Resumo
Este relatório traz uma reflexão sobre a preservação e manutenção do patrimônio artístico e histórico da cidade de Anápolis. A partir de uma exposição fotográfica realizada na antiga estação ferroviária, essa discussão foi levada aos habitantes da cidade que, por meio de obras do artista Francisco Garcêz, puderam conhecer mais do passado e da história que constituiu o território e formou o que se conhece hoje como município.
Palavras-chave: Patrimônio; Fotografia; História.
Apresentação
O presente relatório técnico-científico tem como finalidade documentar e descrever o projeto de intervenção realizado como trabalho de conclusão do curso de especialização em Patrimônio, Direitos Culturais e Cidadania, oferecido pelo Centro Integrado de Aprendizagem em Rede da Universidade Federal de Goiás (CIAR/UFG) e pelo Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás (NDH/UFG).
Também é um projeto de extensão e cultura da Universidade Estadual de Goiás e conta com o apoio do Instituto Jan Magalinski e da Prefeitura Municipal de Anápolis. Concepção, execução e curadoria de Marcos Rogério Val Fernandes Júnior e Paulo Henrique Silva Batista Júnior.
A ação cultural foi desenvolvida com o intuito de valorizar e difundir o conhecimento a respeito do patrimônio cultural, através da exposição fotográfica Anápolis Focalizada por Francisco Garcêz, que foi pensada a partir de conversas com o historiador Jairo Alves, diretor do Museu Histórico de Anápolis e do Instituto Jan Magalinsk. O historiador nos apresentou a história e obra de Francisco Garcêz e, a partir do conhecimento da vida e trabalho do fotógrafo, surgiu a ideia e a vontade de executar a exposição.
Introdução
Francisco Garcêz Chiquito (1900 - 1979) solidificou e eternizou paisagens, arquitetura, urbanidade e ocorrências de Anápolis das décadas de 40 e 50. Por meio de seu olhar e registros, a exposição contou com algumas fotos de seu acervo. O mineiro que residia em Anápolis, amante da fotografia, expressou em seus retratos sua admiração pelas belezas, características urbanas e cotidianas da cidade.
Garcez registrou, principalmente, a identidade arquitetônica do município, que tem como principal influência o Art Déco (1920 – 1940), também conhecido como Estilo de 25, oriundo da Europa. O estilo foi um importante canal de expressão da modernidade e buscava renovar os referenciais estéticos da época, simbolizava o progresso e a tecnologia, se encaixou perfeitamente ao contexto de expansão, desenvolvimento econômico e cultural que o município e o Estado de Goiás viveram.
A fotografia converte momentos, objetos e paisagens em memória, fonte de emoção e informação. O fotógrafo cristaliza o presente através de seu olhar e clique, como uma súbita paralisação do tempo.
Kossoy (2001) descreve que:
Página 458A vida, no entanto, continua e a fotografia segue preservando aquele fragmento congelado da realidade. Os personagens retratados envelhecem e morrem, os cenários se modificam se transfiguram e, também, desaparecem. O mesmo ocorre com o autores-fotógrafos e seus equipamentos. De todo o processo, somente a fotografia sobrevive, algumas vezes em seu artefato original, outras vezes apenas o registro visual reproduzido. (KOSSOY 2001 P. 156).
ANÁPOLIS FOCALIZADA POR FRANCISCO GARCÊZ teve como objetivo principal evidenciar o patrimônio cultural material da cidade através das fotografias de Garcêz, que venceram o tempo e hoje se transformaram em memória e registro de uma época e cultura. As palavras de Kossoy se aplicam ao contexto da exposição, onde o tempo se encarregou de levar o fotógrafo, transformou e/ou aniquilou paisagens e edifícios. Apenas a fotografia resistiu às modificações que o tempo trouxe junto a novas demandas, conceitos estéticos e motivos particulares.
