As feiras de ciências da UFCAT: uma construção baseada na articulação ensino, pesquisa e extensão?

Resumo: Desde 2012 são realizadas Feiras de Ciências da Universidade Federal de Catalão (UFCAT). Neste sentido, buscou-se identificar aspectos que pudessem subsidiar discussões sobre a contribuição da articulação entre atividades de extensão, ensino e pesquisa na formação inicial crítico-reflexiva de licenciandos envolvidos como monitores das Feiras de Ciências da UFCAT. Sendo assim, foi realizada uma pesquisa qualitativa, tendo como instrumento de coleta de dados questionários que foram respondidos pelos licenciandos envolvidos nas oito edições do evento. Os dados foram tratados por meio da metodologia da Análise Textual Discursiva. Acredita-se que a participação em ações de extensão como as Feiras de Ciências da UFCAT auxilia na formação de profissionais com uma visão muito mais reflexiva sobre a prática docente, sendo que boa parte dessa reflexão se dá quando o licenciando tem contato com uma vasta gama de possibilidades, partindo de cenas que o façam protagonista.

Palavras-Chave:Formação Inicial. Feiras de Ciências. Monitoria.

Introdução

As Feiras de Ciências no Brasil acontecem desde a década de 1960. Considera-se que elas são eventos pedagógicos e de divulgação científica importantes para a produção de conhecimento. Neste sentido, desde 2012 são realizadas as Feiras de Ciências da Universidade Federal de Goiás/Regional Catalão (UFG/RC), atualmente Feiras de Ciências da Universidade Federal de Catalão (UFCAT), evento de extensão voltado para alunos e professores da Educação Básica.

A extensão universitária, sob o princípio constitucional da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, é um processo interdisciplinar, educativo, cultural, científico e político que promove a interação transformadora entre a Universidade e outros setores da sociedade (FORPROEX, 2001). Tem-se assim atualmente uma nova postura com relação à extensão universitária, que se pauta pelo princípio educativo, entendido por Gramsci (1989, p. 130) como “[...] a relação teórico-prática, proporcionando um novo pensar e fazer, capaz de desenvolver uma concepção histórica de sujeito e sociedade.” A formação do licenciando vai além da aquisição de conhecimentos técnico-científicos, até porque esses se esvaziam quando não integrados à realidade. Para uma abordagem inovadora, a aprendizagem deve ir além da aplicação imediata, impulsionando o sujeito a criar e a responder a desafios, a ser capaz de gerar tecnologias e de manter a habilidade de aprender e recriar permanentemente; ou seja, a graduação deve se transformar no lócus de construção/produção do conhecimento, em que o aluno atue como sujeito da aprendizagem (FORPROEX, 2001).

Insistindo na busca relevante de novos modelos de ações que estabeleçam a extensão universitária como processo educativo, cultural e científico, articulando o ensino e a pesquisa de forma indissociável, Garcia (2000, p. 79) fala de sua experiência no curso de Formação de Professores:

Temos procurado articular pesquisa, docência e extensão de tal forma que elas vão perdendo a sua rígida especificidade, vão sendo incorporadas à docência, fertilizando-a; e a atividade pesquisadora e a atividade extensionista vão incorporando o que caracteriza a docência, vale dizer, o aprender e o ensinar presentes em qualquer fazer.

A ideia do ensino e da pesquisa articulados à extensão baseia-se em atitudes de reflexão, análise, tomada de decisão, relação com o local de extensão, escuta atenta e parcerias (CASTRO, 2004).

Sendo assim, após oito edições da Feira de Ciências da UFCAT, buscou-se neste trabalho avaliar a experiência formativa dos bolsistas envolvidos como monitores no evento, procurando investigar qual a contribuição desse tipo de atividade de extensão baseada no tripé ensino-pesquisa-extensão e na ação-reflexão-ação para a melhoria da formação docente, objetivo das mudanças curriculares que estão sendo implantadas nos cursos de formação de professores.

