PDCC - Módulo V
 
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2. Cibercultura

Estudos realizados na década de 1990 iniciaram a abordagem sobre a condição cultural que o novo espaço antropológico da internet proporcionou as populações em rede. Comecemos por tentar captar o conceito: Cibercultura é "a forma sociocultural que emerge da relação simbiótica entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias de base micro-eletrônica, que surgiram com a convergência das telecomunicações com a informática na década de 70" (LEMOS, 2003: 12). A cibercultura é o termo utilizado para identificar as relações sociais mediadas por computado bem como sua repercussão. O termo ciberespaço, que gerou o termo cibercultura, foi mencionado pela primeira vez na obra do escritor William Gibson que em 1984 a utilizou no livro "Neuromancer", disponível na internet.

O Professor André Lemos destaca-se como um dos principais autores do tema da cibercultura no Brasil e para entendermos melhor do assunto, comecemos pela compreensão das leis da cibercultura. Segundo Lemos (YOUTUBE, 2010), são três essas leis: Lei da Liberação do Pólo da Emissão e Lei da Conectividade Generalizada, Lei da Reconfiguração. Antes disso, Levy (1999: 127) tinha evidenciado estes três elementos fundantes: "do mais básico ao mais elaborado, três princípios orientaram o crescimento inicial do ciberespaço: a interconexão, a criação de comunidades virtuais e a inteligência coletiva".

Hoje a liberação do pólo da emissão é uma realidade graças ao fluxo de informações que não necessita mais de autorização para o seu trânsito. As mídias digitais proporcionam esse fenômeno que não era possível através das mídias clássicas. Indiferentemente do público, alguém vai acessar esse conteúdo a partir de um nicho de interesse. Essa primeira lei, da liberação do pólo da emissão, está conectada à segunda lei, da conectividade generalizada, pois a liberação só faz sentido se for realizada coletivamente e com a possibilidade de organização em rede. A terceira lei, da reconfiguração, completa o diagnóstico sobre o período atual. O que vemos não é uma substituição, mas sim uma reconfiguração cultural que afeta a dinâmica clássica da comunicação de massa. Com isso, Lemos defende que não devemos ficar dependentes de equipamentos. A virtualização dos conteúdos deve ser a mesma coisa que ler e problematizar os conteúdos, para que depois seja possível a "atualização" desses conteúdos a partir do exercício da fala ou outro ato semelhante. Os equipamentos devem contribuir nessa nova reconfiguração cultural onde podemos virtualizar e atualizar as informações (YOUTUBE, 2010).

A característica complexamente caótica e horizontal do ciberespaço permite que venha a emergir a ideia de inteligência coletiva, que significa compartilhar conhecimentos e apontá-los uns aos outros (LÉVY, 1999). "É com base na idéia de compartilhamento de experiências e de compartilhamento de informações que pessoas no mundo inteiro trocam arquivos contendo músicas, imagens, idéias políticas e os mais variados conteúdos" (LISBOA, 2010: 29). Existe uma dinâmica interessante nesta relação através da internet que Pierre Levy denomina de inteligência coletiva.

Ao passo que a cibercultura foi alimentando a ideia de livre fluxo de informações de forma rápida e em larga escala, as pessoas passaram a fazer o trânsito de todo o tipo de informação, da distribuição de conteúdo adulto a receitas de bolo, o ambiente cibernético foi francamente expandido. Antes disso,

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Ninguém se importava muito se você fizesse fotocópias de algumas histórias e as distribuísse dentro de seu fã-clube. Ninguém se importava muito se você gravasse algumas músicas e desse a fita cassete de presente a um amigo. As corporações sabiam, abstratamente, que tais transações ocorriam em toda parte, mas não sabiam, concretamente, quem as praticava. E mesmo se soubesse, não iriam bater à porta das casas das pessoas à noite. Porém, à medida que essas transações saíram de seus recintos fechados, passaram a representar uma ameaça pública e visível ao controle absoluto que as indústrias culturais mantinham sobre sua propriedade intelectual. (JENKINS, 2009: 194).