A exposição trouxe para a população um conhecimento que ultrapassa as barreiras da educação formal e, de forma prática, apresenta o retrato de uma cidade atualmente desconhecida por grande parte dos visitantes. Para Alessandro de Melo e Poliana Fabiula Cardozo,
O patrimônio é compreendido como a objetivação da produção histórico-social da humanidade, e, portanto, necessita ser socializado, o que é o objetivo da educação patrimonial. A socialização e a apropriação do patrimônio integram a formação genérica do ser humano (DUARTE, 1993), e o alijamento dos homens em relação ao patrimônio é indício de um processo desumanizador. (2015, p.2)
O resgate histórico de Anápolis da primeira metade do século XX traz aos dias atuais uma reflexão sobre a constituição do território e os acontecimentos que marcaram a região. As fotos que ilustram e registraram o passado anapolino hoje são parte do patrimônio histórico-cultural goiano.
Patrimônio é tudo o que criamos, valorizamos e queremos preservar: são os monumentos e obras de arte, e também as festas, músicas e danças, os folguedos e as comidas, os saberes, fazeres e falares. Tudo enfim que produzimos com as mãos, as ideias e a fantasia. (LONDRES, apud IPHAN, 2012, texto de apresentação).
COntextualização Histórica
A década de 1930, durante o governo de Getúlio Vargas, foi marcada por significativas mudanças e transformações no cenário político, social, econômico e cultural do Brasil. Conforme descreve Machado (2009):
Esse período registrou uma nova dinâmica para a economia nacional, graças à penetração do capital no interior do país. Em Goiás, a imagem que marcou o período foi a entrada da estrada de ferro no território goiano, puxada pela produção cafeeira. Com relação a Anápolis, o ano de 1935 ficou registrado na memória como o ano da chegada do trem à cidade e, com ele, a modernidade e o progresso. Esse período foi identificado como o momento de hegemonia do setor terciário, em que houve grande impulso na troca de mercadorias e serviços. (MACHADO, 2009)
A estação ferroviária Prefeito José Fernandes Valente, inaugurada em 7 de setembro de 1935, é um importante símbolo histórico e cultural do município, o edifício simboliza o momento histórico de mudanças pelas quais o Estado de Goiás e Anápolis passaram. A chegada da estrada de ferro em Goiás integrou o Estado à dinâmica capitalista nacional. Em Anápolis, a estação ferroviária contribuiu para que o município se tornasse um dos maiores centros comerciais do Estado de Goiás. (OLIVEIRA e SILVA, 2016). O edifício também representa a chegada da modernidade e transformação urbana, arquitetônica e cultural do município. Polonial (1995) relata que:
Página 459As mudanças davam-se no aspecto físico, com as construções; no aspecto social, com o aparecimento de uma vida noturna, com o crescimento populacional, com a chegada dos imigrantes e com o surgimento dos problemas sociais, como o aumento da criminalidade; no aspecto econômico, com a valorização das terras, a construção de novos estabelecimentos e a dinamização do comércio em geral (Jornal Voz do Sul, 10.01.32 apud POLONIAL, 1995, p. 54).
Ainda segundo Polonial (1995), este progresso deveria estar refletido não somente no prédio da estação ferroviária, mas, também, nas demais construções. A mudança se deu perceptível, principalmente, na arquitetura e urbanismo da cidade, que sofreu fortes transformações neste período. Toda a prosperidade e sede de modernidade que pulsava na população contribuíram para o rápido desenvolvimento e expansão do município.
O expressivo aumento na quantidade de construções passou a ser símbolo do progresso. O crescimento urbano ocorrera tão acelerado e intenso que nem mesmo as empresas construtoras da época conseguiam acompanhar, segundo relatos frequentemente noticiados e registrados pelas mídias locais da época.
E’ incontestável o progresso de Annapolis. Innumeras são as construções em andamento e mesmo assim há falta de casas. Diversas campainhas constructoras já installaram suas agências nesta cidade e segundo informações seguras, o número de inscripções já é volumoso. (O Annapolis, 12-05-1935).
