Autoras: Daniela Maria Ferreira Campos, Danúsia Cardoso Lago, Maria Marta Lopes Flores
Introdução
A formação continuada deve possibilitar aos professores reflexões sobre o comprometimento com a aprendizagem e o desenvolvimento de seus alunos, pois o despreparo e a falta de conhecimentos estão diretamente relacionados com a formação ou capacitação recebida tanto durante a formação inicial quanto continuada. Essa capacitação é um dos principais desafios da inclusão escolar, pois quando se trata de educação inclusiva, os aspectos ligados à formação docente devem ser considerados, uma vez que o professor é o mediador fundamental nesse processo e sua formação deve atender às necessidades e aos desafios de escolarizar todos os alunos na escola comum (ALMEIDA, 2004; CAPELLINI, MENDES, 2007; PLETSCH, 2009; MENDES e VIRALONGA, 2014; LAGO, 2014).
Pesquisas recentes sobre formação continuada de professores destacaram que, de maneira geral, os profissionais da escola não estão preparados para atuarem com alunos Público-Alvo da Educação Especial - PAEE, principalmente pela falta de cursos que contemplem a demanda advinda da inclusão escolar. Esses estudos apontaram a necessidade de ampliação de cursos para professores que sejam mais próximos das demandas advindas da sua atuação no contexto da escola e da sala de aula por meio de uma parceria colaborativa entre professores da educação especial e da escola comum, bem como entre as universidades e as escolas (PLETSCH, 2009; LAGO, 2010; RODRIGUES e LIMA-RODRIGUES 2011; DIAS, ROSA e ANDRADE, 2015; MENDONÇA e SILVA, (2015)).
Várias pesquisas de formação continuada no Brasil já foram desenvolvidas no contexto escolar, com base na colaboração entre os profissionais, de forma exitosa: Silva (2014); Souza (2011); Braum (2012); Caramori (2014); Lago (2014); Vilaronga e Mendes, (2014). Essas pesquisas versam sobre a formação continuada em serviço de professores para atuar em contextos escolares inclusivos de forma colaborativa. Os resultados desses estudos destacaram a importância de se trabalhar as dificuldades reais dos profissionais da escola, de forma a contribuir para o aprimoramento de suas práticas pedagógicas e de suas atuações junto aos alunos com deficiência na escola comum.
A colaboração entre os diversos profissionais da escola, tanto por meio do ensino colaborativo quanto pela consultoria colaborativa, desenvolvida no âmbito escolar rompe com a cultura do trabalho isolado, pois os saberes e responsabilidades passam a ser compartilhados entre todo o grupo. A estratégia da colaboração no contexto escolar tem favorecido a escolarização dos alunos com e sem deficiência e promovido o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes.
O presente artigo tem como objetivo analisar as contribuições de uma formação continuada para professores, que atuam com alunos com deficiência, por meio de um curso baseado na Consultoria Colaborativa. Este estudo faz parte de uma pesquisa de Mestrado em Educação e os resultados aqui apresentados é um recorte dos dados da Dissertação. A subcategoria aqui analisada: “As contribuições de um Curso de Formação Continuada baseado na consultoria colaborativa”. Essa subcategoria faz parte de uma das categorias de avaliação do referido curso.
O princípio da colaboração no contexto da educação inclusiva
A prática da colaboração no contexto da educação inclusiva requer mudanças na organização da escola, bem como no trabalho dos seus educadores, de maneira a romper com a cultura do trabalho isolado e desenvolver um trabalho em equipe, favorecendo uma nova cultura em que os conhecimentos e os saberes são compartilhados entre os pares e, assim, oportunizar a aprendizagem de todos os alunos (CAPELLINI, MENDES, 2007).
Página 58Para uma efetiva atuação em colaboração no espaço escolar é importante que tanto os professores da classe comum quanto do ensino especial assumam responsabilidades compartilhadas: planejamento das atividades, das aulas, das avaliações e replanejamento dessas, visando práticas educativas que atendam a diversidade de todos os alunos e também favoreçam aos docentes seu desenvolvimento pessoal e profissional (CAPELLINI, MENDES, 2007; TARTUCI, 2011).
Os estudos de Tartuci (2011); Zanata e Capellini, (2013) e Lago (2014) destacaram a importância de todos os profissionais da escola desenvolver habilidades para o trabalho em colaboração, modificando a cultura do trabalho isolado dentro da equipe escolar, possibilitando uma moderna cultura em que prevaleçam os saberes compartilhados entre todo o grupo; propiciando aos educadores desempenhar o seu papel de modo mais seguro.
Na perspectiva colaborativa essa estrutura une os professores e os encoraja a novas interações legitimando o conhecimento prático dos professores quanto ao desenvolvimento profissional da equipe. Essa abordagem permite também que os professores tornem-se mais atentos à necessidade de melhoria quando se viabiliza para eles e com eles a análise e a observação de seu próprio perfil e aprendem apoiados na delimitação e solução de problemas por meio da reflexão sobre seus sucessos e fracassos (ZANATA, CAPELLINI, 2013).
A proposta da escola inclusiva remete a uma escola de qualidade que consiga atender de maneira mais eficiente e responsiva o fracasso escolar de parte do seu alunado, inclusive àqueles que apresentam alguma deficiência. Para tanto, torna-se relevante que todos os profissionais da escola - sejam eles professores, gestores e coordenadores - reflitam criticamente as intencionalidades educativas que estão postas, a concepção que se tem de deficiência e das práticas pedagógicas utilizadas para ensinar todos os alunos. A concretização dos princípios da inclusão escolar só terá chance de se efetivar se houver investimentos em formação de professores do ensino comum e especial e um trabalho em colaboração de ambos, somando-se ao apoio de outros profissionais especializados ((PLETSCH, 2009; LAGO, 2010; RODRIGUES e LIMA-RODRIGUES 2011; VIRALONGA E MENDES, 2014; DIAS, ROSA e ANDRADE, 2015; MENDONÇA e SILVA, (2015).
A construção de uma rede de apoios, envolvendo a contratação de profissionais, treinamento e articulação da prestação de seus serviços de forma coletiva e colaborativa na escola. É importante considerar que o apoio desses serviços profissionais especializados na escola ou em sala de aula pode não partir de um princípio de via de mão única, em que pessoas experts tratam do assunto como se os profissionais que já se encontram na escola não tivessem nada a oferecer. Ao contrário, o trabalho em conjunto exige um compartilhar coletivo, em que ninguém se encontrará em um lugar de simples aprendiz de novas práticas e estratégias, mas sim de profissionais que se unem para compartilhar conhecimentos e práticas em busca de um objetivo único, que é a escolarização de todos os alunos (MENDES, VIRALONGA e ZERBATO, 2014, p. 43).
O princípio da colaboração tem se revelado uma importante estratégia para melhorar o desempenho acadêmico dos alunos com e sem deficiência, pois nessa parceria os professores não trabalham sozinhos, pois necessitam compartilhar responsabilidades e desenvolver habilidades visando o objetivo comum que é escolarizar todos os alunos. Contudo, é preciso entender que os envolvidos no trabalho colaborativo devem ser todos aqueles que fazem parte da cultura escolar: professores, administradores, comunidade e o próprio sistema escolar (MENDES 2006; BRAUM, 2012; LAGO, 2014; CARAMORI, 2014; VIRALONGA e MENDES, 2014).
Página 59Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014, p. 11) destacaram estratégias importantes para se trabalhar nos cursos de formação para que os profissionais da educação consigam minimizar as barreiras da aprendizagem e ofertar um ensino de qualidade para todos os alunos, dentre elas: a) oferecer informações e quebrar mitos e preconceitos; b) garantir formação permanente para todos os profissionais envolvidos no processo; c) valorizar o professor por importantes tarefas da escola; d) estabelecer sistemas de colaboração e/ou cooperação, criando e/ou fortalecendo uma rede de apoio.
