Cultura Digidown Formação de Professores para a Inclusão de Estudantes com Síndrome de Down

Contexto Histórico, Formação de Professores na Escola Inclusiva e Digidown

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Autoras: Aline Martins Neto, Vanessa Helena Santana Dalla Déa e Ana Flavia Teodoro de Mendonça Oliveira

"Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim" (Chico Xavier)

Compreendemos que todos que fazem parte da escola, seja professor, coordenador, merendeira, faxineiro, alunos entre outros são responsáveis pela educação e inclusão. Dessa maneira optamos por no referir a “educação inclusiva” como “escola inclusiva”. Analisando o percurso histórica no que se refere às políticas que asseguram uma escola inclusiva, de forma igualitária a todos, percebemos que não foi um processo fácil e nem rápido. De tempos em tempos, surgiram novos paradigmas e novas barreiras a serem quebradas até chegar nos direitos que temos hoje. Apesar da longa caminhada, movimentos, lutas e embates em busca do direito à educação que assegure o acesso, permanência e sucesso das pessoas com deficiência, muitos ainda não compreendem ao certo o que é realmente a inclusão confundindo-a muitas vezes com a integração. Além do contexto histórico das conquistas relacionadas às políticas públicas no primeiro tópico trazemos essa discussão e usamos as referências de Mantoan (2003) para explicar a diferença entre inclusão e integração. 

No segundo momento apontamos sobre a importância da formação continuada de professores, pois a falta de formação dos professores para a atuação educativa, traz conseqüentemente um medo dos novos desafios, criando assim uma barreira entre professor e aluno. A maioria dos estudantes dos cursos de pedagogia e licenciaturas, ou seja, nossos futuros educadores relatam que não se sentem preparados para receber e lidar com crianças com deficiência. Portanto, “a formação de professores é um aspecto que merece ênfase quando se aborda a inclusão” (OLIVEIRA; SILVA; PADILHA; BONFIM, 2012, p. 315).

Consideramos, no entanto, que essas barreiras devem ser removidas, para que a inclusão encontre sucesso e novos valores e concepções a respeito da educação das pessoas com deficiência sejam construídas.

Escola inclusiva

Ultimamente muito se tem ouvido falar sobre a expressão inclusão social, seja essa voltada para o meio social, político e/ou educacional é evidente que esse movimento vem ganhando espaço no discurso das diferentes correntes político-ideológicas. O novo olhar voltado para aceitação das diferenças e a diversidade tem nos feito refletir e compreender a necessidade de construir uma sociedade igualitária para todos.  É importante relembrar que o mérito das políticas e direitos igualitários para as pessoas com deficiência vem sendo conquistado ao longo da história, não sendo uma luta recente.

A diversidade faz parte da nossa sociedade desde os primórdios da nossa história. Mesmo vivendo em uma sociedade que declara os direitos dos cidadãos embasados em princípios de igualdade e democracia, convivemos com diferenças de raça, crença, nível social, econômico e cultural que devem ser respeitados de forma a não serem categorizados, segregados e excluídos por elas. Entretanto “vivemos assim, uma contradição, pois, a mesma sociedade que inclui pela igualdade, exclui pelas diferenças” (FRIAS, 2009, P.2)

Apesar da longa trajetória percorrida até aqui por meio de movimentos, lutas e embates em busca da educação inclusiva, muitas pessoas ainda não compreendem ao certo o que é realmente a inclusão confundindo-a muitas vezes com a integração.

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Segundo Mantoan (2003), as expressões integração e inclusão embora semelhantes tem o sentido completamente diferentes. Segundo a autora quando a integração escolar refere-se à inserção de um aluno no ensino regular que antes já foi excluído. O processo de integração ocorre dentro de uma estrutura educacional que oferece ao aluno a oportunidade de transitar no sistema escolar — da classe regular ao ensino especial — em todos os seus tipos de atendimento: escolas especiais, classes especiais em escolas comuns, ensino itinerante, salas de recursos, classes hospitalares, ensino domiciliar e outros. Trata-se de uma concepção de inserção parcial, porque o sistema prevê serviços educacionais segregados. Desta maneira entende-se que nem todos os alunos com deficiência cabem nas turmas de ensino regular, resultando em uma seleção prévia dos que estão aptos a essa inserção. Em suma: a escola não muda como um todo, mas os alunos têm de mudar para se adaptarem às suas exigências (MANTOAN, 2003).

Para a autora a verdadeira inclusão implica uma mudança de perspectiva educacional, pois não atinge apenas alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades de aprender, mas todos os demais que estão envolvidos na educação, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral. O radicalismo da inclusão vem de fato exigir uma mudança de paradigma educacional, sendo assim causando um impacto no sistema de ensino, mais especificamente dentro das salas de aula (MANTOAN, 2003).

É imprescindível contextualizar a Educação Especial desde o seu surgimento na história para entendermos o lugar que partimos e aonde queremos chegar, ou seja, uma escola inclusiva e de qualidade. Pois as escolas especiais foram importantes nesse processo (ROGALSKI, 2010, p.2). Sabe-se que, historicamente, a educação escolar desde o primórdio se caracterizou como um espaço educativo de atendimento segregado em que apenas uma minoria era privilegiada, havendo assim, uma exclusão social legítima por meio das políticas públicas e práticas pedagógicas educacionais. Como afirma Glat e Fernandes (2005, p.36)

A educação escolar não era considerada como necessária, ou mesmo possível, principalmente para aquelas com deficiências cognitivas e/ou sensoriais severas. O trabalho educacional era relegado a um interminável processo de “prontidão para alfabetização”, sem maiores perspectivas já que não havia expectativas quanto à capacidade desses indivíduos desenvolverem-se academicamente e ingressarem na cultura formal.

Nessa perspectiva criaram-se no Brasil algumas organizações de atendimento educacional especializado para pessoas com de diferentes necessidades físicas, sensoriais e intelectuais, no entanto mais voltado para o âmbito médico ou clínico, mas integrado a função de educação.  Substituindo o ensino comum, recebeu a terminologia de escolas especiais e classes especiais. De acordo com Mantoan (2001), a estrutura da educação especial no Brasil teve sua base fundada no modelo assistencialista e segregativa.

Não reconhecidas pelas políticas públicas de educação, tais iniciativas de atendimento educacional especializado, formavam crianças e jovens com deficiência para viver em um mundo à parte, isoladas do convívio em sociedade. Foi no início da década de 60 que novos olhares despertaram no poder governamental uma nova forma de pensar o sistema de ensino educacional sendo assim reconhecido oficialmente, foi denominada de “educação dos excepcionais.”

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Em 1961 é fundada a lei n° 4.024/61 pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que dá o direito aos “excepcionais” a ingressarem dentro do sistema geral de ensino comum. Manifesta-se neste momento da história o processo de democratização da escola surgindo a problematização do paradoxo inclusão/ exclusão, pois ao mesmo tempo em que o sistema universaliza o acesso à escola ela seleciona e distingue os alunos (BRASIL, 1996).

Foi nos anos 70 que as políticas públicas estabeleceram no país a responsabilidade de garantir a institucionalização da educação especial no sistema de educação pública passando a ser discutida, e repensada pelos governos. Rogalski (2010) enfatiza que a fundação de instituições públicas e privadas, órgãos normativos federais e estaduais e de classes especiais para os indivíduos com deficiências foi legitimada. Embora não se ouvisse falar de inclusão, a importância dada às necessidades das pessoas com deficiência já contemplava a integração tanto física como social.

De acordo com Glat e Fernandes (2005, p.36) “o desenvolvimento de novos métodos e técnicas de ensino baseados nos princípios de modificação de comportamento e controle de estímulos permitiu a aprendizagem e o desenvolvimento acadêmico desses sujeitos”. O padrão do modelo clínico foi substituído principalmente pelo modelo educacional. O destaque não era mais a deficiência particular do indivíduo, mas a falta do meio de oferecer condições apropriadas para articular a aprendizagem e desenvolvimento, portanto a educação especial andava paralelamente com os métodos clínicos. 

O pressuposto essencial desse “conceito é que pessoas com deficiências têm o direito de usufruir as condições de vida o mais comum ou normal possível na comunidade onde vivem, participando das mesmas atividades sociais, educacionais e de lazer que os demais” (GLAT e FERNANDES, 2005, p.37). Alguns anos depois foi aprovada a lei de nº 5.692/71, que modificou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, nela reforçava a ideia de que as crianças em fase escolar com deficiências físicas, intelectual, em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados, deveriam receber tratamento especial, ou seja, seriam encaminhados para salas e escolas especiais.

Dois anos depois o Ministério da Educação – MEC, fundou no Brasil o Centro Nacional de Educação Especial – CENESP, com o propósito de fomentar ações educacionais para as pessoas com deficiência, no entanto ainda voltadas para o caráter assistencialistas. Nesse período apesar da conquista do apoio estatal na educação das crianças com deficiência e superdotadas “não se efetiva uma política pública de acesso universal à educação”. (BRASIL, 1971)

Com a repercussão da luta pelo direito à educação escolar para todos, voltada para as pessoas com necessidades educacionais especiais no Brasil o movimento da história ganhou força no final dos anos 80. Surgiu então uma mobilização por parte das pessoas com deficiência e seus familiares em busca de uma educação inclusiva, ou seja, “um modo de organização do sistema educacional que considera as necessidades de todos os alunos e que é estruturado em função dessas necessidades” (MANTOAN, 2003, p.16)

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Somente em 1988 que a Constituição Federal em seu art.3º, inciso IV, trouxe em um dos seus objetivos a intenção de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (BRASIL, 1988). Determina, no artigo 205, que a educação seja universal e que garanta o desenvolvimento integral da pessoa, para que essa possa exercer seus direito e deveres como um cidadão qualificado para o trabalho.

Ainda segundo o artigo 206, inciso I, pressupõe que é dever do Estado ofertar, assegurar e garantir uma educação escolar na rede regular de ensino, sendo ela igualitária para todos. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/90, reforça no artigo 55, que sendo o pai responsável pela criança fica ao seu encargo matriculá-la.

Historicamente a concepção de educação inclusiva começa a ganhar importância apenas nos anos 90. A Declaração de Salamanca (1994), documento realizado pela Conferência Mundial que discutiu sobre as necessidades educativas especiais, realizada em 1994 na cidade de Salamanca, Espanha, promovida pela UNESCO. 

O princípio fundamental desta linha de Ação é de que as escolas devem acolher todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras. Devem acolher crianças com deficiência e crianças bem dotadas, crianças que vivem nas ruas e que trabalham crianças de minorias lingüística, étnicas ou culturais e crianças e crianças de outros grupos ou zonas desfavoráveis ou marginalizadas (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994, p. 17- 18).

Dois anos depois em 1996, a educação especial conquista um capítulo próprio na LDB, através da Lei Nº 9.394, substituindo as leis 4024/61 e 5692/71. Nesse documento, declara-se que “haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de Educação Especial” (BRASIL, 1996). Também promulga que “o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a integração nas classes comuns de ensino regular” (BRASIL, 1996).

Sem dúvidas foi um grande avanço nas políticas públicas do Brasil, daí em diante a educação inclusiva foi ganhando cada vez mais força e espaço, sendo assegurada por leis através de documentos e decretos legais. Não demorou muito para os reflexos dessas conquistas se efetivarem, em 1999 aconteceu a Convenção Interamericana da Guatemala que abordou a temática de eliminação de todas as formas de discriminação contra a pessoa com deficiência. Acompanhando os acontecimentos o Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 10.172/ 2001 (BRASIL, 2008, p.8e9), destaca que

o grande avanço que a década da educação deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garanta o atendimento à diversidade humana”. Ao estabelecer objetivos e metas para que os sistemas de ensino favoreçam o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, aponta um déficit referente à oferta de matrículas para alunos com deficiência nas classes comuns do ensino regular, à formação docente, à acessibilidade física e ao atendimento educacional especializado.

Visando certificar-se que as pessoas com deficiência fossem contempladas com vagas no ensino regular, como as demais, é promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956/2001 a lei que garante às pessoas com deficiência os mesmos direitos. Este Decreto reflete de forma significativa na educação, “exigindo uma reinterpretação da educação especial, compreendida no contexto da diferenciação, adotado para promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso à escolarização” (MEC/SEESP, 2007).

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Seguindo esses processos de mudanças no meio educacional pelas políticas públicas, as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial Básica, implementada pela Resolução CNE/CEB n°2 em 2001, no artigo 2°, a seguinte afirmação: as vagas devem ser oferecidas a todos os alunos de maneira que consigam efetivá-la, “cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos” (MEC/SEESP, 2001).

