Centro nacional Referência em Tecnologia assistiva – CNRTA

Autor

Cleomar Rocha

Cleomar Rocha possui Doutorado em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Universidade Federal da Bahia (2004), pós-doutorado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP/2009), pós-doutorado em Estudos Culturais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2011), pós-doutorado em Poéticas Interdisciplinares pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2016). Atualmente é professor associado da Universidade Federal de Goiás, onde coordena o Media Lab/UFG, o Observatório de Economia Criativa de Goiás e do Núcleo de Tecnologias Assistivas da UFG. É pesquisador visitante na Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde supervisiona pesquisas de pós-doutorado e na Universidade de Caldas, na Colômbia, com orientação de doutorado. Tem projetos financiados pela FINEP, MDIC, MCTI, CAPES, CNPq, MinC e FAPEG. É coordenador executivo do Arranjo Produtivo Local em Audiovisual e Games de Goiânia.

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Entrevista de Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha, da Divisão de Acompanhamento e Apoio a Políticas em Tecnologia Social – DIPTS e responsáveis pelo Centro Nacional Referência em Tecnologia Assistiva – CNRTA, do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer, concedida ao prof. Cleomar Rocha.

O CNRTA/CTI Renato Archer coordena uma rede de Núcleos de Tecnologia Assistiva no Brasil, montada com recursos do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações – MCTIC, envolvendo as universidades brasileiras. Os NTAs estão distribuídos em todas as regiões do país, com pesquisa, desenvolvimento e inovação de produtos e processos voltados para pessoas com deficiência. O objetivo é avançar na área, produzindo inovação e transferindo os resultados para o mercado, a fim de prover a população de soluções inventivas, funcionais e de baixo custo. Os resultados produzidos dão mostras da estratégia, com registros e patentes, além do incremento em pesquisas voltadas para tecnologias assistivas no Brasil.

Na entrevista, concedida em junho de 2017, as coordenadoras do CNRTA/CTI falam sobre as perspectivas, desafios e conquistas enfrentadas pela pesquisa no Brasil, e qual a relevância das tecnologias assistivas para o cenário brasileiro, no que diz respeito à dignidade e cidadania, às áreas de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação.

Cleomar Rocha

A sociedade contemporânea parece ter identificado que pessoas com deficiência são cidadãos, e tem início um processo de conversão da acessibilidade em valor para a cidadania, ao invés de obrigação. Como o CTI Renato Archer enxerga esse momento?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

Identificamos que, desde 2011, os direitos das pessoas com deficiência passaram a ter prioridade na pauta do Governo Federal, graças à formulação e implementação de políticas públicas a eles relacionados. Esta prioridade é um reflexo do fato de o Brasil ser signatário da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, e do fato de este documento ter adquirido, a partir de 2009, equivalência de Emenda Constitucional. Assim, toda legislação referente à acessibilidade decorre desta convenção e de seus princípios. Reconhecemos que o cumprimento dos requisitos de acessibilidade vai além da execução daquilo que é previsto em lei, pois passa também e sobretudo pela mudança de atitude em relação à deficiência, considerando como valores fundamentais a participação social de todo cidadão e a ausência de qualquer forma de discriminação. O CTI Renato Archer, desde a década de 1980, desenvolve pesquisas na área de Tecnologia Assistiva, mas, desde 2012, ano de criação e implantação do Centro Nacional de Referência em Tecnologia Assistiva (CNRTA), vinculado ao CTI, esta área de conhecimento passou a efetivamente fazer parte da missão do centro. Adicionalmente, o próprio CTI adequou sua estrutura para que ela atenda aos requisitos de acessibilidade, tanto do ponto de vista físico como comunicacional e atitudinal.

Cleomar Rocha

O CTI Renato Archer estruturou uma rede nacional de Núcleos de Tecnologia Assistiva. Onde estão localizados esses núcleos e como funcionam?

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Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

A Rede Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento em Tecnologia Assistiva não foi estruturada pelo CTI. Coube ao MCTIC, por meio da então Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social (SECIS), criar e implementar esta rede por meio de editais de seleção dos núcleos, elaborados em conjunto com o CNPQ. Desde 2012, houve um aumento significativo de núcleos, havendo a princípio 29 núcleos, até que atualmente haja mais de 80 núcleos pertencentes a universidades federais e centros de pesquisa espalhados por todo Brasil. Ao CTI Renato Archer está vinculado o CNRTA, cujo papel é articular as pesquisas desenvolvidas por esta rede, mapeando suas competências e áreas de conhecimento, identificando demandas e potencialidades de pesquisa, e dando visibilidade aos trabalhos desenvolvidos. Estas informações podem ser vistas no “rnpdta.cti.gov.br”

