Licenciatura em Artes visuais Percurso 1
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Teorias da Educação

Autora

Drª Cleide Aparecida Carvalho Rodrigues Possui mestrado em Educação pela Universidade Federal de Goiás (1999) e doutorado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (2006). Atualmente é professora associada da Universidade Federal de Goiás. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Formação de Professores, atuando principalmente nos seguintes temas: mídia e educação, educação a distância, formação de professores,relação tecnologias em processos de formação.

Saiba mais

Apresentação

Seja bem-vindo(a) ao estudo da disciplina Teorias da Educação. Você discutirá as diferentes concepções das práticas educativas e suas implicações nos processos de aprendizagens. Para isso, elaboramos um material que será um ponto de partida para a definição teórica e construção de sua prática pedagógica.

Bom estudo.

Unidade 1: Ponto de Partida – Abordagens Educacionais

Iniciar o estudo referente às teorias da educação requer, em primeiro lugar, entender-se os princípios filosóficos que sustentam, teoricamente, cada grupo. Em segundo, ter-se certeza de que não há substituição, de um por outra, mas sim coexistência, em diferentes momentos históricos, sendo que, em cada um, há predominância de um sobre o outro.

Em terceiro, é necessário compreender-se que a estruturação de uma abordagem pedagógica tem sempre como ponto de partida as demais já existentes; por isso, muitas vezes, há similitudes entre elas a ponto de confundi-las.

Para favorecer esta exposição, vamos “pedagogizar” esse tema, agrupando as abordagens pedagógicas em dois grupos denominados por: tendência liberal (Quadro 1) e tendência progressista (Quadro 2).

O grupo tendência liberal traz como princípios aqueles oriundos do pensamento positivista, que se caracteriza pela concepção da ciência empírica, natural, racionalista como método apoiado na observação, indução e experimentação. Os teóricos mais renomados dessa concepção, dentre outros, são: August Conte, Descartes, Kant, Darwin, Emile Durkheim, João Amós Comenius. Regidos pelos princípios iluministas, que têm a razão como luz da ciência, esses teóricos difundiram teses sobre a construção do conhecimento e organização social que influenciaram, em diferentes tempos históricos e contextos, abordagens educacionais, tais como: tradicional, renovada e tecnicista.

Como já foi dito, não há substituição de abordagens, mas predominância de cada uma delas em distintos momentos. Portanto, passemos a caracterizá-las:

A abordagem tradicional apresenta dois grupos: um marcado pela doutrina cristã e outro pelo início da laicidade. Entretanto, ambos defendiam que a organização social era imutável, o homem, considerado um ser naturalmente determinado, o conhecimento, acúmulo de informações, cabendo à educação preservar o conhecimento, e a escola, o instrumento que prepara esse homem para desempenhar papéis nessa sociedade. No campo educacional, Comenius é o teórico que caracteriza bem essa abordagem, definindo a estrutura organizacional do sistema de ensino, seus níveis de instrução, proposta curricular, metodologias de ensino que transitavam entre os princípios da glorificação da natureza divina e a racionalidade do método empírico de conhecer.

Na sequência, a abordagem renovada ou Escola Nova tem o teórico Jonh Dewey como definidor de princípios de que a organização da sociedade é modificada pelo homem, num processo de interação com o meio; isto é, inicia-se a ruptura com o determinismo, admitindo que, na relação entre escola e sociedade, há um movimento de interação.

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Diferentemente, a abordagem tecnicista tem o teórico Skinner como precursor que focaliza a educação e a metodologia de ensino e aprendizagem regida pelo método funcionalista da racionalidade instrumental favorável aos objetivos de uma sociedade estruturalista, eficiente e produtiva para a sociedade.

O fato é que as relações estabelecidas entre escola e sociedade, em cada uma dessas abordagens, apresentam diferentes desdobramentos, conforme os contextos econômicos, sociais e culturais, confirmando que o determinismo não sustenta uma sociedade nem a produção do conhecimento, mas, sim, a contradição que caracteriza o pensamento dialético. Pode-se destacar alguns teóricos precursores desse pensamento: Hegel, Marx, Bakunin, Gramsci, Max Weber, Pierre Bourdie. É esse pensamento que rege a caracterização do grupo da tendência progressista. Na tentativa de explicar as relações estabelecidas regida pelo capital, as divisões do trabalho fragmentado e de classe, esses e outros teóricos focalizaram aspectos diferentes como organizações econômica, social e educacional. Percebe-se que, em cada uma das abordagens caracterizadas no quadro em estudo, há muitas similaridades que, às vezes, dificultam a distinção, como relatado adiante.

A abordagem libertária mesmo não tendo, no seu momento de origem no séc. XIX, uma efetivação significativa na estrutura do sistema educacional (restrita a países da Europa), ainda hoje mantém forte influência nas propostas de gestões participativa e colaborativa na organização escolar. Tendo como precursor Francisco Ferrer, a proposta de educação escolar rompia com a estrutura hierárquica da sociedade, pois as relações estabelecidas eram de autogestão e coparticipação.

A abordagem libertadora tem seu precursor Paulo Freire, que, ao adotar os princípios do materialismo histórico de Gramsci e Marx, apresenta a proposta de conscientização política por meio da educação, como elemento fundador da transformação social.

uma abordagem similar, a abordagem crítico-social dos conteúdos, elaborada por Demerval Saviane e José Carlos Libâneo, esses defendem que é por meio do domínio dos conteúdos que se desenvolve a criticidade política capaz de transformar a sociedade.

Já a abordagem sociointeracionista, com estudos de Piaget, Vigostky, Frenet e Montessori, com forte influência do campo da psicologia experimental, focaliza a aprendizagem como elemento principal para a transformação do homem e da construção do conhecimento científico com bases cognitivas, afetivas e culturais.