Materializada a luta pela inclusão, e estabelecido o direito de inclusão na escola comum para todos, os próximos passos foi questionar se a organização escolar está adequada para receber esses alunos, se o currículo contempla as suas necessidades, se está acessível, se os professores estão preparados para receber esses alunos e incluí-los de forma adequada entre outros fatores.

Nessa perspectiva o Conselho Nacional de Educação-CNE, aprovou em 2002 a resolução CNE/CP nº1/2002, que prevê nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica uma organização curricular, determinando aos educadores uma formação docente que contemple os conhecimentos acerca das necessidades educacionais dos alunos com deficiência (BRASIL, 2008).

Avançando alguns anos surgem várias outras políticas públicas com o intuito de nortear professores e gestores a propiciar aos estudantes com deficiência uma escola inclusiva. Em 2003, o Ministério da Educação funda o Programa Educação Inclusiva, que visa a transformação dos sistemas de ensino para sistemas de ensino inclusivos, sendo esse lugar um espaço que garanta o direito à diversidade. “Um amplo processo de formação de gestores e educadores nos municípios brasileiros para a garantia do direito de acesso de todos à escolarização, a organização do atendimento educacional especializado e a promoção da acessibilidade” (BRASIL. 2008, p.9).

Em 2006 a Organização das Nações Unidas (ONU) e o Brasil, sendo um país signatário, corroboram com a decisão da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiências, defendendo que é responsabilidade do Estado propiciar em todos os níveis de ensino a educação inclusiva, garantindo no Decreto Nº 6.571, no Art. 24 (BRASIL, 2008, p.10):

a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino fundamental gratuito e compulsório, sob alegação de deficiência; b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo, de qualidade e gratuito, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem.

Como podemos perceber durante o percurso da história muitas progressões e regressões aconteceram dentro do movimento em busca da concretização da inclusão nos campos sociais. Em 2008 o Ministério da Educação, juntamente com o Conselho Nacional de Educação e a Câmara de Educação Básica, institui Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Educação Básica, na modalidade Educação Especial.

Um ano depois com fundamento no Parecer CNE/CEB nº 13/2009, homologado por Despacho do Senhor Ministro de Estado da Educação e por meio da resolução nº 4, de 2 DE outubro de 2009, é reconhecida e sancionada a lei nº 6.571/2008, nela é estabelecida que os alunos com deficiência, transtornos globais e superdotação, devem ser matriculados nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional Especializado (AEE) seja a instituição pública ou não. Na perspectiva da educação inclusiva de 2008 a PNEE trata de questões baseadas nos princípios do AEE, pois

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complementa e/ou suplementa a formação do aluno, visando a sua autonomia na escola e fora dela, constituindo oferta obrigatória pelos sistemas de ensino. É realizado, de preferência, nas escolas comuns, em um espaço físico denominado Sala de Recursos Multifuncional. Portanto, é parte integrante do projeto político pedagógico da escola. (RAPOLI et al., 2010, P.16)

A sistematização entre a escola e a educação especial na perspectiva inclusiva transforma as ideias e concepções de alunos, pais e professores quanto à capacidade dos alunos com deficiência, recriando caminhos já percorridos. A articulação entre esses dois espaços estabelece uma nova visão de educação, centrada em formar cidadãos críticos e reflexivos e não de segregá-los separando e categorizando-os como “normais e especiais”.

Com o intuito de promover uma educação básica para todos o PNE, em 2014 aprova e oferece aos alunos com deficiência o AEE, complementar e suplementar estabelecendo como meta,

universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados (BRASIL, 2014)

Para promover a consolidação dessa meta é desenvolvida diversas estratégias por meio das políticas públicas, que se dispõem a fazer parcerias com instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, tornando a educação mais acessível aos estudantes. Nos últimos três anos duas conquistas significativas foram implantadas no Brasil, a primeira foi a lei nº13.146, de 16 de julho de 2015, que traz em seu Art. 1º a seguinte afirmação:

É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania (BRASIL, 2015)

E a segunda conquista está relacionada com o direito à educação que está em vigência desde o ano de 2016, conforme mencionado no Art. 27° do Estatuto da Pessoa com Deficiência 

A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem (BRASIL, 2015)

Sendo assim fica a disposição do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade garantir que todas as pessoas com deficiência tenham uma educação qualificada e satisfatória, sem que haja discriminação, preconceito e exclusão (BRASIL, 2015). Ao delinear o movimento histórico para se construir uma sociedade inclusiva podemos perceber que a caminhada mesmo não sendo fácil ganhou força e no sistema educacional atual, vemos muitas escolas fazendo ou pelo menos tentando incluir os alunos com deficiência. 

Muito ouvimos falar sobre a inclusão de pessoas com deficiência, mas o que muitos se esquecem é que os princípios a respeito da educação inclusiva estão pautado ao respeito com a diversidade. Na visão de Sassaki (1997), o Brasil está avançando para a organização de uma sociedade cada vez mais inclusiva, mesmo que os resultados ainda são pequenos, se mostram crescentes e animadores.

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O ato de incluir e aceitar as diferenças, mesmo tendo um avanço considerável nas pesquisas recentes ainda requer algumas modificações específicas como é o caso da estruturação das nossas escolas, entretanto não somente, pois os atuais desafios e dificuldades também são manifestadas por parte de professores da educação básica. (GLAT; FERNANDES, 2005).

Do ponto de vista de Mantoan (2003) é preciso que essas mudanças escolares aconteçam previamente, e mais especificamente em relação ao ensino ministrado pelos professores, pois a escola é o ponto de partida para se formar a autonomia, a solidariedade, a criatividade, o espírito crítico e a valorização das diferenças. Escolas assim formadas não excluem o aluno pelas suas diferenças, pois são contextos educacionais pensados e preparados para que todos os alunos tenham a possibilidade de aprender, freqüentando uma mesma e única turma.

A inclusão implica em uma mudança que busca a atualização e reestruturação das condições atuais da maioria das escolas brasileiras (SAMPAIO; SAMPAIO, 2009). Faz-se necessária uma significativa reestruturação na organização escolar, para que esse modelo de educação inclusiva seja efetivado, pois incluir vai muito além do simples fato de aceitar crianças com deficiência na escola, ou até mesmo de fazer algumas adaptações estruturais ou curriculares, sem pensar na verdadeira mudança que contribua para a consolidação da transformação escolar e nos processos pedagógicos (SAMPAIO; SAMPAIO, 2009).

Esta reorganização segundo Sampaio e Sampaio (2009), requer um novo planejamento para as salas de aula, como por exemplo, um menor número de alunos por turma, que os professores pensem e elaborem novas dinâmicas pedagógicas e que haja uma nova infraestrutura no espaço escolar. Toda essa complexidade envolvida no processo de obter uma educação inclusiva corrobora a importância da formação dos professores.

Reflexões sobre a formação de professores para a escola inclusiva 

Muitas transformações vêm ocorrendo no contexto social refletindo profundamente da educação escolar e no modo de trabalho dos professores, sendo assim, novas exigências e necessidades educativas têm sido direcionadas para o campo escolar. Frente a tantas mudanças na sociedade com o desenvolvimento de novos conhecimentos, tecnologias, relações sociais, formas de pensar e compreender a vida que novos parâmetros devem ser pensados e planejados para se organizar o espaço escolar (MACEDO, 2011).

É nesse mesmo contexto de reformas que a inclusão, tem emergido e ganhado espaço dentro da escola, no entanto a falta de formação dos professores para a atuação educativa,  traz conseqüentemente um medo dos novos desafios, criando assim uma barreira entre professor e aluno. A maioria dos estudantes dos cursos de pedagogia e licenciaturas, ou seja, nossos futuros educadores relatam que não se sentem preparados para receber e lidar com crianças com deficiência. Portanto, “a formação de professores é um aspecto que merece ênfase quando se aborda a inclusão” (OLIVEIRA; SILVA; PADILHA; BONFIM, 2012, p. 315). 

No âmbito das políticas públicas educacionais documentos como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9394/96, o Plano Nacional de Educação, Lei 10.172/2001 e o documento intitulado Orientações Gerais da Rede Nacional de Formação Continuada, instituída pela Portaria MEC 1.403/2003, orientam e abordam a formação continuada para professores. Segundo Santos (2011), foi na década de 90 que o Ministério da Educação e Cultura (MEC) juntamente com instâncias de ensino estadual e municipal, implementaram no Brasil programas de formação continuada para os profissionais da educação básica.

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Em relação aos documentos referidos como a LDB e o PNE que possuem caráter mandatório, Santos (2011) destaca que mesmo sendo baseado em princípios e objetivos que oferecem a formação continuada para intensificar e assegurar a qualidade de ensino, “contribuiu para proliferação de diferentes ações e programas de formação continuada, que, não raramente, cumpriram a tarefa de simplesmente certificar os professores e/ou preencher lacunas de uma formação inicial considerada insuficiente” (p.10)

Ainda de acordo com Santos (2011), embora assumir um aspecto positivo, o documento de caráter orientador de formação continuada instituído pelo MEC tem suas controvérsias, pois mesmo tendo em vista associar a discussão entre a escola e a universidade, bem como articular o processo de formação continuada com a visão crítico-reflexivo sobre a própria prática “estão imbuídas de contradições e ambiguidades que, às vezes, denotam práticas que se pautam por ações pontuais, as quais submetem a formação continuada a uma lógica “mercantil” e técnico-instrumental “(p.10).

Sendo assim pode-se perceber que as políticas públicas de educação direcionadas para a formação continuada de professores para a inclusão, não estão em conformidade, ou seja, não foram bem assimiladas por quem as elaborou (MANTOAN, 2003, p.43). 

No caso de uma formação inicial e continuada direcionada à inclusão escolar, estamos diante de uma proposta de trabalho que não se encaixa em uma especialização, extensão ou atualização de conhecimentos pedagógicos. Ensinar, na perspectiva inclusiva, significa ressignificar o papel do professor, da escola, da educação e de práticas pedagógicas que são usuais no contexto excludente do nosso ensino, em todos os seus níveis.

Os professores precisam estar preparados, pois, são eles os protagonistas para a transformação da escola, na perspectiva de uma abertura independente às diferenças e de um ensino de qualidade. “A cooperação, as autonomias intelectual e social e a aprendizagem ativa são condições que propiciam o desenvolvimento global de todos os professores, no processo de aprimoramento profissional” (MANTOAN, 2003, P.43).

Outro documento que prevê os saberes e competências necessárias para a formação continuada articulado com a inclusão dos alunos com deficiência no ensino regular é o curso de formação de professores para a educação inclusiva/ integradora vigente no Brasil desde 1998. Nele são apontadas sete práticas que os professores devem aprender e construir com o curso de formação. São eles: 

mecanismos funcionais de cognição das pessoas com deficiência; consciência das suas próprias condições, conhecimentos pedagógicos e metacognitivos;  desenvolvimento da capacidade de auto-regular e de tomar consciência das etapas do processo de ensino-aprendizagem; coerência entre sua maneira de ser e ensinar, entre teoria e prática; capacidade de ministrar aulas sobre um mesmo conteúdo curricular a alunos que têm níveis diferentes de compreensão e de desempenho acadêmico; respeito ao ritmo de aprendizagem de cada aluno; utilização flexível dos instrumentos de avaliação de desempenho escolar, adequando-os às necessidades dos alunos. (GOFFREDO, 1999, p.69)

A inclusão educacional requer professores preparados para atuar na diversidade, compreendendo as diferenças e valorizando as potencialidades de cada estudante de modo que o ensino favoreça a aprendizagem de todos. Pimentel (2012) ressalta que a inexistência desta formação gera o fenômeno da pseudoinclusão, ou seja, apenas da figuração do estudante com deficiência na escola regular, sem que o mesmo esteja devidamente incluído no processo de aprender. Estar matriculado obter frequência satisfatória em classe do ensino regular, não significa estar envolvido no processo de aprendizagem daquele grupo.

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Segundo Mittler apud Mantoan (2003, p 14), “a maioria dos professores do ensino regular, se consideram incapazes para receber alunos com deficiência dizendo não saber lidar com as diferenças e os desafios que elas acarretariam”. Encontram-se despreparados tanto no quesito teórico, estando este relacionado com o saber sobre a deficiência e aprendizagem desse aluno, quanto na prática pedagógica, sem saber quais atitudes metodológicas podem estimular o aprendizado desses alunos.

