terra não é um lugar estranho à sua existência cósmica. Com o tempo, durante a caminhada sobre esse jovem planeta, verás que até mesmo o nome com o qual foi batizado, nele, encontrará sentido.
Aquelas palavras trouxeram-me alívio e as incertezas deram lugar à felicidade, pois, afinal, acabara de me tornar um ilustre membro do CEPEIA — Centro de Pesquisas Intergalácticas de Andrômeda.
Vários dias se passaram desde que Kukulkán me designara, e nenhuma mensagem do CEPEIA ainda me havia chegado. De tão ansioso que estava, decidi contar estrelas para passar o tempo. Quando estava em cinco milhões quatrocentos e trinta e duas mil trezentos e trinta e nove estrelas, minha mente acessou um chamado:
— Sr. Bolon Yokte K’uh, você tem exatamente um segundo para se apresentar ao mestre Tepeu.
Cheguei alguns centésimos de segundo adiantado e me apresentei. Logo fui conduzido por alguns mensageiros intergalácticos até a sala de preparação para a jornada. Tais mensageiros se encarregam, tanto de nossa trajetória como da nossa chegada aos respectivos destinos. Assim, um dos mensageiros, chamado Ixpiyacoc, ajudou-me a acessar a ponte de lançamento. A ponte é um espaço liminar onde todas as coisas, incluindo nossas mentes, se encontram numa espécie de antiestrutura, ou seja, nada permanece ordenado da mesma maneira como acostumamos ver.
A partir daí, assumimos a forma de energia cósmica e nos tornamos seres extrafísicos.
p. 11Foi somente quando iniciamos a viagem que o mestre Tepeu a mim se apresentou.
— Saudações, Jovem Bolon Yokte K’uh. Agora podemos falar de sua missão. Antes, porém, dir-lhes-ei algumas palavras sobre os seres que atualmente habitam o planeta que lhes acolherá.
O tom de sua fala me transmitia muito conforto, e assim, ele prosseguiu:
— Bem, trata-se de seres que possuem as mesmas e incomensuráveis possibilidades encontradas nos demais seres do universo. Apesar de estarem imersos em vicissitudes, você deverá vê-los, menos como vivendo em um estágio inferior e mais como estando em harmonia com o próprio cosmo, ou seja, num infinito recriar. Entretanto, jovem Bolon — continuou Tepeu. — Os terráqueos, como se autodenominam, fazem escolhas que, na maioria das vezes, lhes impedem de compreender outras dimensões da existência. Contudo, como você poderá ver, há terráqueos que alcançam estágios de compreensão bastante elevados, apesar dos limites que seus corpos físicos lhes impõem.
Tepeu parecia conhecer profundamente os seres daquele distante planeta, pensei.
— Mas, não somos os únicos a visitar a Terra — prosseguiu Tepeu. — Há milhões de anos que este planeta vem sendo visitado por centenas de seres intergalácticos, e diversos são os propósitos que os levam até ele. Muitos visitantes, assim como nós, chegam para cumprir missões; outros são atraídos por ondas eletromagnéticas emitidas pelos próprios terráqueos quando, estes, em momentos muito especiais liberam, momentaneamente, seus corpos espirituais deixando-os vagar pelo cosmo. Neste segundo caso, Bolon, embora se trate de viagens astrais, como a que estamos realizando agora, entre os terráqueos, na maioria das vezes, seus deslocamentos se dão de maneira involuntária, podendo ser causados por situações do tipo transes, sonhos, enfermidades ou até por indução química.
Quão valiosas eram aquelas palavras de Tepeu, pensei. No entanto, ainda não mencionara absolutamente nada sobre a minha missão. Assim, continuou seus ensinamentos:
— Veja Bolon, já estamos no sistema solar, dentro do qual a Terra orbita. Você está vendo aquelas pequeninas naves? São satélites.
— Satélites?! — perguntei.
— Sim, Bolon. Os satélites auxiliam os terráqueos no estabelecimento de um campo comunicacional planetário. Na verdade, trata-se de uma forma muito rudimentar de comunicação se comparado com os nossos sistemas telepáticos, os quais os terráqueos continuam com grandes dificuldades para desenvolvê-los.
— Agora — prosseguiu Tepeu —, já estamos perto da Terra o bastante para que você, Bolon, encontre a frequência adequada à sua missão.
— Mas, qual é a minha missão?! — perguntei angustiado.
— Bolon, ainda não há missão — respondeu-me Tepeu calmamente. — Tudo é exatamente como disse o poeta, “não há caminho. Faz-se o caminho ao andar”. Adeus Bolon, siga em paz.
— Espere mestre!
Tentei chamá-lo, mas foi em vão. Fiquei então, vagando na órbita daquele pequeno planeta pensando em um monte de coisas: “Como encontrar tal frequência?” “Quem é esse tal poeta?” “Como fazer um caminho?”.
Não demorou muito e comecei a enxergar a Terra. Lá estava ela, de um profundo azul cobalto. Permaneci ali, vagando, pensando e fitando aquele planeta. Enquanto ele girava, nada acontecia, eu só conseguia pensar nas palavras de Tepeu. O que ele quis dizer com “não há caminho, faz-se o caminho ao andar?” Mas, de que maneira eu deveria andar para fazer um caminho? Pense Bolon, pense!