Os modelos de colaboração – Ensino Colaborativo e Consultoria Colaborativa – já são reconhecidos pela academia como estratégias eficazes para favorecer a inclusão escolar e podem ser propostos entre professores do ensino comum, do ensino especial e demais profissionais da escola. A política de inclusão escolar brasileira continua ignorando essa alternativa de suporte ao priorizar e estimular serviços de apoio baseados no atendimento educacional especializado fora da sala de aula comum, ofertado em salas de recursos ou em instituições especializadas. Para se efetivar a inclusão escolar e garantir minimamente a escolarização de todos os alunos é necessário formar a equipe escolar para trabalhar de forma colaborativa. Contudo, isso demanda tempo e investimento por parte do poder público, assim os profissionais da educação continuam trabalhando de maneira isolada (MENDES, 2006).
Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014) afirmam que o modelo de trabalho baseado no Coensino é pautado na abordagem social porque pressupõe que a escola deve ser modificada e que é preciso qualificar o ensino ministrado na classe comum; pressupõe mudança na organização escolar, como a contratação de professores de Educação Especial em número suficiente para oferecer suporte na classe comum; a formação de equipes colaborativas; a inserção dos recursos materiais necessários na classe comum e a melhoria do ensino para todos os alunos.
Na Consultoria Colaborativa é possível um profissional especializado contribuir na resolução de problemas ligados à aprendizagem dos alunos; nessa relação professor e consultor podem se beneficiar aprendendo e ensinando ao mesmo tempo. De acordo com Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014, p. 17), o trabalho de colaboração entre profissionais da educação comum e especial é eficaz para resolver os problemas administrativos, pedagógicos, comportamentais - e também promover o desenvolvimento pessoal e profissional de todos os envolvidos - pesquisadores, estudantes de graduação e pós-graduação, professores, diretores, alunos com e sem deficiências - e das escolas inclusivas. Dessa forma, permite que todos os participantes coloquem-se em situação de aprendizes, havendo, portanto, uma relação de troca uns com os outros.
Segundo Souza (2011), a Consultoria Colaborativa traz em seu cerne a reflexão e a ação no contexto investigado e mostra-se como uma possibilidade de instrumentalizar o professor para compreender melhor os fenômenos educacionais, especificamente na promoção da inclusão de alunos com deficiência e no desenvolvimento profissional do professor. Ainda de acordo com a autora, a Consultoria é para o professor um processo de resolução de problemas que ocupa um período de tempo e segue determinados estágios. Durante todo esse processo, o consultor assiste o professor na sala de aula para maximizar o desenvolvimento educacional dos estudantes. O intercâmbio é colaborativo, havendo ênfase no papel igualitário entre professor e pesquisador, e o professor está livre todo o tempo para aceitar ou rejeitar as soluções recomendadas durante a Consultoria.
Página 60Silva (2010) e Mendes, Vilaronga e Zerbato, (2014) elencaram benefícios diretos e indiretos para todos os envolvidos no processo de Consultoria Colaborativa Escolar com destaque para: o desenvolvimento de uma relação próxima com os envolvidos; a oportunidade para os consultantes de receber assistência para lidar com dificuldades acadêmicas e comportamentais dos alunos; a geração de ideias que acontece mais facilmente quando duas ou mais pessoas estão envolvidas na resolução de um problema; a probabilidade de que questões subjacentes (frequentemente sistêmicas) sejam levadas por meio da discussão de problemas específicos relacionado com o aluno; sensação de segurança entre os consultantes, que sabe que existe um profissional para ajudá-los na busca pela solução de um problema; melhora nos serviços oferecidos para os alunos; potencial geração de ideias para o desenvolvimento e implantação de programas educacionais.
Nesse contexto, o papel principal do consultor escolar é favorecer assistência para os consultantes em relação à aprendizagem, ao desenvolvimento acadêmico e a escolarização de todos alunos, com ou sem deficiência; dessa forma, ele pode contribuir para melhorar a forma de atender os alunos público-alvo da educação especial na escola comum, bem como oportunizar um desenvolvimento profissional centrado no próprio ambiente escolar.
