Patrimônio, Direitos Culturais e Cidadania Propostas, Práticas e Ações Dialógicas

Biblioteca em Ação: Revitalização da Biblioteca Pública do Centro de Artes e Esportes Unificados (C E U) do Jd. Alvorada – Anápolis – GO

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Resumo

Este relatório técnico-científico foi realizado a partir de uma abordagem participativa em consonância com a comunidade local e adjacências, frequentadora da biblioteca pública do Centro de Artes e Esportes Unificados de Anápolis – GO (C E U), com a Secretaria Municipal de Cultura de Anápolis e a Universidade Federal de Goiás (UFG). Dentre os objetivos considerados pela ação interventiva destacou-se a revitalização do prédio que abriga a biblioteca acima supracitada. Esta revitalização consistiu em promover uma ação comunitária junto aos integrantes do local (funcionários, usuários) e a especializanda da Universidade Federal de Goiás (UFG) para a realização de pintura das paredes internas do referido prédio, que pela época de intervenção se encontrava bastante degradada (mofo) devido a infiltrações provocadas pela água da chuva, o que tornava o espaço insalubre para seus usuários. Os recursos para a realização deste trabalho foram oriundos da comunidade e dos funcionários daquela instituição, que contribuíram voluntariamente com a mão-de-obra, e a especializanda proponente da ação de intervenção, que custeou os materiais gastos na operação (tinta, pincéis, etc.). Decorrido o processo para a efetivação do projeto a ação interventiva foi dividida em 04 (quatro) etapas distintas: I) apresentação do projeto Biblioteca em Ação: Revitalização da Biblioteca Pública do Centro de Artes e Esportes Unificados (C E U) do Jd Alvorada – Anápolis – GO à SEMUC; II) reunião com a comunidade local para propor a ação comunitária; III) execução da ação interventiva com a participação da comunidade local e funcionários da referida instituição; IV) culminância do projeto com a participação da CIA Volta Seca de Teatro e Circo para a apresentação do espetáculo “Mala Viajante” que, por sua vez, é um projeto itinerante de contação de histórias voltado para o incentivo à leitura e ao resgate da cultura popular, sob os cuidados dos artistas Marises Santos (Violeta) e Luciano Ribeiro de Jesus (Pintadinho).

Palavras-chave: Cultura; Biblioteca; Revitalização; Cidadania.

Introdução

A relação de parceria mediando as ações sociais não está restrita ao âmbito governamental/sociedade, estende-se às mais diversas esferas da sociedade como, por exemplo, a educação - especialmente a educação superior – que vem ampliando seu leque de alcance para além dos muros das faculdades, mediando ações de interesse das comunidades a sua volta. Assim, quando a Universidade Federal de Goiás impetra propostas interativas para seus educandos executarem junto às comunidades, sejam elas culturais ou não, traz para o debate uma série de questões que envolvem o Poder Público e a sociedade civil, a citar as dificuldades de manutenção dos espaços físicos públicos que, ao que parece inicialmente, pela parceria tem maior probabilidade de se efetivarem.

Atualmente, uma das grandes demandas desses dois segmentos trata-se da ocupação efetiva (manutenção, preservação, ampliação) das Praças C E Us das Artes que, dentre muitos fatores, envolve grande contingente de recursos financeiros, humanos e materiais para a realização de um trabalho que contemple as demandas sociais (cultura, esporte, lazer, formação profissional, etc.) outrora elencadas pela proposta C E U das Artes. O trabalho conjunto entre a prefeitura (via Secretaria Municipal de Cultura), a UFG (aqui representada por esta autora/especializanda) e a comunidade local, é uma via de mão dupla onde todos os partícipes têm algo a oferecer (experiência, conhecimento, serviços) e a receber, direta ou indiretamente.

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Com o tema Biblioteca em Ação: Promovendo inserção social por meio da leitura, a ação intervencionista teve por objetivo a revitalização do espaço interno da biblioteca pública do Centro de Artes e Esporte Unificados – Jd. Alvorada – Anápolis – GO, contando não só com a participação coadjuvante daquela comunidade, mas, também, propondo uma participação ativa da comunidade em todo o processo, desde os apontamentos dos problemas de infraestrutura do espaço até os direcionamentos para possíveis resoluções práticas para melhorias do local.

