O GIRO DE BOLON • ISBN: 978-65-86422-44-3
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Apresentação

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Além de uma disciplina acadêmica, a história ambiental pode ser entendida como uma sensibilidade, uma maneira de olhar a realidade. Na perspectiva da história ambiental, o mundo se apresenta com dinamismo e transformação permanentes. Como dizia Paulo Freire, "o mundo não é, o mundo está sendo". Os seres e elementos que aparecem ao longo do tempo no movimento dinâmico da natureza, incluindo os seres humanos, interagem entre si, construindo redes complexas de relacionamento. É a partir das interações que o mundo se constrói e propicia a renovação e ampliação do fenômeno da vida. É possível desenvolver, portanto, uma visão menos estanque e dualista do que tradicionalmente se entendeu como relação entre a "natureza" e a "cultura". Na vida prática dos seres humanos, esses dois polos nunca estão separados. Os movimentos biofísicos e socioculturais estão sempre conectados e Interondulados. Mesmo sendo fundamental considerar que a participação humana nesse jogo de interações traz alguns aspectos muito singulares, ao menos no nível em que eles se desenvolveram na nossa espécie: a linguagem simbólica, as concepções culturais, as sociedades estratificadas (tantas vezes injustas e perversas) etc. Mas é através da materialidade e da ordem dinâmica da natureza que a vida social humana, em toda a sua diversidade, pode acontecer.

Uma visão tão aberta e generosa do mundo não precisa ficar confinada ao modelo dos textos acadêmicos. Daí a relevância da contribuição desse livro de Alexandre Araújo, que envereda pela ficção e pela imaginação para apresentar, em linguagem clara e voltada para educação fundamental, alguns pontos essenciais da percepção histórico-ambiental. Através da sua leitura fica evidente, por exemplo, a importância do saber popular próprio de cada região. Um saber que está sempre inter-relacionado com ecossistemas concretos e com lugares específicos desse planeta cheio e multicolorido no qual vivemos. Pode-se também observar que as opções econômicas produzem profundas consequências para os territórios e os modelos de vida, como no caso do avanço agressivo das monoculturas sobre comunidades e lugares que antes estavam fundados na diversidade. A relação entre o passado longínquo, com o colapso de cidades Maya, e a moderna crise ecológica, se apresenta pelos canais da imaginação, revelando que não podemos pensar as diferentes experiências humanas de maneira isolada da grande história da vida que se manifesta no nosso planeta. É importante destacar que essas compreensões, assim como tantas outras, se descortinaram para o autor, para além dos estudos teóricos, no contexto de trabalhos de campo com diferentes comunidades do Brasil central. Trata-se, portanto, de um livro generoso, humano e criativo, inspirado na busca por uma educação que combine valores e direitos culturais, sociais e ecológicos.


José Augusto Pádua
Professor do Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro