Visibilidade do Esporte e
Atleta Paralímpico
Parte 1 - Contextualizando a Visibilidade do esporte e atleta Paralímpico

3. Visibilidade do esporte paralímpico nos periódicos brasileiros

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Autores: Gleyson Batista Rios, Geovana Ramos, Haryelle Santo.

Qualquer observação pouco criteriosa da realidade esportiva permite afirmar que o esporte paralímpico tem significativamente menos espaço que o esporte convencional na mídia. Esse espaço, demarcado a partir dos patrocínios, salários de atletas, tratamento dado pela mídia etc. influencia na adesão de novos praticantes. Em se tratando de esporte e lazer para pessoa com deficiência, o aumento da visibilidade do esporte pode contribuir para superação da ideia de incapacidade, o que poderia gerar melhora no acesso a prática corporal por essa parcela da população.

Será que poderíamos supor que fenômenos mais visíveis são mais contemplados como objeto pelos pesquisadores? Como o esporte paralímpico tem sido tratado pelas pesquisas? O que será que as pesquisas sobre a visibilidade do esporte paralímpico têm identificado? Quais tipos de pesquisa, fenômenos privilegiados e críticas desenvolvidas pelos pesquisadores do tema visibilidade do esporte paralímpico?

A pesquisa se caracteriza como descritiva e exploratória. O objetivo foi analisar a produção científica sobre a visibilidade do esporte paralímpico. Para isso, pesquisaram-se artigos, no portal de periódico CAPES, no mês de agosto de 2019 a partir dos termos: esporte e mídia e esporte e visibilidade.

Selecionaram-se os artigos em periódicos revisados por pares, encontrando um total de 595 indicações de artigos para a busca por esporte e mídia e 281 indicações de artigos para esporte e visibilidade.

Das 281 indicações, após depurar as repetições, forma levantados 277 artigos sobre o tema esporte e visibilidade, 198 discutiram o esporte como elementos de temáticas secundárias e 74 artigos tinham como foco o esporte convencional. Esses foram descartados por não se referirem a esportes para pessoas com deficiência.

A partir dos descritores esporte e visibilidade, e que tratam de esporte para pessoas com deficiência, foram levantados 5 artigos.

Das 598 indicações, após depurar as repetições, foram levantados 584 artigos sobre o tema esporte e mídia, 403 discutiram o esporte como elementos de temáticas secundárias e 175 artigos tinham como foco o esporte convencional. Esses foram descartados por não se referirem a esportes para pessoas com deficiência.

A partir dos descritores esporte e mídia, e que tratam de esporte para pessoas com deficiência, foram levantados 6 artigos.

Quando comparado a lista de artigos encontrados com os descritores esporte e mídia, com a lista dos artigos encontrados com os descritores esporte e visibilidade, tem-se a repetição de 3 títulos. Assim, ao final da busca, levantou-se para análise 8 artigos.

A primeira classificação da análise permitiu identificar 1 artigo que trata da visibilidade do esporte paralímpico e 7 que discutem outros aspectos das modalidades paradesportivas.

Dos 7 artigos, em que o tema da visibilidade do esporte paralímpico não fez parte nem do debate central nem das argumentações principais, reflexões sobre a visibilidade acabam aparecendo na introdução, justificativa da temática principal da pesquisa ou de processos secundários das análises. Essas reflexões, apesar do pouco aprofundamento nestes artigos, levanta aspectos da visibilidade que devem ser desenvolvido em pesquisas para que o fenômeno seja captado na sua totalidade.

Esportes paralímpicos e visibilidade

Simim e colaboradores (2015a), ao propor diretrizes para melhora do rendimento dos jogadores, pondera que, apesar de ser praticado em 29 países, o futebol de amputados não é amplamente divulgado na mídia.

Fazer parte do quadro de modalidades paralímpicas é um status alcançado por algumas modalidades praticadas por pessoas com deficiência, adaptadas de esportes convencionais ou desenvolvidas com características próprias para pessoas com deficiência, como o goalball. O futebol para amputados não goza desse status.

