Cláudia Helena dos Santos Araújo
helena.claudia@ifg.edu.br

Trabalho Docente e a Tecnologia em Tempos Digitais

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Resumo: Este texto discute as condições do trabalho docente e suas relações com as tecnologias em tempos digitais. Metodologicamente, a partir do pensamento dialético, transita pelo conhecimento de estudos e pesquisas publicados em revistas científicas e disponibilizados no Portal de Periódicos da CAPES referentes ao ano de 2020, caracterizado pela crise pandêmica de COVID-19. Além da revisão de literatura, realizou-se a análise de documentos que orientam a educação brasileira no campo do trabalho docente na dimensão política e pedagógica. Conclui-se que é necessária uma cartografia detalhada da situação de precarização, intensificação e ausência de condições objetivas do trabalho docente, a maior atuação de movimentos sociais e a disposição de uma teoria crítica da tecnologia para impedir o avanço metabólico do capitalismo metamorfoseado em tempos digitais de ensino remoto emergencial.

Palavras-chave: Condições objetivas de trabalho; Intensificação e precarização; Ensino remoto emergencial.

Introdução

A educação, em seus distintos fenômenos, vivencia o período do Ensino Remoto Emergencial (ERE) causado pela crise sanitária da COVID-19. Para além de alterações em calendários acadêmicos e na organização do trabalho pedagógico, também houve mudanças na vida pessoal dos profissionais da área, mais especificamente nos espaços e tempos de trabalho: “os efeitos da crise pandêmica de 2020 dramatizaram problemáticas psicossociais em diferentes contextos” (LARA, 2020).

O trabalho docente possui em sua constituição um processo histórico que contempla desde a educação jesuítica no século XVI ao ERE no século XXI. Atualmente, os lugares e espaços da fala docente estão abafados pelo discurso tecnocêntrico no campo educacional que são nutridos por determinismos e instrumentalismos da tecnologia (FEENBERG, 2003). A técnica e a tecnologia sobressaem ao indivíduo, causando reducionismos dos elementos humanos nos momentos de formação, atuação e socialização.

Em particular, no trabalho docente realizado em tempos digitais, observa-se que sua concepção e profissionalização sistematizam os espectros educacionais baseados no capitalismo e tecnicismo inscritos na sociedade (ARAÚJO, 2014). Ou seja, pauta-se em uma educação de ordem liberal. No entanto, em contraposição à essa ordem, trata-se de buscar uma unidade teórica e prática, onde suas organizações precisam ser consideradas no debate contemporâneo pois “o trabalho que constitui a substância dos valores é trabalho humano igual, dispêndio da mesma força de trabalho humano” (MARX, 2013, p. 117).

O objetivo deste escrito é articular as condições objetivas e subjetivas do trabalho docente e suas relações com as tecnologias em tempos digitais. Para tanto, elabora-se um breve panorama da legislação educacional a partir de suas diretrizes e (re)ordenamentos no trabalho remoto. Além disso, pretende-se tecer considerações acerca do pensar/fazer pedagógico, ou seja, reconhecer o contexto da objetivação desse trabalho no movimento dialético na sociedade capitalista, apreendido em sua essência no recorte histórico da crise sanitária e da necessidade de distanciamento social que a humanidade vivencia (MARX, 2013).

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Por fim, a partir da revisão de literatura e das articulações realizadas na dimensão política e pedagógica, indica-se possíveis encaminhamentos para o trabalho docente e as suas distintas relações com as tecnologias em suas múltiplas determinações.

Caminhos metodológicos

Esse estudo, de abordagem qualitativa, é elaborado a partir da realização de uma revisão de literatura, da leitura de documentos sobre o tema e da articulação destes métodos com os conceitos de condição objetiva de trabalho e do pensar/fazer pedagógico em tempos digitais, ambos explanados em seções subsequentes e fundamentados nos trabalhos selecionados. Posteriormente, conclui-se com a discussão a partir de um movimento do pensamento dialético.

O método utilizado transita pelo conhecimento de pesquisas publicadas em revistas científicas e disponibilizadas no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) referentes ao ano de 2020 e que tratam das relações entre educação e tecnologia no contexto contemporâneo. Realizou-se, ainda a leitura crítica de três documentos que orientam a educação brasileira em seus ordenamentos legais, a saber: LDB de 1996; Portaria 19/2020; e da Resolução do CNE/CP de 2020.