No contexto atual, percebe-se que o acelerado e intenso desenvolvimento tecnológico tem provocado o surgimento de uma abordagem emergente que agrega ao princípio da contradição a análise da complexidade das relações estabelecidas no modo de produção do capitalismo denominado “global”.

Teóricos como Michael Aplle, Edgar Morin, Boaventura Souza Santos, Milton Santos, Pierre Levy, Pirrenoud, Antonio Nóvoa, Tomas Tadeu da Silva, Carlos Alberto torres, dentre outros, apresentam estudos e análises dessa sociedade que ilustra, ao mesmo tempo, as contradições provocadas pelo avanço tecnológico e a complexidade existente nessa organização que não é regida pelo determinismo, mas sim pela incerteza que a própria razão desconhece.

Nos quadros anexos, você poderá observar que não há um período histórico definido para cada abordagem, pois elas coexistem e se redimensionam em diferentes momentos e sociedades. Alguns educadores, ao estudar essas abordagens, tentam identificar suas práticas com os aspectos que as caracterizam, mas isso pode gerar um conflito. O importante é analisar os princípios teóricos que se fazem presentes em cada abordagem. Esse exercício de analisar a sua própria prática ou de sua formação escolar é importante para seu crescimento profissional, pois possibilita o redimensionamento do trabalho docente.

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1.1 Tendência Liberal

Quadro 1
Aspectos Tradicional Renovada Tecnicista
Sociedade A sociedade se apresenta de forma exterior e coercitiva ao homem. A compreensão do homem em re­lação à sociedade se dá a partir do seu confronto com modelos edu­ca­tivos representados pelas gran­­des realizações da humanidade e selecionados como sendo indispensáveis à manutenção da estrutura e funcionamento da sociedade. A sociedade não é imutável nem independente do homem, mas sim passiva de mudanças resultantes da interação do homem com o ambiente que o circunda. A realidade é um fenômeno objetivo. A sociedade já está construída, e a consciência do homem é formada em suas relações com o mundo concreto. Através do cotidiano, o homem estabelece relações com o meio, relações essas controladas cientificamente pela via da educação.
Ser humano O ser humano é considerado um ser físico e espiritual, constituído por uma essência única e imutável, cuja finalidade é dar expressão à sua própria natureza. Considerado, inicialmente, incompleto e imaturo, ele se torna pronto e acabado quando de posse de informações que lhe são transmitidas, bem como a partir do momento em que o seu caráter estiver solidamente estruturado. O homem é considerado um ser que se encontra em contínua interação com o meio, sendo sua natureza mutável, maleável, determinada pelo processo humano de ajustamento social. Nessa interação constante com o ambiente, o homem modifica o meio, sendo também por ele modificado. O homem é considerado um produto do meio. É uma consequência das forças existentes em seu ambiente. É um ser cientificamente cognoscível, sendo seu comportamento governado por leis cien­tíficas, podendo ser, portanto, descrito, explicado, previsto e controlado. Pelo estudo empírico, o homem pode chegar à verdade.
Conhecimento O conhecimento é o produto da incorporação de informações, acumuladas ao longo dos tempos, compõe a herança cultural que deve ser transmitida aos indivíduos, através da educação formal, visando à sua perpetuação e reprodução. A concepção de inteligência tem como base a memorização de informações. O conhecimento é um instrumento social, considerado em constru­ção a partir da experiência humana que se constitui na relação homem-meio. O processo de aquisição do conhecimento é essencialmente ativo. O indivíduo é inteligente quando tem iniciativa em buscar o conhecimento e interagir com o meio de forma equilibrada. O conhecimento é uma “descoberta” nova para quem a faz; porém, o que foi descoberto já se encontra presente na realidade exterior. Torna-se necessário o emprego de uma ciência no planejamento de uma cultura ideal. A inteligência é produto mensurado do comportamento desejável, eficiente e eficaz.
Educação A educação deve estar comprometida com a cultura. Sua função é transmitir e preservar o patrimônio cultural, preparando, intelectual e moralmente, os alunos a fim de que possam desempenhar os papéis que lhe são conferidos pela sociedade. Através da educação, o indivíduo torna-se capaz de atingir sua plena realização como pessoa. (Teórico: Comenius) A educação deve visar à autonomia intelectual do educando, capacitando-o a resolver as situações problemáticas que a vida oferece, bem como formar para a democracia, contribuindo para a constituição de uma ordem social harmônica e organizada, na qual seus membros se aceitem mutuamente com respeito à individualidade. (Teórico: Dewey, Herbart) A educação deve estar comprometida com a cultura. Sua função é transmitir e preservar o patrimônio cultural, preparando, intelectual e moralmente, os alunos a fim de que possam desempenhar os papéis que lhe são conferidos pela sociedade. Através da educação, o indivíduo torna-se capaz de atingir sua plena realização como pessoa. (Teórico: Comenius)
Escola A escola é o local onde se preparam as novas gerações, através do acesso às grandes produções culturais da humanidade e aos valores essenciais, tornando-se bem informadas, reprodutoras da cultura que lhes é transmitida e socialmente ajustada. A escola deve ser ativa e basear-se no interesse do aluno, constituindo-se num ambiente estimulador, capaz de mobilizar a atividade do aprendiz e catalisar as energias necessárias a seu autodesenvolvimento, adequando-o às exigências sociais. A escola deve funcionar como uma agência modeladora do comportamento humano, organizando, adequadamente, condições estimuladoras, através do emprego de procedimentos e técnicas espe­­cíficas, a fim de que as mudanças comportamentais pretendidas pa­ra os alunos sejam efetivadas.
Planejamento O professor planeja suas aulas, selecionando o conteúdo que julga necessário ao aluno. O planejamento não tem preocupação com o contexto social. O planejamento é feito pelo profes­sor, tendo como finalidade atender aos interesses dos alunos e motivá-los às “descobertas”. O planejamento tecnicamente bem elaborado deve garantir o bom desempenho do professor e o su­­cesso do processo ensino-aprendizagem. Deve ser feito previamente pelo especialista e executado com rigor pelo professor. O planejamento é neutro.
Conteúdos Cultura universal acumulada pela humanidade, que deve ser transmitida aos indivíduos através da educação formal. São selecionados a partir dos inte­resses e do desenvolvimento psicológico do aluno. Gerados no conjunto das experiências do indivíduo. As informações, princípios, leis e normas são extraídas da ciência objetiva.
Metodologias Devem possibilitar a reprodução dos conhecimentos transmitidos (exposição verbal através de demonstração e exercícios de fixação). Devem adequar-se à natureza e às etapas de desenvolvimento do educando (pesquisas, estudo do meio, solução de problemas, vivên­cia grupal). Aprender a aprender. Devem basear-se na aplicação da tecnologia educacional (procedi­mentos e técnicas adequadas ao controle das condições ambientais). São as técnicas que irão definir o que professor e alunos devem fazer, quando e como fazer. Aprender fazendo.
Avaliação Valorização do acúmulo de conhecimentos com ênfase na memorização. Valorização dos aspectos afetivos (atitudes). O processo de aquisição do saber é mais importante que o saber propriamente dito. Relaciona-se aos objetivos preestabelecidos e traduzidos em desempenhos observáveis e mensuráveis. Verifica se os comportamentos pretendidos foram alcançados.
Relação Professor-aluno O professor é transmissor dos conteúdos aos alunos. O aluno, um ser passivo que deve assimilar os conteúdos transmitidos pelo professor. O professor é facilitador da apren­dizagem. O aluno é um ser ativo, centro do processo ensino-aprendizagem. O professor é administrador e executor dos planos de ensino. O aluno é passivo e executor de tarefas.
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1.2 Tendência Progressista