A propriedade intelectual passou a ser dividida com todos, mas as corporações enfrentam problemas porque sabem que estão perdendo mercado. E, para que não tenham prejuízos, também fazem transformações na sua atuação, aderindo às redes sociais e utilizando outros tipos de expediente que incorporam a "vibração" da cibercultura na gestão dos seus negócios.

Um dos fatos mais marcantes na indústria do cinema mundial ocorreu em 2007, com o "vazamento" do filme brasileiro "Tropa de Elite 3" meses antes do lançamento. O fato chama a atenção pelo ineditismo, mas também pela facilidade com que os "pirateadores" tiveram na distribuição do filme. Ora, a pirataria de filmes existe desde o tempo que o dispositivo de veiculação da informação era a fita e o decodificador era o vídeo cassete, entretanto, a característica digital do conteúdo facilita o seu trânsito. Crime ou não, a expansão da distribuição do filme chegou a ser considerada por alguns uma estratégia de marketing, pois o "vazamento" não impediu que Tropa de Elite batesse todos os recordes de bilheteria no país, ultrapassando "Dona Flor e seus Dois Maridos" e atingindo o status de filme mais visto da história do Brasil. Esse fato é um atestado de que as mídias digitais não estão substituindo, mas sim reconfigurando o cenário da comunicação e da cultura.

Instrumentos importantes para a cibercultura são as redes sociais como o Twitter, Facebook, Instagram, Linkedln. A partir da utilização das redes sociais, algumas constatações foram realizadas pela professora Raquel Recuero e que estão no livro "Redes Sociais na Internet" de 2009. Recuero entende que existem dois tipos de capital social da rede. Um é o "capital social relacional" que tem a finalidade de "ampliar a intimidade entre os atores na rede, através da publicação recíproca de informações de caráter mais pessoal" (RECUERO, 2009: 119). Já o "capital social cognitivo" tem o "objetivo de difundir uma notícia de um jornal em um Weblog, por exemplo, não é aprofundar laços sociais, mas especificamente informar ou gerar conhecimento" (IDEM).

Recentemente acompanhamos o "desafio do balde de gelo", evento que se enquadra no capital social relacional, por tratar-se de um desafio lançado por um usuário nas redes sociais diretamente para outros usuários. O "desafio do balde de gelo" consiste em postar um vídeo desafiando alguém a ajudar alguma causa filantrópica ou postar outro vídeo onde o desafiado deve "despejar" um balde de gelo sobre seu próprio corpo. A brincadeira começou nos Estados Unidos e ganhou força no Brasil em 2014.

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Criado pela ALS Association em junho de 2014, o "desafio do balde de gelo" recebeu mais de 15 milhões de postagens a partir dos usuários do Facebook que fizeram o desafio ou interagiram com essas postagens. O desafio tem como finalidade chamar atenção para uma campanha de doação de recursos para uma associação que ajuda no tratamento da Esclerose Lateral Amiotrófica – ALS (sigla na língua inglesa). A entidade já arrecadou mais de US$ 2 milhões e constata que o principal motivo para que a campanha fosse "viralizada" se dá devido ao fato de que personalidades com muitos seguidores nas redes sociais terem interagido com a campanha postando vídeos. A primeira personalidade a fazer explodir o desafio foi o Peter Frates, ex-jogador de beisebol norte-americano que foi diagnosticado com a doença em 2012 e postou um vídeo da campanha em 31 de julho. Mas sem jogar o balde na cabeça, pois, como ele mesmo diz, "água gelada e ALS é uma mistura ruim". Zuckerberg participou e desafiou o criador da Microsoft, Bill Gates, a fazer o mesmo (FOLHA, 2014, online).

Assim, percebemos o quanto a internet proporcionou a democratização da comunicação. As mídias digitais são instrumentos que devem ser utilizados para que a cidadania seja exercida em sua plenitude sem manipulações. São variadas as contribuições que a internet nos trouxe, desde o entretenimento, passando pela possibilidade de ações no âmbito da educação-formal, não-formal e informal, e chegando até o trabalho a distância. Esses eventos podem ter níveis de profundidade, dependendo, principalmente, dos temas da mobilidade e da interação, que vamos ver no próximo tópico dessa disciplina.