Para o levantamento bibliográfico foram utilizados os descritores “educação e tecnologia” e “trabalho docente”. Foram encontrados 87 artigos científicos revisados por pares em língua portuguesa, sendo 06 selecionados para essa discussão como configuração do campo teórico. A escolha de tais textos teve como critério de inclusão a relação com as tecnologias na educação em diálogo com as singularidades do limite temporal no ano de 2020 e da pandemia do coronavírus. A partir da leitura na íntegra dos trabalhos e tomando os descritores como eixos explicativos para a análise, foi possível realizar a discussão do tema e a sua contextualização com o objetivo desse escrito.

Os estudos mapeados que compõem a cartografia do tema constituem o cenário educacional com assuntos sobre a educação em tempos de COVID-19; crise pandêmica; precarização do trabalho docente (PONTES, ROSTAS, 2020; SARAIVA, TRAVERSINI, LOCKMANN, 2020); histórico da formação docente no Brasil e educação em tempos neoliberais (KUENZER, 2020); educação a distância (GONÇALVES, DE MARCO, 2020); uso de tecnologias (DE SALES, BOSCARIOLI, 2020); adoecimento docente, uberização e YouTuberização (SILVA, 2020); ensino remoto emergencial e seus desafios. Nessa direção, as tecnologias se apresentam como dispositivos tecnológicos utilizados no trabalho pedagógico realizado em níveis e modalidades educacionais distintos, em particular, no ERE.

Condições objetivas do trabalho docente

O trabalho docente é composto pela formação, atuação e profissionalização, indicando a necessidade de observar as suas diretrizes na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/1996 (LDB). Para o escopo proposto, considera-se também a Portaria nº19/2020 do Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno (CNE/CP) que trata do reexame do Parecer nº 15/2020 acerca das Diretrizes Nacionais para a implementação dos dispositivos da Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020. O parecer estabelece normas educacionais a serem adotadas durante o estado de calamidade pública e na Constituição Federal de 1988, entre outros.

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Observa-se uma sobrecarga de exigências travestidas de orientações legais para o trabalho docente em resoluções do Ministério da Educação (MEC). Como é o caso da Resolução do CNE/CP nº 1, de 27 de outubro de 2020, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica (BNC-Formação Continuada), nela encontra-se a obrigatoriedade de competências profissionais, metodologias de ensino e condução de processos de aprendizagem e ações culturais que objetivam a aprendizagem do estudante. Nesse sentido, o termo competências profissionais traz implicações ao afirmar que apresenta resultados para o desenvolvimento do estudante:

Art. 7º A Formação Continuada, para que tenha impacto positivo quanto à sua eficácia na melhoria da prática docente, deve atender às características de: foco no conhecimento pedagógico do conteúdo; uso de metodologias ativas de aprendizagem; trabalho colaborativo entre pares; duração prolongada da formação e coerência sistêmica.

Desse modo, cabe ao docente a organização didático-pedagógica das aulas em relação interpessoal com os estudantes, a comunidade interna e externa da instituição educativa e a realização de trabalho remoto com uso de tecnologias em tempos digitais. No entanto, não é citada a oferta de requisitos técnicos, tecnológicos e pedagógicos, ou de ações concretas nas questões sociais, emocionais e laborais que contextualizam a atuação, formação e trabalho. O contexto da pandemia descaracterizou o espaço domiciliar das pessoas e, em específico, do docente, como afirma Eliane Brum (2020, on-line): "Quando o vírus nos trancou em casa, as telas nos deixaram sem casa”. A linha tênue do mundo do trabalho se torna opaca na polarização entre a comunicação instantânea possibilitada pela internet e a excessiva jornada de trabalho: “A precarização das condições de trabalho, o apagamento das fronteiras entre vida privada e profissional, o devoramento do tempo, e com ele, a corrosão da vida, já tinham se tornado uma questão crucial da nossa época” (BRUM, 2020, on-line).

É necessário construir um espaço democrático escolar no Brasil, pois vivenciamos situações marcadas pela autocracia na gestão educacional. Por sua vez, o CNE recomenda que na reorganização do calendário escolar seja realizado o acolhimento do docente, estudantes e famílias no apoio à superação de questões psicológicas geradas pelo isolamento social.