* Elaborado em 1996 e reestruturado em 2008. Autoras: Profa. Dra. Cleide Aparecida Carvalho Rodriguese Profa. Dra. Dulce Barros de Almeida FE/UFG.
Aspectos Libertária Libertadora Crítico-social Sociointeracionista Emergente
Sociedade A sociedade é representada por todos os indivíduos. A estrutura hierár­quica é inconcebível. O poder é questionado, e é de­fendida a autogestão em to­das as instâncias. A sociedade é construída coletivamente. Todos os indivíduos são sujeitos históricos responsáveis pela transformação socioeconômico-política e cultural. A sociedade é permeada por conflitos e contradições gerados pelas relações que se estabelecem entre grupos e classes sociais com interesse e aspirações distintas. Sociedade em tran­s­ição do sistema industrial tecnológi­co. Relações de trabalho e sociais influenciadas pelo avanço tecnológico. A sociedade é caracterizada pelo avanço tecnológico, modelo de produção toyotista, relações sociais efêmeras, globalização da informação e reconhecimento de grupos sociais minoritários (ex.: etnia e sexo). A categoria “excluídos” é o referencial para classificação social. O po­der de consumo é o referencial para definir práticas econômicas e políticas. Ora é denominada por “sociedade da Informação”, ora “so­cie­dade do conhecimento”, ora “sociedade tecnoló­gica”. Democracia, tecnologia, inclusão e globalização são palavras-chave.
Ser Humano O ser humano é considerado um ser autogestor, tem liber­dade plena de ação e pensamento. O indi­víduo se afirma como produto do social e o desenvolvimento do individual somente se realiza no coletivo. O homem é um ser histórico e político social capaz de trans­formar, cons­cientemente, a reali­dade vigente em que se encontra inserido e a si próprio. O homem é considerado um ser situado num mundo material, concreto, social, econômico e ideologicamente determinado, o qual lhe cabe transformar através do domínio de conhecimentos elaborados e sistematizados cientificamente. O homem é sujeito ativo no processo de transformação da realidade social e cultural. Considerado um ser construído pelo meio cultural, também está em constante transformação. O homem é considerado o SER CON­SUMIDOR. A distinção dos grupos so­ciais minoritários re­define a atuação do homem na luta pe­los direitos adquiridos nos processos de luta coletiva. A organização dos gru­pos sociais nem sem­pre rompe com a discriminação soci­al. O homem é um ser do mundo, itinerante, desenraiza­do de sua “pátria mater”. É um ser flexível que se adapta às condições da realidade e relações de trabalho e sociais. O homem é considerado um ser autônomo.
Conhecimento O conhecimento é construído coletivamente, como forma de resistência ao conhecimento já elaborado cientifica­mente. Ser inteligente implica a atuação de resistência do indivíduo diante do poder estabelecido. O conhecimento é elaborado e desenvolvido a partir do processo de conscientização (intransitiva, transitiva ingênua e transitiva), e do mútuo condicionamento, pensamento e prática. O sujeito inteligente é aquele capaz de apreender criticamente os fatos da realidade. O conhecimento é uma atividade inseparável da prática social, resultando de trocas que se estabelecem entre o sujeito e os meios natural, social e cultural. O conhecimento não se baseia no acúmulo de informações, mas sim numa reelaboração mental que deve se traduzir em forma de ação, no mundo social. O sujeito inteligente é capaz de encontrar soluções para os de­­safios existentes na prática social. O conhecimento é cultural, construído nas relações entre os homens. O saber de senso comum é transformado em cien­tífico nas relações mediatizadas e entre os homens. É objeto da escola a ser construído nas relações entre aluno-saber-professor-aluno. O conhecimento, muitas vezes, é confundido com acesso à informação. A produção do conhe­cimento é intensifi­cada pelas potencialidades das tecno­logias da informação e comunicação. A visão holística do conhecimento defende o autoconhecimento como elemento importante pa­ra o desenvolvimento das “inteligências múltiplas”.
Educação A educação ocorre, basicamente, na participação em movi­mentos socais. A educação escolar é vista como possibilidade de formação da personalidade nos sentidos libertário e autogestor. (Teóricos: Francisco Ferrer, Mau­­rício Tragtenberg) A educação é de uma amplitude maior que a escola, pois abrange ideias e valores construídos co­letivamente. O trabalho é o princípio educativo. (Teórico: Paulo Freire) A educação perpassa por todos os setores da sociedade, tendo como “locus” privilegiado a escola. Através da educação, acredita-se poder elevar o nível de consciência do educando a respeito da realidade social que o cerca, podendo transformá-la. ( Teóricos: Demerval Saviane José Carlos Libâneo) A educação é construída na mediação entre os homens. A educação é fundamental para equidade dos grupos minoritários da sociedade. É um forte “slogan” dos discursos políticos e nos projetos de expansão do ensino superior de formação de professores, profissional e tecnológico.