Para Dalla Déa (2009) a inclusão de crianças com SD no sistema de ensino regular representa um desafio para os educadores pela falta de informações reais sobre a síndrome. Nesse contexto a DI ganha um destaque, pois essa é uma característica que todas as pessoas com a síndrome possuem, e que muitos docentes criam vários estereótipos ao seu respeito, principalmente o de que o aluno com DI não pode aprender, o que segundo a autora, não é verdade.

A escolarização dos alunos com SD, também continua sendo uma questão a ser repensada na escola pública e privada do Brasil, uma vez que esses alunos, por apresentarem uma DI, têm uma maneira muito própria de construir o conhecimento, que muitas vezes não obedece ao ritmo preconizado pela escola regular. Sobre isso, Batista e Mantoan (2007, p.16) salientam que:

[...] a deficiência mental desafia a escola comum no seu objetivo de ensinar, de levar o aluno a aprender o conteúdo curricular, construindo o conhecimento. O aluno com essa deficiência tem uma maneira própria de lidar com o saber, que não corresponde ao que a escola preconiza. As outras deficiências não abalam tanto a escola comum, pois não tocam no cerne e no motivo da sua urgente transformação: considerar a aprendizagem e o conhecimento acadêmico como uma conquista individual e intransferível do aprendiz, que não cabe em padrões e modelos idealizados.

A DI, não é fator determinante na aprendizagem do aluno com essa deficiência, e sim a interação com seu meio, e a mediação que é feita através do trabalho docente. Vygotsky (1997) afirma que a intervenção pedagógica possui uma influência de grande significância na educação dos alunos com DI, salienta ainda que a intervenção pedagógica com a utilização de meios diversificados é uma possibilidade de alcançar o aprendizado desse aluno. Nesse contexto o autor aponta que esses recursos permitem ao aluno criar outras maneiras de aprendizado e assim se sentir inserido no cenário da sala de aula.

Aprendizado e desenvolvimento. Foi nessa ordem que Vygotsky (1988) instituiu o funcionamento do psiquismo humano, a partir dessa teoria Vygotsky assinala que há uma relação dialética entre o aprendizado e o desenvolvimento e, portanto afirma que o aprendizado antecede e impulsiona o desenvolvimento. Sendo assim o autor apresenta seu conceito de ZDP, representada em dois níveis sendo o primeiro, do nível de desenvolvimento efetivo da criança ou desenvolvimento real e o segundo, o nível de desenvolvimento potencial.

Segundo Vygotsky (1988) o primeiro nível chamado de desenvolvimento real são os aprendizados já atingidos e que possibilitaram a criança seu desenvolvimento. É “o nível de desenvolvimento das funções psicointelectuais da criança que se conseguiu como resultado de um específico processo de desenvolvimento já realizado" (p. 111). Portanto são processos internos que correspondem com os conhecimentos já adquiridos, aprendizados construídos e organizados por meio das interações e auxílio de outras pessoas através dos aspectos históricos e culturais do ambiente em que vivem.

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Já o nível de desenvolvimento potencial é todo aquele aprendizado que ainda será alcançado pela criança e impulsionam seu desenvolvimento, mas para que esse aprendizado aconteça é necessária a mediação de uma pessoa com mais experiência. E esses dois níveis de desenvolvimentos estão interligados por meio da ZDP. Assim sendo, fica visível a importância do outro nos processos internos de desenvolvimento, a partir de uma ideia que em primeiro lugar acontecem os processos interpessoais, ou seja, o que envolve a relação entre duas ou mais pessoas e com os elementos externos, para que consequentemente ocorram os processos intrapessoais que consistem na capacidade de pensar, analisar e internalizar tudo o que foi apreendido por meio da aprendizagem cultural e pela mediação dos elementos externos (VYGOTSKY 1998, 7)

O conceito de zona de desenvolvimento proximal, concebido por Vygotsky, colaborou imensamente para o processo de identificação das necessidades educativas dos alunos com DI, visto que convida o professor a enxergar o que esse aluno já sabe o que de experiência ele traz para a sala de aula, independente de sua situação de deficiência, e a partir daí, intervir de modo a desenvolver o seu potencial, mediante a intervenção pedagógica planejada e direcionada para as suas necessidades, como um dos elementos que compõe a mediação. Nessa perspectiva, o papel que Vygotsky atribui à escola é crucial e necessita ser internalizado pelos professores e demais profissionais da educação (NASCIMENTO, 2017).

Em suma Vygotsky (1998), pontua que o aluno com DI (DI) através da mediação pedagógica pode ser levado de uma ZDR, que são seus aprendizados já adquiridos, a uma ZDP, que é o que o aluno com DI pode aprender através da mediação

A partir desses apontamentos de Vygotsky (1998) podemos perceber como o professor exerce um importante papel, na aprendizagem do aluno com DI, e ainda por essa vertente podemos perceber como a formação docente pode ser indispensável nesse processo de qualificação desse professor mediador, para lhe proporcionar autonomia, para que ele possa lidar com o processo de aprendizagem do aluno com SD de forma significativa e mediadora.

Os estereótipos e as barreiras atitudinais, muitas vezes já construídos antes mesmo de um contato prévio com o aluno com SD, já criam uma distância entre professor e aluno, no entanto podem ser diminuídas e até mesmo eliminadas por meio do conhecimento empírico sobre o assunto e de vivências com essas pessoas. No período escolar a fase de adaptação para a criança com SD é fundamental como para qualquer outra criança. Elas são capazes de aprender muitas coisas: ler, escrever, tocar instrumentos, andar a cavalo, dançar, nadar, e desenvolver qualquer outra capacidade que uma criança sem a deficiência possui isso se tiver estímulos e mediação apropriados (DALLA DÉA 2009).

Entretanto ainda segunda a autora Dalla Déa (2009, p.34), sobre o aprendizado dessas crianças, vale ressaltar que:

[...] muitas vezes, precisam de um tempo maior que outra criança precisaria para processar as informações e aprender. Com paciência e persistência, esses indivíduos surpreendem as famílias e os profissionais. A criança Down pode apresentar dificuldade de aprender quando lhe for exigido grande tempo em estado de atenção. Para que a criança, independentemente de ter síndrome de Down, desenvolva todo seu potencial mental, é necessário que se acredite que ela é capaz.

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A falta de autonomia docente provocada pela má qualificação profissional para desenvolver um bom trabalho pedagógico junto a esses alunos, reflete o modelo de educação que se constituiu no Brasil, e que reproduz o discurso da cultura dominante, aquela que não respeitando a individualidade e a história de cada um, deixa de lado as considerações e experiências vividas pelo aluno. Todo esse contexto acaba por refletir significativamente na autonomia desse docente.

Freire (1996, 1987, 1999) aborda como conceito de autonomia algumas definições similares como: a possibilidade de agir por si, de poder escolher e expor idéias, agir com responsabilidade, ou seja, ele entendia que o conceito de autonomia podia ser compreendido como um processo resultante do desenvolvimento do sujeito, que se relaciona ao fato dele tornar-se capaz de resolver questões por si mesmo, de tomar decisões sempre de maneira consciente e pronto para assumir uma maior responsabilidade e arcar com as consequências de seus atos.

Devido a esses fatores apontados por Freire (1996, 1987, 1999), a formação continuada se faz tão importante para a constituição da autonomia desse profissional, pois permite que o mesmo se desenvolva enquanto profissional, assumindo assim sua responsabilidade para com o ensino desses alunos. 

A formação contribui proporcionando assim uma base teórica e prática para que esse docente possa desenvolver um processo de ensino de forma autônoma e confiante, em uma perspectiva mediadora, permite aos professores propiciar a esses alunos com DI, não somente o acesso a escola, mas principalmente ao aprendizado, constituindo assim de fato, a inclusão desse aluno.

Pensando na inclusão do aluno com síndrome de Down (SD), é de suma importância que o professor detenha de certa autonomia, para mediar o processo de ensino e aprendizagem do aluno com a DI. Essa autonomia se constitui a partir da formação, que ao promover saberes teóricos e práticos sobre necessidades desses alunos como se dá o processo de ensino e aprendizagem, quebram estereótipos e rompem barreiras atitudinais, que impedem a educação inclusiva para com esses alunos.

É imprescindível uma reorganização nas propostas de formação continuada de professores, a finalidade deve ser voltada para a consciência da realidade em que estão e vão atuar (GOFFREDO, 1999). Assim como os alunos, os professores não aprendem no vazio. Mantoan (2003) enfatiza que a proposta de formação deve partir do “saber fazer” levando em conta e valorizando os conhecimentos, experiências e práticas desses profissionais no âmbito da inclusão.

Ainda segundo a autora, deve-se considerar em uma formação continuada para se fazer uma educação inclusiva satisfatória o envolvimento de professores, diretores e coordenadores da mesma escola. O compartilhamento e o exercício constante e sistemático na troca de ideias, sentimentos e ações é um dos fatores cruciais do aprimoramento. Com essa dinâmica, experiências concretas e problemas reais presente na instituição, vivenciadas no dia a dia dentro e fora das salas de aula acarretaram nas mudanças objetivadas pela formação. 

Daí a necessidade de se formarem grupos de estudos nas escolas, para a discussão e a compreensão dos problemas educacionais, à luz do conhecimento científico e interdisciplinarmente, se possível. Os grupos são organizados espontaneamente pelos próprios professores, no horário em que estão nas escolas. Essas reuniões têm como ponto de partida as necessidades e os interesses comuns de alguns professores de esclarecer situações e de aperfeiçoar o modo como trabalham nas salas de aula. O foco da formação é o desenvolvimento da competência de resolver problemas pedagógicos (MANTOAN, 2003, p.45)

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Um fator importante nessa proposta de formação organizada dentro das próprias escolas envolvendo diferentes profissionais, pensamentos e sugestões é permitir ao professor direcionar seu olhar para sua própria prática docente. Esse processo reflexivo pode possibilitar ao docente a escolha de qual é o melhor caminho para se obter o sucesso no desafio inclusivo dos alunos com deficiência na escola, conhecendo e respeitando as diferenças e as necessidades específicas para favorecer o ensino/aprendizagem de todos de forma igualitária, inclusive no sistema avaliativo (DALLA DÉA; ROCHA, 2018).

Segundo Mantoan (2003), a escola real precisa acompanhar as transformações sociais, assim superando o sistema tradicional de ensino, que deve levar em consideração um modelo pedagógico que alcance todos os alunos e suas especificidades. Para mudar a escola e garantir uma educação inclusiva para todos os alunos a autora aponta quatro tarefas indispensáveis que são:

Recriar o modelo educativo escolar, tendo como eixo o ensino para todos. Reorganizar pedagogicamente as escolas, abrindo espaços para que a cooperação, o diálogo, a solidariedade, a criatividade e o espírito crítico sejam exercitados nas escolas, por professores, administradores, funcionários e alunos, porque são habilidades mínimas para o exercício da verdadeira cidadania. Garantir aos alunos tempo e liberdade para aprender, bem como um ensino que não segrega e que reprova a repetência. Formar, aprimorar continuamente e valorizar o professor, para que tenha condições e estímulo para ensinar a turma toda, sem exclusões e exceções. (MANTOAN, 2003, p.33)

Recriar o modelo educativo significa romper e contestar aquilo que tradicionalmente é implementado nas escolas. O reconhecimento e a valorização ao “que” e “como” se ensina tem haver com a qualidade de ensino que queremos. Esses fatores farão com que os alunos “cresçam e se desenvolvam, sendo seres éticos, justos, pessoas que terão de reverter uma situação que não conseguimos resolver inteiramente: mudar o mundo e torná-lo mais humano” (MANTOAN, 2003, p.34)

Um ensino de qualidade como destaca Mantoan (2003) implica em uma construção de espaços educativos que sejam capazes formarem alunos que tenham senso crítico, que saibam respeitar as diferenças na convivência de seus pares. A reorganização educacional é um grande desafio para a inclusão, pois envolve questões tanto pedagógicas quanto administrativas que possuem cunho paradigmático meritocrata e elitista.

A compreensão de ensino do ponto de vista da proposta inclusiva coloca em destaque que para haver inclusão é necessário acontecer uma ruptura das fronteiras entre as disciplinas curriculares e a construção de conhecimentos, experiências e significados. A intenção desse modelo de organização educacional é que o professor ao ensinar integre os saberes decorrentes da transversalidade curricular, assim promovendo a participação dos alunos com deficiência (MANTOAN, 2013).