Por meio de uma abordagem participativa da comunidade local, a intervenção abordou a importância da contribuição de todos (Poder Público, comunidade e fomentador cultural) para a manutenção, preservação e efetivação dos espaços públicos de cultura em Anápolis em prol da promoção de cidadania plena aos partícipes do processo. Tal parceria resultou numa ação comunitária (mutirão) para a pintura das paredes internas do prédio que abriga a biblioteca pública do Centro de Artes e Esporte Unificados – Jd. Alvorada – Anápolis – GO, em que os moradores e funcionários da biblioteca entraram com a mão de obra, a pesquisadora com os recursos financeiros pertinentes para a execução do projeto, e parceiros da Secretaria Municipal de Cultura contribuíram (gratuitamente) com sua arte.

Tomou-se o mês de junho de 2018 para a realização da ação interventiva, começando por uma reunião com o Secretário Municipal de Cultura, com os usuários e funcionários da biblioteca pública do Centro de Artes e Esporte Unificados – Jd. Alvorada – Anápolis – GO. Na ocasião foi feita a apresentação do projeto de revitalização, colhimento de assinaturas necessárias à permissão de cada membro envolvido quanto ao uso de imagem e outras deliberações.

Acolhidas as opiniões, manifestações e apontamentos feitos pela comunidade, tais como a importância do espaço para os moradores e adjacências, realizou-se uma ação comunitária para a pintura do espaço interno (paredes) da biblioteca acima mencionada, que em virtude de infiltrações encontrava-se bastante danificada com umidade, mofo, rachaduras, tornando o local insalubre conforme mostram as fotos em anexo. Essa ação prática foi realizada por funcionários da biblioteca e moradores, nos moldes de mutirão.

A culminância das ações se deu no dia 22 de junho de 2018 nas dependências da biblioteca, palco do projeto, com a apresentação da CIA Volta Seca de Teatro e Circo, com o espetáculo “Mala Viajante” (Contação de história). Grupo este que trabalha justamente com o resgate da cultura popular e incentivo à inclusão social por meio da arte/cultura/leitura, sendo toda a comunidade local convidada a participar.

Assim sendo, a sensibilização da comunidade local em abraçar a proposta de revitalização (entendendo que o espaço é comum a todos, portanto seus problemas e benesses também o são) foi, com certeza, um dos grandes marcos do projeto.

Desenvolvimento

Em seu processo de proposta, elaboração e aplicação, o Plano Nacional de Cultura (PNC) aponta algumas diretrizes a serem alcançadas e consideradas para a cultura até o ano de 2020. Dentre elas se destacam 53 metas que elencam suas pretensões junto à sociedade brasileira, desde as particularidades culturais dos grupos à relação capital entre mercado e cultura (PIB Nacional), como também a apropriação de espaços culturais por parte da comunidade, por exemplo, as bibliotecas públicas e museus (meta 34).

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Pensado para tanto, o PNC aborda em seu texto as dimensionalidades da cultura, que seriam: dimensão simbólica, cidadã e econômica. Uma vez amparado pelo Art. 215 da Constituição Brasileira que trata da responsabilidade de o Estado garantir os direitos culturais plenos para o cidadão, as metas do PNC constituem vetores fundamentais para pleitearem ações voltadas para o uso efetivo dos espaços culturais nacionais. Considerando que este é um dos aportes legislativos de cunho nacional, espera-se que o mesmo também faça jus aos seus entes federados (estados, municípios e DF).

Sem dúvida, as bibliotecas públicas são espaços elementares para a fruição de ações culturais coletivas, ora pelo prazer da leitura, ora pela responsabilidade com a pesquisa, ora pelo atendimento diversificado voltado para os mais variados públicos por meio de múltiplas atividades culturais, que tanto podem entreter ou informar/orientar/conscientizar seu público.

Os Centros de Artes e Esportes Unificados (C E Us) fazem parte de um programa do Governo Federal (via Ministério da Cultura com o aporte de outros ministérios) elencados junto aos municípios a partir de 2012, onde se interagem várias ações culturais, esportivas, lazer, qualificação profissionais, etc., instalados em áreas de vulnerabilidade social, (especialmente, dentro de praças), cujo principal objetivo é a atuação de serviços sócio/assistenciais conjuntos. Primam pela proposta de administração tripartite (Poder Público, comunidade civil, comunidade civil organizada).

Os C E Us contam com vários espaços físicos para atenderem as demandas que os procuram, dentre os quais se encontram as bibliotecas públicas. As bibliotecas dos C E Us compreendem espaços de atendimento (pelo menos se propõe) por meio de seus acervos variados, oferecendo ao seu público diferentes linhas de leitura, as mais variadas atividades (saraus, oficinas literárias, debates, dentre outros) pertinentes ao âmbito bibliotecário. Pela proposta de efetivação dos C E Us os entes federados podem contar com o auxílio do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP) que por sua vez articula-se aos estados e municípios por meio do Plano Nacional do Livro e da Leitura (PNLL).

