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Comunicações científicas

1Contribuições à Anatomia Descritiva do Encéfalo do Tamanduá Bandeira (Myrmecophaga Tridactyla - Linnaeus, 1758).

Introdução

Dentre as ordens de mamíferos encontrados na América do Sul os Xenartras são os mais antigos (RIBEIRO, 2012). Últimos membros de uma ordem quase extinta e habitantes do cerrado e outros biomas (SOUZA e ARAÚJO, 2013) em rota segura de destruição, devem ser descritos sob pena de perdermos as informações importantes constantes em seu registro anatômico (FERREIRA e PRADA, 2009). As informações que uma descrição de seus encéfalos pode conter têm importância anatômica e evolutiva de como as séries animais resolveram problemas evolutivos durante seu percurso. Esta descrição abordou o encéfalo do Tamanduá bandeira (Myrmecophaga tridactyla - Linnaeus, 1758) doravante TB, incluindo as estruturas mais relevantes da base do encéfalo ou vista ventral, da face dorsolateral e da vista dorsal. Estas três visualizações devem dar conta da informação básica (POPESKO, 1993) que pode fundamentar futuros estudos das funções das estruturas encefálicas e da irrigação do mesmo. Utilizamos referências que nos possibilitaram nomear os sulcos, giros e estruturas encefálicas, como a Nomina Anatômica Internacional de 2005, e as obras de Popesko (1993), Schaller (1999) e Getty (1986).

Material e Métodos

Os animais utilizados vieram do Centro de Triagem de Animais Silvestres de Goiânia (CETAS/IBAMA), recebidos de terceiros ou coletados por funcionários do mesmo. Os animais, vítimas de atropelamentos nas rodovias do estado de Goiás, foram congelados após o óbito e enviados para fixação padrão com formalina a 10% no Departamento de Morfologia do ICB/UFG. Antes da fixação os espécimes foram perfundidos com solução salina morna (38º), injetados com látex natural (Altamira-MG®) corado com corante vermelho vivo (Serigraf®) pela a. aorta torácica por meio de incisão no 5º e 6º espaços intercostais. Após 2 horas os animais foram infiltrados com solução tamponada de formol a 10% e imersos por 1 mês em cuba de formol também a 10%. A remoção dos encéfalos foi realizada com fixação da cabeça em morsa, rebatimento dos delgados envoltórios do crânio e serragem da calota craniana. Com o uso de um formão retirou-se a calota e seccionando a dura-máter craniana chegou-se ao encéfalo. Os mesmos foram retirados seguindo a técnica descrita por Rodrigues (2010), e conservados na mesma solução da fixação para a descrição.