Percurso da pesquisa
O projeto foi submetido à aprovação da Subsecretaria Regional de Educação – SRE de Catalão – Goiás, por meio do Termo de Anuência e ao Comitê de Ética da Universidade Federal de Goiás - aprovado por meio do Parecer nº 2.013.294. Após anuência desses órgãos as professoras participantes receberam todas as informações necessárias acerca da sua participação na pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE.
Os dados foram produzidos na Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão durante o curso de formação continuada: “Consultoria Colaborativa Educacional viabilizando a colaboração entre profissionais da escola que atuam com alunos com deficiência intelectual - na rede de ensino estadual de Catalão – Goiás”.
Participaram dessa pesquisa cinco professoras de duas escolas públicas estaduais da cidade de Catalão que cursaram a referida formação continuada. Entre essas participantes estavam presentes profissionais que atuavam em diferentes funções no ambiente escolar: gestora, coordenadora pedagógica, professora de apoio à inclusão escolar, professora do AEE. Essas participantes foram identificadas por nomes fictícios visando à preservação da identidade de cada uma delas, sendo respectivamente: Acácia, Íris, Jasmim, Margarida, Liz.
Em relação à formação inicial e continuada das cinco participantes verificou-se que todas são pedagogas e possuem curso de pós-graduação em nível de especialização na área da Educação, sendo que uma possui Mestrado. A faixa etária da maioria das professoras estava acima dos 40 anos de idade; o tempo de experiência docente, para três participantes era em torno de 20 anos e para duas participantes era de dois anos.
Um dos instrumentos de coleta de dados foi um roteiro de entrevista semiestruturada, seguida do diário de campo, com as observações da pesquisadora. As entrevistas foram gravadas em áudio, cada entrevista durou cerca de 40 minutos a 1 hora e 15 minutos, as informações advindas desse processo foram transcritas de maneira a não revelar os vícios de linguagem. Os trechos selecionados e transcritos nos resultados estão dispostos com recuo de texto de 4 (quatro) centímetros e letra em itálico para diferenciar das citações teóricas; esses critérios foram baseados nos estudos de Manzini (2012).
Página 61O procedimento de análise adotado nessa pesquisa possibilitou a identificação de elementos pertinentes sobre o conteúdo investigado, ou seja, as entrevistas foram baseadas na análise de conteúdo de Bardin, (2016) e Franco, (2003) e a análise interpretativa apoiou-se nos indícios da perspectiva histórico cultural, bem como no referencial teórico que versa sobre a temática.
As contribuições de um curso de formação continuada baseado na consultoria colaborativa
As cinco participantes relataram que os conhecimentos adquiridos durante essa formação auxiliaram na forma de escolarizar os alunos com deficiência. Apontaram que o trabalho de Consultoria Colaborativa desenvolvido nas escolas foi realmente um diferencial, pois a partir dessa parceria perceberam a importância da continuidade nos estudos sobre a temática ao analisarem os temas abordados durante o curso; ampliaram o conhecimento sobre as atividades pedagógicas adaptadas e sobre como avaliar pedagogicamente os alunos com deficiência.
As participantes foram unânimes em relatar que a concepção acerca da deficiência e as possibilidades de se trabalhar o desenvolvimento desses alunos foram sendo ressignificadas a cada encontro dessa formação e que o fato de parte dessa formação ocorrer dentro do ambiente escolar contribuiu para perceberem a importância da colaboração entre os vários profissionais da escola como estratégia para a inclusão escolar.
Excerto 1 – Depois que a gente estuda a importância da colaboração na educação especial, a perspectiva da gente enquanto profissional muda. Eu achava que nem era possível isso, nunca tinha pensado nessa perspectiva do que seria o ensino colaborativo e a consultoria colaborativa porque a gente já vem com essa cultura do trabalho isolado enquanto aluno e enquanto profissional. E essa perspectiva, eu acho que seria a solução, com certeza, pra melhorar a educação porque a facilidade de um professor pode ser a dificuldade do outro, e assim por diante; é uma troca. A primeira resistência e barreira foram comigo mesma, [...] mas a partir do momento que a gente foi tentando, modificando e sendo mais otimista, é que fez a diferença. [...] (Professora Acácia)
O estudo de Caramori (2014) também apontou que a formação deve ocorrer dentro do ambiente escolar, contando com a participação de todos os envolvidos no processo educativo e destaca que o formato de trabalho na prática com a prática, por meio da colaboração, resolvendo problemas reais enfrentados pelos professores, repercute positivamente no aprendizado e na atuação profissional.