Metodologia

Como o objeto de pesquisa deste projeto encontra-se num campo abstrato, as metodologias fundamentadas na pesquisa qualitativa se tornaram as mais indicadas, porque tal abordagem procura buscar no campo dos significados das ações humanas o que não é perceptível e nem captável estatisticamente (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Na pesquisa qualitativa a preocupação não está em acumular dados quantitativos, mas procurar responder a problemas de investigação por meio da construção de dados. Dentro dessa abordagem diferentes metodologias ou técnicas de construção de dados podem ser desenvolvidas, como por exemplo: questionários, entrevistas semiestruturadas, estudos de caso, pesquisas de opinião, entre outras (LAVILLE; DIONNE, 1999).

No caso deste projeto, utilizou-se questionários que foram respondidos por estudantes de cursos de Licenciatura em Ciências da Natureza que participaram como monitores da Feira de Ciências de forma a se conhecer como a articulação entre extensão, pesquisa e ensino vivenciada durante sua participação no evento pode ter contribuído para formar o futuro professor de ciências.

Para o tratamento dos dados empregou-se a metodologia intitulada Análise Textual Discursiva, que tem no exercício da escrita seu fundamento enquanto ferramenta mediadora na produção de significados e, por isso, em processos recursivos, a análise se desloca do empírico para a abstração teórica, que só pode ser alcançada se o pesquisador fizer um movimento intenso de interpretação e produção de argumentos (MORAES; GALIAZZI, 2006).

Resultados e Discussão

Acredita-se que uma das diferenças ao se trabalhar com as Feiras de Ciências seja a possibilidade de se proporcionar uma participação mais ativa dos alunos no processo de ensino e aprendizagem, de forma que o professor deixe de ser transmissor de conhecimentos e passe a atuar como mediador do conhecimento (LOPES; BORBA, 1994, p. 59).

Assim, tem-se buscado cada vez mais nos cursos de licenciatura, desde que adequados às novas diretrizes instituídas pelo Ministério da Educação com as alterações curriculares determinadas no Parecer CNE/CP 09/2001 (BRASIL, 2001) e na Resolução CNE/CP 02/2002 (BRASIL, 2002), favorecer um contato mais direto e inicial dos professores em formação com as atividades de sala de aula, bem como aguçar sua criatividade na elaboração e na proposição de práticas diferenciadas, tais como as propiciadas por uma Feira de Ciências.

Segundo Bernardes et al. (2017), as Feiras de Ciências são importantes e provocam a discussão de temas científicos no ambiente escolar; nesse sentido, os autores consideram que tal metodologia é capaz de oferecer aos estudantes a possibilidade de serem ativos no processo de ensino-aprendizagem, desenvolvendo pesquisa e elaborando experimentos; consideram ainda que um trabalho como esse motiva e incentiva o aluno ao aprendizado.

Para Dornfeld e Maltoni (2011), as Feiras de Ciências contribuem de maneira efetiva para a formação docente, considerando-se que são eventos realizados nas escolas com a intenção de promover um diálogo com o público externo, promovendo uma troca de conhecimentos, vislumbrando novas metodologias de pesquisa e adquirindo novas habilidades; além disso, são também uma oportunidade para um aprendizado construído pela mediação do conhecimento.

Segundo Pereira (2000), a mediação do professor é essencial para se alcançar os resultados esperados com a realização de uma Feira de Ciências e, portanto, compreender o processo de mediação é importante na formação inicial docente.

Acredito que este projeto tenha auxiliado muito na capacidade de mediação. Ele estimula que nós, professores, deixemos de ser transmissores de informações/conteúdos. Passamos a ser mediadores e os alunos passam a ser protagonistas do processo. (L1)

[...] me permitiu conhecer a fundo essa metodologia de ensino observando principalmente as contribuições da mesma para que os alunos sejam sujeitos ativos na apropriação do seu aprendizado, além de serem críticos por levarem os alunos a refletirem temas de importância social. (L2)