Anápolis, assim como outros municípios goianos, foi contemplada com um Centro de Artes e Esportes Unificados. Inaugurado em julho de 2014, na Praça Jorge Naben, Jd. Alvorada, o espaço comporta uma área de 3000 m², contendo um Centro de Referência Social (CRAS), uma Biblioteca, um Cineteatro, um Tele Centro, uma quadra poliesportiva, uma pista de skate e um playground, devidamente mobiliado e equipado. Sob a tutela da Secretaria Municipal de Cultura, envolve desta feita várias outras secretarias municipais e a comunidade em geral (via Conselho Gestor) na administração, organização, preservação, manutenção e efetivação da Praça C E U do Jd. Alvorada – Anápolis – GO.

A biblioteca do C E U do Jd. Alvorada conta com razoável acervo literário entre literatura infantil, infanto-juvenil, literatura em geral, alguns exemplares para pesquisa e, também, absorve boa parte de obras de escritores anapolinos. Para a renovação e manutenção de seu acervo literário trabalha em parceria com a comunidade local promovendo, sempre que possível, a troca de livros. Também recebe doações de livros, revistas, etc. Presta relevantes serviços para a comunidade em geral, pois além de promover a política de empréstimo de livros constitui um espaço variado para leitura, aulas de grafite, aulas de violão, dentre outros.

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Contudo, apesar de as esferas públicas e sociedade compreenderem, e até mesmo concordarem, quanto à importância dos marcos regulatórios dispensados hoje para as orientações em prol das ações culturais e a efetiva manutenção dos espaços físicos de cultura, também concordam que os mesmos ainda não são autossuficientes. Não raro, deparamo-nos com as dificuldades materiais de os responsáveis (gestores) pelos espaços culturais prestarem devidamente os serviços de manutenção conforme o usuário almeja. Daí a ideia de uma ação comunitária para a revitalização do espaço da biblioteca do C E U do Jd. Alvorada em Anápolis – GO. A proposta da ação previa a revitalização do espaço interno da biblioteca C E U das artes seguindo os parâmetros orientados por estudiosos que tratam a Pesquisa Participante como um leque primordial para promover ações coletivas nos espaços públicos (biblioteca) ou privados que, dentre outros fatores, atendam mais condignamente ao seu público.

Tomadas as providências (apresentação do projeto para a comunidade local, funcionários da biblioteca, SEMUC, recolhimento das anuências dos participantes envolvidos no decorrer da produção, execução e culminância do projeto de intervenção), foi possível apresentar àquela comunidade um espaço agradável e esteticamente favorável para leitura, entretenimentos e pesquisa aos seus usuários, conforme mostram as imagens em anexo.

Como já citado na introdução deste trabalho, a relação de parceria mediando as ações sociais estende-se às mais diversas esferas da sociedade. No caso da educação superior, por exemplo, o alcance para além dos muros das faculdades, tal como tem feito a Universidade Federal de Goiás impetrando propostas interativas para seus educandos executarem junto às comunidades, traz para o debate pensadores como:

Para Gadotti (2017), esse mecanismo de ensino/ação tem bastante aporte mediante as proposições defendidas pela Constituição de 1988 (Constituição Cidadã/Art. 207) ao associar pesquisa e extensão, juntamente com os predispostos pela Lei de Diretrizes e Base da educação LDB/1988 (Lei nº 9.394/96, Art. 43) que, dentre outras coisas, aponta a extensão universitária como um agente transformador social mediado pelo diálogo participativo entre as partes envolvidas (pesquisador/pesquisado) – promove o ensino, gera conhecimentos sistematizados, democratiza uma relação antes imposta de cima para baixo – conceito este repelido por (FREIRE, 1996) em sua obra Pedagogia da Autonomia.

Darcy Ribeiro concebe a extensão universitária uma missão social capaz de promover cidadania aos grupos (apud ROCHA, 2001). Apesar de suas ressalvas (carece de mais políticas públicas em torno do tema), Nogueira também tem um olhar positivo ao discorrer sobre o papel social da universidade, ora ampara o estudante do ensino superior que precisa de vivências práticas para embasar seu academicismo latente, ora ampara as comunidades de base normalmente envolvidas nessa dialética do ensino superior (NOGUEIRA, 2001).