Excerto 2 - “Nossa, eu achei excepcional! Porque é tão difícil o pesquisador fazer esse trabalho dentro da escola, não é? [...] Eu acho que isso ajuda, acho que é contagiante; esse trabalho feito diretamente na escola de avaliar o nível de desenvolvimento dos alunos nos deu uma posição real, do que o aluno realmente é capaz de aprender, de desenvolver [...]” (Professora Liz)
O relato da Professora Liz indica que a deficiência não pode ser utilizada como justificativa para a não escolarização desses alunos. Todos os profissionais da escola, de acordo com suas atribuições, deveriam se responsabilizar pela inclusão escolar dos alunos que apresentam alguma deficiência; para isso, é indispensável pensar na formação de todos esses profissionais que fazem parte do contexto educacional, de modo que possam enfrentar os desafios postos pela educação contemporânea dentro da real necessidade da escola, onde os problemas são comuns a todos que dela fazem parte (PLETSCH, 2009, LAGO; 2010; ALMEIDA, 2016).
Página 62Segundo Lago (2009, p. 2040), “na colaboração é preciso acreditar que a aula pode ser modificada e organizada para que alunos com deficiência possam aprender ou diminuir as dificuldades com relação aos demais colegas”. Dessa forma, por meio da Consultoria Colaborativa, é possível ampliar saberes e elaborar estratégias que favorecessem o desenvolvimento acadêmico dos alunos com deficiência, assim como contribuir para o desenvolvimento profissional da equipe escolar que trabalha em favor da diversidade, inclusive da gestão escolar.
O gestor da escola na perspectiva inclusiva deve desenvolver ações que priorizam a escolarização de todos os alunos, incentivar o desenvolvimento profissional de todos os membros da equipe escolar e favorecer as parcerias com instituições, nos diversos segmentos sociais, para efetivar práticas inclusivas na escola comum (CAPELLINI, 2012, p. 51).
As pesquisas realizadas por Capellini (2012); Viralonga (2014) e Lago (2014) destacam que o gestor deve ser o primeiro a se conscientizar do seu papel na organização da escola de modo que se torne inclusiva. O gestor precisa ter conhecimentos para mobilizar práticas inclusivas entre sua equipe para que assim todos possam colaborar. O relato, a seguir, de uma das participantes que era gestora corrobora com essa afirmativa:
Excerto 2 - [...] contribuiu muito, quando vou conversar com a minha equipe e com os pais eu tenho mais argumento, eu tenho outro olhar sobre o trabalho delas em relação ao aluno com deficiência [...] eu enquanto gestora tenho uma visão geral, observo o comportamento dos alunos, converso com eles e também observo o professor e as atitudes deles em relação ao aluno com deficiência [...] eu preciso entender a deficiência dele, as limitações, as possibilidades de aprendizagem e incentivá-los sempre. A gente percebe quando o professor tem formação para trabalhar a favor desses alunos, o desenvolvimento deles acontece de maneira mais abrangente [...]. (Professora Liz)
A cinco participantes relataram que a orientação “in loco”, por meio da Consultoria Colaborativa, e o suporte durante todo o curso foram de grande valia para que conseguissem desempenhar melhor suas funções; sobretudo, algumas como a do professor de apoio e do AEE, as quais ainda não tinham muita clareza do papel a ser desempenhado. Nesse sentido, ressaltaram que a consultoria colaborativa atrelada à credibilidade e experiência da professora formadora ajudou a trilhar outros caminhos e possibilidades no trabalho junto aos alunos com deficiência.