As Feiras de Ciências são consideradas como espaços de formação inicial e continuada de professores e isso implica conceber a formação docente como um continuum que não se inicia nos cursos de graduação e que vai além deles (ZEICHNER, 1994; GONÇALVES, 2000; IMBERNÓN, 2002). Esses espaços foram vistos pelos licenciandos desta pesquisa como uma oportunidade de formação docente mais ligada às metodologias que permitem uma participação mais ativa dos alunos da educação básica, possibilitando o aprendizado da mediação e não da transmissão do conhecimento. Assim, a importância do contato com essas metodologias ativas é expressa em vários momentos nas respostas dos licenciandos:

[...] a participação contribuiu para que eu atuasse como professora mediadora. (L1)

Me permitiu conhecer as potencialidades da metodologia e levar o desenvolvimento da mesma para a escola onde atuo seja com alunos do ensino médio ou do ensino fundamental. (L2)

[...] porque a partir das atividades desenvolvidas fui aperfeiçoando a elaboração de metodologias diversificadas, a comunicação em público. [...] o desenvolvimento de novas metodologias de ensino, como por exemplo, a interdisciplinaridade e o trabalho em equipe. (L4)

O projeto da Feira de Ciências mostrou atividades de ensino-aprendizagem investigativos que são importantes para a prática docente, não se restringindo a meios ou ações tradicionais de ensino [...] refletir sobre propostas pedagógicas que podem ser utilizadas durante atividades em sala de aula. (L7)

Evidencia-se aqui a importância do professor como mediador do conhecimento, de forma que os alunos aprendam os saberes escolares em interação com o outro, e não apenas recebam de forma passiva o conhecimento transmitido.

A aprendizagem escolar tem um vínculo direto com o meio social que circunscreve não só as condições de vida das crianças, mas também a sua relação com a escola e estudo, sua percepção e compreensão das matérias. A consolidação dos conhecimentos depende do significado que eles carregam em relação à experiência social das crianças e jovens na família, no meio social, no trabalho (LIB NEO, 1994, p. 87).

Diante das respostas dos licenciandos entrevistados, torna-se evidente a relevância da reflexão do professor ao longo de sua formação e também sobre suas práticas e as fundamentações teóricas que as embasam, sobre os fundamentos didático-pedagógicos, enfim, uma reflexão para ponderar e analisar qual é o perfil do docente que a universidade está formando e colocando no mercado de trabalho, e qual a consciência desse profissional durante seu percurso na educação (LELIS, 2001). As respostas dos entrevistados demonstram ainda a importância de se proporcionar o contato dos professores em formação com metodologias de ensino que permitam uma atuação docente diferenciada, que propicie o contato/conhecimento/vivência/aprendizado da mediação do conhecimento. Sendo assim, trata-se de uma oportunidade formativa bastante importante para os professores em formação, que têm a oportunidade de mediar o conhecimento e vivenciar uma prática pedagógica diferenciada da tradicional.

Conclusão

Assim, há que se ressaltar o papel deste evento na formação dos licenciandos envolvidos como monitores; ao fazer parte desta ação de extensão, eles têm a oportunidade de entrar em contato com alunos e professores da educação básica por meio da oferta de oficinas de elaboração de projetos, além de monitorar/auxiliar os alunos na elaboração e desenvolvimento de seus trabalhos, promovendo assim melhorias em sua formação docente. Portanto, o evento possibilita a inserção dos licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública e privada de educação básica, onde eles têm a oportunidade de auxiliar os alunos de forma a mediar a construção do conhecimento científico. Ao final de cada evento, os bolsistas do Projeto ainda realizam avaliações qualitativas sobre o mesmo através de questionários aplicados aos alunos e professores da educação básica e os resultados são apresentados em eventos científicos e em revistas científicas. Assim, a formação docente é beneficiada pelo fato de o projeto permitir que se alie os três pilares da Universidade para uma sólida formação docente: extensão, ensino e pesquisa, o que possibilita ao monitor refletir e desenvolver trabalhos sobre as diversas atividades desenvolvidas e a importância de cada uma, promovendo sua divulgação em eventos e revistas científicas.

Referências

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