No entanto, apoderando-se do pensamento dialético adotado, é preciso notar a ausência de ações efetivas no que se refere ao docente, bem como o escamoteamento da educação pública como se observa na Portaria nº 983/2020 – que estabelece as diretrizes sobre a regulamentação das atividades docentes no âmbito da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, acerca da jornada de trabalho docente. Configura-se, ainda, o retorno às aulas em sua forma híbrida (presencial e on-line), a partir de regras próprias definidas por estados e municípios. Esse retorno está previsto no Parecer CNE/CP nº 19/2020 que, ao instituir diretrizes orientadoras para os sistemas de ensino, instituições e redes escolares, públicas, privadas, comunitárias e confessionais, durante o estado de calamidade, apresenta indicações sobre a reabertura de escolas a partir de comparações com experiências internacionais na educação: “(...) deve ser segura e consistente de acordo com as orientações das autoridades sanitárias locais e das diretrizes definidas pelos sistemas de ensino” (p. 91).

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Diante dos ditames neoliberais materializados em leis, normas, resoluções e portarias, afirma-se que a autonomia docente precisa ser garantida em suas atividades de trabalho e a inviolabilidade à vida humana (BRASIL, 1988). O trabalho docente constitui-se de bases dispostas a partir da intencionalidade, natureza e finalidade educacionais, de ações mentais a desenvolver no processo de aprendizagem e dos recursos pedagógicos. Para esse fenômeno educativo ser multifacetado, após o momento de formação, retoma-se ao diagnóstico do ensino e aprendizagem, realizando a avaliação processual e qualitativa.

Nessa perspectiva, o planejamento educacional, se inscreve no trabalho docente nos tempos digitais muito mais contextualizados pela técnica que pela função social da educação: “há uma transição de uma ideia de educação com forte imposição ideológica para um ensino com a predominância da instrução, da técnica. São características que grosso modo segue a evolução de prioridades da sociedade industrial e capitalista” (STOCKMANN, 2019, p. 175-6). As estruturas educacionais norteadas pelas técnicas aperfeiçoadas no bojo da sociedade indicam instruções e prevalência de resultados que artificializam o processo educativo e as relações humanas diante de exigências da nova rotina de trabalho na atualidade.

No entanto, o processo do trabalho docente implica na análise e reflexão das políticas públicas em consonância com as ações e vozes dos estudantes nos desdobramentos educacionais, sociais, culturais e econômicos. As condições do trabalho alcançam as suas sistematizações que têm a mediação e a interação como elementos centrais. Nesse sentido, percebe-se um interesse político em hegemonizar um discurso de desafios e flexibilizações na docência a partir de liturgias digitais e profilaxias ao longo da história da educação.

É importante situar a formação docente no cenário contemporâneo. Trata-se de uma formação inicial e continuada gerida por políticas públicas educacionais, mas constituídas por processos de precarização e aligeiramento. Essa é a realidade da educação brasileira no pensamento pedagógico contemporâneo.

Quando se pensa em tempos digitais não se trata necessariamente do ágora (termo grego) desse tempo histórico, mas de estudos e pesquisas realizadas há décadas e marcadas historicamente por análises que apresentam um aligeiramento na formação docente e uma precarização do trabalho no âmbito escolar (ARAÚJO, 2014; KUENZER, 2020). Não se trata, tampouco, de um paradoxo entre real e virtual, entre tempos e espaços educativos, mas de observar a realidade a partir do imediato que pode ser ou não digital. Inscreve-se, portanto, a ideia que o humano está no digital e vice-versa; em uma relação dialética que conduz ao pensamento da ligação natureza e homem, onde o trabalho é uma atividade que imprime a ação docente.

Acerca das relações humanas mediadas pelos sujeitos envolvidos nas práticas educativas, afirma-se que a mediação ocorre à medida que nas revelações essencialmente históricas, superam-se idealismos e visões futuras de modernidades tardias. Um dos idealismos é anular as visões para as dificuldades vivenciadas pelos docentes que, em sua maioria, não receberam formação inicial e continuada para a utilização das tecnologias em suas atividades de ensino.