Excerto 3 - Eu acho que esse foi o diferencial do curso, ao mesmo passo que o professor foi para a universidade adquirir os conhecimentos teóricos, a professora formadora veio para nossa escola conhecer os nossos alunos e nos ajudar a direcionar o trabalho com eles por meio da consultoria; [...] Eu cresci muito com esse acompanhamento por meio da consultoria porque como eu não tinha experiência como professora de apoio, e ela (refere-se à formadora) vai norteando, vai dando segurança, [...., [...]. E por meio da consultoria, ela foi elencando vários pontos que ela observava de avanços e que eu, por essa ansiedade de querer vê-lo responder como os demais responderiam, não conseguia observar os avanços dele. (Professora Acácia)
O referido curso baseado na Consultoria Colaborativa teve como foco as questões educacionais relativas ao aluno com deficiência e não na deficiência em si; diferente do modelo médico-pedagógico que ressalta as questões biológicas para definir as demandas pedagógicas. Conforme a teoria Vygotskyana, a deficiência deve ser considerada no sentido de possibilitar ações específicas e formas diferenciadas para impulsionar a aprendizagem do aluno. O trabalho colaborativo busca as possibilidades de aprendizagem dos alunos visando o seu desenvolvimento acadêmico e humano; de acordo com a teoria histórico-cultural, o professor deve proporcionar a todos os alunos os conhecimentos sistematizados e construídos historicamente pela humanidade (SILVA, 2013; LAGO, 2014; MENDES, VIRALONGA e ZERBATO, 2014).
Página 63Excerto 4 – [...] a gente só consegue alcançar o objetivo final se tiver essa rede de colaboração, e essa colaboração tem que ser entre todos os profissionais da escola; professor regente, de apoio, do AEE e coordenação. Enquanto a rede não estiver bem ligada e realmente colaborativa não irá funcionar bem, irá comprometer o funcionamento. [...]. (Professora Margarida)
A partir da análise dos relatos, verificou-se que as professoras participantes romperam com o paradigma que sustenta a maneira excludente de ensinar e propôs recursos pedagógicos que possibilitaram aos seus alunos o acesso aos conteúdos acadêmicos. Cabe à equipe escolar elaborar propostas pedagógicas baseadas nas especificidades do aluno com deficiência, organizar os conteúdos de acordo com os ritmos de aprendizagem dos alunos, rever metodologias de ensino, de forma que essas auxiliem na motivação dos alunos; conceber a avaliação como um processo, visando ao progresso de todos os alunos
Excerto 5 – “Esse curso ajudou a trabalhar não só com os alunos com deficiência, mas também os que não têm nenhuma deficiência, mas têm outras peculiaridades no comportamento, na carência, no abandono emocional por parte das famílias; [...] meu olhar ficou mais sensível às diferenças dos alunos. [...]. A consultoria me ajudou muito no trabalho com o aluno com DI que acompanho [...] a consultoria e a experiência da professora formadora com a deficiência intelectual me auxiliou muito nesse trabalho. Hoje não faço mais aquelas tarefas infantilizadas, repetitivas e sem novidades.” (Professora Íris)
Os relatos dessas professoras enfatizam a importância do trabalho realizado em colaboração com as escolas e nas escolas. Segundo Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014) e Lago (2014), a prática atual em Educação Especial mais promissora é a prática da colaboração entre os profissionais da escola e da educação especial, tanto por meio do ensino colaborativo quanto pela consultoria colaborativa.
Nesse sentido, embora a formação dessas profissionais tenha sido voltada para o trabalho em ambientes homogêneos, essa formação continuada conseguiu mostrar outro viés, ou seja, o trabalho voltado para diversidade e pautado nos princípios da inclusão escolar, contemplando aspectos da Educação Especial associada ao cotidiano de suas realidades escolares.
Os resultados, de maneira geral, apontaram a formação docente como um processo de desenvolvimento profissional emancipatório, como evolução, como continuidade de experiências. As participantes ressaltaram a importância da formação em serviço, pois nesse curso conseguiram atrelar teoria e prática articulando diferentes saberes ao buscarem atender às demandas da escolarização desses alunos nas escolas onde atuam.