Art Decó e Anápolis
O Art Decó ou estilo de 25, que se destacava entre as décadas de 1920 e 1940 no mundo, foi importante representante e expressão da modernidade, o qual teve como princípios e conceito a renovação estética e o avanço tecnológico que o mundo sofrera nesse período, após a 1ª Guerra Mundial. Nestas décadas, Anápolis passava por um forte momento de modernização e acelerada expansão urbana, conforme citado acima. Por esta razão, o estilo predominante e marcante do município é o Art Decó, presente nas principais e importantes edificações históricas da cidade. O estilo tem grande representação na cidade e no Estado, que prosperava e se expandia urbanamente nas décadas de 1930 e 1940.
O Lugar
A antiga Estação Ferroviária José Fernandes Valente foi escolhida para sediar a exposição fotográfica (projeto de intervenção) por alguns fatores. Sobretudo por se tratar de um importante patrimônio cultural da cidade, símbolo da modernidade e da vigorosa transformação cultural e expansão que o município sofreu em consequência da chegada da estrada de ferro em Goiás.
De acordo com Polonial (1995), esse período foi marcado por uma série de pedidos e licença para construção de prédios e a estação se tornou símbolo de lazer na cidade. Freitas, citado por Oliveira & Silva (2016), relata que a chegada e partida do trem eram vistos como um acontecimento especial:
Página 460Era a hora de recepcionar os visitantes, ou de dar adeus àqueles que partiam. Mas não eram só as famílias que visitavam a estação. Os espertalhões também marcavam presença. E, bem próximo à estação, funcionava uma zona boêmia. (Oliveira & Silva, 2016, p. 363).
Mas não demorou muito para que a ferrovia, o motor que impulsionou o desenvolvimento econômico de Anápolis no Século XX, se tornasse um transtorno. Em consequência do desenfreado crescimento urbano, ausente de planejamento urbanístico, os trilhos começaram a se tornar um empecilho na região central, causando acidentes e complicações na mobilidade pública. Segundo Freitas, citado por Oliveira & Silva (2016), já em 1942 os trilhos começaram a apresentar os primeiros problemas devido à insuficiente e inadequada manutenção. Com isso, os transtornos eram constantes, atrasando e atrapalhando os comerciantes e o comércio dado ao atraso das viagens.
Os trilhos também se tornaram um obstáculo à expansão da área urbana da cidade, além dos números de acidentes cada vez mais frequentes, visto que o número de automóveis circulando na cidade crescia a cada dia, exigindo modificações na estrutura ferroviária do Setor Central. Oliveira & Silva (2016), recorrem à Freitas (1995), que descreve o acidente de colisão entre o ônibus e o trem em 27 de junho de 1970 como o mais grave:
No acidente, uma pessoa morreu e outras 22 sofreram ferimentos de variada gravidade, sendo internados em um hospital da cidade. A catástrofe consternou a cidade. Ocorreram protestos e foi pedida a retirada imediata dos trilhos. (Oliveira & Silva, 2016, p. 363).
Porém, somente em 1976 é que de fato teve início o processo de retirada dos trilhos do centro da cidade.
A retirada dos trilhos e a desativação da estação ferroviária, associadas à falta de ações públicas adequadas à preservação da mesma contribuíram para que o prédio da estação se deteriorasse em consequência da ação do tempo e dos interesses econômicos, afastando-a da população e provocando, assim, uma carência de identificação da população anapolina com a história relacionada à estação, história esta de fundamental importância para a construção da Anápolis que temos hoje. (OLIVEIRA e SILVA, 2016, p. 367)
A estação ferroviária de Anápolis, que foi tombada pela Lei Municipal nº 1.824 em janeiro de 1991, também se tornou um lugar de resistência após a determinação da desapropriação de um dos lados do terminal urbano de ônibus coletivo, depois de anos de luta judicial. Em 2013, o Ministério Público de Goiás obrigou a então concessionária de transporte público municipal, TCA, a demolir o Terminal 2, com o intuito de dar visibilidade e restaurar a construção histórica, mas a demolição de fato só foi efetivada em 2015.
Desde então, o edifício se encontra em desuso mesmo após sua restauração “concluída” em 2016. A falta de investimento, má gestão, planejamento e execução da restauração do edifício impossibilitou a abertura do mesmo para funcionamento público. A restauração foi concluída com ausência de banheiros, instalação elétrica e hidráulica inadequada e ineficiente, não correspondente a exigências técnicas e de acessibilidade e, também, carente de equipamentos, mobília e paisagismo.