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Mesmo não sendo do grupo de modalidades paralímpicas, como acontece também com as modalidades esportivas convencionais que não fazem parte do grupo de modalidades olímpicas, o futebol de amputados se estrutura a partir da referência do esporte de alto nível. A sustentabilidade financeira por meio de políticas públicas ou de financiamento privado, principalmente patrocínio, parece ser influenciada pela cobertura midiática, bem como a cobertura midiática parece ser pautada quando há recursos financeiros significativos investidos nas modalidades.

Ao discutir as adaptações realizadas no futebol para atender pessoas com deficiência, Reis e Mezzadri (2017), afirmam que os Jogos Paralímpicos do Rio 2016 trouxeram maior visibilidade para modalidades esportivas adaptadas. Exalta o destaque que o futebol ocupa no cenário esportivo mundial e apresenta de forma superficial um dos debates da visibilidade do esporte: o atleta de sucesso como incentivador para novos praticantes.

O papel do ídolo esportivo se apresenta como um dos complexos centrais para compreensão do fenômeno da visibilidade do esporte. Como se constitui o ídolo? A importância do ídolo para reforço ou difusão de novos valores sociais? A força do ídolo na venda de mercadorias? Além de outras questões, se apresentam de forma inseparável ao momento do esporte.

Simim e colaboradores (2015b) ao realizar revisão de literatura dos estudos que abordam o futebol de cinco, concluem que os principais estudos se propõem a apresentar a modalidade para comunidade acadêmica ou abordando o contexto histórico. Sobre a visibilidade, discutem que apesar do crescimento da cobertura midiática do esporte paralímpico no Brasil a partir de 2004, ainda não tem força suficiente para criar demanda de visibilidade, visto que a divulgação ainda não seria a ideal.

A importância da discussão levantada por Simim e colaboradores (2015b) é facilmente compreendida se imaginássemos o fato da seleção brasileira masculina de futebol fizesse uma final de copa do mundo sem transmissão ao vivo pela televisão aberta. O poder do futebol masculino de pautar a mídia não só se apresenta como concorrente da visibilidade de outros esportes, como se apresenta como a condição mais complexa de desenvolvimento da visibilidade do esporte, que parece não se fazer presente nos esporte paralímpicos. Talvez estudos comparados possam se apresentar como uma forma adequada para compreensão do fenômeno da visibilidade do esporte paralímpico.

Santos e colaboradores (2016), ao avaliar o perfil antropométrico e o consumo alimentar de basquetebol em cadeira de rodas, afirmam que o crescimento da procura de esporte por pessoas com deficiência se dá por ser visível a melhora do bem-estar físico, social e psicológico.

O simplismo apresentado pelos autores, ponderando que não era papel do artigo fazer esse debate, traz implícito um aspecto importante para se pensar a visibilidade do esporte paralímpico. Aspecto esse também apontado por Begossi e Mazo (2016) ao analisarem as normativas legais que orientam a conformação da organização do esporte para pessoas com deficiência no Brasil, afirmam que o desenvolvimento mais breve e expressivo do esporte adaptado nos EUA e Europa, se deu pelo pioneirismo nos processos de reabilitação de pessoas com deficiência.

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A orientação por profissionais de saúde, a partir da coordenação do cuidado longitudinal quando do encaminhamento para serviços de saúde de menor complexidade, parece tecer uma rede de ampliação no número de praticantes de esportes adaptados. Pesquisar a continuidade construída entre o esporte de reabilitação e o esporte de alto nível, talvez permita identificar processos de construção da visibilidade completamente diferentes dos encontrados no esporte convencional.

Além de indicar a relação do esporte de reabilitação e do esporte de alto nível, Begossi e Mazo (2016) afirmam que a visibilidade do esporte adaptado se deu principalmente pelos resultados brasileiros nos Jogos Paralímpicos e demais competições mundiais. Mas aponta também um aspecto importante da relação entre visibilidade e políticas públicas. Os dados analisados pelas autoras sugerem um momento de invisibilidade do esporte adaptado para as políticas públicas. Quais fatores levam o Estado a olhar de forma permanente para práticas corporais específicas na construção de suas políticas de esporte e lazer? Será que há algo específico, ou um estudo da visibilidade em geral permite encontrar os determinantes da (in)visibilidade de certas práticas corporais na construção de políticas públicas?