Cleomar Rocha

Como a tecnologia auxilia pessoas com deficiência a terem melhor qualidade de vida?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

Há uma clássica frase, cuja autoria é atribuída a Mary Pat Radabaugh (1993), que resume o papel da tecnologia para as pessoas com deficiência. “Para as pessoas sem deficiência, a tecnologia torna as coisas mais fáceis; para as pessoas com deficiência, ela torna as coisas possíveis.” Desse modo, a Tecnologia Assistiva engloba diversos recursos que auxiliam as pessoas com deficiência a transporem barreiras encontradas no ambiente, provendo a elas autonomia e ampliando suas funcionalidades. A Tecnologia Assistiva é uma área bastante abrangente, que inclui desde recursos de baixo custo até recursos bastante elaborados e com um custo mais alto. Ela contempla ferramentas de auxílio para a vida diária, de acesso ao computador, de mobilidade, de comunicação aumentativa e alternativa, entre outras. Também é importante que as pessoas com deficiência tenham acesso à Tecnologia da Informação e que os dispositivos e aplicativos de uso comum sejam plenamente acessíveis, em conformidade com os princípios do Desenho Universal.

Cleomar Rocha

Como está a posição do Brasil no desenvolvimento, inovação e mercado de produtos de tecnologia assistiva?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

As ações governamentais do Brasil relacionadas à Tecnologia Assistiva geraram um avanço no que se refere à ampliação de conhecimento nesta área e ao acesso dos usuários. Entretanto, ainda há pouca integração entre os diferentes setores (pesquisa e desenvolvimento, produtivo e cidadão), e isto dificulta a transferência de tecnologia, de modo que as soluções inovadoras nem sempre cheguem aos usuários finais. Some-se a isso o fato de que grande parte dos produtos hoje disponíveis é importada, havendo ainda pouca produção e disponibilização nacional.

Cleomar Rocha

O aumento de startups tem contribuído para o surgimento de novos produtos de tecnologia assistiva?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

Sim, as pequenas empresas inovadoras também têm se dedicado a criar produtos e serviços nesta área. Entretanto, ainda é bem incipiente, elas encontram dificuldades de fomento a estas iniciativas, e obstáculos para aumento da produção e disponibilização para o acesso dos usuários finais.

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Cleomar Rocha

O que é necessário para melhorarmos o cenário nacional de tecnologia assistiva, nos âmbitos de PD&I?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

No âmbito de PD&I o governo vem fomentando a área de Tecnologia Assisitiva e houve um bom desenvolvimento. Alguns aspectos ainda devem ser aprimorados, por exemplo, seria bem-vindo que os pesquisadores se aproximem mais das reais demandas das pessoas com deficiência, sendo desejável que eles possam ouvi-las e contar com a participação delas na concepção e desenvolvimento de suas ideias. Também é necessário que sejam criados mecanismos para a transferência de tecnologia, para que os novos conhecimentos se convertam em soluções disponíveis para os usuários. É necessário haver uma redução de custo dos produtos de TA, que, em sua maioria, são caros e importados. Por fim, é preciso aumentar a produção nacional, e sempre com foco no usuário final.

Cleomar Rocha

Qual o papel das universidades na cultura da acessibilidade?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

Na formação universitária, em nível de graduação e pós-graduação, os alunos devem ter contato com as áreas de acessibilidade, Tecnologia Assistiva e inclusão. Este contato deve ser transversal, ou seja, deve permear todos os cursos e disciplinas, e não somente aqueles estritamente relacionados ao tema da deficiência e saúde. Além disso, as próprias universidades devem ter uma estrutura inclusiva e acessível, capaz de atender, em equiparação de condições e oportunidades, alunos e professores com e sem deficiência. Deve ser também estimulada a participação de docentes e pesquisadores com deficiência, cuja vivência e cujos trabalhos acadêmicos possam agregar conhecimento na área.

Cleomar Rocha

Como podemos pensar em um país baseado no respeito e oportunidade para pessoas com deficiência?

Regina Maria Thienne Colombo e Fabiana Fator Gouvêa Bonilha

Os direitos previstos na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência devem ser plenamente cumpridos, assim como os princípios a eles associados. Devem ser transpostas principalmente as barreiras atitudinais, que impedem a participação social das pessoas com deficiência e de todo cidadão. Em termos de legislação o Brasil está atualizado. O grande desafio é no dia a dia, nas atividades típicas do cidadão haver a igualdade e a possibilidade de independência da pessoa com deficiência. Acreditamos no cumprimento à legislação e, principalmente, nas ações das pessoas, seja na forma mais simples de respeito ao outro como também na conscientização, com a divulgação de informações, conhecimento e legislações sobre o direito das pessoas com deficiência.