A maioria dos professores ainda têm seu olhar voltado para o ensino como uma ação funcional. Um bom professor deve ter expectativas em relação a capacidade de aprender e desenvolver que seu alunado tem, com isso deve sempre estar se atualizando e buscando meio para ajudá-los seja com materiais diversificados ou em sua própria formação. De acordo com Dalla Déa e Rocha (2018), com as novas demandas da educação especial na educação inclusiva é importante levar em consideração uma educação que atenda a todos os alunos, nessa perspectiva “a formação dos professores surge como um ponto que necessita de questionamentos, debates e aprofundamentos” (p.9).

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Diante da contextualização e do aporte teórico apresentado ao longo deste capítulo, percebe-se que a educação inclusiva deve ter mais relevância e mais espaço, pois como afirma Garcia (1999) a cada dia se torna mais explícita a necessidade de incorporar nos programas de formação de professores conteúdos para aquisição de saberes, conhecimentos, capacidades e atitudes que permitam a esses docentes em formação apreender as complexas situações de ensino. Assim os permitindo constituir um novo olhar de crítico de reflexão e aceitação das diferenças para construir um espaço que escolar que não exclua o aluno com DI.

Com base nesses pressupostos da formação docente para a educação inclusiva de alunos com DI mais especificamente a SD é que o LABIN, situado na Faculdade de Educação da UFG, no campus Universitário em Goiânia-Go em parceria com o Núcleo de Acessibilidade (UFG), promoveu um curso de formação continuada para professores das redes públicas e privadas de ensino, estendendo também aos alunos de graduação do curso de pedagogia, com o intuito de construir saberes relativos à educação inclusiva de alunos com SD, bem como analisar as compreensões dos professores acerca das aprendizagens dos alunos com deficiência bem como está sendo desenvolvido o trabalho dentro de sala de aula que garanta a inclusão e o desenvolvimento do aluno com SD. 

Cultura Digidown: Percepção dos professores em formação

Essa pesquisa se deu a partir do estudo do projeto “Cultura Digidown” que ofereceu aos professores participantes as respectivas vertentes para discussão sendo elas “Cultura Digidown: interfaces digitais para a leitura e escrita de estudantes com SD”, “Cultura Digidown: o professor que acolhe as diferenças” e “Cultura Digidown: aprofundando compreensões sobre a alfabetização de pessoas com SD”. A proposta desse projeto foi construir saberes relativos à educação inclusiva de alunos com SD, bem como analisar as compreensões dos professores acerca das aprendizagens dos alunos com deficiência e como está sendo desenvolvido o trabalho dentro de sala de aula para que garanta a inclusão e o desenvolvimento do aluno com SD. 

Sendo assim para melhor compreender os temas e subtemas propostos para estudo e atividades realizadas serão demonstradas no quadro a seguir.

Quadro 3 - Tópicos propostos para a discussão dentro dos respectivos temas. Fonte: Reunião para elaboração dos temas discutidos no dia 07 de março de 2017.
Tema 1 - Cultura Digidown: o professor que acolhe as diferenças. - Características e desenvolvimento de pessoas com Síndrome de Down;
- Inclusão escolar: rompendo as barreiras atitudinais e desconstruindo estereótipos;
- A escola que acolhe as diferenças: desafios e possibilidades;
- Sobre a Consciência Fonológica e Software para o estudo da leitura e escrita com método fônico;
- Vivências de oficinas de leitura e escrita com estudantes com Síndrome de Down.
Tema 2 - Cultura Digidown: interfaces digitais para a leitura e escrita de estudantes com síndrome de Down. - Oficina para estudantes com Síndrome de Down em fase de alfabetização
- Vivência de leitura e escrita de pequenos textos;- Oficinas com o software Alfafon;
- Vivências com leitura e escrita de postagens em blog;
- Vivências em atividades de musicoterapia.
Tema 3 - Cultura Digidown: aprofundando compreensões sobre a alfabetização de pessoas com Síndrome de Down - Propostas de alfabetização e seus fundamentos;
- Experiências com a alfabetização com pessoas com Síndrome de Down;
- Vivências de oficinas de leitura e escrita com estudantes com Síndrome de Down.
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O curso que já estava em sua segunda versão teve início no dia 09 de março de 2017 e foi concluído no dia 29 de junho de 2017. Os encontros para as oficinas oferecidas pelo curso de formação continuada foram feitas no LABIN - da Faculdade de Educação da UFG, todas as quintas feiras das 14h às 17h. Foram realizados 15 encontros, totalizando uma carga horária de 60h, sendo 30h presenciais por meio de estudos teóricos com professores especializados na área e as outras 30 horas complementares foi dedicada ao planejamento das aulas, relatórios, estudos e pesquisas dos professores participantes. O curso utilizou-se de um recurso de rede social chamado blog para disponibilizar conteúdos para os professores participantes, assim como para colher suas percepções no decorrer do processo e disponibilizar fotos e relatos sobre os encontros. O blog é considerado um diário online e todos os encontros e discussões do curso foram colocados no blog para estar a disposição de outros professores. Esse Blog pode ser visualizado no link http://culturadigidown.blogspot.com/.

O curso surgiu da preocupação que a professora Vanessa Santana Dalla Déa tinha ao verificar na Asdown (Associação de Síndrome de Down de Goiás) a dificuldade de alfabetização das pessoas com síndrome de Down, e procurou a professora Maria de Fátima Teixeira Barreto para realizarem juntas em 2016 a Cultura Digidown, que por meio dessa proposta de formação continuada oficializaram a parceria entre Núcleo de Acessibilidade da Universidade Federal de Goiás (UFG) e o LABIN-FE. No ano de 2017 as professoras doutoras Ana Flávia Teodoro de Mendonça Oliveira (FE-UFG), Cleide Aparecida Rodrigues (FE-UFG), e Cláudia Zanini (EMAC) foram convidadas a compor a equipe de trabalho. A idéia foi que o discurso sobre inclusão estivesse mais presente nos cursos de licenciatura e conhecer e avaliar novas propostas pedagógicas que auxiliem na alfabetização e letramento de pessoas com SD.

O curso de formação Cultura Digidown, foi realizado em três momentos (QUADRO 4). O primeiro momento, contou somente com a participação dos professores, nesse momento os professores puderam ampliar seus conhecimentos, através de bases teóricas sobre os temas: inclusão escolar: rompendo as barreiras atitudinais e desconstruindo estereótipos, a escola que acolhe as diferenças: desafios e possibilidades, família das pessoas com DI: desafios e dificuldades, alfabetização e letramento, compreender a SD e a DI, no que diz respeito às características físicas, ao desenvolvimento cognitivo e emocional e desenvolvimento da linguagem, e assim quebrar estereótipos, e barreiras atitudinais, principalmente em relação à de aprendizagem desses alunos. 

No segundo momento os professores conheceram o funcionamento e as bases teórica do software Alfabetização Fônica Computadorizada, desenvolvido em 2010 por pesquisadores da USP e ao contato e vivência dos professores com pessoas com SD, que é o software o qual o curso utilizou como principal recurso para trabalhar a alfabetização e o letramento e prepararam atividades para vivência utilizando os softwares de alfabetização.

No terceiro momento, os professores tiveram vivências com os alunos com SD através de oficinas práticas, onde eles executavam aulas (que eram planejadas antecipadamente) com os alunos, as aulas foram pautadas no software, o qual desenvolve a alfabetização a partir do método fônico (CAPOVILLA; CAPOVILLA, 2005). Essa foi à fase dos professores aplicarem os conhecimentos adquiridos no primeiro e segundo momento, obter uma vivência com alunos com SD dentro do contexto do ensino e aprendizagem, trabalhando a alfabetização e letramento desses alunos com DI.

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Os professores participantes do curso foram agrupados em 5 a 6 pessoas para pensar e elaborar atividades práticas para serem vivenciadas com os alunos que também foram divididos em grupos de 2 a 3 conforme o nível de desenvolvimento. Além disso, os professores tinham autonomia para planejarem atividades diferenciadas e diversificadas para o grupo de estudantes, no entanto deveriam ser considerados no planejamento ao menos 15 a 20 minutos de vivência com o software.

Quadro 4 - Descrição do programa de formação continuada “Cultura Digidown”. Fonte: Cultura Digidown (2017, P.14 E 15).
Encontro Assunto/Tema principal Objetivos
1ª ETAPA
Conhecendo a Síndrome de Down: características e desenvolvimento. (a) Conhecer o grupo; (b) Apresentar os objetivos do curso; (c) compreender a Síndrome de Down, no que diz respeito às características físicas, ao desenvolvimento cognitivo e emocional e desenvolvimento da linguagem.
Inclusão escolar: rompendo as barreiras atitudinais e desconstruindo estereótipos. (a) Identificar quais os Estereótipos em relação a pessoa com Síndrome de Down; (b) refletir sobre as principais barreiras atitudinais que impedem a inclusão das pessoas com SD; (c) compreender a sexualidade da pessoa com DI, orientando os professores sobre como lidar com essa questão.
A escola que acolhe as diferenças: desafios e possibilidades. (a) Apresentar os aspectos históricos da Educação das pessoas com Deficiência; (b) refletir sobre as políticas públicas na área da educação inclusiva; (c) apresentar a experiência de escolas que obtiveram êxito na inclusão de pessoas com deficiência.
Família das pessoas com DI: desafios e dificuldades. (a) entender a importância da interação família-escola na inclusão dos alunos com S.D; (b) Compreender o modelo de adaptação ao receber a notícia da deficiência; (c) apresentar as comunidades de pais nas redes sociais.
Finalização da parte teórica da formação. Conhecendo o software Alfabetização Fônica Computadorizada. Apresentar aos professores o software alfabetização fônica computadorizada, seus desenvolvedores e proposta pedagógica.
2ª ETAPA
Preparando atividades para vivência utilizando os softwares de alfabetização. Preparar atividades pedagógicas para vivenciar com os alfabetizandos com S.D.
7º ao 13º Vivenciar atividades com os alunos com S.D. Trabalhar com os alunos com S.D. utilizando o software de alfabetização e os outros recursos planejados pelos professores.
3ª ETAPA
14º Apresentação dos relatórios sobre as vivências com os estudantes. Avaliar a contribuição da formação continuada através dos relatórios produzidos pelos professores.
15º Realização do Grupo focal. Verificar as percepções dos professores em relação ao uso do software.

A escolha de diferentes temáticas para tratar a inclusão dos alunos com SD possibilitou além de conhecimento e informação aos professores, o contato com profissionais e com diferentes instituições que tem realizado um trabalho reconhecidamente exitoso com esse alunado.

Professores em formação

Participaram dessa pesquisa 40 professores da rede regular de ensino municipal e estadual de Goiânia, e alunos do curso de graduação em Pedagogia da Universidade Federal de Goiás, matriculados no curso de formação Cultura Digidown. O quadro 5 apresenta dados sobre o perfil dos participantes.