Escola A escola é considerada o espaço possível de concretização dos princípios de liberdade de pen­samento-ação, criticidade e autogestão. A escola não é o espaço mais importante para o proces­so de conscientiza­ção política, mas é valorizada como um espaço de luta, de discussões sociais a par­tir da cultura cons­truída pelo coletivo. A escola deve ser valorizada como um instrumento de luta das camadas populares, propiciando, de forma sistemática, o acesso ao saber historicamente acu­mulado e reavaliado em face das realidades sociais, saber esse necessário à ex­plicitação e à com­preensão da prática social na qual o aluno se insere. A escola é o espaço de construção do conhecimento, de interação entre os sujeitos e os saberes. A escola não é mais o lugar privilegiado de acesso ao conhe­cimento, pois as tecnologias de informação e comunicação potencializam esse acesso. A escola não insere as tecnologias nos projetos de ensino cotidianos, apenas na organização adminis­trativa. A autoaprendizagem se dá a par­tir da iniciativa do estudante com acom­panhamento do sistema educacional por meio de ferramentas das tecnologias de informação e comunicação.
Planejamento O planejamento é feito, coletivamente, pelo professor e alu­nos e alterado de acordo com as necessidades e interesses dos mesmos. O planejamento é elaborado, quotidianamente, pelo professor, mas flexível, de acordo com os interesses e realidade cultural dos educandos. O planejamento é elaborado pelo professor, considerando a capacidade cognos­citiva e o conhecimento anterior dos alunos (de acordo com a realidade so­ciopolitico-eco­nômica em que se insere). O planejamento traz, no seu bojo, a opção política do educador. Através do planejamento interdiscipli­nar, pretende-se superar a dicotomização entre teoria e prática. O planejamento é flexível e parte das necessidades dos con­textos cultural, cognitivo e afetivo do aluno. O planejamento educacional e de ensino é elaborado, coletivamente, com base nos referenciais dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), com objetivo de atender às necessidades e interesse de cada realidade. O planejamento é flexível, avaliado durante o processo e redimensionado. O planejamento é um ato político.
Conteúdos Devem surgir das necessidades e interesses manifestos pelo grupo como respostas às exigências da vida social. “Temas geradores” de cunho político-social, extraídos da problematização de vida dos educandos. São os conteúdos culturais, universais, incorporados pela humanidade, porém reavaliados em face das realidades sociais. Os conteúdos são definidos no contexto pelos sujeitos envolvidos no processo educativo. Os conteúdos são definidos a partir dos PCNS e da diagnose da realidade social. São insertos nos projetos de ensino elaborados e desenvolvidos na es­cola. Apesar de o conhecimento na so­ciedade exigir do homem o desenvolvimento de “ inteligências múltiplas”, nem sempre os con­teúdos são definidos para esse fim.
Metodologias Vivência grupal, na forma de autogestão. Exclui-se qualquer forma de poder hierárquico. Enfatizam o diálogo através dos “grupos de discussão”. Problematiza a realidade e a construção coletiva de alternativas. Os métodos de ensino devem ter, como ponto de partida, a prática social comum a professores e alunos. É dessa prática que emergem os problemas e a busca através da problematização dos conhecimentos necessários para resolvê-los. A metodologia de ensinar e aprender é a mediação entre os sujeitos e os saberes. Com base nos pilares “ aprender a aprender”, “aprender a fazer”, “aprender a conviver” e aprender a ser”, as atividades de ensino são elaboradas e desenvolvidas numa prática pedagógica voltada para a formação do homem “autônomo”. A participação coletiva na elaboração de projetos educacionais nas dimensões macroscópica e microscópica do sistema educacional legitima o caráter democrático da sociedade.
Avaliação A avaliação utiliza como critério de re­levância do saber sistematizado o seu possível uso prático. Dispensa qualquer tentativa de avaliação formal da aprendizagem e pro­move a autoavaliação grupal. A avaliação prioriza a prática vivenciada entre educador e educando, ou seja, o processo grupal. Ênfase na autoava­liação (compromis­so com a prática social) e/ou avaliação mútua e permanente da prática educativa. Avaliação permanente e contínua do processo ensino-apren­dizagem. É importante avaliar o domínio de conhecimentos, habilidades e capacidades dos alunos em organizar, interpretar e reelaborar as suas experiências de vida na prática social. Avaliando o aluno, avalia-se também o pro­fessor. Avaliação é processual e considerada instrumento para redimensionamento da prática pedagógica. A avaliação apresenta duas dimensões: institucional e de aprendizagem. Regida por legislações específicas, o sistema educacional define instrumentos e metodologias de aplicação de avaliações dos cursos e desempenho dos edu­candos. Os resultados são utilizados para redimensionamento das polí­ticas e projetos.
Relação Professor-aluno O professor é coordenador ou animador das atividades organizadas conjun­tamente com os alunos. O aluno é sujeito de sua história e de seu processo de aprendizagem. O professor é orien­tador e catalisador, colocando-se como sujeito do grupo para uma reflexão comum. O aluno é sujeito construtor do processo. O professor é mediador entre o aluno e as matérias de ensino. O aluno é um ser concreto e, historicamente, determinado pelas relações socioeconômicas e culturais. O professor é o mediador do processo de aprendizagem. O aluno elabora o conhecimento na relação com o outro. A relação pedagó­gica tem como princípio a mediação vol­tada para o desenvolvimento da “autonomia” dos edu­candos por meio de atividade interativas. Professor e aluno são sujeitos “autônomos” que constroem relações interativas para apren­dizagem coletiva e autoaprendizagem.
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Unidade 2. Concepções de Aprendizagem e Decorrências Metodológicas

