Vamos dançar Sussa?

3 • Cantos na Sussa

Página 13

Referente ao canto que se manifesta durante a sussa, podemos observar nas letras das cantigas relações com a vida cotidiana no meio rural , relações com a natureza: chuva, poeira, plantações, animais que vivem no ambiente e ainda temáticas religiosas , invocação a Deus, louvor a natureza... Siqueira(2006) relata que algumas letras são jocosas, apresentam duplo sentido e falam em tom lúdico sobre relações de gênero, como uma sobre a saia que se molhou, a formiga cuja picada dói , ou um papudo cujo papo se molhou na chuva.

Dentre as canções transcritas pelas mulheres kalungas, podemos identificar uma canção para pedir chuva, cantada por Marta que traz a reverencia ao boi, que está inerente tanto no mundo rural sertanejo quanto nas cosmologias banto africanas.

" Chove chuva, hoje! Pra meu beber! Chove chuva, hoje! Pra meu boi beber. Pra nascer capim morena, pra meu boi comer… boi, boi, boi sinhá, boi boi, boi sinhá…“ (Marta Kalunga)

Já na proposta do grupo de sussa, coordenado por Vanderléia dos Santos Rosa, os cantos da sussa incluem letras de músicas não apenas das tradições kalungas, mas inclui letras de músicas que foram compostas por crianças e adolescentes pertencentes ao grupo Flores e frutos do quilombo kalunga. Vanderléia inclui ainda no grupo músicas que foram aprendidas em grupos de movimentos sociais, como do “movimento sem-terra”, que expressam temas sobre a luta pela terra e ainda temáticas afro-brasileiras, onde se valoriza a cultura e identidade negra, combatendo o racismo e os preconceitos.

Vanderléia aponta para uma música de sussa que não gosta com a seguinte letra:

…" Duas vezes sete é quatorze, três vezes sete é vinte é um. Quem casar com moça preta enche a casa de anu. Eu vou sabiá, sabiá eu vou... Você vai mais eu? Eu vou sabiá, sabiá eu vou…

Na canção o anu é colocado como um bicho preto e agourento, assim cantando esta música Vanderléia analisa que pode ter sido uma reprodução de uma fala que não partiu da comunidade.

“Quem casar com moça preta enche a casa de anu” aí quem é o anu? Anu é os filhos que vão nascer todos pretinho! E aí que representava um agouro. Aí essa é a única que eu não gosto, eu detesto! Eu falo que se na época eu visse alguém cantando, eu ia falar assim, corta! Isso não é para nós, por quê se casar com moça preta, não tem problema encher a casa de anu. Porque a gente hoje não vê o preto como agourento como uma coisa ruim, tem que ver como uma coisa boa, né”. (Vanderléia)

Ao dar início com as toadas da sussa, podendo ser homem ou mulher o(a) guia ou puxador(a), canta um verso onde os demais foliões executam a resposta ou contracanto em coro, para os versos do(a) puxador (a). A maioria das letras são curtas, apresentando a repetição das estrofes durante algum tempo. Rodrigues (2011:p.63) apud Vargas (2007) ressalta, porém, que “as letras das canções estão sujeitas a improvisos que rompem com as “voltas” normalmente esperadas. Muitas tendem ao formato ‘aberto’ de pergunta resposta, fruto de improvisações baseadas em desafios entre cantadores, formas lúdicas de expressão e comunicação.”

Página 14

Lá no mar tem areia
Lá no mar tem areia
Lá no mar tem areia
Oh lé, lé lá no mar tem areia
Eu vou dançar,
Areia no mar
Eu vou dançar
Areia no mar
Oh lé lé, oh lá lá
Areia no mar

"Amanhã eu vou embora é fala, meu boi baião! Porque já disse o que for, e fala meu boi baião! Eu aqui não sou querido e fala, meu boi baião! Na minha terra eu sou e fala, meu boi baião não... Quando eu sair daqui fala, meu boi baião! Quero sair avoando fala, meu boi baião! Que é para o povo não dizer fala, meu boi baião! Que daqui saiu chorando fala, meu boi baião não…" "Lá em casa tem uma nega na caatinga tem um boi. Segura a nega que eu amarro boi. Lá em casa tem uma nega na caatinga tem um boi. Segura a nega que eu amarro o boi"....

Levanta a saia muiê, não deixe a saia molhar ( Puxador)
A saia custou dinheiro, dinheiro custou ganhar.( Puxador)
Levanta a sai muiê, não deixea a saia molhar (coro)
A saia custou dinheiro , dinheiro custou ganhar ( coro)

Piriquitim bunitim , tá querendo avoa ( Puxador)
Os pezim tá no chão e as asinhas no ar. ( puxador)
Piriquitim bunitim , tá querendo avoa ( coro)
Os pezim tá no chão e as asinhas no ar. ( coro)

Página 15

Ô menina, o que você tem? (
Marimbondo, sinhá, (Puxador)
Marimbondo sinhá. ( coro)
É hoje, é hoje
que a palha da cana voa. ( puxador)
É hoje, é hoje
que tem de avoar. ( coro)

Canoeiro, canoeiro o que trouxe na canoa ? ( puxador)
Trouxe ouro, trouxe prata , trouxe muita coisa boa ( coro)
Canoeiro, canoeiro o que trouxe na canoa ? ( puxador)
Trouxe ouro, trouxe prata , trouxe muita coisa boa.( coro)