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Quadro 5 - Dados dos participantes da pesquisa: professores. Fonte: Organização de dados do “Cultura Digidown”, 2017. *Os espaços em branco foram assim deixados pelos participantes que optaram por não responder a pergunta.
PARTICIPANTE FORMAÇÃO INICIAL PÓS-GRADUAÇÃO CAPACITAÇÃO NA ÁREA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL FUNÇÃO QUE EXERCE TEVE ALUNOS COM SÍNDROME DE DOWN
PROF.1 Pedagogia Especialização Sim Apoio Não
PROF.2 Licenciatura História/ Licenciatura Biologia Mestrado Sim Professora Formadora Não
PROF.3 Biblioteconomia Não Não Organização de bibliotecas particulares e normalização de textos acadêmicos Não
PROF.4 Graduanda em Pedagogia Não Não ___ Não
PROF.5 Geografia Especialização Sim Professora de Apoio Não
PROF.6 Letras Especialização Não Professora Não
PROF.7 História Especialização Sim Professora Não
PROF.8 Graduanda em Pedagogia Não Não ___ Não
PROF.9 Pedagogia Especialização Sim Coordenador e Assessor da APAE Não
PROF.10 Zootecnia Pedagogia em Andamento Mestrado Sim Professora de Educação Ambiental e Apoio Pedagógico para Educação Inclusiva Não
PROF.11 Licenciatura História/ Licenciatura Biologia Mestrado Sim Professora Formadora Não
PROF.12 Bacharel Educação Física Especialização Não Professora de PráticasAquáticas Não
PROF.13 Pedagogia Especialização Sim Professora Formadora Não respondeu
PROF.14 Pedagogia Não Não ___ Sim
PROF.15 Pedagogia Não Sim Agente de Combate aEndemias Sim
PROF.16 Pedagogia Não Não ___ Não
PROF.17 Pedagogia Não Sim ___ Sim
PROF.18 Pedagogia ___ Não ___ Não
PROF.19 Pedagogia ___ Não ___ Sim
PROF.20 Pedagogia ___ Não Tec. Em Enfermagem Não
PROF.21 Pedagogia ___ Não ___ Não
PROF.22 Pedagogia ___ Não ___ Não
PROF.23 Pedagogia ___ Não Auxiliar Administrativo Não
PROF.24 Pedagogia ___ Não ___ Não
PROF.25 Educação Física Especialização Sim Professora Não
PROF.26 Pedagogia ___ Não Desempregada Não
PROF.27 Pedagogia ___ Não Secretária Sim
PROF.28 Pedagogia, Ciências e Matemática ___ Não Professor Não
PROF.29 Pedagogia ___ Não Estagiária CEPAE Não
PROF.30 Pedagogia ___ Sim ___ Não
PROF.31 Letras Mestrado Não Técnico em Assuntos Educacionais ___
PROF.32 Pedagogia ___ Não Estudante Não
PROF.33 Licenciatura Informática ___ Não Estudante Sim
PROF.34 Pedagogia Especialização Não Assistente Administrativo Não
PROF.35 Pedagogia ___ Sim ___ Não
PROF.36 Pedagogia ___ Não Auxiliar de Atividades Educativas Não
PROF.37 Matemática Mestrado Sim Professora de Matemática Não
PROF.38 Pedagogia ___ Sim Monitora de criança Síndrome de Down Não
PROF.39 Pedagogia ___ Não ___ Não
PROF.40 Letras Especialização Sim Professora Não

Avaliando a percepção dos professores

Este estudo se deu a partir da pesquisa de campo que correspondeu à observação/ ação e a coleta de dados.

Segundo Gonçalves (2001, p.67), 

A pesquisa de campo é o tipo de pesquisa que pretende buscar a informação diretamente com a população pesquisada. Ela exige do pesquisador um encontro mais direto. Nesse caso, o pesquisador precisa ir ao espaço onde o fenômeno ocorre, ou ocorreu e reunir um conjunto de informações a serem documentadas [...].

Foram utilizados para coleta de dados questionários presenciais e questionários online. Os questionários nos forneceram informações importantes sobre os professores que estavam participando do curso de formação continuada, o que nos possibilitou saber quais eram suas maiores dificuldades em relação à educação escolar dos alunos com SD, quais professores já passaram pela experiência de ter um aluno com deficiência em sala de aula regular e quais foram às maiores barreiras e desafios que enfrentaram e esperavam. 

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Além dos questionários foi utilizado nesta pesquisa o grupo focal, definido por Morgan (1997) como uma técnica de pesquisa qualitativa, ou seja, resultado de entrevistas em grupo e coleta de informações por meio de comunicações e interações. Ainda nessa perspectiva Pommer e Pommer (2014, p 10) destacam que o grupo focal em uma abordagem qualitativa “é uma metodologia de entrevista onde ocorre uma exposição oral específica e espontânea dos envolvidos. Esta técnica fomenta interações de um grupo sobre tema proposto, juntamente com os debates suscitados entre os participantes”.

Sendo assim a escolha da técnica de grupo focal foi importante para essa pesquisa, pois propiciou um debate aberto e acessível em torno de um tema de interesse comum aos participantes e reuniu conhecimentos, e assim proporcionou compreensões de percepções, crenças e atitudes de diferentes pontos de vista sobre um mesmo tema.

Para a interpretação dos dados foi considerado as categorias sistematizadas a partir das idéias centrais levantadas após a transcrição dos questionários respondidos e as falas dos professores participantes. Logo em seguida a essa etapa foi analisado quais as categorias encontradas respondiam ao nosso objetivo de pesquisa para que assim pudéssemos fazer a classificação de quais inferências seriam importantes até chegar à interpretação.

Dessa maneira foram levantadas 3 (três) categorias de acordo com as percepções dos professores participantes do curso de formação continuada “Cultura Digidown”, que foram organizadas da seguinte forma (QUADRO 6):

Quadro 6 - Categorias de Análise: Percepções dos professores. Fonte: Elaborado pela pesquisadora.
PERCEPÇÕES DOS PROFESSORES PARTICIPANTES DO CURSO QUE RESULTARAM EM CATEGORIAS DE ANÁLISE
1º Desconstrução de estereótipos e barreiras atitudinais em relação às pessoas com síndrome de Down;
2º Novos saberes sistematizados referentes à educação inclusiva e às singularidades  dos estudantes com síndrome de Down;
3º Contribuições que refletirão na práxis pedagógica inclusiva.

Enfim partimos para última fase apontada por Bardin (1977), onde foi realizado o tratamento dos resultados obtidos e a interpretação. Desse modo, procedemos à análise sobre o que os dados nos falaram, tendo sempre como referência os objetivos propostos na pesquisa.

Desconstrução de estereótipos e barreiras atitudinais em relação às pessoas com síndrome de Down

Em nossa pesquisa verificamos que a resposta dos professores participantes do curso de formação continuada foi unânime quanto a que o curso Cultura Digidown proporcionou um novo ponto de vista sobre a pessoa com síndrome de Down.

Para melhor compreensão das respostas dos professores vamos iniciar esclarecendo o que queremos dizer quando falamos em estereótipos e barreiras atitudinais. Perez (2012) afirma que o conceito de estereótipo está relacionado com termo preconceito mais difundido na sociedade e que percorre todo o processo histórico. Ainda segundo a autora de forma mais explícita pode-se dizer que “o estereótipo é uma forma de simplificar nossa visão de mundo, poupando tempo e energia ao realizar determinadas generalizações” (P.885) 

Compartilhando da mesma concepção Banaji e Bhaskar (2000) definiram a ideia de estereotipar como representação mental de um determinado grupo social. De forma geral, as definições de estereótipo sempre nos levam a um ponto comum que é a “crença compartilhada acerca de atributos – traços de personalidade ou comportamentos – de grupos de pessoas” (RODRIGUES, ASSMAR e JABLONSKI, 1999, p. 150).

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Sabe se que a estereotipação do grupo de PCDs é considerada um facilitador cotidianamente, no entanto os impactos negativos para o desenvolvimento dessas pessoas são imensuráveis, pois acarretam em generalizações incorretas sobre o indivíduo, ocasionando injustiças, gerando julgamentos enviesados e a exclusão (HILTON; HIPPEL, 1996; RODRIGUES; ASSMAR; JABLONSKI, 1999).

Podemos perceber a importância dessa desconstrução de generalização de estereótipos e estigmas que permeiam o meio social com tanta naturalidade sobre a pessoa com deficiência na fala dos professores que participaram do curso:

(...) Esse encontro foi de suma importância para romper estereótipos que foram construídos devido a falta de conhecimento. Tive um olhar atento e diferenciado ao refletir sobre os meus preconceitos em relação ao modo como vivem e se relacionam. São pessoas que mesmo com uma limitação intelectual são capazes de terem uma vida como outra pessoa qualquer vivem a vida de maneira intensa e demonstram muita dedicação e capacidade para exercer qualquer atividade que esteja dentro dos seus limites. (Professor -32)

Ainda no mesmo contexto percebemos na fala de outro professor participante como a naturalidade de homogeneização das pessoas com deficiência se tornou um contexto tão natural e a importância dessa quebra de estereotipação:

(...) o curso digidown apresentou um enorme impacto na minha vida, de tal forma que está sendo desconstruído diversos preconceitos que estavam enraizados em mim e simplesmente eu não os reconheciam. E veja que, eu pensava que não tinha preconceitos sobre pessoas com deficiências e agora reconheço que estou “ainda” imersa aos preconceitos, estereótipos, terminologias etc. Os quais irei dedicar para que sejam desconstruídos e que sejam construídas novas concepções acerca das pessoas com deficiência. Aprendi muito que qualquer pessoa tem direitos e que somos diferentes independentemente se temos ou não deficiências e por isso somos iguais no quesito de ter direitos. (Professor -25)

Da mesma forma que a estereotipação as barreiras atitudinais encontradas pelos sujeitos com deficiência corroboram para sua exclusão perante aos demais sujeitos e o meio social. Lima e Tavares (2012), de maneira sistemática, afirmam que: 

As barreiras atitudinais são barreiras sociais geradas, mantidas, fortalecidas por meio de ações, omissões e linguagens produzidos ao longo da história humana, num processo tridimensional o qual envolve cognições, afetos e ações contra a pessoa com deficiência ou quaisquer grupos em situação de vulnerabilidade, resultando no desrespeito ou impedimento aos direitos dessas pessoas, limitando-as ou incapacitando-as para o exercício de direitos e deveres sociais: são abstratas para quem as produz e concretas para quem sofre seus efeitos. (TAVARES, 2012, p. 104).

As barreiras, podem ser uma das causas de exclusão do sujeito, assim como  a limitação imposta sobre ele que o diferencia perante aos demais, principalmente nos espaços sociais, onde as possibilidades de sentir-se em grupo e inserido são devastadoras, a exemplo, a escola (SANTOS e CAVALCANTI, 2016).

Ainda de acordo com Tavares (2012) às barreiras atitudinais podem ser classificadas por ações e perspectivas que a pessoa sem deficiência tem sobre a pessoa com deficiência. São diversas e podem ser conceituadas como barreira atitudinal de substantivação que é quando a pessoa com deficiência é vista e tratada pelas pessoas sem deficiência como se fosse toda deficiente; barreira atitudinal de rotulação essa se caracteriza quando o sujeito é rotulado e depreciado pela deficiência que tem; barreira atitudinal de estereótipos que determina pontos positivos e negativos de pessoas diferentes, mas com a mesma deficiência.

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Ainda segundo o autor existe a Barreira Atitudinal de Generalização, ou seja, a tendência de homogeneizar os indivíduos com deficiência por alguma experiência; Barreira Atitudinal de Padronização que é por sua vez a consequência da generalização e dessa forma concretizada pela efetivação de serviços; barreira atitudinal de particularização conceituada pela segregação das pessoas com deficiência. Subentende que pela deficiência elas têm modos específicos e particulares de atuarem; barreira atitudinal de recusa e negação que se configura na negação da existência ou se impõe um limite para rejeitar a interação com uma pessoa com deficiência; barreira atitudinal de ignorância, representada pela falta de conhecimento da deficiência, implicando assim no processo de desenvolvimento da pessoa com deficiência e consequentemente a barreira atitudinal de medo, essa é uma das mais praticadas pela ignorância das pessoas sobre a deficiência, que leva ao receio de fazer ou dizer algo na frente de pessoas com deficiência

E por fim, a barreira atitudinal de baixa expectativa, essa presume que a pessoa com deficiência de não vá conseguir fazer algo; a barreira atitudinal de inferiorização da deficiência caracterizada pela crença de incapacitação, quando as pessoas com deficiência são comparadas com outras sem deficiência; a barreira atitudinal de adoração do herói, representando a exaltação e super valorização da pessoa com deficiência, colocando - a em evidência, porque delas são esperados resultados inferiores das demais; a barreira atitudinal de exaltação do modelo que é quando a deficiência é usada como superação na comparação das pessoas com e sem deficiência; a barreira atitudinal de compensação caracterizada pelo favoritismo e privilégio dado à pessoa com deficiência com bem ou serviço, por dó; a barreira atitudinal de dó ou pena assinalada pela expressão e/ou atitude de piedade para com as pessoas com deficiência frente a algum trabalho; e concluindo a barreira atitudinal de superproteção, ou seja, proteção desproporcional com a pessoa com deficiência cria-se uma visão da incapacidade do sujeito de fazer algo ou de tomar decisões em função da deficiência. 

Quanto aos conceitos trazidas pela autora Tavares (2012) considerações podem ser destacadas a partir das seguintes falas:

P32 - O curso é muito esclarecedor e possibilitou a quebra de várias barreiras, às vezes os alunos não são incluídos por falta de conhecimento por parte do professor dificultando em sua prática pedagógica. (Barreira Atitudinal de Ignorância).

P22 – Eu tinha um pensamento de tentar proteger a pessoa, tratando ela como vítima e indefesa. E nos relatos e vídeos de hoje e essa discussão em sala pude perceber e analisar esse assunto de outra forma, rompendo com preconceitos que eu tinha. A parte  que mais me emocionou na aula, foi ver os relatos da mãe do Breno sobre a autonomia dele. Fiquei muito feliz por essa oportunidade, de estar aqui discutindo inclusão. (Barreira Atitudinal de Superproteção).