Educar é colaborar para que professores e alunos – nas escolas e organizações – transformem suas vidas em processos permanentes de aprendizagem. É ajudar os alunos na construção da sua identidade, do seu caminho pessoal e profissional – do seu projeto de vida, no desenvolvimento das habilidades de compreensão, emoção e comunicação que lhes permitam encontrar seus espaços pessoais, sociais e de trabalho e tornar-se cidadãos realizados e produtivos (MORAN, José Manuel).

Artigo disponível na Internet no seguinte endereço: http://www.eca.usp.br/prof/moran/desafio.htm Acesso em 04 abril de 2010.

Ao tratar das novas maneiras de viver, construir e socializar conhecimentos, especificamente, no processo educativo, é necessário compreender as teorias que subsidiam as práticas de aprender e ensinar e discutir suas implicações no âmbito escolar.

Para isso, as concepções de “educações” são colocadas em pauta como espaços de apropriação e socialização de conhecimentos, os quais são construídos em movimentos rizomáticos e arbóreos que se articulam, gerando diferentes configurações criadas nas relações entre os sujeitos “aprendentes” e “ensinantes”.

No contexto atual, não se atribui à escola o papel de formação para o trabalho ou para a vida, mas como um espaço de humanização onde o sujeito parte da informação para conhecer a realidade social e transformá-la. Nesse espaço, qual é o papel do professor? A palavra-chave que tem sido usada é mediador. Mas o que é ser mediador? O mais adequado não seria humanizador?

Entende-se que a escola é mais que um espaço de humanização, ela é um espaço de conexões. Esse espaço de conexões implica compreensão de que conectar não se restringe a ligar pontos, mas, sim, estabelecer relações convergentes ou divergentes, provocar tensões, perceber intersecções, ou seja, construir redes de ideias, saberes, dúvidas tecidas pelos diferentes fios, isto é, os sujeitos e suas singularidades.

Na busca de estabelecer essas conexões, tem-se o processo de aprendizagens como a maneira pessoal que cada um tem para entrar em contato com o conhecimento e de se apropriar dos saberes; isso é particular em cada indivíduo e o acompanha desde o nascimento.

Esse movimento tem como matriz a construção que está em permanente dinâmica e sobre a qual se vão incluindo as novas aprendizagens, “ressignificando-as”, ou seja, reimprimindo significado a elas. Para melhor compreensão dessas conexões, esse texto abordará os seguintes aspectos: Abordagens pedagógicas na aprendizagem e Práticas pedagógicas na sala de aula.

2.1 Abordagens educacionais na aprendizagem

Essa temática trata das relações entre as teorias pedagógicas e as teorias de aprendizagem no âmbito escolar. Nesse sentido, iniciamos com o questionamento: o que é uma teoria?

Segundo alguns autores, a teoria é um sistema de enunciados, um corpo organizado de ideias sobre a realidade ou sobre um certo aspecto da realidade. (HOHLFELDT et al., 2001, p. 47). De acordo com SANTAELLA (2001, p. 45), é um corpo de generalizações e princípios desenvolvidos em associação com a prática em campo de atividade que forma conteúdo como uma disciplina intelectual.

Considerando que teoria envolve ideias, princípios, o que se entendo por teoria de aprendizagem? Segundo MOREIRA (1999), uma teoria de aprendizagem é uma construção humana de interpretação sistemática da área de conhecimento chamada aprendizagem.

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No tratamento da relação entre as teorias de aprendizagem e pedagógicas (e ensino), percebem-se alguns equívocos, tais como:

A aprendizagem cognitiva resulta no armazenamento organizado de informações na mente do ser que aprende. aprendizagem cognitiva resulta no armazenamento organizado de informações na mente do ser que aprende.

Resulta de sinais internos ao indivíduo e pode ser identificada com experiências, tais como prazer e dor, satisfação ou descontentamento, alegria ou ansiedade.

Envolve respostas musculares adquiridas por meio de treino e prática (MOREIRA, 1999, p. 140.)

A partir dos anos 1980, emergem pesquisas e teorias no intuito de (des)construir e (re)construir as teorias, até então, adotadas no processo educativo. Dentre elas, algumas se destacam como a abordagem construtivista com referencial Piagetiano e a sociohistórica com base em Vygotsky. Entende-se que essas e outras abordagens, independentes dos precursores, apresentam similitudes quanto à contextualização das práticas educativas e a compreensão de que ensino e aprendizagem são faces da mesma moeda.