Hoje a Estação está desativada e não sedia nenhum órgão ligado à cultura ou patrimônio do município, o que foi um fator determinante para que o projeto ocupasse este espaço. O edifício se encontra desativado por falta de infraestrutura e investimento dos órgãos públicos responsáveis.
Página 461Além de reviver o passado através das fotografias de Garcez, a ação também teve como objetivo e proposta revitalizar a Estação Ferroviária, transformando-a em um espaço cultural aberto à população durante o período da ação (14/08/2018 – 18/08/2018), tendo assim um uso, mesmo que pontual. A localização centralizada e o fácil acesso ao edifício (situado em frente ao terminal de transporte público) também foi um fator importante para escolha do local.
O espaço foi concedido após solicitação na Secretaria Municipal de Cultura por meio de um ofício, o qual foi prontamente autorizado e assinado pelo secretário da Cultura. Pensando em solucionar a ausência de banheiros, optou-se pela utilização de banheiros químicos no local. Os banheiros foram cedidos pela prefeitura municipal, após petição.
Concepção
A ação intervencionista começou a ser pensada e desenvolvida no fim de 2017, a partir das orientações obtidas presencialmente e online com o orientador acadêmico Diogo Jansen. Primeiramente, surgiu a ideia de se fazer releituras das fotos antigas utilizando o grafite como forma de reprodução, mas a proposta foi inviabilizada no momento por falta de verba, o que motivou o grupo a inscrever o projeto em editais de incentivo à cultura num futuro próximo.
O tema e a abordagem foram definidos e amadurecidos após algumas reuniões de grupo. A discussão principal desde o início teve como foco levar a história e cultura do município para a população, que em sua maioria não tem acesso e conhecimento a respeito. A ação buscou promover educação patrimonial por meio de um método não formal, tendo como objetivo evidenciar a história e reforçar a identidade cultural do município, com foco principal na arquitetura e urbanidade da cidade nas décadas de 40 e 50, por meio das fotografias.
O conhecimento e entendimento a respeito do Patrimônio Cultural são essenciais para a formação íntegra de um cidadão, pois através do mesmo é possível desenvolver um maior senso crítico e compreender melhor o meio em que se vive. (HORTA, 1999, p. 4).
A partir da experiência e do contato direto com as evidências e manifestações da cultura, em todos os seus múltiplos aspectos, sentidos e significados, o trabalho da Educação Patrimonial busca levar as crianças e adultos a um processo ativo de conhecimento, apropriação e valorização de sua herança cultural, capacitando-os para um melhor usufruto destes bens, e propiciando a geração e a produção de novos conhecimentos, num processo contínuo de criação cultural. (HORTA, 1999, p. 4).
Somente após o conhecimento e acesso ao patrimônio que o cidadão entende a importância e valor da preservação e conservação do mesmo para a formação de uma identidade. Tendo consciência dessa relevância, o indivíduo passa a ser um agente crítico e participativo.
Execução
A partir da definição do tema da exposição, se deu início à busca por parcerias. Além de ser um projeto diretamente ligado ao Núcleo de Estudos Interdisciplinares em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás, através da especialização, foi possível o cadastro do evento como um projeto de extensão da Universidade Estadual de Goiás, o que viabilizou a impressão dos materiais gráficos de divulgação e digitalização das fotografias no scanner da universidade.
Página 462Seleção das Fotos
A ideia da ação se concretizou de fato após o conhecimento e acesso às fotografias de Francisco Garcêz, apresentadas pelo historiador Jairo Leite. O acervo particular do Instituto Jan Magalisnk conta com aproximadamente 100 fotografias de Garcêz, destas apenas 26 foram selecionadas para compor a exposição, após análise e estudo das imagens. O critério de escolha das fotos foi a seleção de imagens que pudessem melhor representar a arquitetura, cultura e cotidiano do município entre as décadas de 40 e 50, permitindo um corte linear onde fosse possível reconhecer ou conhecer pontos da cidade. Dentre os critérios, também se preocupou em optar pelos registros de melhores ângulos e enquadramento, segundo o ponto de vista dos alunos. Além de selecionar imagens de importantes edificações que ilustrassem o patrimônio e história da cidade, também se optou por escolher imagens de edificações e praças que não existem mais, que se eternizaram por meio da fotografia ou na memória de quem vivenciou aquele tempo.