P26 - No decorrer das discussões e vídeos mostrados, tive a oportunidade de refletir da forma em que as pessoas são tratadas, pois são tantos estereótipos construídos durante a vida que fica mais fácil achar que o outro não pode fazer sozinho. Contudo, como pude ver hoje, devem-se criar condições para as pessoas com Síndrome de Down fazerem sozinhas. (Barreira Atitudinal de Dó ou Pena e Estereótipos)

P27- Entender que essas pessoas são iguais a todas, não apenas no campo teórico, mas inclusive na prática é de fundamental importância. Na maioria das vezes nossos olhares medíocres as fazem se sentirem inferiores ou incapazes. Às vezes ocorre o contrário também. As idolatramos e enaltecemos seus feitos, considerando-as seres angelicais e heroísticos. O que nos falta é a compreensão, o entendimento de que elas são apenas seres humanos com capacitações e limitações como qualquer outro (Barreira Atitudinal de Inferiorização da Deficiência e Barreira Atitudinal de Adoração do Herói)

P28 – A aula de hoje me despertou para coisas que eu nunca havia pensado antes. Uma dessas coisas é o fato de a pessoa com deficiência física ou intelectual ser tratado como vítima (incapaz, sempre sofredora) ou como o herói (supera todas as dificuldades). Esses rótulos são dolorosos, pois no caso da vítima pode fazer com que ela sempre se sinta infeliz e incapaz e no caso de herói ele sempre tem que superar tudo e estar sempre feliz ( o que não acontece nem com as pessoas sem deficiência). Tenho certeza de que aprenderei com esse curso muitas coisas que farão diferença na minha vida, na minha profissão e na vida de alunos (Barreira de Atitudinal de Rotulação, Barreira Atitudinal de Inferiorização da Deficiência e Barreira Atitudinal de Adoração do Herói).

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Ainda identificamos nas falas dos professores participantes do curso a quebra de preconceitos estereotipados em relação a sexualidade, aprendizagem e desenvolvimento e a infantilização dos sujeitos com síndrome de Down, conforme o quadro a seguir (quadro 7).

Quadro 7 - Primeira Categoria de Análise. Fonte: Elaborado pela pesquisadora.
Desconstrução de estereótipos e barreiras atitudinais em relação às pessoas com síndrome de Down
Total de Apontamentos
Sexualidade 15
Aprendizagem e Desenvolvimento 24
Infantilização 8

Giovanoni (1994) considera o termo sexualidade humana um conceito muito abrangente, segundo a autora pode compreender relacionamentos inter pessoais como namoro e casamento e também a auto estima do sujeito. Ainda a esse respeito Michel Bozon (2004, p. 14) destaca que “os saberes, representações e conhecimentos sobre a sexualidade e, de maneira geral, as próprias disciplinas relativas à sexualidade são produtos culturais e históricos que contribuem para moldar e modificar os cenários culturais da sexualidade.” 

Ainda em relação a complexidade de compreender sobre a sexualidade humana e corroborando com a ideia dos outros autores, Nunes (1987,p.14-15) afirma que “[...] as relações sexuais são relações sociais que vão sendo construídas historicamente em determinadas estruturas, modelos e valores que dizem respeito a determinados interesses de épocas diferentes”.

Acrescentam Sprovieri e Assumpção Jr. (2005) que a sexualidade é um modo de comportamento um tanto complexo, formado por estruturas sociais e aprendido por meio da observação e reprodução de informações. Os impulsos sexuais são cognitivamente controlados conforme as exigências e restrições estabelecidas socialmente.

Quando nos referimos às pessoas com deficiência intelectual, é incoerente pensar em uma forma diferenciada e pré estabelecida de vivenciarem e expressar a sexualidade. A este respeito, Casarin (1999, p. 281), destaca que:

embora a alteração genética possa determinar características físicas e semelhantes a seus portadores, eles mantêm traços familiares e preservam sua individualidade. O mesmo acontece com as características psicológicas. Apesar de haver uma tendência a uniformização, a pessoa com síndrome de Down tem sua própria personalidade e se diferencia de outras pessoas. 

Por décadas a sociedade tem construído um contexto histórico equivocado em relação a sexualidade das pessoas com SD. Podemos perceber nas falas dos seguintes professores:

Acredito que após esta aula muitos preconceitos e barreiras atitudinais foram rompidos, principalmente em relação à sexualidade. Sempre acreditei que pessoas com síndrome de Down possuem uma sexualidade exacerbada e hoje descobri que isso apenas acontece, pois não foram ensinados os devidos limites, mas que podem ser alterados (professor 18).

Sobre a aula de hoje, foi uma descoberta atrás da outra. E também uma quebra de rupturas ou estereótipos, principalmente quando o assunto é sexualidade com pessoas com deficiências (professor 22).

Eu também não sabia que pessoas com Síndrome de Down namoravam e tem uma vida normal como as nossas. Essa aula quebrou muitos paradigmas (professor 24).

Por fim, outro ponto importante que foi mudado, que foi desconstruído foi a questão da sexualidade, pois sobre ouvi sobre ela ser exacerbada e hoje pude ver melhor o quanto isso é mais um estereótipo, pois todos nascem com as mesmas capacidades de ser (professor 26).

Achei interessante a questão da sexualidade, pois cresci ouvindo que as crianças com deficiência tinham a sexualidade exacerbada e me surpreendi com o vídeo em que uma Down se torna mãe (professor 29).

A sexualidade foi um tema que me deixou um pouco inquieta, pois antes de realizar a leitura dos textos e ouvir as explicações da professora, eu nunca tinha parado para pensar na vida sexual de uma pessoa com Síndrome de Down e vejo o quanto é natural esses acontecimentos, porém eles necessitam ser orientados como todos nós somos  (professor 37).

Não vou negar, antes de conhecer um pouco sobre essa temática, tinha muitas dúvidas e questionamentos. Tinha dificuldades de enxergar esses jovens namorando, casando. Não por preconceito, mas de achar que eles teriam que ser protegidos. Na disciplina do professor Ricardo isso começou a ficar mais claro e percebi uma expectativa vida normal; dentro das limitações que a deficiência permite (professor 39).

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Enfim no que tange sobre a sexualidade das pessoas com deficiência intelectual é que, elas têm necessidades como qualquer outro indivíduo, e, portanto, sentem prazer e desejo de modo a desfrutar uma relação saudável com seus pares e o convívio social (FERREIRA, 2001). Em relação a aprendizagem e desenvolvimento dos alunos com síndrome de Down os professores participantes do curso puderam vivenciar de várias formas e na prática a quebra desse pré conceito. Dessa maneira foi levado em consideração pelos professores participantes do curso que há uma necessidade de estabelecer estratégias pedagógicas diferenciadas nos processos educacionais desses estudantes para garantir a aprendizagem dos mesmos. 

Em seus estudos Vygotsky (1998) ressalta que a metodologia utilizada pelo professor no atendimento educacional de  pessoas com deficiência é importante visto que cria outras vias que podem assegurar seu aprendizado na sala de aula. Além de estratégias o aluno com DI necessita que o professor acredite no seu potencial, como afirma Mantoan (1989, p.161) 

Ao considerar o deficiente mental a partir do que ele é capaz de ser, de fazer, de enfrentar, de assumir como pessoa, revelam-se a todos nós e a ele próprio possibilidades que se escondiam, que não lhe eram creditadas, por falta de oportunidades de emergirem espontaneamente. Os pais, professores, especialistas e a sociedade em geral terão clarificados os quadros de deficiência mental, na medida em que derem um crédito de confiança para competência e o desempenho dos deficientes, no dia-a-dia da casa, nos estudos, no esporte, no lazer, nas atividades culturais e religiosas. É preciso, a um só tempo, reconhecer a especialidade e a generalidade de cada aluno e, nesse sentido, a educação tem muito ainda a realizar. Ocorre que os professores, ao trabalharem com alunos deficientes, prendem-se unicamente ao que é próprio de sua condição; aqueles que se dedicam ao ensino de alunos normais ficam restritos ao que é característico da maioria, sem levar em conta que cada aluno é um indivíduo, com suas particularidades de desenvolvimento. 

Podemos também constatar esta percepção na fala dos professores 25 e 30,

Primordialmente, devemos enxergá-los como uma pessoa e não como um fragmento de pessoa, como um coitado, ter pena, achar que não tem condições de aprender, etc. Minha visão foi ampliada em relação como a educação e a aprendizagem, pois, hoje tenho consciência de que se é perfeitamente possível ensinar uma pessoa com síndrome de Down, e que ela tem condições para aprender dentro do seu tempo e de suas limitações. Cabe ao (a) educador (a) fazer adaptações aos materiais que serão utilizados em sala de aula e respeitar as limitações desses alunos (PROFESSOR 25).

“O debate sobre estereótipos foi importantíssimo, pois para que o professor ensine, é preciso que ele acredite que o aluno pode aprender. A expectativa de aprendizagem do aluno influencia no que o professor ensina e em como ele ensina” (PROFESSOR 30).

Dessa maneira o professor torna-se o mediador entre o aluno e o seu aprendizado, assim viabilizando os processos de aprendizagem. Nessa relação todo e qualquer processo de aprendizagem é ensino-aprendizagem, incluindo aquele que aprende aquele que ensina e a relação entre eles. Vygotsky (1998, p.55) afirma que “o aprendizado é mais do que a aquisição de capacidade para pensar; é a aquisição de muitas capacidades especializadas para pensar sobre várias coisas.” Sendo assim, o autor considera que a aprendizagem está intrinsecamente relacionada com o desenvolvimento.

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A relação direta configura-se no contato com algo que uma criança por si só realiza, sem compreender ou encontrar algum sentido, não havendo a chance de aprendizado, mas, se, ao contrário, existir um elemento intermediário que viabilize a ela compreender o que está em sua volta, haverá então a mediação, o meio pelo qual a criança poderá alcançar o aprendizado e assim desenvolver-se. “Mediação, em termos genéricos, é o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação; a relação deixa, então, de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento.” (OLIVEIRA, 1997, p. 26). Sforni (2010) relata e discute que 

Na escola, o professor e os colegas mais experientes são os principais mediadores". Apesar de não incorreta, essa ideia reduz o conceito de mediação às relações interpessoais, seja entre adulto e criança ou entre criança e criança mais experiente. Entendida como sinônimo de ajuda empreendida pelo professor na interação com o aluno, muitas vezes, a mediação parece se confundir com a imagem da presença física do professor intervindo nas tarefas que o estudante realiza. Essa é uma compreensão muito comum nos meios educacionais. (p.1)  

Nesse caso, percebe-se que a compreensão sobre mediação está limitada às relações interpessoais, nas quais a interação entre professor–aluno, aluno-aluno ou criança com outros mais experientes, possibilitará o aprendizado. E com as crianças com síndrome de Down essa relação não é diferente. Vale ressaltar que a Deficiência Intelectual, não é fator determinante na aprendizagem do aluno com essa deficiência, e sim a interação com seu meio e a mediação que é feita através do trabalho docente. 

Embora vemos progressos na desconstrução dos estereótipos e barreiras atitudinais adquiridos culturalmente, muitos ainda associam a pessoas com síndrome de Down como eternas crianças. A infantilização pode ser considerada como uma estereotipação limitante para o desenvolvimento da pessoa Down, além de ser uma barreira atitudinal que pode ser enquadrada em superproteção, rotulação entre outras. Podemos constatar esse fato nas seguintes falas: 

“Eu acho assim, que a própria sociedade já põe um rótulo de que eles são infantis, incapaz” (PROFESSOR 09- GRUPO FOCAL)

A minha mudança foi o olhar de infantilização (...) porque além do olhar de infantilização tem o olhar de limitação e acho que, o conhecer sobre o que é a síndrome de down, conhecer o que é realmente né sobre as limitações e a parte da estimulação do que realmente é necessário das possibilidades e a troca de experiência também me ajudou a mudar esse olhar, também a ver como pessoa enquanto criança e enquanto adulta (...)mudou também ver a pessoa com síndrome de down não como uma pessoa doente né mas como uma pessoa com potencial e capacidades ilimitadas. (PROFESSOR 05- GRUPO FOCAL)

Segundo o autor psiquiatra Montobbio citado por Peñuelas (2013) o que uma pessoa com deficiência intelectual precisa para crescer e se desenvolver nada mais é do que exemplos de normalidade. Portanto quando a pessoa com SD recebe o tratamento de infantilização sua identidade, potencialidades, autoestima e dignidade estão sendo severamente comprometidas e limitadas.