A flexibilidade permitida pela pesquisa-ação, quando de sua abordagem, favorece, dentre outros fatores, ao pesquisando e sua equipe um contato direto com seu objeto de pesquisa (comunidades de base) e a partir das trocas de experiências, informações, análise do contexto, etc., avançarem para a elaboração conjunta de um plano de ação que culminará na intervenção pensada, aprovada pelos participes envolvidos (THIOLLENT, 2007). Mas, não se enganem, mesmo a pesquisa-ação é um gerador de conflitos, alerta o autor. Isso mesmo, a pesquisa-ação é por si só um gerador (fomentador) de conflitos, pois, observa-se os muitos interesses, desejos, sonhos, dentre outros, tanto de um lado como do outro (grifo nosso).

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Assim, promover políticas públicas sociais como foi a proposta inicial do Programa C E Us das artes não é tarefa simples e acaba se esbarrando no velho paradigma da política eleitoreira, tão comum no Brasil, tornando-se sempre refém das ações imediatistas de políticos despreparados ou mesmo desinformados sobre as questões culturais em Anápolis e que, por sua vez, acabam por promover tão somente o que bem ressalta Demo (2006), políticas sociais pobres para pobres. O propósito aqui não se trata apenas de uma crítica pura e simples, mas, de se perceber a proporção e importância de se promover políticas públicas em cultura ou em qualquer outro segmento social para a cidade que correspondam às necessidades reais e perenes das comunidades.

Conclusão

Partindo da ótica de que a participação popular é de suma importância para a comunidade, o projeto de intervenção Biblioteca em Ação: Revitalização da Biblioteca Pública do Centro de Artes e Esportes Unificados (C E U) do Jd. Alvorada – Anápolis – GO foi uma experiência bastante positiva. Foi o momento em que pesquisando (instituição) e o pesquisado (comunidade) se “deram” as mãos para dialogarem, expressarem suas carências, suas conveniências. Direcionaram ações que naquele momento eram relevantes para todos os envolvidos. Através do “ouvir” o outro se detectam realidades especifica pertinentes ao grupo questionado.

Contudo, observa-se que nem tudo são flores no processo de intervenção, como bem define (THIOLLENT, 2007), ao adentrarmos a intimidade de determinado grupo somos inegavelmente geradores de conflitos. Se lida com interesses diversos e cada um tem suas urgências próprias. Conseguir manter a sensatez do diálogo para um foco objetivo e comum a ambos os polos talvez seja um dos grandes desafios para os pesquisadores.

Em uma sociedade condicionada a receber tudo pronto, onde esta se exime da responsabilidade de cuidar, preservar, resguardar os espaços públicos (no caso a biblioteca), como lhes é de direito, percebe-se cidadãos incoerentes com o processo intervencionista/participativo, os quais ainda veem as repartições públicas como responsabilidades únicas do Poder Público, haja vista que o número de participantes na primeira reunião não tenha sido tão expressivo como o esperado.

Considerar e promover ações educativas sobre o processo patrimonial /cultural e suas demandas junto à sociedade é um grande desafio para os atores que lidam diretamente (educação) ou indiretamente (fazedores de cultura), tanto no âmbito privado quanto para o Poder Público. Porém, esse caminho é sem dúvida um aporte para sedimentar a cultura da participação (envolvimento) popular na pesquisa-ação.

Referências

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BRASIL, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil.

DEMO, Pedro. Pobreza política: a pobreza mais intensa da pobreza brasileira. Campinas, SP: Armazém do Ipê (autores Associados), 2006.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa/51ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.

GADOTTI, Moacir. Extensão Universitária: Para quê?. Instituto Paulo Freire, 2017. Disponível em: https://www.paulofreire.org/images/pdfs/Extens%C3%A3o_ Universit%C3%A1ria_- _Moacir_Gadotti_fevereiro_2017.pdf. Acessado em: 03 de abril de 2018.

NOGUEIRA, Maria das Dores Pimentel. A Construção da Extensão Universitária na América Latina. In Dores Santos de Faria (Org.). Brasília, Brasiliense: 2001, p. 57 - 71.

ROCHA, Roberto Mauro Gurgel. A Construção da Extensão Universitária na América Latina. In Dores Santos de Faria (Org.). Brasília, Brasiliense: 2001, p.13 – 27.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação: 15ª Ed. São Paulo: Cortez, 2007. (Coleção temas básicos de pesquisa-ação).

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