Do ponto de vista das teorias de aprendizagem, além da cognitiva, surgem teorias que abordam as aprendizagens afetivas e psicomotoras. Simultaneamente, do ponto de vista das teorias pedagógicas, além das metodologias de ensino, buscam-se os aspectos relacionais (professor-aluno; aluno-aluno), culturais e sociais dos sujeitos envolvidos, bem como o contexto dos conceitos sistematizados voltados para a aprendizagem significativa .

Segundo Ausubel (1980 apud MOREIRA, 1999), aprendizagem significativa processa-se quando o material novo, ideias e informações que se apresentam ao “aprendente” numa estrutura lógica, interagem com conceitos relevantes e inclusivos, claros e disponíveis na sua estrutura cognitiva, sendo por ele assimilados, contribuindo para sua diferenciação, elaboração e estabilidade. Os conceitos relevantes preexistentes dão suporte para ancoragem dos novos conceitos a partir da predisposição do “aprendente” no desejo de aprender.

Tendo como referência a distinção das três filosofias subjacentes às teorias de aprendizagem, quais sejam comportamentalista, humanista e cognitivista, passa-se a estabelecer agora algumas relações com as teorias pedagógicas que se distinguem nas correntes do pensamento inatista, empirista e interacionista.

É preciso esclarecer que o propósito dessas relações não é o enquadramento ou identificação de práticas pedagógicas em uma ou outra concepção, pois a dinâmica do processo de construção de conhecimentos não obedece a normas e regras preestabelecidas. Do ponto de vista das teorias comportamentalistas e inatistas, o ensino e a aprendizagem são vistos como fato, produto de um conjunto de procedimentos e princípios adotados. O sujeito “aprendente” é aquele que apresenta comportamentos predefinidos pelo sujeito “ensinante”.

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As teorias humanistas e interacionistas, por sua vez, apresentam as seguintes similitudes: têm como princípio básico o caráter humano; o ensino é centrado no aluno ou educando, e o conteúdo é contextualizado; busca a integração do ato de pensar, sentir e agir num processo de conscientização e de “ressignificação” de saberes sistematizados ou não.

Pode-se considerar que esse processo de “ressignificação” de saberes é o ponto de intersecção entre a teoria humanista e a interacionista, pois ambas primam pela formação humana integral, envolvendo as dimensões cognitivas, afetivas, psicomotora, social e cultural sem perder de vista as diferentes formas de ensinar e aprender no âmbito escolar.

No afã de propiciar a formação humana integral à teoria da aprendizagem significativa, sob o ponto de vista dos teóricos , gera significados que passam a fazer parte da história cognitiva do indivíduo. Para Novak (1980 apud MOREIRA, 1999), a aprendizagem significativa subjaz à integração construtiva de pensamento, sentimentos e ações. Para Gowin (1980 apud MOREIRA, 1999), ela propõe uma relação triádica entre aluno, materiais educativos e professor, tendo como objetivo compartilhamento de significados.

David Ausubel, Joseph Novak e Gowin

Nos últimos anos, em face da necessidade emergente de desenvolver práticas pedagógicas em sintonia com o avanço tecnológico e as transformações sociais e culturais deste milênio, tem-se buscado a aplicação de metodologias e procedimentos de toda e qualquer teoria na crença de que a “bricolagem”, de tudo um pouco, resolveria os problemas da escola. Mas, pelo contrário, isso fragiliza cada vez mais o trabalho docente. As dificuldades de aprendizagem, a falta de motivação para o aprender, o desânimo do professor em relação aos resultados obtidos do seu trabalho, a indefinição das atribuições da escola e da família no processo educativo são algumas dentre muitas situações desafiadoras presentes no cotidiano escolar.

Com a preocupação de construir práticas pedagógicas consistentes e compatíveis com as necessidades contextuais numa abordagem significativa, faz-se necessário mudar alguns focos, tais como:

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Enfim, ao professor cabe, ainda, fazer, periodicamente, avaliação de sua própria prática, utilizando como referência a autoavaliação dos educandos nos seguintes aspectos:

Tais questionamentos contribuirão para que o professor tenha uma atitude de protagonista e não de mero executor de tarefas do processo educativo traduzido na prática docente.

O exercício de autoavaliação da própria prática docente nos remete à necessidade de compreender a prática pedagógica na sala de aula, consubstanciada nas teorias de ensino e aprendizagem. Isso implica alinhar algumas ideias sobre o saber escolar, papel do aluno, papel do professor enquanto seres “ensinantes” e “aprendentes” no processo de construção do conhecimento.

2.2 A prática pedagógica numa abordagem de aprendizagem significativa

Alguns estudiosos entendem que o saber escolar não pode se visto como uma doação dos que julgam que sabem aos que julgam nada saber, porque, entre outras razões, o aluno não substitui, passivamente, o conhecimento informal pelo conhecimento sistemático. Ao contrário, o conhecimento prévio do aprendiz interage, continuamente, com os conhecimentos escolares, produzindo novas formas de interpretar o mundo. Cabe ao professor estabelecer conexões entre o saber que ensina e a cultura prévia do aluno, ampliando-lhe a capacidade de observar e questionar o ambiente que o cerca.

Essa reelaboração do conhecimento é fundamental para o processo permanente de ação e reflexão da prática docente.