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Novos saberes sistematizados referentes à educação inclusiva e às singularidades dos estudantes com síndrome de Down

Falar em Educação Inclusiva é relembrar um movimento marcado por lutas, entraves, persistências e vitórias que aconteceram por um longo período de tempo a favor de uma educação básica e igualitária no sistema de ensino regular que garanta o acesso escolar a crianças e adolescentes independente de cor, origem, raça, sexo, condições sociais e econômicas ou qualquer outra condição, inclusive pessoas com deficiência.

Nas últimas décadas a proposta da inclusão da pessoa com deficiência vem sendo abordada em diversos âmbitos, no entanto vamos nos ater ao campo educacional. Tal esfera vêm mostrando discussões científicas através de pesquisas significativas e, com isso, tem-se assistido a um grande debate acerca das vantagens e desvantagens da efetivação de políticas públicas de Educação Inclusiva no Brasil e no mundo (FONTES, 2009). 

A legalidade da inclusão nas instituições de ensino tem um extenso histórico, com início na década de 60, entretanto ganhando maior força e relevância na década de 90 com a promulgação da Lei n. 9.394 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em 1996 (BRASIL, 1996) e em seguida perpassando pelas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, o Plano Nacional de Educação – PNE em 2001 com a aprovação de novas Resoluções (BRASIL, 2001) e também pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (AEE) (BRASIL, 2008) entre outras.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva é considerada um documento norteador do Atendimento Educacional Especializado (AEE) na escola e tem como objetivo “identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas” (SEESP/MEC, 2007. P. 10). Seu sentido é de orientar o funcionamento das escolas para que estas ofereçam as melhores condições de ensino, respeitando a singularidade de cada indivíduo, ou seja, a necessidade dos alunos com deficiência e sua realidade. 

Sendo assim o AEE é imprescindível no que se refere ao acesso, participação e aprendizagem dos alunos com DI que frequentam as escolas de ensino regular. Visto essa concepção fica evidente que a Educação Inclusiva é um processo que vem aos poucos se consolidando, para os alunos incluídos, professores e demais profissionais da escola. Dessa maneira muitas são as concepções construídas sobre o que é de fato inclusão escolar, dessa maneira Mazzotta salientou sua opinião dizendo que:

Atualmente, sob as mais variadas interpretações, a inclusão escolar tem mobilizado aqueles que a consideram uma ação impraticável e, também, os que a entendem como medida a ser imposta a todos em quaisquer circunstâncias individuais ou institucionais. Outros, como eu, a defendem como ação política e social implantada e desenvolvida com responsabilidade. ( 2010, p. 81).

Podemos perceber a ação impraticável que o autor se refere na fala de alguns professores participantes do curso. 

“Apesar do grande comentário sobre inclusão, sabemos que infelizmente essa ainda só existe no papel”. (PROFESSOR 29)

“O encontro de hoje me possibilitou ter um embasamento em relação ao processo pedagógico inclusivo, foram grandes as conquistas, porém ainda é necessário um novo olhar.” (PROFESSOR 32)

“Já tinha clareza de que o certo é a pessoa com deficiência frequentar a escola regular, junto com as pessoas sem deficiência. E que o direito a educação é de todos e todas, mais o que nem sempre é o que acontece.” (PROFESSOR 34)

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De forma geral a inclusão é entendida como um processo que trouxe ao sistema educacional uma significativa reforma estrutural e curricular. Entretanto  tais mudanças devem ser mais profundas, trata-se da própria concepção de escola e a construção de valores, ideologias e práticas culturais. (RODRIGUES; LIMA-RODRIGUEZ, 2011).

Para que haja de fato uma consolidação da inclusão é necessária a colaboração de todos os profissionais sejam eles professores, gestores, coordenadores, orientadores ou qualquer outro profissional da educação. Capellini e Mendes (2007) destacam que o primeiro passo a ser reorganizado é o trabalho isolado por trabalho em equipe, ou seja, o professor tem que estabelecer uma nova cultura em que os conhecimentos e aprendizagens podem ser compartilhadas e adquiridas entre colegas de trabalho que visam o mesmo objetivo, oportunizar de forma igualitária os saberes a todos os alunos.

A força da colaboração encontra-se na capacidade de unir as habilidades individuais dos educadores, para promover sentimentos de interdependência positiva, desenvolver habilidades criativas de resolução de problemas e apoiar um ao outro, de forma que todos assumam as responsabilidades educacionais (CAPELLINI; MENDES, 2007, p. 125) 

Nessa perspectiva entendemos que a educação deve envolver todo o corpo docente em busca de novos caminhos, novas práticas metodológicas pedagógicas que atendam a todos. Até porque a escola tem a responsabilidade de escolarizar todos os alunos que nela estejam matriculados, alunos com ou sem deficiência.

Echeita e Ainscow (2011) destacam quatro pontos fundamentais que delineiam a inclusão escolar e ainda destaca que devem ser concepções claras para gestores, professores e todos que fazem parte do contexto escolar, antes de qualquer implementação de mudanças. São os seguintes elementos: 

Primeiro, “a inclusão é um processo” (ECHEITA; AINSCOW, 2011, p. 32), ou seja, deve ser uma ação contínua em busca de formas mais adequadas de valorização à diversidade e ao respeito às diferenças, possibilitando a todos os alunos um atendimento de igualitário, e que o fator tempo é bastante relevante já que mudanças necessitam de tempo para serem consolidadas;

Segundo, “a inclusão busca a presença, a participação e o sucesso de todos os alunos” (ECHEITA; AINSCOW, 2011, p. 33), os autores explicam que o termo “presença” utilizado na frase tem um significado além do simples fato de comparecer, como se os alunos com deficiência fossem a escola apenas porque estão matriculados e não para adquirir conhecimento e aprendizagem, “presença” está relacionada ao acesso. A terminologia participação diz respeito à particularidade das experiências vividas pelos alunos quando estão no ambiente escolar tanto pessoal quanto social e, por isso a necessidade que os educadores adotem medidas necessárias para que todos os alunos desenvolvam o melhor desempenho  de suas capacidades; e, por último, o sucesso que está relacionado com as aprendizagens estabelecidas pelo currículo escolar,ou seja, o aprendizado científico  que todo e qualquer aluno deve compartilhar;

Terceiro, “a inclusão determina a identificação e a eliminação de barreiras” (ECHEITA; AINSCOW, 2011, p. 33), neste contexto barreiras é a expressão de tudo aquilo que impede o efetivo exercício dos direitos das pessoas com deficiência, dizendo mais claramente tudo que impede o direito à educação inclusiva e sua qualidade que podemos identificar como crenças e atitudes que muitas vezes se configuram por meio da cultura, das políticas públicas e das práticas educacionais. 

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Quarto, “a inclusão dá ênfase aos grupos de alunos que poderiam estar em risco de marginalização, exclusão ou fracasso escolar” (ECHEITA; AINSCOW, 2011, p. 33), trata-se de assumir responsabilidade moral daqueles que se encontra em maior nível de vulnerabilidade dentro do sistema educacional garantindo seu acesso e participação, permanência e sucesso na escola.

Enfim conclui-se que a efetivação da aprendizagem de todos os alunos, inclusive dos alunos com síndrome de Down é de responsabilidade da escola e que cabe a mesma imcubir-se de implementar as mudanças necessárias seja ela estrutural ou curricular, assim como cabe aos professores e gestores buscar conhecimentos consistente por meio de formação continuada para que seja possível assegurar o aprendizado de todos de acordo com suas limitações e especificidades.

Como podemos perceber na fala dos professores que participaram do curso de formação continuada Digidown:

Na discussão de hoje pensamos a inclusão como sendo direito de todos, considerando-o não como sendo só para pessoas com deficiências, mas todas. Hoje o que se vê é um movimento de integração, no qual o aluno com deficiência têm  acesso à escola, mas não do conhecimento, pois no despreparo dos profissionais acabam colocando estes alunos aquém do conhecimento. É importante salientar a singularidade de cada pessoa e, assim sendo, é um erro alarmante achar que pessoas com deficiências terão comportamentos pré determinados. (PROFESSOR 26)

Construí conhecimentos acerca de que as crianças precisam ser incluídas, mas não só colocadas em salas, é preciso ter igualdade de condições para que todos possam alcançar a “aprendizagem”. (PROFESSOR 28)

Para Troncoso e Cerro (2004), o processo de aprendizagem da criança com síndrome de Down deve ser de acordo com suas particularidades, pois é preciso ensinar a elas muitas coisas que as demais crianças aprendem sozinhas. 

Além disso, necessitará que se lhe ensine de um modo diferente, com uma metodologia mais sistematizada com objetivos mais parcelares, com passos intermediários os menores, com maior variedade de materiais e de atividades, com uma linguagem mais simples, clara e concreta, pondo mais cuidados e ênfase nos aspectos motivadores e de interesse, repetindo uma maior variedade de exercícios e praticando noutros ambientes e situações. (TRONCOSO; CERRO, 2004, p.19)

Dessa maneira, conhecer as singularidades dos alunos com SD é uma dos fatores determinantes para que haja uma inclusão efetiva, assim como a formação continuada é um fator indispensável no atual cenário educacional brasileiro, uma vez que a formação inicial ainda é insuficiente para que seus profissionais possam contribuir significativamente com os sujeitos que apresentam em seu desenvolvimento escolar especificidades. 

Segundo Alves (2016) conhecer e entender as especificidades dos alunos com deficiência é um posicionamento ético do educador diante a diversidade e que pode contribuir na qualidade do ensino-aprendizagem. A falta de conhecimento das necessidades e potencialidades dos estudantes pelos educadores leva a exclusão daqueles que demonstram formas diferentes de aprender, principalmente os alunos com DI/SD.

De um modo geral as crianças com Down exteriorizam um perfil característico de aprendizagem, e saber quais são os pontos fortes e fracos dos alunos permite aos educadores uma visão mais ampla de planejamento, facilitando significativamente o aprendizado desses alunos. Entretanto não podemos nos esquecer que apesar de uma generalização no modo de aprender, todo o sujeito independente de deficiência possui singularidades que devem ser consideradas (ALTON, 2008).

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A seguir apresentamos algumas especificidades que podem comprometer o aprendizado dos alunos com SD, uns relacionados a implicações físicas e outras relacionadas ao desenvolvimento cognitivo. De acordo com Alton (2008) em média 60 a 70% das pessoas com SD desenvolvem um comprometimento da visão ainda bem pequenas, sendo necessária na maioria das vezes a correção com lentes (óculos). Uma boa estratégia pedagógica segundo o autor é colocar o aluno sempre mais a frente e priorizar letra em caixa alta. Outro comprometimento que pode limitar a aprendizagem dos alunos com SD é a audição. Ainda ressalta o autor que cerca de 20% das crianças com SD apresentam perda sensorial-neural, esse fator se dá pela má formação dos nervos auditivos. Outro motivo que pode acometer perda auditiva é por meio de infecções respiratórias pelo fato dos canais auditivos serem mais estreitos. É de grande importância a identificação da dificuldade auditiva na criança com SD, visto que pode limitar o desenvolvimento da fala.

O comprometimento da fala e da  linguagem também são características específicas da deficiência, os autores Silva (2006); Tristão (1998); Luiz (2008); referem se a fala ou expressão verbal da linguagem, a condição de maior comprometimento do aluno com SD, devido às dificuldades de audição na diferenciação de sons, no desenvolvimento motor e alterações nos componentes fisiológicos do aparelho fonador. 

Ainda segundo Tristão (1988) o desenvolvimento fonológico da criança com SD é um processo lento que consequentemente ocasiona a especificidade da fala que na maioria das vezes é de difícil compreensão, entretanto sua expressão gestual acompanha o desenvolvimento das outras crianças. A autora considera esse aspecto como  vantajoso no desenvolvimento da criança com Síndrome de Down. Em relação à linguagem o educador pode utilizar como estratégia estímulos como o uso funcional da linguagem e compreensão das regras utilizadas na conversação, escutar atentamente, falar virado (a) de frente e olhando para o aluno, usar linguagem simples e familiar com frases curtas e pequenas, checar se o aluno entendeu e se for necessário repetir o que foi falado; pedir para a criança repetir instruções dadas, reforçar a fala com expressões faciais, gestos e sinais; reforçar instruções faladas com instruções impressas, usar imagens, diagramas, símbolos e material concreto entre outras.

