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Artigo 2) A memória cultural como um direito público: o uso dos meios de comunicação na trajetória institucional do IPHAN

As publicações especializadas e a revista do patrimônio

A série Publicações do SPHAN teve o primeiro volume publicado em 1937. Como mencionado anteriormente, foi editada ao longo dos trinta primeiros anos de fundação do órgão e apresenta, principalmente, uma reflexão sobre a história da arte e da arquitetura no Brasil. De acordo com Adriana Nakamuta (2006), as publicações compreendidas entre o primeiro até o vigésimo terceiro número da série apresentam discussões sobre uma história da arte e da arquitetura que valorizam, sobretudo, as produções artísticas e os bens materiais remanescentes do período colonial do Brasil.

Salvo o anteprojeto elaborado por Mário de Andrade, que tinha como uma de suas preocupações a valorização da cultura popular, a função social do órgão e a comunicação com o público - a produção editorial do período da administração de Rodrigo Melo Franco de Andrade serviu como fonte de reflexão sobre uma produção artística brasileira específica e pouco conhecida entre setores mais populares da sociedade.

Por meio das linhas editoriais do próprio SPHAN, Rodrigo e os intelectuais que detinham poder de atuação no campo cultural “conseguiram consolidar uma perspectiva bastante particular acerca do que seria o patrimônio cultural representativo da memória dos brasileiros” (SANTOS, 2010, p. 33).

Além disso, podemos apontar uma crítica a partir do Artigo 1º do Decreto-Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, que regulamenta a proteção dos bens culturais no Brasil. Segundo este Artigo, constitui patrimônio histórico e artístico nacional o “conjunto de bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico”. No entanto, apesar do Artigo apontar que a conservação dos bens móveis e imóveis deveria ser ou até mesmo partir do interesse público e estar vinculado a fatos memoráveis da história do Brasil, ao estudarmos a trajetória política e institucional do IPHAN, principalmente, nas três primeiras décadas de sua existência, percebemos que a população não participava tão ativamente desse processo, ou seja, não opinava acerca de quais bens eram passíveis de serem memoráveis, quais bens realmente teriam valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico e artístico para o interesse público.

Diante disso, observamos que um grupo de intelectuais modernistas é que tinham o “discurso autorizado” para dizerem se um bem cultural era passível ou não de ser representativo para a memória nacional e cultural do povo brasileiro. E hoje, mais do que antes, sabemos que a cultura brasileira é extremamente diversa, ela não é uma cultura homogênea.

Nesse primeiro momento, no período de gestão do Rodrigo Melo Franco de Andrade, foram realizados significativos tombamentos de bens materiais que, de acordo com tais intelectuais, eram representativos para a nossa memória e cultura, geralmente, eram bens que apresentavam uma arquitetura colonial e\ou expressões artísticas ligadas ao período barroco.

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Por falar em memória, devemos pensar nas linhas editoriais do IPHAN e os meios de comunicação que foram ou são utilizados pela Instituição como “lugares da memória”, como aponta Pierre Nora (1993), ou seja, além de selecionar algo representativo para a população, tais meios são espaços que guardam, informam e\ou divulgam o patrimônio cultural.

Vamos falar agora da “menina dos olhos” do IPHAN, ou seja, da Revista do Patrimônio, que muitos de vocês já conhecem. Editada a partir de 1937, assim como as Publicações do SPHAN, a Revista do SPHAN ou a Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional traz contribuições acerca do período Barroco Brasileiro. Durante muitos anos, a Revista constituiu-se de artigos e ensaios sobre discussões acadêmicas voltadas para um público formado por “especialistas” ou “interessados” no tema do patrimônio cultural.

A partir da década de 1980, a edição do periódico passou a trabalhar com uma abordagem mais multidisciplinar e de diálogo com vários setores da sociedade e, a partir de 1994, passou a ser temática, ou seja, organizada por artigos sobre um mesmo assunto.

Apesar do espaço editorial da Revista ter sido aberto, nas últimas décadas, para uma abordagem mais multidisciplinar e de diálogo com vários setores da sociedade, percebemos que continuou sendo um local para a produção e divulgação de artigos científicos de estudiosos em campos bem específicos do conhecimento.

Além disso, assim como as Publicações Especializadas, a Revista do Patrimônio deve ser percebida como um espaço de disputas políticas e intelectuais e para a preservação da memória cultural. Além disso, também como um âmbito de disputas porque em suas páginas eram defendidas ideias de um determinado grupo de intelectuais ou estudiosos que detinham um saber específico a respeito das discussões e técnicas que envolvem a preservação do patrimônio histórico e artístico nacional.