Ao considerar o conhecimento prévio do aluno, criam-se situações nas quais, num primeiro momento, ele pode reconstruir seu saber, revendo-o, aperfeiçoando-o, completando-o, generalizando-o e superando-o, num processo progressivo de aproximação em relação ao conhecimento universal. Num segundo momento, ele pode retomar seu próprio mundo para analisá-lo e novamente explicá-lo de acordo com a nova ótica adquirida, completando, assim, o processo permanente de ação-reflexão-ação sobre a realidade.

Dessa forma, pensar em uma prática pedagógica da sala de aula – tomada como toda a relação que se estabelece com os educandos na busca do conhecimento – não se trata em considerá-la como uma forma de introduzir aos alunos o mundo dos conteúdos científicos, das descobertas já realizadas, dos conceitos já formados, das teorias já prontas. Isso seria considerar o aluno como um depositário de informações (educação bancária, segundo Paulo Freire).

Pensar em uma prática pedagógica na sala de aula de forma coerente com uma postura pedagógica crítica ou progressista, em favor da autonomia do ser dos educandos, implica:

Processo dinâmico, espiral e ilimitado.

Perseguir tais finalidades exige que se ultrapassem os limites tradicionalmente abrangidos pelos conteúdos programáticos das diversas disciplinas, exige o estabelecimento de um “novo” paradigma, a construção de um “novo” olhar sobre essa prática, exige a construção de uma prática pedagógica consciente, coerente com um posicionamento teórico, com uma concepção de educação, de homem, de sociedade, fundamentada em uma teoria de aprendizagem e de ensino.

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Segundo Paulo Freire (1998, p. 25), ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção.

Em matéria especial para Folha de São Paulo , Antonio Carlos Gomes da Costa define a escola do futuro como uma escola inteiramente renovada em conteúdo, método e gestão. No que diz respeito ao método, essa escola praticaria, no dia-a-dia, uma nova visão de homem, de mundo e de conhecimento. Uma visão de homem capaz de fazer do educando não um mero receptáculo, mas uma fonte de iniciativa, compromisso e liberdade. Uma visão de mundo que o impulsionasse a relacionar-se com a família, com a comunidade, com a cidade e, virtualmente, com o país e com o mundo. Em termos de conhecimento, teríamos uma escola em que todos estariam voltados a aprender o aprender (autodidatismo), ensinar o ensinar (didatismo) e conhecer o conhecer (construção de conhecimentos). Nessa escola, os jovens seriam protagonistas, envolvidos numa aprendizagem significativa, mas o protagonismo não se limitaria a eles. Eles estariam cercados de professores, pais, gestores escolares e lideranças comunitárias, cada um assumindo seu próprio papel de ator protagonista nessa escola, que participaria da vida da comunidade e dessa comunidade, que participaria da vida da escola.

O artigo intitula-se: Mudar o con­teúdo, o método e a gestão.

2.3 Isso é uma utopia, ou essa escola seria possível?

Acredita-se que essa escola, a escola protagonista, é a escola necessária, capaz de responder às necessidades da sociedade contemporânea.

Mas como, objetivamente, exercer a prática pedagógica, de forma a atender a esses pressupostos?

Parece consenso entre os educadores o desejo (a necessidade) de “ressignificar” o espaço escolar, de modo a que ele possa se transformar em ambiente de superação de desafios pedagógicos e, dessa forma, efetivamente, estar voltado para a formação de sujeitos ousados, ativos, reflexivos, cidadãos atuantes e participativos. É preciso dar um (re)direcionamento à prática pedagógica, impulsionando uma prática significativa e que leve a tais resultados. São várias as abordagens, as quais, se bem dinamizadas, poderão contribuir para que se chegue a tais resultados. Nesse texto, trataremos de uma das abordagens cuja proposta configura-se numa prática pedagógica que dinamiza e significa a aprendizagem denominada pedagogia de projetos.

A proposta de uma ação pedagógica interdisciplinar e contextualizada a partir de projetos de ensino não é recente. William H. Kilpatrick, em 1918, propunha numa das mais prestigiosas revistas americanas de educação da época, Teachers College Record, aquilo que ele denominava de Método de Projetos e que melhor traduzia, naquele momento, o pensamento de John Dewey sobre uma “Pedagogia Ativa”, isto é, do realizar dentro da sala de aula o que se faz continuamente no ambiente natural verdadeiro. (SANTOMÉ, 1998)

Muito tempo se passou – quase um século –, e a discussão sobre a função social da escola continua em evidência entre os educadores. As mudanças na conjuntura mundial, com a globalização da economia e a informatização dos meios de comunicação, têm provocado uma série de reflexões sobre o papel da escola, o papel do professor, o tipo de homem que se quer formar, dentro do atual modelo de sociedade desenhado para este século. É nesse contexto que a discussão sobre a Pedagogia de Projetos hoje se coloca.

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A Pedagogia de Projetos, aqui entendida como uma abordagem pedagógica, objetiva a “ressignificação” desse espaço escolar, transformando-o em um espaço vivo de interações, aberto ao real e às múltiplas dimensões.

O trabalho com projeto tem sido utilizado em várias áreas profissionais e nem sempre com o mesmo sentido. Ao tratar da pedagogia de projetos na prática pedagógica, é considerado como uma abordagem de ensino que tem como propósito uma aprendizagem significativa, através da interação entre seus participantes; sustenta-se na investigação, no questionamento, no levantamento de hipóteses, na comprovação do que se afirma e na experimentação dos fatos. Tem por princípio, portanto, um método científico de investigação .

O Método Científico de investigação, antes adotado apenas em pesquisas acadêmicas e voltado para o ensino de Ciências, passa a ser sustentação teórica da pedagogia de projetos.