Haiachi e colaboradores (2016), em estudo que caracterizou a carreira esportiva do atleta paralímpico brasileiro, afirma que o profissionalismo no esporte para pessoa com deficiência se apresenta como possibilidade após a ampliação nos últimos anos, principalmente com as estratégias construídas para participação do Brasil nos Jogos Paralímpicos Rio 2016, dos incentivos financeiros, desenvolvimento das estruturas de treinamento e a crescente visibilidade dada pela mídia.

Em se tratando da visibilidade construída pela mídia, o destaque não se apresenta no esporte paralímpico enquanto carreira, mas, em formas de pautar a inclusão e a superação através do esporte. Fato que não pode ser negado já que a identificação com o esporte ao “assumir a identidade de atleta, novas portas se abrem e o sentimento de incapacidade cede espaço para o pertencimento” (HAIACHI et al, 2016, p. 3003), além das possibilidades de ampliação de discussão sobre a deficiência a partir dos megaeventos esportivos.

Os autores levantam outro aspecto para discussão da visibilidade do esporte paralímpico no Brasil. “Desde os Jogos de 2000, a entidade [Comitê Paralímpico Brasileiro-CPB] investe na comunicação como uma ferramenta para divulgar o movimento paralímpico no país e proporcionar a consolidação da carreira de seus atletas” (HAIACHI, 2016, P. 3002-3003). Ou seja, o aumento da cobertura da mídia, principalmente tentando dar visibilidade mais a carreira do atleta que a superação e inclusão, é produto de uma ação planejada do CPB desde 2010.

Almeida (2016), ao analisar aspectos da candidatura do Brasil para sediar a Copa do Mundo FIFA 2014 e os Jogos Olímpicos e Paralímpicos 2016, afirma que o discurso de políticas públicas que justificam a candidatura de um país não se baseia em fatos que comprovem pretensos legados esportivos.

Um desses legados seria a possibilidade de motivar a população a engajarem na prática de atividade física. A relação direta entre os megaeventos esportivos e a motivação para prática de atividade física da população em geral não encontra fundamento em pesquisas científicas. Os poucos casos de sucesso levam a ignorar os casos malsucedidos. E a redução da desigualdade social e econômica sugere maior impacto nos dados de inatividade física sediar megaeventos esportivos ou transmitir esporte pela televisão (ALMEIDA, 2016).

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A autora não se detém a aspectos específicos que pudessem diferenciar os eventos convencionais e paralímpicos. Mas traz um importante elemento geral que diz respeito a forma de exploração da visibilidade do esporte em países em desenvolvimento. Ao “não atingir graus satisfatórios de desenvolvimento em comparação a outros países, a exposição midiática dessas sedes geralmente passa por uma gestão de imagem para tentar mudar os preconceitos que cercam essas cidades e países” (ALMEIDA, 2016, p. 73), já que esses países são classificados como tendo problemas relacionados a renda per capita, índice de endividamento do país, percentual da população subnutrida, mortalidade infantil, entre outros.

O único artigo encontrado e que aprofunda na temática da visibilidade do esporte paralímpico tem o título: “A abordagem midiática sobre o esporte paralímpico: o ponto de vista de atletas brasileiro (MARQUES et al, 2014). Com o objetivo de investigar o ponto de vista dos atletas sobre conteúdos, meios e abrangência da divulgação midiática, os autores sintetizaram em três importantes temas, as respostas dos entrevistados.

