Guia de Inclusão na
Educação Física na Escola Comum

Guia de Inclusão na Educação Física na Escola Comum

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Para entender por que a Educação Física enfrenta tantos problemas para ser mais inclusiva é importante saber um pouco da história e caminhos desta.

A Educação Física já passou por momentos em que o corpo foi utilizado e valorizado como força de trabalho, assumindo papel de construir um corpo saudável e produtivo, levando ao modelo mecanicista pautado na parte física/motora e nos aspectos biológicos.

A Revolução Industrial trouxe a divisão das classes, precarização e surgimento de epidemias dando origem a reorganização sanitária e ao modelo higienista e a Educação Física busca hábitos mais saudáveis, assepsia e uma a formação de uma ordem social fincada nas questões morais.

Outra questão que surge e influencia a Educação Física da época é o estudo da eugenia, proposta por Galton, ciência que explicava a humanidade biologicamente. Uma época de doutrinamento físico como forma de promover a produção de capital por meio do trabalho, sendo que este corpo deve ser dócil para não causar estranhamento ao modo de produção e forte o suficiente para suportar o ardor laboral.

Tivemos também como determinante dos caminhos da Educação Física os métodos ginásticos que tinham como objetivos regenerar a raça, promover a saúde afim de constituir uma sociedade servil e forte para servir a pátria na guerra e fortalecer a indústria.

No Brasil, especificamente, na Educação Física escolar em meados de 1.850 o que imperava era a moralidade sanitária, influenciada pelo modelo higienista, eugênico e moral compreendendo que os indivíduos desses espaços deveriam “carregar” consigo os traços da serviência, da força física e saúde, para servir a Pátria e fortalecer a indústria.

Nessa mesma época fora do ambiente escolar, como resultado da Segunda Guerra Mundial temos um grande número de pessoas soldados e pessoas alguma deficiência decorrente da guerra que precisavam ser atendidos. Assim surgem centros de atendimentos e reabilitação que incluem em suas práticas o esporte adaptado. Esse movimento de utilizar o esporte e a pratica corporal como forma de reabilitar e integrar a pessoa com deficiência cresceu, deu origem à Educação Física Adaptada como uma área de conhecimento e teve repercussão também na Educação Física Escolar.

Na década de 80 no Brasil, foi um período onde iniciou-se a observação, constatação e denúncia a um modelo de aula de Educação Física escolar do ponto de vista de formação humana, excludente, pois os professores de educação física em sua maioria ministravam as aulas baseados em uma prática ora em um modelo ginástico, ora eugenista, ora militar e esportivizado que era bastante questionado pelos adeptos das abordagens críticas da Educação Física.

Com objetivo de contrapor a prática discutida e criticada surgem algumas novas teorias de ensino na Educação Física. Dentre estas podemos citar a Teoria do Ensino Aberto com a obra “Concepções abertas no ensino de educação física” (HILDEBRANDT e LAGING, 1986), a Crítico-superadora apresentada na obra “Metodologia no Ensino da Educação Física”, pelo Coletivo de Autores (1992), além da abordagem Crítico-emancipatória, que tem como autor Kunz (1994).

A concepção do Ensino Aberto ganha espaço a partir da década de 80, no Brasil, e tem como precursor Hildebrandt, apresenta o significado como categoria central, sendo que este é elaborado a partir do consenso, por meio do diálogo e estímulo ao sujeito em se colocar no lugar do outro.

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Já para outra abordagem, a Crítico-superadora, situa sua concepção no Materialismo Histórico e Dialético que externaliza as dificuldades que os determinantes sociais apresentam nas práticas educacionais, incentivando a busca da construção de uma nova democracia, engajada nos interesses da classe trabalhadora. O objeto da Educação Física então passa a ser vivenciada por meio do que denominaram de “cultura corporal” (como jogos, ginástica, lutas, acrobacias, mímicas e esporte).

A abordagem critico-superadora visa considerar e contemplar a totalidade humana e social, em uma práxis reflexiva e crítica, em posição ao modelo tecnicista, esportivista e biologista. Para isso utiliza-se da concepção dialética da história, considerando a existência de interesses de uma classe social e da necessidade de transformação da realidade.

Essa pedagogia leva a Educação Física a pensar suas construções teórico-práticas para além do esporte atrelado ao alto rendimento, que não dava conta das finalidades e especificidades da escola, levando a uma prática pedagógica que busca o desenvolvimento de competências, por meio de uma educação efetivamente emancipatória e inclusiva.

Acreditamos que a Educação Física baseada na premissa da Educação Inclusiva e a pedagogia tradicional não convergem. A Educação Física tradicional ou esportivizada não entende que os sujeitos dessa prática possuem individualidades e que experiências anteriores que devem ser levadas em conta na socialização. Diferente da educação tradicional, a educação inclusiva é a uma educação de qualidade para todos, independentemente de seu talento, deficiência (sensorial, física ou cognitiva), origem sócio-econômica, étnica ou cultural.

Vimos no nosso trabalho que o esporte na educação física escolar pode dificultar a inclusão das pessoas com deficiência, pois no conteúdo de ensino da Educação Física direcionado pelo esporte competitivo a relação professor-aluno, passa da relação professor-instrutor e aluno-recruta, para a de professor-treinador e aluno-atleta, onde os princípios buscam racionalidade, eficiência e produtividade não vistos historicamente na pessoa com deficiência.

Apesar de hoje as pessoas com deficiência estarem mais presentes na Educação Física Escolar, a valorização do corpo robusto, perfeito, belo, atlético que, com a influência da mídia, ganha contornos de adoração, em detrimento dos corpos considerados imperfeitos, feios, degenerados, como o corpo com deficiência, obeso, trabalhador ou pobre

A inclusão dos alunos com deficiência na educação básica, e também na educação física escolar é um direito garantido em diversas diretrizes e leis, podendo-se citar a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2013), Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto, 1997), a Política da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015).

A Política da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) favorece a inclusão de estudantes com deficiência trazendo para o contexto escolar brasileiro princípios da educação inclusiva mundialmente discutidos.

Outra discussão importante que apresentamos em nosso trabalho é a diferenciação entre Educação Física Adaptada, Educação Física Especial e Educação Física Inclusiva.

Na Educação Física Escolar o movimento da Integração pode ser comparado com o movimento da Educação Física Adaptada. O termo Educação Física Adaptada surge na década de 50 como Educação Física para pessoas com deficiência considerando suas condições, dificuldades, ritmo e interesses.

Outra denominação utilizada foi Educação Física Especial que se diferenciava de Educação Física Adaptada por se referir à Educação Física apenas para pessoas com deficiência, como a realizada em instituições especiais.

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A Educação Física Adaptada foi um importante passo para inclusão, atendendo às especificidades dos estudantes com deficiência, auxiliando em sua integração na escola, mas não atende aos princípios inclusivos.

A Educação Física sofreu críticas e vem se modificando de adaptada para inclusiva acompanhando a área da Educação Inclusiva. Na Educação Inclusiva as especificidades e necessidades das pessoas com deficiência não são desconsideradas, com isso busca-se o respeito da individualidade na sociedade e na inclusão social.