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Os tempos digitais intitulados de “Sociedade da Informação” (CASTELLS, 2000), foram caracterizados pelo fordismo, ou seja, a força de trabalho para a produção em massa a partir dos processos de industrialização nos anos de 1960. A docência foi assegurada por uma série de iniciativas que remetiam a ideia de inovação instrumental. Uma delas é a de utilizar as tecnologias no espaço escolar, de modo a realizar aulas mais atrativas e motivacionais. Em contraposição, as contradições se apresentam em face a um obscurantismo desde a ausência de apoio técnico e pedagógico, excessiva jornada de trabalho, formação precarizada, questões salariais, tempos de planejamento escolar às questões de recursos necessários ao seu cumprimento. Somadas às essas questões, tem-se o desmonte da educação em detrimento de políticas educativas que atendem aos mercados neoliberais e aos organismos internacionais.

A democratização do trabalho e da atuação docente, em um debate ético (FEENBERG, 2003), representa uma pauta urgente para a discussão do tema abordado. Em tempos digitais, particularmente os anos 2020 em diante com as aulas remotas estruturadas em momentos síncronos e assíncronos, observa-se que o docente assumiu papéis distintos (tutor, conteudista, designer, entre outros) no trabalho pedagógico. Constata-se a ausência de uma agenda pública acerca da racionalidade estrutural por parte da gestão governamental no Brasil, bem como da realização de uma análise da práxis desenvolvida no processo educativo.

Os ditames neoliberais impugnam a sentença de esgotamento emocional, intelectual e físico ao docente e a constante necessidade de inovação exigida em seu pensar/fazer pedagógico. O particular de seu trabalho em seu desenvolvimento é a mediação e a interação; a superação de discursos ingênuos; e a concretização de sínteses de aprendizagens de uma realidade concreta e imediata.

Pensar/fazer pedagógico em tempos digitais

No formato atual, observa-se uma demanda maior de trabalho dos professores sem as devidas condições de realização. Por vezes, atribui-se como atividade docente a responsabilidade de acesso e permanência do estudante nas instituições escolares. Desse modo, “o professor trabalha com a matéria viva, com pessoas na qual há, portanto, uma relação interpessoal e ao mesmo tempo pública, pois sua ação laboral é com coletividades, com turmas” (STOCKMANN, 2019, p. 180).

A realização do trabalho escolar em seu desenvolvimento precisa de elementos como o desejo, os motivos e as necessidades de aprendizagem (DAVYDOV, 1988). Essas condições advêm da maneira como o poder público compreende, em suas ações educativas, a natureza e a finalidade da educação, o pensar/fazer pedagógico e a formação dos sujeitos educativos. Nesse sentido, as teorias educacionais no rastro ontológico da história da educação têm seus parâmetros conceituais alinhados no conhecimento acumulado historicamente e nas relações sociais entre os sujeitos.

As medidas educacionais, por vezes, são elaboradas sem considerarem o espaço escolar e suas especificidades. A ideia do que seja instituição educativa, aula, sujeitos educativos, trabalho pedagógico, contextos de diversidade, currículo, avaliação, entre outros, ainda tangencia de forma pouco cotejada na concretização de políticas de Estado.

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O trabalho docente não se materializa sem considerar a realidade apresentada, sem partir do imediato. Da realidade concreta, pode-se avançar para o entendimento das singularidades dos espaços escolares. Para além de todos os obstáculos vivenciados pelo docente na sistematização do seu trabalho, ressalta-se outro obstáculo: o desenvolvimento das aulas on-line para avatares – imagens dos perfis dos estudantes nas telas de computadores e celulares. Sabemos que essa situação advém de desdobramentos de problemas de acesso à equipamentos tecnológicos, da falta de internet com boa conexão para os estudantes ou do receio de permanecerem com suas câmeras ativadas.

No entanto, a objetivação do trabalho docente pode alcançar a formação do pensamento científico dos estudantes, mas a interação é fundante do processo em evidência. Nesse sentido, observa-se as dificuldades com as relações entre docentes e estudantes pelo não reconhecimento da totalidade do trabalho. Como afirmam Saraiva, Traversini e Lockmann (2020, p.17): “A docência nos tempos de pandemia é uma docência exausta, ansiosa e preocupada”. Há o intuito e a preocupação em avançar, mas ainda não encontrou o caminho tampouco as estruturas essenciais das práticas educativas.