Os temas 1) divulgação do esporte paralímpico na mídia; 2) divulgação das dificuldades do atleta com deficiência e/ou seus feitos esportivos e; 3) comparação entre esporte olímpico e paralímpico na mídia, foram tratados a partir da compreensão da existência de “uma interdependência entre mídia, exposição e acúmulo financeiro no esporte-espetáculo” (MARQUES et al, 2014, p. 990), que os produtos vinculados ao esporte paralímpico são apresentados em um mercado altamente competitivo, e de que os “meios de comunicação colocam-se como ferramentas indispensáveis nesse processo, como forma de disseminação de ideias e ideais e promoção de produtos” (p. 990).

Para os entrevistados, não há divulgação satisfatória do esporte paralímpico, por se restringir a grandes eventos e aos melhores resultados e, apesar de estar em crescimento, a divulgação no Brasil concorre com outros esportes, principalmente o futebol (MARQUES et al, 2014).

Não há consenso entre os entrevistados sobre a ênfase nos feitos esportivos ou a exploração da superação enquanto pessoa com deficiência. As respostas dos atletas reforçam a compreensão do alto risco comercial para a mídia, da dificuldade do público relacionar com o alto rendimento e não com a inclusão da pessoa com deficiência (MARQUES et al, 2014).

Nas respostas, sobre a comparação entre o esporte paralímpico e o olímpico, percebe-se um descontentamento com a maior cobertura midiática do olímpico, mas, apesar de não se expressar em todos os entrevistados uma preocupação de comparação direta dos resultados dessas duas formas de manifestação, devido a especificidade, o maior número de medalhas em concorrência, entre outros aspectos.

Considerações finais

A análise dos artigos nos permite construir uma agenda de pesquisa sobre visibilidade do esporte paralímpico. A justificativa está na inexpressiva produção sobre o tema divulgada por um canal oficial da pesquisa brasileira.

Mesmo os artigos, que o objeto não contemplou a visibilidade do esporte paralímpico, possibilitou levantar categorias e determinantes não só de orientação para uma agenda de pesquisa, como também de uma agenda para mudança no cenário da visibilidade do esporte para pessoas com deficiência.

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Aspectos que o artigos analisados indicam que necessitam ser aprofundados em futuras pesquisas, são: 1) o fenômeno do esporte paralímpico como meio para ampliação da discussão do lugar social da pessoa com deficiência; 2) o poder do esporte em pautar a mídia e a relação desse poder com o financiamento, público e privado (principalmente do mercado), do esporte como determinante da visibilidade dessa prática na mídia; 3) a influência do ídolo paralímpico em comparação ao ídolo esportivo convencional e; 4) fatores além da mídia, que permitam medir a visibilidade do esporte paralímpico, por exemplo, em como o sistema de saúde e os processos de reabilitação se apresentam como ‘veículo’ da visibilidade do esporte paralímpico.

Referências bibliográficas

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MOURA, S. M. A. et al. Futebol de cinco para deficientes visuais. RBFF-Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v. 7, n. 24, p. 231-233, 2015.

SIMIM, M. A. M. et al. Futebol para amputados: aspectos técnicos, táticos e diretrizes para o treinamento. RBFF-Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v. 7, n.25, p.246-254, 2015.

SANTOS, M. V. L. et al. Perfil antropométrico e consumo alimentar de atletas de basquete em cadeira de rodas da região metropolitana de São Paulo. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva, São Paulo. v. 10. n. 58. p.467-473, 2016.

BEGOSSI, Tuany Defaveri; MAZO, Janice Zarpellon. O processo de institucionalização do esporte para pessoas com deficiência no Brasil: uma análise legislativa federal. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 21, n. 10, p. 2989-2997, Oct. 2016.

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HAIACHI, Marcelo de Castro et al . Reflexões sobre a carreira do atleta paraolímpico brasileiro. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 21, n. 10, p. 2999-3006, Oct. 2016.

TOLEDO, Renata Maria; GRIX, Jonathan; BEGA, Maria Tarcisa Silva. Megaeventos esportivos e seus legados: uma análise dos efeitos institucionais da eleição do Brasil como país-sede. Rev. Sociol. Polit., Curitiba , v. 23, n. 56, p. 21-44, Dec. 2015.

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