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Resultados e Discussão

Ao retirar os resistentes ossos cranianos do TB e remover a dura-máter encefálica encontramos um encéfalo pouco circunvoluto tanto em adultos como em filhotes. O encéfalo é alongado seguindo o padrão da cabeça do animal. Os sulcos, poucos e rasos, demarcam com dificuldade cerca de 8 giros no telencéfalo. Um achado bem interessante é a ausência da fissura longitudinal do cérebro, no local da mesma encontramos um sulco raso que chamamos sulco longitudinal do cérebro, implicando a fusão dos dois hemisférios e permitindo a visualização do corpo caloso apenas em cortes coronais onde vemos apenas uma massa cortical sobre o corpo caloso incluso na mesma. Este sulco contorna, seguindo pela linha mediana, os dois polos rostrais fundidos aos bulbos olfatórios e prossegue na face ventral até o quiasma óptico. Em vista dorsal vemos o sulco marginal paralelo ao sulco longitudinal delimitando o giro marginal desde os polos frontais aos occipitais. O sulco cruzado que se inicia no terço rostral do sulco lateral do cérebro (Silviano/Silvius) se dirige num trajeto rostro medial até o giro longitudinal delimitando os giros suprasilviano rostral e suprasilviano caudal lateralmente ao giro marginal. O sulco lateral do cérebro (Silviano) se inicia em depressão entre os bulbos olfatórios e os polos frontais dos telencéfalos, daí tem um trajeto em direção caudal permanecendo horizontal em seus dois terços iniciais, em seu terço caudal contorna o giro infrasilviano rostral sofrendo flexura dorsal formando um arco que termina no sulco ectosilviano. Este possui trajeto em direção ventral delimitando o giro infrasilviano caudal. O sulco marginal paralelo ao sulco longitudinal origina em sua extremidade caudal o sulco occipital que tem trajeto também em direção ventral, paralelo ao sulco ectosilviano delimitando causalmente o giro occipital e rostralmente o giro ectosilviano. Ventralmente ao sulco lateral do cérebro visualizamos o giro infrasilviano que pode ser visto caudalmente paralelo ao tubérculo olfatório. No polo caudal ou polo occipital do telencéfalo encontramos a fissura cerebral transversal bem profunda e ocupada por crista óssea, delimitando os giros occipitais contralateralmente e tendo caudalmente o cerebelo. Ventralmente ao sulco lateral do cérebro encontramos dois giros: o giro infrasilviano rostral e o giro infrasilviano caudal separados pelo ramo ventral do sulco lateral. Vimos similaridade deste encéfalo com o encéfalo de suínos e ovinos (POPESKO, 1993; PÁDUA, 2013) A maior parte do córtex se situa em áreas correspondentes ao olfato sensitividade e motricidade se utilizarmos o cão como referência (POPESKO, 1993). Um lobo temporal composto por dois giros: temporal e ectosilviano, O que mais impressiona neste modelo evolutivo de encéfalo é o investimento em funções olfativas, citamos os grandes bulbos olfatórios, grandes tubérculos olfatórios, um grande giro paralelo a estes o giro infrasilviano e o lobo piriforme, estas estruturas ocupam mais de 50% da área da base do encéfalo. Ainda notamos um cerebelo bem desenvolvido com um terço do comprimento do encéfalo, com vérmis e centro medular branco bem evidentes, conectado por uma ponte bem desenvolvida reforça a ideia da motricidade avançada (SOUZA e ARAÚJO, 2013) do animal. O fórnice bem desenvolvido relacionado com córtex e núcleos do controle emocional parece indicar comportamento complexo e modulado por emoções básicas. (GETTY, 1986; RIBEIRO e SANTOS, 2012; FERREIRA e PRADA, 2009).

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Conclusão

Conclui-se que com apenas 8 giros, incluindo-se aí o lobo piriforme e 9 sulcos e fissuras o encéfalo do TB é pouco circunvoluto não podendo ser classificado como lisencefálico. A conformação encontrada se articula com os hábitos de vida do animal e o ambiente em que habita, entretanto são necessárias mais pesquisas para se relacionar diretamente as áreas corticais levantadas aqui com a verdade incontestável.

Agradecimentos

Agradecemos a colaboração do CETAS, quando da cessão dos animais para pesquisa, após atropelamentos nas rodovias. Sem essa colaboração este trabalho não seria possível.

Referências

FERREIRA, J. R.; OLIVEIRA, V. L.; OLIVEIRA, K. M.; SOUSA-JÚNIOR, N. B. Contribuições ao estudo da anatomia macroscópica do encéfalo do Bradypus torquatus (Linnaeus, 1758) e Bradypus variegatus (Schinz, 1825). Braz J vet Res anim Sci, São Paulo, v. 42, n. 6, p. 397-404, 2005.

ICOVGAN. Nomina anatômica veterinaria. Hannover: Sapporo Editorial Committee, 2005.

MORAES, S. O. S. Morfometria do encéfalo e formação do circuito arterial em equinos mestiços. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: UFRRJ, 2014. 

PÁDUA, A. C.; MELLO, P. A. Contribuição ao estudo dos giros, sulcos e vascularização do encéfalo de ovino (Ovis aries, L. 1758). Tese de Doutorado. Brasília: UNB. 2013. 

POPESKO, P. Atlas de anatomia topográfica dos animais domésticos. São Paulo: Ed. Manole, 1993.

RODRIGUES, H. Técnicas anatômicas. Vitória: GM Gráfica e Editora, 2010.

SCHALLER, O. Nomenclatura anatômica veterinária ilustrada. São Paulo: Ed. Manole, 1999.

SOUZA, P. R. Anatomia dos músculos do ombro, braço e plexo braquial do Tamanduá bandeira (Myrmecophaga tridactyla - Linnaeus, 1758). Tese de Doutorado. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2013.