Desse modo, as significantes alterações nas formas de trabalho, a ausência de limites entre espaços pessoais e profissionais e as exigências de estratégias e metodologias de ensino intensificam o pensar/fazer pedagógico estratificado pelo aumento do tempo de preparo das aulas, atenção dedicada aos estudantes em tempos distintos de atuação e extenuantes cobranças por produtividade por parte de gestões governamentais (PONTES, ROSTAS, 2020; SILVA, 2020).

Por isso, com base nos trabalhos resultado do movimento de revisão da literatura que foram citados, é que se declara a importância de recorrer à uma abordagem crítica para refletir sobre as possibilidades político-pedagógicas nas relações entre o trabalho docente e as tecnologias, resistindo aos discursos de flexibilização aos novos rearranjos laborais.

Encaminhamentos

A cartografia mostra um cenário de precarização, intensificação e ausência de condições objetivas e subjetivas do trabalho docente. Distante de pragmáticas neoliberais que insistem no discurso de adaptação e flexibilização ao “novo normal” é que se propõe a compreensão do período em que o mundo se encontra: crise econômica, na saúde e educacional. Entende-se que imunizar a população mundial é uma das alternativas acrescidas aos cuidados sanitários. A educação é o caminho para essa realização; constituindo a ciência, e distanciando-se do senso comum. Recorrer em alternativas de abordagens educacionais progressistas é uma das possiblidades.

Além das questões advindas da dinâmica social, é necessário refletir acerca das relações entre o trabalho docente e as tecnologias em distintos contextos culturais. Nesse sentido, as relações humanas vão além de uma perspectiva interpessoal, mas requerem respeito à jornada de trabalho e adequações nas ações laborais. Orienta-se para uma formação que contemple a organização do trabalho pedagógico de forma justa e factual. Como afirma Antunes (2020, p.11) sobre a utilização das tecnologias no trabalho nessa fase atual: “(...) as tecnologias de informação e comunicação (TICs) se encontram plasmadas, impulsionadas e comandadas pelas relações capitalistas em sua forma mais destrutiva, o quadro vem se agravando sobremaneira”.

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A atuação dos movimentos sociais, das frentes sindicais e a articulação entre os docentes para a elaboração e desenvolvimento de políticas públicas é um dos possíveis caminhos na garantia de educação de qualidade e na promoção da saúde mental dos docentes e demais sujeitos educativos.

Quando se trata das esferas do trabalho educativo e das relações humanas constituídas em tempos digitais, entendemos que uma das problemáticas para refletir é a dimensão política materializada em medidas públicas e orientações pedagógicas. A unidade teoria e prática é base fundante para a realização das objetivações do trabalho docente e das atividades em direção à formação dos estudantes enquanto seres sociais. Elas podem acontecer a partir do planejamento e organização escolar, considerando os objetivos, os conteúdos e os métodos de ensino e, sobretudo, as premissas de atuação docente.

Por fim, é preciso pensar em qual realidade concreta e caótica estamos vivendo na sociedade. Ou seja: quais os motivos de vivermos sob a égide de ações estruturalistas e compostas por paradigmas neoliberais? Por que elementos sociais da contradição e da alienação existem em espaços educacionais que se posicionam a partir de uma abordagem progressista, defendendo um debate ético e democrático?

Por ora, sabemos que estamos diante de um capitalismo que fragiliza o trabalho docente, causando o adoecimento das relações humanas em todos os tempos, em particular, no agora existente. No entanto, longe de pessimismos e considerando a emancipação como essencial para a formação integral humana é que se defende o acolhimento e a presença de interações baseadas nas percepções dialéticas dos sujeitos educativos.

Podemos encontrar o caminho da teoria crítica da tecnologia que busca a transformação, a práxis e que compreende os processos tecnológicos emergentes na sociedade; não pulveriza em fragmentos à totalidade do trabalho docente, fundamental para a constituição de uma sociedade que tem a educação como princípio educativo.

Referências

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BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP nº 1, de 27 de outubro de 2020, que trata das Diretrizes Curriculares para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Continuada da Educação Básica (BNC-Formação Continuada). Brasília, Diário Oficial da República Federativa do Brasil, seção 1, p. 103. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-cne/cp-n-1-de-27-de-outubro-de-2020-285609724. Acesso em 25 jan. 2021.

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Notas

1. IFG.