A memória auditiva recente é responsável pela capacidade de se aprender apenas ouvindo. O déficit na memória auditiva recente interfere no armazenamento da informação, no processo de compreensão e assimilação da língua falada e na habilidade de processamento auditivo, desse modo limita a aprendizagem da leitura e escrita. Além disso, conforme Alton (2008) às crianças com SD costumam ser distraídas e ter dificuldade em se concentrar. É relevante pensar e preparar tarefas curtas e com menor duração de tempo. A utilização de recursos diferenciados e a variação do nível de dificuldade das atividades são essenciais para que aumente o interesse da criança por mais tempo na atividade. 

O comprometimento do sistema motor fino e grosso é uma das características mais conhecidas como no referimos às crianças com SD. Isso se dá pelo fato de apresentam hipotonia (flacidez do tônus muscular), o que afeta sua habilidade de coordenação e, por conseguinte torna o desenvolvimento cognitivo mais lento. Do ponto de vista de Pimentel (2012) o atraso no desenvolvimento cognitivo é o aspecto mais característico do aluno com síndrome de Down, dentre todas as outras especificidades. Uma dica que Alton (2008) sugere é de planejar atividades que visam o fortalecimento das mãos como, por exemplo, alinhavar, seguir tracinhos com o lápis, desenhar, separar, cortar, apertar, construir, etc. e o equilíbrio do corpo como, por exemplo, montar circuitos onde a criança, corra, pule, engatinhe, suba, desça entre outros.

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Estruturar a rotina  para a criança com síndrome de Down é imprescindível, pois ela se adapta muito bem à organização de rotina, a ambientes estruturados e atividades concretas, em virtude de, se sentirem mais seguras e confiantes por saberem o que vai acontecer durante o dia. Imprevistos que ocasionam mudanças na rotina e na estrutura do ambiente podem  trazer transtornos às crianças com SD, sendo assim é necessário uma reorganização do tempo para a preparação antecipada da criança, uma vez que, ela pode precisar de algum tempo para se adequar ao novo espaço e rotina. Como forma de preparar os alunos previamente para algum imprevisto e mudanças corriqueiras, é importante que o aluno tenha conhecimento sobre o calendário com os horários das atividades e as regras da instituição escolar. As explicações devem ser sempre de maneira clara e objetiva com palavras simples e do uso cotidiano da criança, tente sempre ter auxílio de desenhos e imagens para que a criança possa compreender melhor a rotina escolar. Alton (2008) sugere que a construção do horário pode ser feita de maneira visual, utilizando-se de imagens, desenhos, fotos, objetos e palavras. No início do dia o educador pode fazer rodinhas de conversa com a turma, assim incluindo o aluno e informando sobre o que será realizado durante todo o dia, é imprescindível que o aluno tenha conhecimento da sequência das atividades do dia.

Em relação à leitura, escrita e conhecimento lógico-matemático cabe ao educador propiciar aos alunos com SD atividades mediadas e organizadas num tempo de maior duração e no ritmo do aluno para despertar suas potencialidades e estimular o aprendizado e desenvolvimento. Enfim o autor aponta que as atividades concretas que possuem objetos para relacionar com as atividades escritas e orais contribuem para aprendizagem dos alunos com síndrome de Down, em razão de que possuem maior capacidade para o aprendizado visual. Para facilitar a aprendizagem o educador deve preparar atividades utilizando cartões, figuras, fotos coloridas e objetos representativos, que possam ser associadas às palavras. 

De acordo com Simioni (2011), os recursos e propostas que o educador busca a fim auxiliar os alunos com síndrome de Down a superar obstáculos que limitam o seu aprendizado e desenvolvimento é determinante, assim como o olhar para o sujeito enquanto aluno e não como “deficiente”. Essas são estratégias cruciais que a escola comum deve empregar diante das diferenças e suas responsabilidades.

Atividades elaboradas pelos professores participantes do curso de formação continuada “CULTURA DIGIDOWN”.


Imagem 1 - Na imagem mostra sete balões colados na parede com uma placa ao meio escrito, “Ditado Estourado”. As alunas tiveram que estourar os bolões para encontrar palavras iguais às que estavam no cartaz. Tentavam ler para colar ao lado da palavra igual que já estava colada ao cartaz. Fonte: Acervo pessoal.

Imagem 2 - Na imagem tem cinco pessoas sentadas em forma de círculo no chão. A roda é composta por duas alunas com síndrome de Down e três professoras. No meio do círculo a atividade está em forma de cartaz no chão. No cartaz tem várias palavras coladas como, olho, nariz, orelha, bocas, nariz, braço, perna e abraço. O objetivo dessa atividade é que as alunas associam à es

crita a parte do corpo além de comparar as letras para achar as palavras iguais. Fonte: Acervo pessoal.
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Imagem 3 - Na imagem mostra um cartaz com a letra da música “Amigo” e ao lado do cartaz as vogais A, E, I, O , U recortadas em E.V.A nas cores amarelo e verde. Mostra ainda um aluno com síndrome de Down, circulando a vogal A. O objetivo dessa atividade era de que o aluno pudesse observar as vogais e circular todas que encontrassem na letra da música. Assim associando o som da letra com a escrita. Fonte: Acervo pessoal.

Imagem 4 - A imagem mostra uma professora sentada junto com duas alunas com síndrome de Down. Em cima da mesa de uma aluna tem dois círculos grandes nas cores amarelo e rosa e em cada um está escrito o nome da cor respectiva. Na mesa da outra aluna tem dois círculos, um na cor laranja e o outro na cor verde e também escrito o nome das cores respectivas. O objetivo dessa atividade foi que as alunas aprendessem as cores e associassem à escrita do nome da cor as respectivas cores. Fonte: Acervo pessoal.

Contribuições que refletirão na práxis pedagógica inclusiva

Considerando, portanto que no curso de formação continuada para professores foram mobilizados saberes pelos professores buscamos analisar nesta categoria a partir das falas quais contribuições refletirão na práxis pedagógica inclusiva junto aos alunos com deficiência na sala de aula regular. Portanto como aponta Carvalho (1998), sem que haja uma formação desses educadores, corre-se o risco de apenas inserir a pessoa com deficiência no convívio com outras crianças, sem que se efetivem, entre todos, trocas interativas enriquecidas pela plena aceitação das mesmas.

Numa instituição social e historicamente construída a atividade docente é compreendida por Caldeira e Zaidan (2013) como prática social, uma vez que a ação é baseada no fundamento, expressão e produto do saber pedagógico. Ainda seguindo a mesma vertente os autores consideram que a prática pedagógica é uma prática social complexa que envolve a rotina dos educadores e estudantes em diferentes espaços e tempos da escola, e que por sua vez é mediada pela interação professor, aluno, conhecimento. 

Corroborando com a mesma ideia o educador Paulo Freire (1997) destaca que  a filosofia de educar está intrinsecamente ligada ao campo do saber e nesse contexto a docência está relacionada a uma prática social concreta.

(...) ensinar não é transferir a inteligência do objeto ao educando, mas instigá-lo no sentido de que, como sujeito cognoscente, se torne capaz de inteligir e comunicar o interligido. É nesse sentido que se impõe a mim escutar o educando em suas dúvidas, em seus receios, em sua incompetência provisória. E ao escutá-lo, aprendo a falar com ele (Freire, 1997, p. 135). 

Para Paulo Freire (1997), a prática de ensinar fundamenta-se na compreensão da realidade do sujeito e consequentemente na, reflexão e ação, na qual se torna um norteador capaz de transformar se necessário o ethos vivido. Dessa maneira o autor considera que o ato de aprender a ler e escrever é muito mais do que apenas a codificação e decodificação das palavras, é, sobretudo o modo principal que o sujeito interpreta o mundo a vida e a sociedade.

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Nessa perspectiva, entende-se a teoria combinada com a ação prática configuram-se como práxis. Nossa abordagem sobre a relação teoria e prática perpassa o compromisso existente dos sujeitos na construção de saberes e com a transformação da sociedade. Dentro do processo pedagógico, teoria e prática precisam  estar em constante diálogo, a ideia de que de que o saber está somente na teoria, construído distante ou separado da ação/prática é um pensamento que não está de acordo com a educação dos dias atuais.

Na concepção de Freire (1987), teoria e prática são inseparáveis tornando se, por meio de sua relação, práxis autêntica, que possibilita aos sujeitos reflexão sobre a ação, proporcionando uma educação libertadora. “A práxis, porém, é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-oprimido”  (p. 38).  

Assim, linguagem, pensamento e ação se tornam um processo capaz de direcionar o homem a ser protagonista na construção da sua própria história e da mesma maneira lutar por uma sociedade justa onde todos tenham os mesmos direitos e não existam dominantes e dominados. 

Sendo assim no que se refere à práxis da educação inclusiva é visível a urgência de se desenvolver cursos de formação continuada de professores buscando contemplar a dimensão teórica e prática, na qual constituem uma relação dialética na construção da práxis, assim sendo uma ação teoricamente sustentada.

 Pensando na dialética teoria-prática, Freire (1987) salienta que a educação em seu quefazer exige ao educador e educando um posicionamento de reconhecimento e emancipação humana, para isso, “o seu quefazer, ação e reflexão, não pode dar-se sem a ação e a reflexão dos outros, se seu compromisso é o da liberdade” (p.122). A práxis pedagógica e epistemologia em sua conjuntura veem na condição humana, potencial de esperança, amor, autenticidade, diálogo e transformação, com capacidade de compreensão e intervenção no mundo. Estes pressupostos fazem com que os sujeitos coloquem-se diante do outro, com propósito de modificar a realidade e as relações de opressor/dominador.

De um modo geral o discurso dos professores que participaram do curso de formação continuada “Digidown” aponta que a teoria é o princípio de uma boa prática para contemplar a educação inclusiva. Como veremos a seguir, podemos perceber nas falas de alguns professores participantes que sugeriram mais tempo de aulas teóricas, e mais temas específicos relacionada à alfabetização e letramento do aluno com SD na próxima versão do curso. 

“As aulas teóricas deveriam ser estendidas. Considero que são poucas aulas para o conteúdo, pois penso que estes conteúdos estudados deveriam ser a base da ação do professor dentro de sala aula” (PROFESSOR 25).

“Gostaria de saber mais teoricamente a respeito do aprendizado e da formação da pessoa com Síndrome de Down. Também a respeito das leis e das políticas públicas para crianças com Síndrome de Down” (PROFESSOR 21).

“Seria interessante se tivéssemos mais tempo de estudos para depois recebermos os alunos para colocar em prática o que aprendemos” (PROFESSOR 37).

“Podia ter uma aula sobre o processo de ensino-aprendizagem e desenvolvimento intelectual. Penso que quando o professor domina este processo, facilita na elaboração e prática das atividades e nos possíveis resultados do aluno” (PROFESSOR 35).

Desse ponto de vista é importante salientar o interesse que os professores demonstram ter em busca de mais aprendizado, visando propiciar aos alunos uma educação inclusiva de qualidade. A análise que podemos fazer a partir das falas dos professores, é que o interesse por mais estudos teóricos, trata-se de querer compreender a unidade na diversidade, pois a questão desafiadora da prática é saber como contemplar as especificidades dos alunos com SD. Uma vez que, 

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A formação de docentes educadores para o trato com a diversidade se defronta no sistema escolar e na academia com concepções generalistas, únicas de ser humano, de cidadania, de história e de progresso, de racionalidade, de ciência e de conhecimento, de formação e de docência. Defronta-se com diretrizes curriculares, normas e leis, políticas, processos e tempo de ensino aprendizagem legitimados em princípios universais. Quando essas concepções, princípios e diretrizes são tomada como padrão único de classificação de indivíduos e dos coletivos, de povos, raça, classes, etnias, gêneros ou gerações, a tendência será hierarquizá-los e polarizá-los. Fazer da diversidade desigualdades em função desses padrões únicos (ARROYO, 2008, p.17)

Nessa perspectiva o autor pontua que o educador deve enxergar na práxis as semelhanças e diferenças do aluno quanto a forma de aprendizado, sem se deixar influenciar por uma formação inicial que acredita em um padrão único de alunos, onde todos vão aprender num mesmo ritmo e ter comportamentos e experiências iguais. Sem dúvida foi um desafio romper estereótipos criados pelo senso comum, barreiras atitudinais e buscar a legitimação na dialética teoria-prática na construção de uma nova postura de professor para a educação inclusiva.