Com a constante transformação da paisagem urbana e cultural muitos edifícios foram demolidos e substituídos por novos prédios ou estacionamentos rotativos, outros foram abandonados e deteriorados com o tempo. A exposição teve como objetivo expor e trazer a conhecimento popular os registros de uma época e cultura local, o estilo de vida e experiência que só quem viveu naquele período vivenciou. Por meio da observação e análise das fotos, através da exposição, pôde-se transportar para as décadas de 40 e 50 e visualizar como era a cidade e a vivência dos anapolinos.
Tratamento e Montagem
Para montar o material físico da exposição, as fotografias foram digitalizadas em um scanner de alta resolução, para que a qualidade permanecesse mesmo com a ampliação. Após a digitalização, as fotos foram editadas, melhorando o contraste, luz, sombra, nitidez etc., e, em seguida, enviadas à gráfica escolhida para a impressão do material. As imagens foram plotadas em papel fotográfico fosco em tamanhos A1, A2 e A3, conforme a disposição pensada pela curadoria da exposição. Depois de impressas, as fotos foram coladas no papel pinho para dar mais firmeza e possibilitar a montagem da exposição conforme o planejado.
A disposição das fotografias foi pensada de forma dinâmica, que causasse também uma experiência sensorial. As fotografias em tamanho A1 foram penduradas frente e verso nas tesouras da edificação. As fotos em tamanho A2 e A3 foram instaladas nas paredes de maneira intercalada e seguindo uma coerência estética e contextualizada. As fotos expostas nas paredes foram coladas com fita dupla face 3M em um pedaço de isopor e depois na parede, para dar um efeito de profundidade e para evitar que as fotos não ficassem com aspecto de chapadas na parede. Conforme já destacado, foram selecionadas 26 fotografias do acervo particular, que conta com cerca de 100 fotos
A Exposição
A exposição teve sua abertura oficial no dia quatorze de agosto às dezenove horas e ficou aberta ao público para visitação em horário comercial até o dia dezoito de agosto, contando com um número expressivo de visitantes. Foram registrados 44 visitantes na abertura e 225 durante a semana, totalizando 267 visitantes, os quais puderam ver as 26 fotografias ampliadas, além das originais. Também foram expostas câmeras fotográficas das décadas de 40 a 80, dentre estas, modelos semelhantes e iguais à que Garcêz utilizava para produzir seu trabalho e arte.
Página 463A exposição contou com visitas guiadas, onde foram contextualizadas as histórias do município, da Estação Ferroviária e das fotografias expostas. O público também teve a experiência de ter acesso e conhecer o interior do edifício da Estação Ferroviária, que mesmo após sua restauração se mantém fechada a visitações e sem uso específico. Os visitantes puderam sentir um pouco da nostalgia e história que o lugar transmite, o que permitiu que crianças ficassem fascinadas pela história local e que os mais idosos, incluindo ex-ferroviários, se emocionassem com suas lembranças.
Foi enviado material de divulgação, juntamente com um convite, para as escolas públicas (municipais e estaduais) do município para uma visitação guiada à exposição. Apenas duas escolas puderam comparecer (Colégio Estadual Plínio Jaime e Colégio Militar Sargento Ricardo Barreto). Porém, outras unidades entraram em contato demonstrando interesse, mas lamentaram inviabilidade devido a questões financeiras para a locação do transporte para a mobilidade, que não se conseguiu gratuitamente. Além das duas escolas de ensino básico, três turmas da Escola de Artes Oswaldo Verano também visitaram a exposição, juntamente com alguns professores e a diretora.