Considerações finais
De maneira geral, as cursistas relataram que a parceria Universidade/Escola estabelecida por meio da consultoria colaborativa é fundamental na ampliação do conhecimento das(os) professoras(es) da Educação Básica. De acordo com os relatos foi um curso que trouxe a expertise da pesquisadora nessa área sem deixar de atrelar teoria e prática, pois além da formação na universidade com relatos de experiências, parte teórica, planejamento, avaliações, adaptações curriculares, a pesquisadora prestou a consultoria colaborativa nas escolas para conhecer a realidade dos profissionais envolvidos nessa formação, bem como a realidade dos alunos com deficiência intelectual matriculados nessas escolas.
As participantes destacaram que os conhecimentos adquiridos acerca da deficiência, das possibilidades de aprendizagem e do modo de escolarizar esses alunos foram de grande valia tanto para as mudanças de suas concepções quanto das suas práticas pedagógicas juntos aos alunos com deficiência. Essas mudanças refletiram na atuação profissional dessas participantes e, também na equipe gestora, visto que passaram a acreditar na escolarização desses alunos.
Página 64Os resultados analisados apontaram para a necessidade de ampliação de cursos de formação continuada que sejam mais próximos da realidade vivenciada pelos profissionais da escola e por seus alunos com deficiência, bem como a colaboração entre os profissionais da Educação Especial e da escola comum como sendo uma perspectiva real de apoio à inclusão escolar.
Apesar de destacar a importância da colaboração entre os profissionais para se efetivar práticas inclusivas, as participantes admitem que essa ainda não acontece de maneira satisfatória no ambiente escolar, principalmente entre o professor regente, de apoio e do AEE. Uns dos caminhos apontados para essa efetivação seria por meio dos cursos de formação para todos os profissionais envolvidos no processo de inclusão escolar. Muitas ainda não conheciam essa perspectiva da colaboração e tampouco tinham vivenciado nas suas práticas.
A visão das cinco professoras em relação a essa formação foi muito positiva no que se refere aos conteúdos trabalhados sobre Educação Especial e alunos com deficiência, pois ressaltaram que se apropriaram dos conhecimentos teóricos sobre a Educação Especial e das especificidades da forma de escolarizar esses alunos de forma colaborativa.
Sobre os(as) autores(as)
Daniela Maria Ferreira Campos é pedagoga, professora da rede estadual de Educação do Estado de Goiás, mestre em Educação pela Universidade Federal de Goiás pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Regional Catalão. Experiência em Tecnologias na Educação, Formação de Professores e Educação Inclusiva e Pesquisa Colaborativa. Atualmente, atua como professora da Sala de Recurso Multifuncional da Escola Estadual João Neto de Campos. Autora da dissertação de mestrado cujo título é: Formação Continuada de Professores por Meio da Consultoria Colaborativa: Contribuições para Atuação Profissional no Contexto da Inclusão Escolar
Danúsia Cardoso Lago possui graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB/2005), mestrado e doutorado em Educação do Indivíduo Especial pela Universidade Federal de São Carlos - Conceito 6 (UFSCar/2010 e 2014). Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e pesquisadora pós-doc na Universidade Federal de Goiás (UFG), Regional Catalão - Programa de Pós-Graduação em Educação. Tem experiência na área de Educação com ênfase na formação de professores, atuando, principalmente, nos seguintes temas: educação especial, inclusão escolar, deficiência intelectual, ensino colaborativo, políticas públicas de inclusão escolar, estágio supervisionado.
Maria Marta Lopes Flores possui graduação em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO-1991), mestrado em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU/2000) e doutorado em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP/2005) e pós-doutorado pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Atualmente é professora titular da Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão (UFG). Tem experiência na área de Educação com ênfase em Inclusão Escolar - políticas e Práticas, atuando nos seguintes temas: Educação Infantil, Formação de Professores, Financiamento da Educação, Gestão Escolar. É professora do programa de Pós-Graduação em Educação e coordena a linha de pesquisa deste programa denominada Práticas Educativas, Formação de Professores e Inclusão. É vice-líder do grupo de Pesquisa Práticas Educativas e Inclusão-Neppein do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). É vice-chefe da Unidade Acadêmica Especial de Educação (UAEE).
Página 65Referências
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