O literar em ação
As ações do Literar transcorreram de junho a novembro de 2020. Semanalmente, um calendário editorial de postagens foi elaborado com materiais escolhidos, sugeridos e desenvolvidos pelos participantes do projeto, de forma a tecer um eixo temático que criasse conexão entre os conteúdos abordados. As produções foram elaboradas a partir de grandes blocos de temas, e o tempo designado a cada um foi estabelecido a partir da relevância para o período e do próprio desejo dos participantes de produzir sobre eles.
Alguns dos temas foram estabelecidos desde a gênese do projeto, levando em conta o que os participantes consideraram como essencial para o enfrentamento do período de isolamento e das consequências da pandemia. Outros surgiram organicamente, frutos de experiências de membros, datas comemorativas ou atravessamentos inesperados na realidade. Em ordem cronológica, os temas foram: O que é literar?; Ser criança; Amizade e saudade; Medo e (des)conhecido; Brincadeiras e férias em casa; Folclore brasileiro; cordel; Infância e natureza; Diversidade; e Continue a literar.
Após a apresentação inicial do projeto e da proposta de literar (no mês de junho de 2020), abordamos a infância como um processo cultural e simultaneamente único para cada criança. O intuito foi estabelecer uma percepção diferenciada da experiência da infância, de modo a convidar o público a se deparar com suas próprias condições e significados construídos para si. Essa pavimentação foi também base para a provocação da curiosidade, da criação de símbolos e das potencialidades das crianças, ainda que tenha servido também como estímulo para que os adultos e participantes observassem a realidade com um novo olhar.
Depois, em julho, momento em que a pandemia já se estendia por alguns meses e as crianças se depararam com a incerteza dos reencontros com colegas, amigos, professores e familiares, vimos a necessidade de indicar possibilidades de conexões que extrapolassem os limites do contato físico. Além disso, a saudade, compreendida também como um luto relativo à rotina que incluía laços já estabelecidos, adquiriu novos contornos durante a pandemia. Esse foi o gancho para o tema seguinte, no qual empreendeu-se uma tentativa de criar bordas para os diversos lutos e medos suscitados pela possibilidade de contaminação pela doença, pela perda de pessoas, experiências e contextos e pelo desamparo frente ao (des)conhecido. Ao apresentarmos a concepção de que o conhecido está contido no desconhecido, pretendeu-se estabelecer que, apesar da aparente falta de referências frente à pandemia, seria possível encontrar relações com outras experiências já vividas, retomando afetos e maneiras de enfrentamento.
Com o início das férias de julho de 2020 e sua não concretizada promessa de liberdade e exploração do mundo fora das paredes residenciais, foi necessário abordar a desilusão frente ao novo formato do período: agora em casa e somente com a família. Decidimos fomentar a criatividade e as possibilidades de (re)exploração não mais do fora, mas do dentro. Foi também nas férias que conseguimos convidar outros participantes para o projeto em formato de lives, ou transmissões ao vivo, a partir das mídias sociais. Foi possível, assim, realizar tardes de brincadeiras e canções, que contaram com presença significativa do público.
Ao pesquisar e elaborar o conteúdo para as férias, chegamos à conclusão de que muitos brinquedos, passatempos e propostas de lazer remetiam ao folclore brasileiro. Com a aproximação de agosto, mês em que usualmente o folclore é celebrado, decidimos dedicar espaço às manifestações culturais constitutivas de nossa identidade pessoal e sociocultural. O mergulho nesse baú de memória e história empreendeu apresentar facetas regionais e culturais que pudessem despertar novas irrupções do simbólico e do imaginário no dia a dia do público. Nesse sentido, logo seguiu-se para o trabalho do tema cordel, conectado à cultura brasileira. A apresentação de diferentes formas de prover sentido e simbolização à dura realidade foi importante para a valorização das diferentes formas de enfrentamento, míticas e/ou poéticas, desenvolvidas pelo povo brasileiro.
A chegada da primavera, em setembro, suscitou produções relativas à descoberta da natureza, mesmo que de dentro de casa, e ao desabrochar de novas possibilidades. A indicação de diversos tours virtuais, vídeos e livros foi fundamental para possibilitar o conhecimento sobre animais, plantas e ecossistemas, assim como a relação indivíduo-meio ambiente. Também foi possível realizar uma live com uma escritora de livros infantis voltados à natureza.
O Dia da Árvore, 21 de setembro, que é também o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, marcou o início da temática de diversidade. A eleição coincidente da data remete à expressão da diversidade e ao contínuo nascimento para conquista e florescimento de reivindicações. Assim, procuramos explorar não somente a diversidade no que tange diferenças particulares e pessoais entre sujeitos, mas também em relação a inúmeros fatores, como história, faixa etária, condição orgânica ou de saúde, tipo físico, contexto sociofamiliar, classe social, cultura, educação e experiências subjetivas. No âmbito desta discussão, realizamos um diálogo, também em formato de live no Youtube, com uma professora especialista nos temas educação especial, inclusão e autismo, participante do projeto.
Ao fim, na abordagem da última temática, objetivamos incitar o público a criar novas maneiras de continuar a literar, com a divulgação e elaboração de dicas, indicações e conteúdos voltados para os professores, famílias e interessados por literatura infantil. O propósito de finalizar o projeto desta forma foi o de deixar um legado, não somente para o público como também para os participantes, transformadores e transformados por essa experiência. A disponibilização de todo o conteúdo neste e-book facilita ainda mais o acesso e divulgação e é parte do convite feito pelo projeto, para que todos continuem a literar!