Concebe-se, aqui, que a pedagogia de projetos precisa estar voltada para o ensino e aprendizagem; isto é, deve transcender a sala de aula, a organização do conteúdo programático e de atividades pedagógicas à medida que envolve a organização da escola, a definição da proposta de trabalho da escola seja do ponto de vista das formas de gestão, do trabalho docente realizado em sala de aula, das relações entre escola e comunidade/família e relações interpessoais.

De acordo com Rodrigues (2002), adotar essa concepção requer envolver alunos, professores, conselho escolar ou de pais, no processo de avaliação do contexto escolar, partindo de interesses e necessidades significativas dessa realidade. Além disso, é preciso romper com a cultura das práticas individualistas e instaurar a prática de construção coletiva do trabalho docente, o que implica também a produção de saberes específicos da prática pedagógica.

É verdade que a construção coletiva, em geral, é conflituosa à medida que as diferentes leituras e concepções sobre a realidade promovem divergências na organização e realização do trabalho docente.

Na tentativa de explicitar o entendimento sobre a construção de projetos voltados para articulação ensino-aprendizagem, apontam-se algumas considerações:

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Ao considerar tais aspectos, o trabalho com projetos pode promover intervenção na realidade de forma significativa, pois envolve a reflexão sobre a realidade que temos, que se deseja, o que é possível realizar e o que é significativo para os alunos. Isto é, faz-se necessário considerar a diversidade e a singularidade da escola que se constitui do conjunto das condições de trabalho, da estrutura e funcionamento administrativo e pedagógico da escola, recursos financeiros, bem como suas formas de organização e gestão.

Adotar a pedagogia de projetos não deve ser uma mera busca de inovações ou mais um modismo, pois tal proposta exige mudança de atitudes e ações integradas entre os sujeitos envolvidos, especialmente dos professores. Sem ignorar o caráter da globalização presente no trabalho com projetos, percebemos que o mesmo pode converter-se em uma prática de ruptura das relações verticais entre professores e alunos, bem como do tratamento dicotômico do conhecimento, onde cada disciplina fica em uma gaveta, como afirma Libâneo (2001, p. 98): “o projeto surge como forma de superação de um paradigma técnico (tecnicista) em que tudo o que a escola e os professores precisam fazer já vem estabelecido de cima”.

A partir dessas considerações, é preciso ter-se clareza de que a construção de projetos não se reduz à realização de “... pequenas atividades, assim como não se pode confundir o trabalho de pesquisa (cópia?) sobre um determinado tema, o qual deve ser entregue em folha de papel almaço, ou ainda limitar-se a uma série de exercícios de matemática” (NOGUEIRA, 2000, p. 37) ou, também, confundir com atividades funcionais, as quais são regulares (repetem-se sempre do mesmo modo, com pequenas variações) e são “intermináveis”, ou seja, não têm perspectiva de ser finalizadas.

Na verdade, o trabalho com projetos coloca os sujeitos envolvidos num processo de construção de conhecimento através da intervenção na realidade, como aponta Vasconcellos (2000) ao afirmar que a construção de projetos se impõe como elemento provocador à própria atuação do professor, o qual precisa dominar o “por que”, o “para que”, e o “como” numa atitude de busca.

Nessa perspectiva, é atribuição do professor colaborar para o desenvolvimento de ações significativas para o educando, o que implica assumir atitudes de busca, autonomia, estudo e disponibilidade para o trabalho coletivo, o que se confirma nas palavras de Libâneo (2001, p. 98):

o projeto, numa perspectiva progressista, é o meio pelo qual os agentes diretos da escola tornam-se sujeitos históricos, isto é, sujeitos capazes de intervir conscientemente e coletivamente nos objetivos e nas práticas de sua escola, na produção social do futuro (da escola, da comunidade) da sociedade.

Segundo Abrantes (1995), são características fundamentais do trabalho com projetos:

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Critério de escolha de um tema não pode basear-se apenas no que os alunos gostam, mas nas suas experiências e conhecimentos sobre o tema e nas possíveis contribuições de ampliação de conhecimentos e de intervenção na realidade.

É bom ressaltar que o princípio da interdisciplinaridade rege as etapas já mencionadas, as quais se constituem de conjuntos das atividades e da ação consciente do professor, que busca estabelecer a relação horizontal com o aluno, propondo caminhos que buscam a articulação entre intencionalidades, realidades e mediações no processo que se aprende ao ensinar. Dessa forma, torna-se imprescindível caracterizar a realidade que temos, delinear a que queremos construir e criar possibilidades de transformá-la à medida que nos transformamos.

Segundo Rodrigues (2002), a proposta de projetos de ensino na organização do trabalho escolar é concebida como inovação quando sua construção é gerada pelos sujeitos quais sejam: professores, alunos, funcionários, alunos e pais. Na verdade, a ideia de que a proposta de uma escola pode ser aproveitada em outra é ilusória, pois cada instituição escolar é caracterizada por suas diferenças e singularidades; não há como reproduzir realidades, pessoas e sonhos.

Considerações finais

Retomando a ideia de que a escola é um espaço de conexões de saberes, tensões e relações entre os sujeitos, concebe-se aqui que as decorrências das concepções teóricas na prática pedagógica precisam ser compreendidas pelos professores como formas possíveis de aprendizagem significativas. Isso implica entender que a construção da prática docente se dá também no compartilhamento, com seus pares, de suas ideias e incertezas relativas aos processos de ensinar e aprender.

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Sentir-se protagonista de sua própria prática é um primeiro passo para que o professor construa uma prática pedagógica significativa voltada para uma aprendizagem significativa de seus alunos.

Um caminho não há, mas, sim, trilhas possíveis. Afinal, já disse o poeta Thiago de Melo: “Não, não tenho caminho novo. O que tenho de novo é o jeito de caminhar...”.


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