O historiador Jairo Leite, que esteve presente durante a semana, realizou algumas visitas guiadas, contando um pouco da história da cidade e da ferrovia, do contexto em que as fotos foram tiradas e dos eventos que marcaram o território anapolino naqueles dias.
Conclusão
Com o estudo, análise e interpretação das fotografias de Garcêz, notou-se a admiração e paixão que o artista tinha pela cidade, deixando transparecer em seus registros fotográficos (figura 30). Outro fator interessante é a admiração que o fotógrafo tinha pela arquitetura e urbanidade da cidade, visto que a maioria de seus registros é de ruas, edifícios e praças, além de festividades e ocorrências do município. A rápida modernização e ares de ventura que pulsavam na cidade e população naquele período podem ter influenciado e direcionado o olhar do fotógrafo para o cotidiano da cidade e suas edificações.
Pensando numa perspectiva educacional, é importante ressaltar que a educação patrimonial é um campo de estudo relativamente novo no Brasil (DEMARCHI, 2016) e, por isso, se faz necessário que mais ações voltadas para este tipo de educação sejam desenvolvidas, não só em âmbito municipal, mas em todo o país.
Essa importância de conhecer a história e a formação social através de documentos e outros artifícios históricos é uma forma de educação não formal e que traz consigo a comprovação destes fatos. Segundo João Lorandi Demarchi,
O conhecimento de uma realidade ocorre por um fragmento que não é neutro. É preciso problematizar a sua sobrevivência. A educação patrimonial deve trabalhar no sentido de refletir sobre o conhecimento que todo patrimônio é suporte, assim como contestar e contextualizar sua autoridade narrativa. (DEMARCHI, 2016, P. 278)
A educação não formal foi a principal ferramenta de absorção e transmissão de conhecimento da ação, desde a concepção do trabalho até a execução, com uma rica troca de conhecimento e informação. Absorveu-se e transmitiu-se bastante conhecimento durante os dias de visitação da exposição. Nesses dias, alguns idosos que viveram na mesma época em que as fotografias foram produzidas puderam conferir de perto uma Anápolis que hoje eles guardam na lembrança. Todos os 267 visitantes, incluindo idosos, adultos, adolescentes e crianças, que passaram pela Estação durante os 5 dias de visitação, demonstraram interesse, com as mais diversas reações e interações. De nostalgia a descoberta. Cada um dos 267 visitantes pôde deixar e levar um pouco de vivência, experiência e, principalmente, história.
Página 464A partir do feedback e observações feitas durante os dias de exposição aberta ao público, percebeu-se o fascínio e interesse que as pessoas despertaram pelas fotografias, história e por todo o conteúdo intrínseco. O envolvimento que os visitantes tiveram com a exposição foi além do esperado. Um ex-ferroviário chorou ao adentrar a estação depois de muitos anos e recordar o local em que passou grande parte de sua vida trabalhando, e que por muitos anos se encontrava abandonado e fechado.
Idosos, adultos, adolescentes e crianças passaram pela Estação durante os cinco dias de visitação e o número de visitantes superou as nossas expectativas. Como já ressaltado, além das visitas do público em geral foram convidadas escolas da rede pública de ensino e a Escola de Artes Oswaldo Verano, que levaram turmas de estudantes para a visitação. Dentre os muitos elogios, houve pedidos de que a exposição continuasse em outros pontos da cidade para que alcançasse um número maior de visitantes.
O projeto deixa como legado as fotos digitalizadas e ampliadas para o Instituto Jan Magalinski e para o Museu Histórico de Anápolis, a fim de que a exposição continue recebendo visitas pontuais de escolas ou outras instituições do município. A experiência e o conhecimento adquiridos pelos visitantes de modo não formal contribuíram para o desenvolvimento intelectual e cultural destes indivíduos.
O trabalho também trouxe a discussão sobre a importância de outros eventos culturais que possam beneficiar a região de Anápolis de forma positiva, que contribuam intelectualmente e culturalmente, e que mais pessoas possam ter acesso a diferentes formas de ações e manifestações culturais, democratizando essas informações para todos.
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